Capítulo 29
ALLAN
Saí da cozinha para deixá-las a sós, mas não me contive, fiquei em uma pilastra escondido para ouvir o que elas iam falar. Rebecca contou que suspeitava que Mi-Suk gostava de mim desde o começo das aulas, pelo visto ela estava certa mesmo. Depois começou a contar sobre a noite na casa de Mi-Suk, em como ela disse que Rebecca tinha um corpo bonito...
— Logo eu, Leth, que me acho gorda, a garota é magrinha — ela aumentou a voz gradativamente e eu permanecia quieto e ouvindo.
— É porque ela tem corpo de criança — minha prima comentou. Letícia não ia dizer que Rebecca não estava gorda? Porque eu diria, ela estava ótima, era pesada sim, mas porque tinha presença.
— Ela é baixa, também, ia ficar estranho se tivesse corpão. Então, ela disse que tirava boas fotos e me convenceu a deixá-la tirar algumas minhas, para eu ver como era bonita e tal. Eu aceitei, estava precisando aumentar a minha autoestima e foi assim que tiramos as fotos. E foi isso, cheguei a pensar que ela era homossexual, mas depois ela foi tomar banho e eu me vesti e fui dormir.
— Será que ela foi tocar uma siriric4 pensando em você? — eu arregalei os olhos, porra, Letícia era uma maldita maluca, como uma garota como Rebecca era amiga de minha prima?
— Que nojo, não fala merda, Letícia! — ouvi um som de tapa, imaginei que Rebecca tinha dado um tapa em Leth e sorri. — Ela deve ter ido mandar as fotos pra ele. Eu estou com muita vergonha do seu primo, tinha foto minha em várias posições, até de bruços na cama e... eu estava com uma lingerie vermelha minúscula, Letícia!
Rebecca tinha abaixado o tom da voz e ouvi Leth cair na gargalhada. Para mim, foi de mais, tive que sair de mansinho da pilastra e quase correr até o meu quarto, eu tive uma er*ção com a lembrança daquelas imagens que recebi. Eu precisava de uma namorada, ou até alguém para uma noite, usando camisinha tudo é possível. E eu morava sozinho, estava assustado comigo mesmo por nunca ter trazido nenhuma pra cá, sem contar com Rebecca que veio bêbada e só pra dormir. Ainda assim tinha sido um momento que não se esquece tão rápido.
Voltei para as meninas quando já estava com o amigo mais calmo, elas disseram que já estavam de saída, Rebecca mal olhava pra mim, muito menos imaginava a proposta que eu faria agora.
— Rebecca, posso ir com você pra sua casa? Um amigo meu mora lá perto, faz tempo que não vou lá na minha antiga vizinhança também. — eu disse casualmente, era verdade o que dizi, mas eu também queria um tempo com ela para conversar sobre algumas coisas, só estava unindo o útil ao agradável.
Ela hesitou.
— Ah, claro, pode sim...
— É que não sei direito qual ônibus pegar. — esclaresci.
— Vamos ter que ir daqui para próximo da faculdade, lá passa o ônibus que vai pra nossa casa. Quer dizer, pra minha casa e a sua antiga. — ela estava nervosa, mas deixei passar, provavelmente estava assim porque a vi seminua. Coitada, eu a entendi.
— Allan... — Letícia chamou a minha atenção, seu tom de aviso e ela estava com uma cara que insinuava alguma coisa, nenhuma boa provavelmente, já que vinha dela.
— Se liga, Letícia — reviro os olhos e a empurro pra fora. Elas saíram e tranquei a porta.
— Vou pra casa de um amigo, nos vemos segunda — Letícia acenou pra gente e foi na direção de um ponto de ônibus que ficava ali perto, ela era muito louca, nem tinha avisado antes.
Rebecca e eu fizemos o primeiro destino de ônibus em silêncio, depois ficamos um bom tempo esperando o outro perto da faculdade, esse a viagem seria mais longa e teríamos tempo pra conversar, imaginava que ela teria coisas pra me dizer também. Ela estava de mochila ainda, eu quis carregar, mas ela agradeceu e disse que não precisava. Ela ainda não olhava no meu rosto, imagine se soubesse que já tinha visto ela de lingerie antes, ao vivo...
— Como anda a vida, Rebecca? — eu puxei assunto logo que entramos no ônibus de poltronas confortáveis, ela quis pegar o mais barato, mas eu não faria essa viagem longa em um banco desconfortável, então paguei nossa passagem para irmos com mais conforto.
— Ah, vai bem, nada de novo. Não saí do país nenhuma vez nem nada. — ela falava me lançando olhares rápido, sem nunca me encarar de verdade, ao contrário de mim que olhava sem desviar. Queria passar a mão em seus cachinhos, pareciam macios.
— É alguma indireta? — eu ri. — Saiba que é muito bom viajar, talvez um dia você também saia do país, acho que vai gostar.
— Algum Lollapalooza em Chicago ou Rock in Rio em Portugual, quem sabe?... — ela disse sorrindo, pelo visto contando seus sonhos que eu não sabia.
— De Portugal eu só quero o nosso ouro de volta — eu brinquei e ela riu ainda mais, virando o rosto pra janela.
— E seu irmão, como vai? Sua família... — sabia que ela tinha curiosidades sobre mim, então vamos finalmente engatar em uma conversa longa, eu queria saber tantas coisas...
— Juliano lembra de você, ele chegou de mencioná-la algumas vezes — ela me olhou surpresa e eu jamais teria coragem de dizer que ele dizia coisas idiotas sobre ela. — Meus pais estão bem, estão felizes por estar de volta à Coreia do Sul.
— Você nasceu lá? — ela passou a olhar pra mim agora, estava mais relaxada e nos reclinamos no banco, virados uma para o outro.
— Não, nasci no Brasil, meus pais acharam que seria legal criar os filhos aqui, conseguiram o emprego de seus sonhos rápidos. Doideira, não é?
— Sim, eles se arrependem? — ela fez uma cara engraçada e eu dei risada. O ônibus começou a sair, mas estávamos entretidos de mais na conversa para reparar qualquer coisa que acontecia a nossa volta.
— Não, mas estão felizes de estarem de volta, de rever a família... — dei de ombros.
— E por que você voltou? Se quiser falar, claro — ela me olhava com curiosidade, mas eu tive que hesitar muito antes de dar alguma desculpapróxima da verdade.
— Sentia falta daqui, minha vida toda foi aqui, apesar de ter gostado de lá, estava bem mais familiarizado com o Brasil. Fora meus amigos, também.
— A maioria saiu também, foram jogar futebol fora, você ficou sabendo?
— Fiquei, sim. Futebol não é mais pra mim, gosto de assistir, mas jogar já não me deixa tão empolgado quanto antes. Acho que aconteceu depois que desloquei o ombro e fiquei meses sem jogar.
— Eu lembro desse dia... — ela desviou o olhar. — Foi o primeiro jogo que assisti de verdade de vocês, o outro jogador te deu uma trombada... Sabe, tenho que confessar que fiquei muito preocupada. Fiquei a tarde todo daquele dia na janela de casa esperando você e sua família chegar do hospital, só descansei quando o vi chegar rindo com a tipoia e parecia estar bem.
— Ficou a tarde toda me esperando? Sério? Achei que me odiava naquela época, Rebecca. — eu mal podia acreditar no que ela dizia, estava frustrado, por que ela nunca tinha me dito aquilo?
— Eu nunca te odiei de verdade, Allan...
— Não se odeia de mentirinha — cortei.
— Eu nunca te odeiei, ponto, só não era a fim de você na época. — ela não me encarou de novo ao dizer, não podia me dar ao luxo de achar que ela era a fim de mim agora.
— E a carta, o que achou dela? Lembra o que estava escrito? Eu não lembro muito.
— Já que estamos sendo sinceros e colocando os pingos nos "is", preciso dizer que gostei bastante da carta, nunca tinha recebido uma de nenhum garoto. Claro, fiquei achando que era algum trote no começo...
— Você, sempre com a mente fértil — eu sorri.
— Mas depois eu continuei lendo e relendo a cartinha, senti verdade nas suas palavras, eu fui até a sua casa agradecer, mas você não estava mais... — ela parecia mesmo triste ao contar, eu não podia acreditar ainda no que ouvia, o tempo todo eu achando que ela não tinha dado a mínimo para a minha cartinha.
— É sério? — eu sussurrei, continuava a olhar o seu perfil, já que ela não queria me encarar.
— A cartinha dizia: "Para a linda garota que rouba os meus pensamentos toda a noite, uma joia rara que as joalherias não tem. Quando eu tiver a honra de um encontro com você, vou compor um soneto, e eu nem sei o que é isso... Com carinho, A." — ela recitou toda a carta com um pequeno sorriso no rosto e com o olhar longe, fiquei tocado, ela tinha gravado cada palavra na cabeça, eu queria beijá-la naquele exato momento.
— Rebecca...
— Eu sei, eu fiquei lendo vezes de mais e acabei gravando tudo, eu me sentia perdida, pois você tinha me escrito algo tão lindo e logo depois foi embora para nunca mais voltar. — falou, em tom de ressentimento.
— Eu achei que você tinha odiado a carta, assim como achei que tinha me odiado, esperei no colégio você falar comigo e você simplesmente foi embora sem me dizer nada. Minha família já tinha programado a viagem de férias, então joguei tudo pro alto e fiquei feliz de deixar tudo pra trás por um tempo. Só que as coisas lá ficaram emotivas, nossa família nos recebeu de braços abertos e meus pais viram que meu irmão e eu gostamos de lá. Fora o ensino, você sabe... E foi assim que decidimos morar lá de vez.
Parei pra respirar e aproveitei para beber a água da garrafinha que eu tinha comprado no ponto de ônibus.
— Ah, eu sempre quis saber o que tinha acontecido, eu não fazia ideia.
— Pois é, palavras não ditas as vezes magoam pessoas. Mas enfim, eu voltei e estou feliz por isso, agora sou bilíngue — eu sorri e ela também, nossos rostos estavam próximos e ficamos nos encarando por algum tempo, até ela voltar a falar.
— Conheceu um monte de garotas Corenas por lá? — ela estava rindo e fazendo parecer que estava brincando, mas eu sabia que ela queria mesmo saber se eu tive namorada e coisas assim.
— Ainda pensando mal sobre mim, rockeirinha? — ela revirou os olhos, sorrindo. — Eu não tive nenhum namorada lá, mas digamos que as aulas particulares de Coreano com a minha professora foram produtivos.
Eu ri, para descontrair, talvez não devesse ter dito aquilo, mas simplesmente saiu, eu me sentia a vontade com Rebecca.
— Você tr4nsou com a sua professora? — ela ergueu as sobrabcelhas e eu dei risada.
— Ela era nova, Rebecca, era só dois anos mais velha do que eu e só me dava aula com saias de colegial para provocar. Mas enfim, nem era para estar te contando isso. É que foi a minha primeira vez depois de... sabe, eu acho que ela nem sabia disso. — eu não podia contar sobre a minha primeira vez de verdade ainda.
— Primeira vez? Eu lembro de ter visto uma gaveta cheia de camisinhas na sua casa aquele dia em que me passou o trote que caiu.
— Um homem tem que estar sempre prevenido, Rebequinha. — eu pisquei e ela revirou os olhos.
— É, bem, talvez tenha sido mesmo informações de mais...
— Mas e você, vai me dizer que também não saiu com ninguém...
Ele ficou vermelha na hora e desviou os olhos, se sentando ereta enquanto falava.
— Eu não! A única pessoa que beijei depois de você foi... — ela se interrompeu e botou as mãos nos lábios, me olhou com os arregalados antes de desviar de novo.
Algo na sua postura me fez supor que eu conhecia a pessoa, ou ela não teria agido assim. Fiquei nervoso e me sentei também.
— Quem? Quem você beijou, Rebecca?
—Pra que quer saber? Acabou de dizer que se divertiu com a sua professora Coreana.
— Não vou deixar você fazer isso, quero saber quem é, pois tenho a leve impressão de que é alguém que eu conheço.
— Eu não sei, prometemos nunca falar pra ninguém, e foi um grande erro... — ela resmungava com os ombros baixo. Que merda, quem que eu conhecia tinha beijado ela depois de mim?
— Olha, eu sei que não tenho nada a ver com quem você beija ou não, mas achei que estávamos sendo sinceros um com o outro, tenho certeza que estávamos nos entendendo...
— Dylan! — ela exclamou o nome rápido e colocou as mãos no rosto.
Não, claro que ela não tinha dito aquele nome. Eu com certeza tinha ouvido errado.
— Quem?
— Dylan e eu nos beijamos.
Senti o mundo girar em baixo dos meus pés, meu coração disparou e minha mente rodava a mil, me senti enjoado. Não era possível aquilo, eles se odiavam, Dylan a odiava. Ele estava sempre chamando ela de estranha, dizendo coisas que a diminuíam. Eu me sentia cada vez mais péssimo, traído, pelo dois. Dylan tinha beijado ela depois que fui embora, ele provavelmente gostava dela quando eu também gostava e por isso tentava me fazer achá-la uma menina estranha e até feia. Eu não tinha certeza se era isso, mas iria descobrir depois, ia por ele contra a parede, no momento eu só sentia uma dor dilacerante no peito e no estômago.
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