³⁵|Laranja avermelhado
Ela está acabando comigo. Não há outro jeito de dizer. Genevieve Prescott. Está. Acabando. Comigo. Ponto.
E a sensação é muito boa. E muito assustadora.
— Meu cabelo está bom? — ela pergunta, alheia a minha conclusão, enquanto passa as mãos pelos cabelos.
Estamos tentando parecer que não acabamos de foder no escritório do meu pai.
— Você está linda — digo pela segunda vez esta noite. Pouco. Preciso dizer isso a ela mais vezes.
Genevieve tenta esconder o sorriso, abaixando o rosto e fingindo que está ajeitando seu vestido.
O que fizemos aqui foi… loucura. Novamente. Antes tínhamos sido guiados pela raiva e hoje… pela distração? Acho que sim, eu precisava parar de pensar por um minuto e Genevieve me deu isso. Ela é tão incrível. Não pelo sexo… Quer dizer, por isso também, mas eu me refiro ao fato de ela ter entendido mesmo sem eu ter que explicar.
Ergo seu queixo e deixo um beijo em seus lábios.
— Obrigado — digo com sinceridade.
— Estou sempre pronta para uma transa de distração — ela brinca.
Mas da próxima vez não será distração, é o que não digo a ela. Eu estava planejando como isso aqui ia acontecer de novo, mas apesar de ter acontecido antes, fico feliz que ela tenha aceitado ir a um encontro comigo. É louco como eu fiquei nervoso para convidá-la, algo bobo comparado as outras coisas que fizemos.
Nós nos afastamos para dar espaço um para o outro e eu já começo a sentir falta dela, do seu corpo ao meu redor, do seu cheiro.
Expiro antes que eu atinja o recorde e fique duro novamente.
— Own, esse é você?! — Genevieve pergunta, os olhos brilhando.
Aproximo-me dela que está parada ao lado da mesa de meu pai, segurando um dos porta-retratos que ele mantém aqui. A foto é no aniversário de sete de Khalil, eu acho. Eu tinha três anos e não me lembro direito. Mas na fotografia, somos papai, Khalil e eu atrás de uma mesa com um bolo gigante. Meu pai está me segurando enquanto eu me inclino para frente e ajudo meu irmão a apagar a vela.
— É, sim — respondo a Genevieve, acariciando seu braço.
— Você era tão fofinho. Khalil também. Nunca achei que fosse achar o seu irmão fofinho.
— Não deixe ele ouvir isso. — Rio um pouco.
— Seu pai era um gato. Minha nossa.
Faço uma careta, tentando tirar o porta-retrato da sua mão, mas ela não deixa, se afastando.
— Espere!
— Se você continuar babando eu vou contar a Carlota — ameaço.
— Ela sabe que o marido dela é bonitão.
Arqueio a sobrancelha.
— Passamos do passado para o presente?
— Ele está muito bem para um senhor de idade. — Finalmente, ela larga o porta-retrato e se aproxima, passando os braços ao redor do meu pescoço. — Mas eu prefiro o filho.
— Que sortudo eu sou. — Sorrio como um idiota. Tipo, eu estou literalmente sorrindo de orelha a orelha. Eu tento parar, mas parece impossível com Genevieve olhando para mim como se eu tivesse dito que ela pode comer todos os docinhos do universo. — Tudo bem aí?
— É possível alguém gozar apenas com um sorriso? — pergunta, os olhos vidrados.
Dou risada. Juro por Deus que ela ronrona.
— Eu espero que não ou estarei causando uma crise orgástica para todo mundo de agora em diante.
— Isso foi fofo, mas sinto que ainda posso gozar se você continuar sorrindo assim, então por favor, pare ou dessa vez vamos transar nessa mesa.
— Acho que meu pai não gostaria disso.
— Agora você entende o meu ponto?
Eu rio outra vez, mas é sem querer. Ela murmura alguma coisa, enquanto tento me controlar, e se afasta de mim. Eu novamente lamento silenciosamente até seus olhos voltarem de novo para a foto e ela franzir as sobrancelhas.
— Achei que sua mãe tinha ido embora quando você tinha seis anos. — Ela volta a pegar o porta-retrato. — Você tem o quê aqui, quatro?
— Três. — Imito sua expressão, também confuso por um momento. Olivia deveria estar nessa foto… — Ah. — Lembro-me então.
Meu pai achou que eu não lembrava de quando ela sumiu pela primeira vez, e eu realmente não lembrava, mas juntando essa foto, minha memória fragmentada daquela época e o que meu pai disse, tenho quase certeza que essa foto foi tirada quando ela não estava lá.
— Quando ela foi embora de vez, não foi a primeira vez que ela sumiu — conto a Genevieve, que está prestando atenção em mim agora. — Meu pai disse que ela sumiu por uns seis meses quando eu tinha três anos. Deve ter sido nessa época. — Ela não teria se importado de faltar ao aniversário de Khalil.
Pensar nisso só faz o que estava tentando esquecer por uns momentos, voltar, levando embora quase todo o meu bom humor.
— Você não sabe por quê? — Genevieve pergunta, colocando o porta-retrato de volta no lugar pela segunda vez.
— Não. Meu pai disse que ela só deixou um bilhete e voltou depois como se nada tivesse acontecido.
— E ele não perguntou? Quer dizer, a esposa dele sumiu, voltou e ele não quis saber onde ela estava?
— Ele não queria mais brigas. E ele a amava.
Ficamos em silêncio, com Genevieve ainda franzindo as sobrancelhas.
Encosto-me na mesa, cruzando meus braços.
— Ele colocou um detetive atrás dela. — Ouço-me dizer o que tem me atormentado na última hora.
— Quando ela sumiu da primeira vez?
Nego.
— Agora.
Genevieve fica em silêncio por alguns segundos até falar novamente:
— Não sei se estou entendendo.
— Meu pai colocou um detetive para achar a Olivia. Agora, depois de vinte e seis anos. — Solto o ar.
Eu precisava dizer isso em voz alta para começar a fazer sentido. Meu pai realmente fez isso. Sem nos consultar.
— Você está de brincadeira? — perguntei após ouvir o que meu pai disse. A decisão que ele tomou sem perguntar se Khalil e eu estávamos de acordo.
Khalil estava encostado na parede do quarto dos nossos pais, de braços cruzados. Ele não disse nada ainda e seu silêncio em momentos como esse nunca é uma coisa boa.
— Eu não brincaria com isso — meu pai falou tranquilamente, ajeitando sua gravata na frente do espelho.
— Então você está louco — atirei de volta, irritado, principalmente com sua calma depois de soltar essa bomba aos nossos pés. — Porra, por que você achou que isso seria uma boa ideia?
— Ela é mãe de vocês…
— Não. Nós só temos uma mãe e ela está lá embaixo agora — eu o interrompi. — Aliás, ela está sabendo disso?
— Sim e ela concorda comigo.
Balancei a cabeça, sem acreditar. Eu esperava tudo a essa altura, menos essa merda. Achar Olívia, depois de todos esses anos? Ele andou bebendo?
— Ela nos abandonou. Não queremos nada com ela. Está ouvindo? Pode desistir de procurá-la.
— Ela pode ter se arrependido, Eros. Todos merecem uma segunda chance. — Enrico virou para mim, me olhando nos olhos. Isso parece ser mesmo importante para ele. Não faz sentido e eu não me importo.
— E nós decidimos se vamos dar uma segunda chance ou não. E você já sabe a nossa resposta. — Sabia que estava falando em nome de Khalil, mas se ele não me interrompeu, é porque concordava. — Você não pode esperar que…
— Eu já tomei a minha decisão, Eros. — Em outro momento eu teria parado, porque meu pai raramente usa seu tom cortante que indica fim de conversa. Ele é amigável e todo paz e amor. Mas isso seria em outro momento, agora me aproximei dele para que ele ouvisse com atenção.
— A decisão não é sua — falei. Acho que nunca bati de frente com meu pai antes. Mas ele não demonstra surpresa, Anthony, por outro lado, que estava quieto até agora, dá um passo à frente. — É as nossas vidas e você não vai trazer aquela mulher para nossa família. Ela fez a escolha dela ao ir embora, e teve todos esses anos para vir até nós, o que ela não fez. Então esqueça essa merda.
Meu pai apenas ergueu o queixo, nenhum pouco abalado.
— Eu não vou voltar atrás, queira você ou não. Agora pare de birra e aja como o homem crescido que eu criei.
Eu não sei quais as próximas palavras que sairiam da minha boca, mas sei que não seriam agradáveis, muito menos algo que eu deveria dizer ao meu pai, quando Khalil se colocou entre nós dois, de costas para nosso pai e de frente para mim, pondo uma mão em meu peito.
— Chega — Khalil disse. Sua expressão era tão inabalável quanto a do homem atrás dele.
— Chega? — Afasto sua mão, mais que irritado, puto. — Vai me dizer que você está de acordo com essa palhaçada?
— Não, eu não estou. — Khalil pôs a mão em meu ombro, apertando tanto que eu sabia que ele me daria um soco se eu o afastasse outra vez.
Eu definitivamente estava disposto a me arriscar a isso, até ele prosseguir:
— Mas eu vou arrancar os olhos dela se ela chegar a um metro de nós.
Eu o encarei. Ele estava falando sério. Eu sei que deveria me preocupar, mas o contrário acontece: sinto um alívio diante da sua promessa.
— Khalil — nosso pai o adverte e meu irmão se afasta para poder olhar para Enrico.
— Eu não quebro promessas. Se você achar aquela cadela e ela tentar se aproximar de nós, eu acabo com ela.
— Ela é sua mãe… — meu pai tentou, apenas para ser interrompido.
— Você ouviu o que Eros disse: nossa verdadeira mãe está lá embaixo, e não perdida no mundo.
Meu pai soltou um suspiro. Não apenas por causa da declaração de Khalil, mas pelo que ele admitiu. É raro ouvirmos ele chamando Carlota de mãe, apesar de ele claramente ser grato e amá-la como uma.
Pela primeira vez, meu pai pareceu cansado e eu vacilei um pouco.
— Terminamos esse assunto depois — ele diz com sua habitual calma. — Agora vamos descer e aproveitar a festa.
Solto um suspiro.
— E foi isso — murmuro para Genevieve depois de contar tudo.
— Uau. — Ela senta em uma das cadeiras acolchoadas. Acho que foi muita informação para ela. — Ele tomou essa decisão tão do nada assim? E sem consultar vocês? Não parece algo que seu pai faria.
— Eu não sei mais de nada. — Suspiro de novo, passando minha mão pelo meu cabelo.
Genevieve pega minha outra mão, entrelaçando-a a sua. Seus olhos são atenciosos ao procurarem meu olhar.
— Quer falar sobre isso? — pergunta.
Franzo o cenho, segurando sua mão com as minhas duas. Toco o anel de noivado em seu dedo, observando a safira que é da cor dos seus olhos. Esse com certeza é um dos seus melhores trabalhos e me vejo orgulhoso dela — não pela primeira vez.
Lembrando do que Genevieve perguntou, penso nisso. Não sei se estou bem. Parei de pensar em reencontrar Olívia desde que tive idade para entender que o que ela fez foi uma escolha. Ela nos abandonou e não voltou depois.
— Não quero reencontrá-la — confesso. — Ela nunca voltou para nós, nem uma vez, nunca ligou ou mandou um cartão postal. E ainda tem tudo o que ela fez ao Khalil. Não posso perdoá-la.
Genevieve anue, entendendo, mas hesita. Ela tem uma opinião sobre isso mas não sabe ao certo se deve dizer ou não. Aperto sua mão para encorajá-la. Quero saber o que ela pensa sobre tudo isso.
— Sua mãe ainda está na minha lista negra — Genevieve começa. — Acho que nenhuma mãe que realmente ama seus filhos iria tratá-los mal ou abandoná-los, mas talvez, apenas talvez, você devesse ter uma conversa com ela caso a encontrem.
Não digo nada, raciocinando o que ela disse. Genevieve vê isso como encorajamento para continuar.
— Ela pode ter se arrependido, mas não voltou por vergonha, certo? Ou porque achou que era melhor assim, que vocês estavam melhor sem ela. — Genevieve dá de ombros. — Talvez algo tenha acontecido. Ela pode até já estar…
— Morta — completo quando ela hesita. Genevieve anue.
— Mas se ela estiver viva, acho que você poderia ouvir o que ela tem a dizer. Não estou dizendo para perdoá-la, só… tenha certeza.
Assentindo, expiro novamente.
— Vou pensar nisso. — Então acrescento ao beijar seus dedos: — Obrigado.
Genevieve sorri, apertando minha mão.
— Agora vamos voltar antes que comecem a achar que morremos aqui.
💎
Nós voltamos para a festa e tento esquecer esse assunto. Pelo menos pelas próximas horas. Não é nenhuma novidade que eu não esteja afim de socializar com desconhecidos que só querem saber das nossas vidas, mas diferente das outras vezes, não fazemos isso. Genevieve nos leva diretamente para a mesa onde minha família deve ficar, mas no momento apenas Khalil está lá.
Apesar do que eu falei sobre esquecer aquele assunto, as palavras do meu irmão voltam a minha mente. Eu acredito que ele não vai deixar Olívia se aproximar de nós. Ou melhor — pior, dependendo do ponto de vista — ele realmente pode fazer alguma coisa. Eu deveria estar preocupado porque ele ameaçou abertamente a mulher que nos gerou, e até estou um pouco, sim, mas não o suficiente para querer começar uma briga por causa disso.
Puxo uma cadeira para Genevieve, que me agradece com um sorriso depois de se sentar. Eu ocupo o assento ao seu lado, ficando entre ela e meu irmão.
Khalil obviamente não está com um terno completo, preferindo sua jaqueta de couro. Acho que ele se classifica no que chamam de "bad boy".
— Como vão as coisas na empresa? — pergunto a Khalil, puxando assunto. Ele tem passado mais tempo lá, com nosso pai que o está treinando. Acredito que em poucos anos ele poderá assumir inteiramente quando papai estiver pronto para se aposentar.
— Entediantes. — Dá de ombros. Ele olha para minha entrelaçada a de Genevieve e franze as sobrancelhas. — Pensei que você disse que essa coisa não era real.
Felizmente estamos falando baixo, mas ainda fico alerta para caso Genevieve nos ouça. Não contei a ela que Khalil sabe de tudo ou que foi ele que vazou as fotos.
— As coisas mudam — digo simplesmente.
Khalil encara Genevieve. Por tanto tempo que começo a ficar tenso.
— Pare com essa merda. — Chuto seu pé.
Ele ainda a encara por cerca de cinco segundos — os quais eu quase perco a paciência — antes de finalmente desviar o olhar para mim.
— Apenas tenha certeza disso. E tome cuidado.
Reviro os olhos, mas… no fundo fico surpreso. Não muito porque sei que ele se importa — o que ele confessou naquele dia é uma prova disso — mas ainda me choca, sim.
Genevieve aperta minha mão e eu olho para ela, me aproximando para ouvi-la.
— O que foi isso? — pergunta.
— Ele só está preocupado — asseguro. Eu sei que Khalil pode ser assustador às vezes. — Desculpe se te incomodou.
Genevieve olha Khalil por um momento e depois balança a cabeça, voltando sua atenção para mim.
— Não. Tudo bem. Na verdade, acho bonito isso, que você e seus irmãos se preocupam um com o outro.
Não sei o que dizer quanto a isso. Apesar de todas nossas diferenças, meus irmãos e eu sempre protegemos um ao outro — mesmo quando pode não ser necessário ou que gere brigas.
Depois que Genevieve fica suspirando ao comer uma trufa de cereja, eu peço para o garçom trazer mais para ela, que fica horrorizada com o prato cheio de trufas que o garçom coloca na sua frente.
— Eu não vou comer tudo isso — diz.
Quando Kate vem se juntar a nós, apenas cinco trufas restam.
— Acho que eu estou bêbada — Kate murmura. Eu olho para ela, percebendo que seus olhos estão mesmo um pouco vidrados.
— Você veio com o seu carro? — pergunto.
— Não. Eu queria aproveitar a festa e a bebida de graça.
— Podemos dar carona a você — Genevieve oferece o que eu já estava prestes a fazer.
Kate faz uma careta.
— Muito obrigada, mas prefiro não entrar naquele carro.
Por um segundo, não entendo o que ela quer dizer com isso, mas então Genevieve entorna todo o champanhe da sua taça, ficando vermelha.
— Ops! — Kate exclama, rindo. — Talvez eu fale demais quando estou bêbada.
— Tô começando a perceber — Genevieve murmura, me lançando um olhar arrependido.
Balanço a cabeça, achando graça. Não me importo que ela contou a Kate sobre o que aconteceu no carro mais cedo. Depois que Kate ouviu tudo o que aconteceu no escritório, acho que relato sobre o banco de trás do carro não é nada.
As duas ficam fofocando pelos próximos minutos, mas não participo da conversa, sendo tão silencioso quanto Khalil. Notei que ele está bebendo enérgico e não álcool, e eu também recuso quando um garçom tenta me servir uma taça de champanhe.
Nossos pais e Anthony ainda estão falando com as pessoas e socializando por todos nós. Mesmo com a discussão que tive com meu pai mais cedo, estou orgulhoso da nossa família, da Blackburn Empire e seus setenta anos. Sinto orgulho de trabalhar em uma das maiores empresas de joias do país. E logo, da Europa também, quando o projeto de expandir nossas filiais para além da América, der certo.
Depois do que parece ser horas, meus pais e os outros convidados finalmente se sentam e o jantar começa a ser servido. Ainda não estou pronto para falar com meus pais normalmente, então por um momento, a tensão em nossa mesa é óbvia. Eu sei que Anthony está incomodado, mas ele não vai se meter, e nossa mãe, apesar de não falar, acha minha atitude infantil, mas irá me dar um tempo para eu digerir isso.
Ela e papai vão esperar por um bom tempo então.
💎
— Você gosta mais de vermelho ou rosa? — Freya pergunta subitamente, deitada no chão da academia enquanto desenha em um papel ofício.
— Vermelho — respondo, minha respiração um pouco ofegante por causa do peso que estou levantando.
— Eu também! É a cor do meu cabelo e da mamãe. Só que não é tãããão vermelho. Também é laranja. Tem um nome pra isso?
— Laranja avermelhado.
— Laranja avamelhado — ela repete, me tirando uma risada.
— Avermelhado, Spider — corrijo-a gentilmente.
— Avermelhado. Laranja avermelhado — ela fica repetindo isso várias e várias vezes enquanto sua mãozinha se move em cima do papel que ela está desenhando.
Já deve faltar poucas para às 07h00, o que significa que estou aqui há uma hora. Eu acordei mais cedo e precisava descarregar minha ansiedade em alguma coisa, então vim para a academia. Freya apareceu meia hora atrás, com folhas de papel, dois estojos e perguntando se podia ficar comigo porque a mãe dela ainda não havia acordado. É claro que não me impus contra isso, pelo contrário, perguntei se ela não queria tomar café. Como ela negou e não disse nada sobre estar com fome ainda, decidi terminar meu treino.
Agora está quietinha deitada no chão enquanto desenha, ocasionalmente me perguntando qual cor eu prefiro ou o que eu gostaria que ela desenhasse.
Eu estou feliz com a sua companhia. Aliviado, até. Às vezes ainda me vejo pensando no que aconteceu há duas semanas. Acho que nem o término abrupto do meu antigo relacionamento não me deixou com um sentimento tão ruim, uma devastação tão grande, quanto foi quando Freya começou a me afastar e depois me olhou com medo. Eu me senti um lixo total, não sabia o que estava acontecendo, apenas que aquela garotinha doce e sempre alegre não estava mais sorrindo para mim.
Foi uma das piores sensações que já senti na minha vida. E não quero que se repita.
— Você gosta de flores? — A voz de Freya me faz voltar ao presente.
— Não sei. Não tenho nada contra elas.
— Eu gosto. Eu gosto de girassóis, margaridas, lírios e… Aquela que tem cor lilás.
— Violetas?
— Não. É outra. — Freya suspira e ouço o barulho da sua mão quando ela bate contra sua testa.
— Me fale mais sobre ela. É lilás e…?
— Sabe as árvores de Natal?
Franzo as sobrancelhas, começando a ficar confuso.
— Pinheiros?
— É, isso. É tipo pinheiro, só que menores e lilás.
Ponho a barra com os pesos no lugar de apoio, resolvendo parar por aqui.
— Lavanda? — pergunto após um momento de pesquisa no meu cérebro que sabe o nome de pouquíssimas flores.
— Isso! Isso, lavanda. — Freya comemora. — São as flores preferidas da mamãe e as minhas também.
— São? — Sento, pegando minha toalha e enxugando meu rosto.
— Sim. Ela diz que rosas são muito… — Quando não acha a palavra, Freya, fecha os olhos, concentrada.
— Clichê?
— Isso! Como você consegue lembrar de tanta coisa? — Ela olha para mim fazendo biquinho. — A minha cabeça é pequena. Não cabe tanta coisa.
— Você está me chamando de cabeção, Spider? — Dou risada. Essa garota é uma figura.
Freya arregala os olhos.
— Isso é uma palavra feia? Eu não sabia! — Ela faz uma pausa. — Mas sua cabeça é mesmo maior que a minha.
Ainda rindo, fico de pé pegando minha garrafa de água.
— Não. Quer dizer, talvez. — Faço uma careta, sou péssimo em educar uma criança. — Mas é melhor não chamar as pessoas assim. Elas podem não gostar.
— Tá bom!
— Certo. Agora vamos tomar café. — Eu a ajudo a guardar seus lápis de cor e suas canetinhas coloridas, então deixamos a academia.
Ela não tem escola porque já está de férias, então Genevieve e eu a deixaremos com a minha mãe quando formos trabalhar daqui a pouco. Genevieve ficou meio relutante com essa ideia, mas eu sei que com os últimos acontecimentos, ela não está confiando em muitas pessoas para ficarem com Freya e minha mãe é a única pessoa entre as que ela confia que está disponível por oito horas seguidas.
Isso me lembra de outra coisa, alguém na verdade. Tobias não dá as caras desde o jantar com a minha família. Quando ele colocou aquelas baboseiras na cabeça de Freya. Se Genevieve não tivesse me convencido, eu teria feito uma loucura, com certeza. Mas não vou mentir que gostei quando ela disse que deu um soco no filho da puta.
— Mamãe, você já acordou. — Freya corre até Genevieve que, de fato, está bem acordada e aparentemente fazendo waffles.
— Bom dia, flor do dia. Pra quem não gosta de acordar cedo, você caiu da cama hoje.
— Eu não caí da cama!
Genevieve e eu rimos. Eu gostaria de estar filmando momentos como esse. Não só para registrar as pérolas da Freya, mas também a risada de Genevieve que afasta todas as minhas preocupações.
— É modo de dizer, meu bem — Genevieve diz enquanto vou lavar minhas mãos. — Você escovou os dentes?
Freya nega.
— Eu não queria te acordar fazendo barulho.
Genevieve semicerra os olhos.
— Sei, espertinha. Eu estou acordada agora, pode ir.
A garota vai fazer o que a mãe mandou e eu enxugo minhas mãos, me aproximando dela.
— Bom dia — murmuro, lhe dando um beijo.
— Bom dia, Raio de Sol. — Genevieve retribui o beijo, um sorriso em seus lábios.
Percebo que quero que essa manhã se repita para sempre.
— Acordou de bom humor? — questiono. Ela ainda está de pijama – uma blusinha de alças finas e uma calça folgada com estampa de bolinhas. Não deveria ser sexy, mas agora eu quero mais do que beijá-la.
— Talvez. Freya não te acordou, né? Eu já falei para ela não sair do quarto até eu acordar.
— Eu já estava acordado. Não precisa pedir para ela ficar no quarto. — Franzo as sobrancelhas. — Quero que ela se sinta em casa.
Genevieve fica me encarando, mas anue.
— Por que vamos mais tarde hoje mesmo? — pergunta, mudando de assunto.
Dou de ombros e aproveito para começar a preparar as panquecas de Freya.
— Não precisamos ir tão cedo para a empresa. Na verdade, podemos até trabalhar de casa a maior parte do tempo.
— Mas você ama trabalhar no seu escritório.
— Ocupava minha mente. Além disso, eu gostava da rotina. Era melhor do que ficar em uma casa vazia.
Apesar de amar os cachorros e odiar interações humanas na maior parte do tempo, ir para a empresa me dava um propósito e me impedia de ficar louco nessa casa, tendo apenas os cachorros como companhia.
— Não é mais assim? — Genevieve pergunta.
Como vou dizer a ela que desde que Freya e ela vieram para cá, quero passar mais tempo com elas e de repente meu trabalho não é mais a coisa mais importante da minha vida? Como posso explicar isso a ela sem assustá-la? Estou tentando ir com calma principalmente com a certeza que venho tendo a cada dia que passa sobre meus sentimentos por ela, e não quero afastá-la ou assustá-la com isso.
— Não. Não é — digo simplesmente, sufocando todo o resto.
💎
Meu pai marcou outra reunião apenas com meus irmãos e eu. Kate me avisa por mensagem antes de eu chegar na empresa. No caminho, passamos na casa dos meus pais para deixar Freya com minha mãe. Ela não sabia sobre o que poderia ser essa reunião.
Se for algo relacionado a Olívia, eu estou pronto para outra discussão. Não mudei meu pensamento ou estou tranquilo com meu pai tomando essa decisão por nós.
Genevieve nota o meu mau humor enquanto ainda estamos no carro, e tagarela o resto do trajeto. É uma conversa totalmente unilateral, mas me pego realmente prestando atenção no que ela está dizendo. Contando, na verdade, sobre o novo livro que ela está lendo. Eu fico tão entretido na sua voz e na sua animação ao contar, que paro de pensar sobre essa reunião, que quando chegamos na empresa estou menos tenso.
— Obrigado — digo a Genevieve quando entramos no elevador.
— Não sei do que você está falando — murmura.
— Você está linda, aliás. — Olho para ela pela milionésima vez, para o seu vestido azul rodado acima dos joelhos. Azul é bom.
— Obrigada. Você finalmente parou de reclamar que eu fico burlando o código de vestimenta.
Dou de ombros.
— Eu gosto do que vejo.
Genevieve me lança um olhar pelo espelho do elevador, um sorriso surgindo em seus lábios.
Quando chegamos ao nosso andar, Kate me informa que meu pai e meus irmãos já estão me esperando, então deixo ela e Genevieve para trás.
Katrina diz a mesma coisa que Kate quando chego no andar da presidência e quase reviro os olhos.
Ao entrar na sala, sem bater, suspiro.
— Então? Pra quê esse mistério todo? — Fecho a porta, chamando a atenção dos três.
Meu pai está em sua cadeira e Khalil está atrás dele, encostado nas janelas de vidro, os braços cruzados e o rosto impassível. Anthony está sentado em uma cadeira de frente para a mesa do nosso pai e parece tão confuso e ansioso quanto eu.
— Bom dia pra você também, Eros — meu pai cumprimenta.
— Tenho trabalho a fazer. Vou agradecer se for direto ao ponto — digo, parando atrás da cadeira vazia, ficando em pé ao invés de me sentar.
Tenho a sensação que meu pai quer falar algo sobre o meu comportamento, mas muda de ideia. Ótimo.
— Os cofres da empresa estão vazios.
Nós três o encaramos em silêncio por um momento enquanto o que ele diz se assenta em nossos cérebros.
— Espere, o quê?
— Como assim "vazios"?
— Desde quando…
— Isso é impossível…
Anthony e eu estamos falando ao mesmo tempo, mas eu não ligo, só quero entender que porra foi que eu acabei de ouvir. Eu devo estar delirando, certo? Não há como isso ser real.
— Eu sei, parece um absurdo — nosso pai volta a falar, erguendo a mão para que a gente cale a boca. — Mas eu mesmo revisei as contas, passei a última semana em reuniões com o pessoal da contabilidade. Não temos dinheiro para pagar o próximo trimestre dos funcionários.
— Que caralho — Anthony pragueja.
Resolvo me sentar, então.
— Como? Como isso pode ter acontecido? — exijo. — Isso não acontece da noite para o dia.
— Não, não acontece. — Papai fica de pé, passando a mão pelo rosto. — Fomos roubados. E foi alguém de dentro. Não há rastros.
Estou balançando minha cabeça, sem acreditar. Eu preferia que ele me dissesse que acharam Olivia. Seria melhor do que isso.
— Eu não contei à mãe de vocês ainda — meu pai continua. — Ela estava animada planejando a festa, eu não quis estragar tudo.
— A casa em Oak Park — Khalil fala de repente. — Você está vendendo para cobrir essa bagunça.
Enrico nega.
— Parece irônico, mas eu já havia decidido vender a casa antes de descobrir sobre isso.
— O que vamos fazer agora? — Anthony questiona.
Nosso pai suspira, apoiando as mãos na mesa. Posso ver o peso de tudo isso recaindo sobre seus ombros.
— Já contratei uma empresa para investigar isso, mas ainda não acionei a polícia.
— Mas isso não nos dá dinheiro — termino por ele.
— Não. — Outro suspiro. — Mas vou cuidar disso.
Nós sabemos que ele fará isso e não pedirá nossa ajuda. Papai venderá imóveis e irá usar todo dinheiro de suas contas pessoais para salvar a empresa. Mas apesar do que ele pensa, não vamos deixar que carregue o peso sozinho. Não preciso nem perguntar aos meus irmãos, pois o os olhares nos rostos deles dizem isso.
— Foi o Tobias — digo após o silêncio. Olho para meu pai. — Eu não tenho dúvidas disso.
— Essa é uma acusação muito grave — Óbvio que ele diria isso.
— Mas é a verdade e o senhor sabe. Ele sumiu depois que Genevieve foi atrás dele. — Eu contei ao meu pai o que Tobias fez para que ele enxergasse quem Tobias é, além de exigir sua demissão.
— Ele teria que ter tido ajuda…
— As pessoas não são tão leais quanto nós pensamos, aparentemente. Eu não ponho a minha mão no fogo por ninguém nessa empresa além da nossa família. — Eles sabem que incluo Genevieve e Kate nisso. — Tobias esteve aqui por tempo demais para fazer a cabeça de quem quer que o tenha ajudado.
Meu pai não diz nada por um momento, voltando a sentar. Ele parece ainda mais cansado do que ontem.
Eu vou matar o filho da puta do Tobias.
— Tudo bem. Eu vou investigar isso. Agora vão e não falem com ninguém além dessa sala sobre isso.
Arqueio a sobrancelha.
— Certo. Tirando Genevieve e a Kate. Elas são da família.
Anuo, já ficando de pé e me preparando para ir quando Khalil diz:
— Lembre-se que sua noiva ainda pode ser uma espiã, Eros.
Viro-me para ele.
— Por que você não vai se foder?
— Ok. Chega. Vamos. — Anthony me empurra antes que nosso pai comece com alguma bronca sobre não xingarmos e agirmos como adultos.
Definitivamente um bom dia, não é?
💎
Me encontre na sala ao lado, mando para Genevieve depois de voltar do escritório do meu pai.
Ainda não contei a ela e a Kate sobre essa bomba. Eu mesmo ainda estou digerindo isso. Nunca achei que Tobias iria tão longe para me ferir, por isso estou começando a achar que há mais nessa história. Ele não pode ter acordado um dia e decidido que ia roubar a minha família, certo? Além disso, ele pode ser bom de lábia, mais dois meses é pouco tempo para causar o estrago financeiro que ele causou.
Suspiro, tentando relaxar. Não quero que Genevieve note como estou tenso. Não quero esconder isso dela, mas não quero falar isso ainda. Tenho algo para ela e não quero estragar tudo com meu mau humor ou minhas preocupações.
— Toc, toc. — Falando nela… Genevieve entra na sala, fechando a porta atrás de si. — Oi.
— Oi.
Ela vem até mim, onde estou perto das janelas de vidro. Esse escritório é quase do tamanho do meu, apenas mais largo, porém com a mesma vista de tirar o fôlego. Está vazio agora — tirando uma mesa de madeira — e nossas vozes fazem eco pelo cômodo.
— O que estamos fazendo aqui? — Genevieve pergunta, desconfiada, olhando em volta da sala, para as paredes brancas, o chão que está brilhando a ponto de vermos nosso reflexo nele. — Você vai mudar de escritório?
— Não. — Olho em volta da sala de novo e depois para seu rosto, seus olhos curiosos que estão ainda mais azuis por conta da luz. — É pra você.
Ela pisca e depois ri.
— Estagiárias não têm escritórios. Muito menos um desse tamanho. — Ela parece muito convencida disso, então vou até a mesa, pegando a pasta que deixei lá em cima.
— Você está certa. Estagiárias não têm escritórios assim. — Lhe entrego a pasta, pondo minhas mãos nos bolsos em seguida, observando ela abrir. — Mas Designer de Joias, sim.
Seus olhos se arregalam, olhando da pasta para mim.
Genevieve lê o que está escrito e engole em seco algumas vezes antes de conseguir falar.
— A Blackburn Empire quer me contratar como Designer de Joias?
— Sim. Já era hora, não acha? — É uma pergunta retórica porque definitivamente já deveríamos ter feito isso e a culpa de ter demorado tanto, foi minha.
— Mas tínhamos combinado que isso só aconteceria depois que o noivado falso acabasse. — Ela olha para mim, seus olhos emotivos. — Achei que ainda íamos conversar sobre isso.
— É verdade, mas você já esperou tempo demais para essa promoção, Genevieve.
Ela franze as sobrancelhas, encarando a pasta.
— Você não está fazendo isso apenas porque nós…
— Não — a interrompo, meu tom firme o suficiente para não haver dúvidas. Ela volta a olhar para mim, esperando. Tiro minhas mãos dos bolsos e seguro seu rosto. — Eu já disse a você mais de uma vez o quanto admiro o seu trabalho. Você é muito boa no que faz. Incrível, na verdade. Todos os pequenos projetos que você trabalhou foram perfeitos. E eu peço desculpas.
— Desculpas?
— Sim. Eu… — Desvio do seu olhar, envergonhado. — Eu julguei você mal. Deixei meu ódio pela sua família guiar minhas atitudes referentes a você e não lhe dei o real valor profissional que você merece. — Trago meus olhos de volta para ela. — Não estou dando essa promoção a você. Você conquistou isso há muito tempo e assim como peço desculpas por ter demorado tanto para enxergar o meu erro, peço também que assine esse contrato e seja nossa nova Designer de Joias e trabalhe comigo de igual para igual.
Genevieve engole em seco novamente e se afasta de mim, dando alguns passos pela sala, olhando para o escritório com novos olhos. Há um sorriso em seus lábios que cresce à medida que ela observa tudo de novo.
— Você pode decorar como você quiser — falo. — Mas um retrato meu naquela parede é obrigatório.
Ela balança a cabeça.
— Nada disso. Eu só aceitaria se fosse um retrato onde você está sorrindo e nós sabemos que seu sorriso pode virar um problema mundial.
De fato, estou tentando não sorrir no momento. Eu consigo me controlar para não sorrir como um idiota, mas não posso fazer nada contra a queimação que sinto em meu rosto.
— Você está corando! — Genevieve dá risada.
— Hum? Eu não. — Viro o rosto quando ela se aproxima outra vez.
— Sim. Você, sim. Tão fofinho.
Faço uma careta. Isso a faz rir mais e eu já não estou me importando que estou corando feito um adolescente recebendo um elogio da garota de quem ele gosta. Eu a puxo pela cintura e selo nossos lábios, sentindo o gosto de morangos e paraíso que ela tem.
— Eu preciso de uma caneta — Genevieve murmura.
Felizmente, tenho uma em meu paletó.
Entrego a ela, que quebra nosso beijo, mas não se afasta. Não, ela apenas apoia a pasta com o contrato em meu peito e assina seu nome.
— Você nem leu — lembro-a.
— Eu confio em você.
Eu pisco e ela também para por um momento, percebendo o que falou. Eu espero ela retirar, mas Genevieve realmente quis dizer o que disse.
Ponho uma mecha do seu cabelo atrás da orelha e acaricio sua bochecha.
— Eu também confio em você — digo baixinho, sentindo algo em meu peito inchar. Eu não digo essas palavras há muito tempo.
Genevieve sorri e me beija outra vez. Eu não preciso explicar, ela sabe o que significa dizer essas palavras depois de tanto tempo.
Abraçando-a pela cintura, eu a giro no ar, e sorrio ao ouvir o seu gritinho.
— Você está segurando a nova Designer de Joias da Blackburn Empire — ela sussurra contra meus lábios.
Eu ainda não tinha certeza sobre os meus sentimentos, mas nada nunca esteve tão claro.
Eu estou apaixonado por Genevieve Prescott e nunca estive tão feliz quanto agora.
💎
Ooooii. Agora sim a semana começou!
O que acharam do Capitulo?
Espero que estejam gostando deles grandes pq os próximos estão enormes (com mais de 6K LAZMKSKWZKKWKSAKA
Confesso a vocês que suspirei aliviada com a cena do Eros e da Freya na academia 😭😭😭♥. Minha cena preferida desse capítulo foi essa. E a de vcs?
Rezem pra ter capítulo sexta-feira 💋
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MEU PERFIL: AUTORA.STELLA
2BJS, MÔRES♥
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