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Capítulo 6 - LÍVIA

HENRIQUE RESMUNGA QUASE INADIVALMENTE.

Ele olha no relógio pela décima vez enquanto estamos parados no trânsito. Tento acalmá-lo afagando sua coxa, mas nada parece tirar a tensão nos nós de seus dedos. Há mais de quarenta minutos estamos presos em um congestionamento com, pelo menos, dois quilômetro de carros parados à nossa frente. Embora Henrique seja calmo, esse tipo de situação o tira do sério, perdendo apenas para o irmão.

Ele afrouxa a gravata e confere as horas outra vez. Já ligamos na empresa para avisarmos sobre nosso atraso, no entanto, Henrique continua nervoso. Subitamente, ele desce do carro, e o acompanho com o olhar enquanto ele anda alguns metros e troca algumas palavras com um policial auxiliando na organização do trânsito. Instantes depois, ele volta.

— O que aconteceu? — pergunto quando Henrique se senta ao banco do motorista.

— Um acidente entre um utilitário e um ônibus. Estão resgatando as vítimas do carro. O motorista ficou preso nas ferragens. Estão desviando o percurso dos carros, mas está uma loucura lá na frente.

Um pequeno calafrio percorre meu corpo, uma sensação sombria eriça meus pelos. Remexo-me no assento.

— Você está bem? — Ouço sua voz

— Sim. Só... não gosto de acidentes.

Ele suspira e acena, tornando a olhar para frente.

Busco pelas horas em meu relógio de pulso. 13h27min. Suspiro pensando que há vinte e sete minutos eu já deveria estar na empresa. De repente, lembro-me de que às 14h00min. eu e Alfredo participaremos de uma reunião com os representantes da filial londrina. A essas alturas, ele já deveria estar enchendo meu número com ligações, querendo saber por qual motivo ainda não cheguei. Mas, por alguma razão, sequer me deu uma ligação. Procuro meu celular na bolsa e disco para o ramal de sua sala, após alguns toques sem ninguém atender, sou direcionada para o ramal de Jéssica, sua atual secretária executiva, e ela atende prontamente.

— Oi, Jéssica, é Lívia. Alfredo já chegou? — falo e, quando pronuncio o nome dele, sinto os olhos de Henrique correr até mim.

Já tem um ano desde que resolvi dar uma "chance de verdade" a nós. Dizer ter sido um fracasso é eufemismo. Ainda não sinto por ele o que realmente gostaria de sentir. Tenho um grande afeto e carisma por Henrique, um amor pela pessoa dele, por ser tão paciente e tolerante. Gosto dos nossos momentos juntos, dos encontros a dois ou com Enzo, do sexo e do modo como ele deita minha cabeça sobre seu peito após fazermos amor. Mas nada é comparável ao modo como eu realmente gostaria de amá-lo.

Mas, mesmo assim, continuo a insistir nesse relacionamento. Há oito meses estamos morando juntos. Compramos um apartamento maior, e eu aluguei o meu antigo. Ele insistiu para eu vender, mas algo dentro de mim me aconselhou a não. Ponderei todas as possibilidades, uma delas era se, nós não déssemos certo, eu teria para onde ir.

E mesmo após um ano de relacionamento sério com Henrique, ele ainda cerra os punhos de raiva ao ouvir o nome do irmão ser pronunciado. Principalmente quando eu o pronuncio.

Ele ainda não chegou, senhorita Lívia — é a resposta de Jéssica atravessando a linha de telefone. Pergunto-me se ele também não estará preso no engarrafamento.

— Ele ligou avisando se irá se atrasar?

Não. Ele não ligou.

Franzo o cenho. Alfredo normalmente notifica quando irá se atrasar ou se ausentar da empresa. O que é realmente estranho.

— Está bem, Jéssica. Faça-me um favor, sim? — continuo — Caso ele apareça antes de mim, diga que estou presa no trânsito e provavelmente não chegarei a tempo para a reunião com os londrinos. E sem nenhum de nós chegarmos em vinte minutos, avise aos investidores, remarque a reunião para o mais breve possível e, caso necessário, faça um reserva de hospedagem a eles por conta da empresa, certo? — passo as instruções a ela, que emite um "sim, senhorita", e a chamada é encerrada.

Suspiro pesadamente e guardo o celular, já com a bateria fraca. Ótimo!, penso no carregador no fundo da minha gaveta de sutiã.

— Algum problema? — Henrique indaga, passando a primeira marcha para andarmos mais cinco metros apenas.

— Temos uma reunião importante, mas Alfredo também não apareceu.

— Talvez também esteja no trânsito.

Aceno, concordando. Após mais uns dez minutos de quilômetros de carro parado, finalmente começamos a sair do lugar, apesar de muito vagarosamente, mas é constante.

— Sabe o que causou esse acidente? — pergunto a Henrique enquanto nos movimentamos lentamente.

— Segundo o policial, um ônibus atravessou o sinal vermelho e bateu contra o carro. O impacto foi tão forte que o veículo capotou duas vezes. — Fico imaginando horrorizada a cena desse acidente. Henrique continua a falar, e a sensação sombria percorre novamente minha espinha: — Pelas informações, o motorista do ônibus está bem. E bêbado. Pergunto-me como pode existir gente irresponsável dessa maneira: dirigindo embriagado um ônibus.

Assinto, sentindo meu estômago embrulhar. Eu definitivamente não gosto de ouvir ou falar sobre tragédias.

— Alguma morte? — pergunto de repente.

— Não sei, o policial também não soube informar. Ainda estão resgatando as vítimas.

Suspiro, e a fila de carros parece diminuir conforme andamos.

Já no horizonte, consigo divisar um caminhão de bombeiros e um carro de resgate em torno de um determinado local. A pista do lado esquerdo está totalmente fechada, e as duas faixas da avenida, quando próximas ao ponto do acidente, se tornam apenas uma.

Vamos aproximando aos poucos, e a cena à minha frente mexe com meus nervos. O carro acidentado está de ponta-cabeça, impossível reconhecer modelo ou marca, alguns homens do corpo de bombeiro trabalham para cortar a lataria do veículo, todo retorcido. Meus olhos correm pela circunferência do local fechado com uma faixa amarela. Dois homens carregam uma maca; o corpo sobre ela está todo coberto por uma manta térmica de alumínio. Bem, agora sabemos que há uma morte, pelo menos. Outro arrepio na coluna. Passamos pelo acidente, e eu fico imaginando a dor da família quando receber a notícia da morte daquela pessoa.

Quando chegamos à empresa, já são 14h15 min., e corro para o andar da presidência, batendo fortemente o pé no piso do elevador enquanto ele sobe. Se eu tiver um pouco de sorte, ainda consigo participar da reunião com os londrinos.

As portas se abrem, e marcho em direção à sala de Jéssica.

— Alfredo já chegou? — pergunto após ela dizer "entre"

— Ainda não. — Sua voz agora é um pouco alarmada.

— Alguma ligação dele? — Jéssica nega com a cabeça, uma pequena preocupação me corrói por dentro. — Tentou fazer contato?

— Sim, mas o celular está desligado.

Alfredo nunca foi homem de sumir assim, dessa maneira. Tirando o ocorrido de um ano atrás, quando ele se ausentou por uma semana por conta do término do nosso relacionamento, esse episódio jamais se repetiu.

— E Sophie, tentou falar com ela? Eles iriam almoçar juntos.

— Sim, mas o celular dela também está desligado. E na casa deles ninguém atende.

Suspiro estranhando totalmente o "sumiço" dos dois.

Troco mais algumas palavras com Jéssica sobre a reunião com os londrinos e, após ela me confirmar que toda a agenda de Alfredo já fora remarcada, sigo para minha sala. Sento-me frente ao computador, tento fazer meu serviço e tirar o atraso de um relatório incompleto precisando urgentemente ser digitado e finalizado. Mas simplesmente não consigo. As imagens de aço retorcido e de um corpo sendo retirado em plena luz do dia não saem da minha mente. O telefone sobre minha mesa toca e me sobressalta com o barulho estridente. Atendo, é Helena, minha assistente:

É uma ligação do hospital São Camilo — me informa, e meu coração salta. São Camilo é o hospital de convênio com a Hauser Alimentícia, e a ideia de que alguma coisa aconteceu a Enzo me deixa agitada de nervosismo.

— Repasse a ligação, por favor — peço e espero por um segundo, que parece ser uma eternidade, antes de uma voz feminina se pronunciar:

Senhorita Lívia Diniz? — a voz pergunta.

— Sim, ela mesma. O que houve? — Tento controlar o desespero em minha voz, repetindo um "não é nada demais".

Há em nossos registros alguns números de telefones para informamos em caso de emergência. Este é o terceiro e o único que obtivemos retorno.

Meu coração vem à boca. Emergência? Minhas mãos começam a ficar tremulantes, mal consigo segurar o telefone.

— Sim, sou a responsável por Enzo Hauser. O que aconteceu com meu filho? — digo, já levantando da cadeira, meu coração está apertado.

O paciente internado em nosso hospital não foi o seu filho, senhorita. — Pestanejo e ao mesmo tempo me sinto aliviada por saber que Enzo está bem. Não tenho tempo de perguntar de quem se trata o paciente, a recepcionista vai logo informando: — O conveniado na nossa emergência é o senhor Alfredo Hauser.

Na mesma hora sinto meu sangue congelar. O alívio de não ser meu filho quem deu entrada na emergência é substituído pela preocupação.

— O que aconteceu com ele? É grave? — Quase me engasgo com minhas palavras. A mulher me explica o ocorrido; segundos depois estou atravessando a empresa sentindo meu coração descompassado e as lágrimas enchendo meus olhos.

— Henrique...! — chamo-o, abrindo a porta abruptamente. Ele está analisando alguns papéis quando entro de repente, o baque da porta contra a parede o faz saltar na cadeira, assustado.

Tento controlar minhas emoções, mas simplesmente não consigo. Meu rosto molhado e a respiração falha são visíveis a qualquer pessoa distante uns vinte quilômetros. Ao ver meu estado transtornado, ele se levanta com um semblante preocupado e vem até mim.

— Ei, o que aconteceu? Por que está chorando? — pergunta, aflito, e faz menção de me abraçar, mas me esquivo.

— O acidente... há pouco... Era... era o seu... irmão nele! — balbucio nas palavras, não encontro força suficiente para dizer de uma fez e preciso fazer pausas para chorar. Mal consigo enxergar através dos meus olhos embaçados pelas lágrimas acumuladas.

— O quê? — murmura, em choque.

Então, entre lágrimas e soluços, lhe falo sobre a ligação do hospital.

— Qual é o estado dele? — pergunta-me com sua voz alarmada.

— Está vivo, mas com ferimentos muito graves. Pode não resistir... Henri... eu... — soluço mais uma vez e sou envolvida pelos braços de Henrique, ele se esforça para me acalmar. — A recepcionista não me falou de Lauren ou de Sophie... mas nós vimos o carro capotado, a maca com um corpo, não vimos? É ela, não é? Oh, meu Deus, Henrique... — o pensamento de Sophie morta me deixa estarrecida e aperta ainda mais meu coração. Estive com ela há apenas algumas horas. A falta de notícias sobre Lauren também me faz deduzir o pior.

Precisamos ir ao hospital. E avisar à mamãe. — Henrique pronuncia, me afastando de seu peito e olhando em meus olhos, controlando os nervos. Alguém precisa manter a sanidade no lugar.

Decido deixar Henrique dirigir. Ele está estranhamente calmo enquanto estou num desespero insano, embora eu não saiba explicar. Talvez eu seja sensível demais, ou por quê, querendo ou não, Alfredo é uma pessoa importante na minha vida, ou ainda por que trabalhamos juntos. Ou talvez por todos estes motivos.

Henrique mal estaciona o carro e já estou correndo para dentro do hospital; ele precisa esticar mais as pernas para me acompanhar.

— Somos os familiares de Alfredo Hauser. Queremos notícias dele, da esposa e da filha — exijo com minha voz engasgada para a recepcionista. Henrique pousa sua mão sobre meu ombro, tentando me acalmar. Como ele consegue estar tão tranquilo sabendo que o irmão pode até mesmo morrer? Balanço a cabeça fortemente querendo desviar pensamentos negativos dela. A mulher a nossa frente digita algo em seu computador, a espera parece infinita.

— Chamarei o médico responsável, ele dirá exatamente o estado do senhor Alfredo — a mulher diz e se levanta caminhando por um corredor extenso e virando à esquerda, sumindo do nosso campo de visão.

Henrique e eu nos acomodamos em um sofá ali próximo, enquanto aguardamos pelo médico. A espera parece quase eterna, não consigo parar de balançar as pernas. Mil coisas se passam pela minha cabeça. Como uma forma de defesa e negação, tento não pensar no pior para Sophie e Lauren, apesar de todas as evidências indicarem o óbvio.

Subitamente, uma loura usando jaleco surge, nos perguntando se somos parentes de Alfredo. Levanto-me imediatamente e desembesto a perguntar sobre ele.

— Sou a doutora Ariana Mendes — ela nos cumprimenta, e eu quase lhe digo não me importar com seu nome.

— Henrique Hauser — eles se cumprimentam — Sou irmão do Alfredo. Essa é Lívia, minha mulher — a loura aperta minha mão, enquanto pergunto outra vez por Alfredo, Lauren e Sophie. Ariana comprime os lábios e nos conta tudo. A cada palavra dela, sinto um pedaço de mim morrer.

***

Uma semana desde o acidente já se passou, Alfredo continua em coma, com algumas poucas melhoras. Mas seu estado ainda é grave. Sentada na poltrona de seu quarto, o observo. O rosto com uma barba um pouco mais grossa do que de seu costume; seus cabelos cresceram alguns centímetros — nem sei como consigo reparar nisso. O rosto está tampado pela quantidade de tubos para auxiliá-lo na respiração. O medidor cardíaco apita constantemente e invade meus pensamentos enquanto divago.

Há sete dias me revezo entre dona Carmen, Karlita e Bernardo (ele veio da França assim que o avisei) para ficarmos de companhia para Alfredo, e isso tem me cansado física e mentalmente. A pressão do trabalho, a tensão do estado dele, minha vida em cuidar de Enzo, da casa e a convivência com Henrique, mais a canseira acumulada, massacram meu corpo e mente. Mas eu não me importo. Apenas anseio fortemente em vê-lo bem outra vez.

A Doutora Ariana sempre está presente, nos deixando a par do estado dele, nos alertando sobre a probabilidade de Alfredo permanecer em coma por tempo indeterminado. Quanto mais tempo o paciente passa inconsciente, menores são as chances de despertar. O paciente pode passar meses — talvez anos — em coma. E todos os dias eu rezei para ele despertar o mais rápido possível.

Sou interrompida de meus pensamentos quando ouço baterem à porta, e Henrique surge. Levanto-me, indo em sua direção.

— Oi... — sussurro e o beijo rapidamente.

— Como ele está? — cochicha ainda na porta

— Do mesmo jeito — suspiro e olho para trás.

— Podemos conversar? — Volto-me a Henrique e aceno, saindo com ele até o corredor do quarto.

Henrique cruza os braços e me encara com uma expressão impossível de decifrar.

— Por quanto tempo vai ficar aqui? — me pergunta

Olho no relógio.

— São dez da noite. Só saio amanhã cedo.

Ele desvia os olhos e bufa.

Por que ele está bufando?

Não tem obrigação nenhuma de ficar aqui, sabe disso, não é?

Junto a sobrancelhas diante às suas palavras. Sei que ele está chateado por toda a minha atenção estar em Alfredo agora, mas pensei que esse motivo fosse compreensível. Mas pelo jeito não está sendo.

— Não faço por obrigação. — respondo cruzando os braços — Faço porque quero.

Ele acena tristemente, e seus olhos castanhos e abatidos emitem um brilho de inconformismo.

— Me pergunto quando Alfredo deixará de ficar entre nós, atrapalhando nosso relacionamento.

Separo os lábios, incrédula com o que acabei de ouvir.

— Henrique, é seu irmão! E por acaso ele está em uma cama de hospital com grandes chances de nunca mais acordar! Sério que quer discutir sobre isso?

— Eu não quero discutir, Lívia! Mas, desde tudo, você tem chorado pelos cantos, eu já vi; seu celular está cheio de chamadas diárias pra cá, você mal come e mal dorme, mal fica comigo! — protesta, entredentes, e eu preciso respirar fundo.

Não acredito que Henrique está enciumado por causa dessa situação. A calma dele diante ao acidente de Alfredo é estranhamente assustadora. Enquanto eu, Karlita e Carmen estamos com os nervos à flor da pele por conta do estado de Alfredo, Henrique está simplesmente indiferente. Questiono-me de como ele consegue ficar tranquilo.

— Porque eu tenho sensibilidade, Henrique! Por isso! Qualquer um sabendo do estado dele e das coisas acarretadas por esse acidente sentiria um mínimo de compaixão.

— Compaixão é uma coisa, obsessão... dedicação é outra completamente diferente. E você tem feito exatamente isso nos últimos dias: se dedicado a ele! A gente nem transa há uma semana, Lívia, por causa dele!

O quê? Estou pasma.

— Porque talvez eu não tenha cabeça pra transar, Henrique, principalmente sabendo que seu irmão pode nunca mais acordar! — Esqueço-me totalmente onde estou e elevo um pouco a voz. O irmão à beira da morte, e Henrique reclamando da falta de sexo? Meu deus, ele tem o coração tão congelado a esse ponto?

— Exatamente, Lívia — agora é ele quem grita. — Você está deixando de viver comigo por causa dele! Alfredo não é nada seu, não precisa ter toda essa preocupação com ele! Você nem deveria estar aqui!

Minha cabeça começa a doer. Inspiro e expiro fundo, acalmando o ritmo do meu coração acelerado.

— O problema é que você ainda o ama — completa, e sua voz está mais calma.

Abro os olhos para encará-lo.

— Não confunda as coisas, Henrique. Estou fazendo isso por compaixão, não por amor... — também abaixo o tom da minha voz.

Ele balança a cabeça negativamente.

— Esse desgraçado deveria estar morto! Talvez assim teríamos um pouco de paz! — Torna a aumentar o volume de sua voz, e agora estou totalmente embasbacada.

Pestanejo e rezo para ter ouvido errado.

Meus ouvidos não conseguem acreditar nas palavras ouvidas. Ele desejou mesmo a morte do irmão? Sempre achei o ódio de Henrique por Alfredo um tanto quanto compreensível, e até acreditei que, com o tempo, a mágoa remoída seria esquecida e eles teriam uma boa convivência. Mas agora percebo como seu rancor pelo irmão vai além de qualquer coisa.

Enquanto Alfredo, há um ano, se culpou pela concussão em Henrique, e de fato se preocupou com a saúde dele, com os papéis invertidos, ele friamente está desejando a morte de seu próprio irmão. Não posso acreditar nisso. Justo Henrique, um alguém tão bom, justo e amável, está deixando a amargura e coisas do passado se enraizar em seu coração.

— Você se ouviu? — pronuncio completamente incrédula, mas sua expressão sequer se abala. — Ouviu o que acabou de sair da sua boca? — Aumento a voz.

Henrique respira fundo e desvia os olhos dos meus.

— Acho que nem morto ele deixaria de estar entre a gente — continua dizendo com uma frieza que me deixa pasma

Levo as mãos até os cabelos, totalmente inconformada. Eu jamais esperava isso dele. Sem dizer nada, ele simplesmente vai embora. Volto para dentro sentindo as mãos tremerem. Não posso sequer pensar em Alfredo morto.

O problema é que você ainda o ama, suas palavras martelam em minha cabeça.

Suspiro observando Alfredo pensando que, talvez, Henrique tenha razão.

Não consegue amar a mais ninguém porque seu amor por mim ainda vive em você, quase posso ouvir a voz rouca de Alfredo ao pé do meu ouvido dizendo-me essas palavras.

Cerro os olhos fortemente, e as lágrimas descem. Talvez Henrique e Alfredo tenham razão...

***

São duas semanas desde o acidente. Alfredo está progredindo, agora já consegue respirar sem a ajuda dos aparelhos, contudo, continua em coma. E eu continuo com minha vida corrida entre casa, hospital e empresa. Minha convivência com o irmão dele está cada dia pior, e há cinco dias Henrique dorme na casa da mãe.

Olho no relógio, meu expediente está quase acabando. Repasso mentalmente tudo o que preciso fazer antes de ir ao hospital para mais um plantão com Alfredo. Já estou juntando minhas coisas para ir embora quando ouço baterem à minha porta, é Carmen. Sorrio fraco ao vê-la.

Dona Carmen é uma mulher forte, mas os filhos são sua fraqueza. A expressão abatida de seu rosto é visível a quilômetros de distância, e, de todos nós, ela é quem está mais sofrendo com tudo isso.

— Oi, querida — ela sussurra, quase inaudível.

— Oi, dona Carmen... — cumprimento-a, me aproximando. — Notícias do Alfredo? — pergunto, estranhando sua visita repentina.

Ela balança a cabeça negativamente e termina de entrar na sala. Convido-a para se sentar, ela aceita o convite. Sento-me na cadeira ao seu lado, suas mãos envelhecidas pousam sobre minha coxa, a afagando. Eu quero lhe perguntar se está tudo bem, mas é lógico que não está nada bem. Há duas semanas ninguém se sente bem.

— Tem um minuto para nos falarmos, querida? — Sua voz é baixa, seus olhos estão opacos.

Assinto e seguro sua mão com as minhas e as acaricio.

— A doutora Ariana tem nos reforçado sobre a realidade da situação do Alfredo — ela começa, e posso ver seus olhos brilhando por conta das lágrimas se juntando. — Quanto mais tempo ele passa em coma, maiores são as chances de não acordar.

Apenas aceno, atenta às suas palavras, rezando interiormente para ele abrir seus lindos olhos azuis o mais breve possível. Enquanto faço minha oração mentalmente, dona Carmen Hauser continua:

— Apesar de essa possibilidade me assustar e me deixar em um estado desesperador, todos nós precisamos continuar com nossas vidas — sua voz está embargada, e as lágrimas timidamente descem por seu rosto pequeno e marcado pelo tempo.

Não posso nem imaginar como seria continuar com nossas vidas com Alfredo inconsciente para sempre. Apenas concordo, esperando-a chegar aonde quer com o assunto.

— E caso isso venha acontecer, queira Deus que não, mas precisamos estar preparados para tudo, alguém terá de ficar na presidência da empresa. Eu estou velha demais, e Henrique não foi preparado para isso. — Dona Carmen respira fundo e enxuga algumas gotas antes de continuar — Por isso indiquei você a este cargo para o Conselho da Hauser.

Quase caio para trás quando ouço o que ela me diz. Pisco várias vezes absorvendo a informação que chega até mim.

— Dona Carmen... — minha voz treme — eu... eu não posso aceitar isso. É um cargo de extrema responsabilidade.

Não que eu seja incompetente, mas ainda há uma pequena esperança dentro de mim que Alfredo regressará e assumirá a presidência outra vez. Não quero pensar em substituí-lo. Carmen segura firme em minhas mãos, seus olhos encontram os meus.

— Eu confio em você, querida. Sei que é capaz.

Engasgo com minha própria saliva ante a sua insistência.

— Mas, e o Hélio? Ele é vice-presidente e, com este cargo, tem o direito de ser o regente da empresa — questiono-a.

— Sim, e ele já está sendo, mas somente até um novo presidente ser nomeado — ela me explica — Por favor, Lívia, aceite minha oferta. Já conversei com todos os acionistas do Conselho, eles estão de acordo em você assumir a presidência do grupo.

Respiro fundo, ainda atônita com a oferta tentadora e ao mesmo tempo aterrorizante. Pensar em assumir a presidência por motivos de Alfredo estar incapaz e inconsciente o resto da vida não me anima tanto assim.

— Você precisa de um tempo para pensar, por isso não irei pressioná-la — dona Carmen pronuncia, mas eu já tenho uma decisão em minha mente.

— Não há necessidade. — interrompo-a — Eu aceito o cargo — quando digo isso, um pequeno sorriso é posto em seu rosto. — Mas, com uma condição — faço uma objeção, e ela me olha, me aguardando continuar. — Só tomarei posse da presidência se tivermos certeza de que Alfredo não irá acordar. — minha voz sai estrangulada só de pensar nessa terrível possibilidade.

— Condição aceita — ela concorda e deposita um beijo em minha testa, tristemente. Quando Carmen atravessa a porta e vai embora, eu caio sentada na minha cadeira com as mãos no rosto, desejando profundamente nunca ser a presidente do grupo.


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