40. vilã e violenta.
Andrew e Amélia nunca foram o tipo de irmãos que compartilham risadas ou cumplicidade. Na infância, enquanto outras crianças corriam e brincavam juntas, eles eram distantes, quase estranhos vivendo sob o mesmo teto. Andrew sempre parecia sério demais, pesado demais para a sua idade. Ele havia sido criado sob o peso das expectativas rígidas de Marvim, treinado para ser impecável, infalível, desde muito novo. Amélia não conseguia lembrar de uma única vez em que viu o irmão sorrir livremente ou participar de brincadeiras.
Ele simplesmente não sabia como.
Já Amélia, embora não tão contida como Andrew, havia sido moldada para ser perfeita aos olhos dos outros. Não podia se sujar, correr descalça, ou agir como uma criança comum. Cada movimento seu era monitorado, cada ação calculada para agradar. Desde cedo, ela aprendeu que não podia dizer que não gostava de algo, pois sua função era agradar, não questionar.
Seus dias eram preenchidos com aulas de etiqueta, comportamento social, e sorrisos ensaiados. Brincadeiras infantis eram um luxo que Amélia nunca experimentou de verdade. E, assim, enquanto Andrew era ensinado a ser a rocha da família, rígido e sem espaço para falhas, Amélia era lapidada para ser a jóia perfeita, sem defeitos, sem emoções que pudessem escapar ao controle.
Agora, como adultos, mesmo com todo o ressentimento e mágoas acumulados ao longo dos anos, havia um certo entendimento silencioso entre os dois. Eles eram produtos diferentes da mesma prisão dourada.
Os irmãos estavam sentados no chão do quarto de Amélia, suas costas apoiadas na cama coberta por um edredom suave. A luz suave do final da tarde filtrava-se pela janela, criando um ambiente tranquilo, mas a tensão pairava no ar. Era um momento raro em que os dois se sentiam à vontade para falar sobre suas verdades, e Andrew, com uma expressão distante, decidiu abrir o coração.
—— Você sabia que a Erica estava grávida quando nosso pai desapareceu com ela? —— A voz de Andrew estava baixa, quase hesitante, como se temesse a gravidade de suas palavras. Amélia olhou para ele, surpresa, mas também sentindo uma onda de tristeza pelo irmão.
Andrew respirou fundo, e a dor nos seus olhos se intensificou. —— Eu sempre me perguntei como seria. Se ele teria os meus olhos ou o cabelo dela. Eu passava horas imaginando como seria ser pai, como seria aquele bebê. —— Ele fez uma pausa, lembrando-se de momentos que nunca teve a chance de viver.
—— E então tudo mudou. —— Andrew deixou escapar, a amargura escorrendo em sua voz. —— Marvim fez ela perder o bebê. Eu sempre soube, mesmo que não quisesse acreditar.
Amélia sentiu seu coração apertar ao ouvir a dor do irmão. Ela sabia que Andrew sempre carregou essa culpa e tristeza, mas ouvir aquelas palavras lhe trouxe uma nova compreensão da profundidade do sofrimento dele.
—— Andrew, eu... sinto muito. Eu nunca soube que você carregava isso —— ela disse, a sinceridade preenchendo o espaço entre eles.
Ele olhou para ela, e por um momento, as paredes que separavam seus mundos pareceram desmoronar. —— Ninguém nunca falou sobre isso, Amélia. Nós só seguimos em frente, como se tudo estivesse bem. Isso é ser um Harriman. —— A vulnerabilidade em sua voz era quase palpável, e Amélia sentiu uma conexão genuína brotar entre eles, mesmo em meio à dor.
Andrew respirou fundo, seus olhos fixos em Amélia, como se estivesse decidindo cada palavra com cuidado. —— Eu entendo agora, Amélia. A pressão que você sente, a sensação de estar presa. E eu quero te ajudar a sair dessa prisão que chamamos de casa. —— Ele tirou um pendrive do bolso e o entregou a ela, seus dedos tremendo levemente.
—— Isso é o que você precisa —— disse ele. —— Informações confidenciais da empresa. Corrupção, coisas que Marvim e os outros estão fazendo. Isso pode destruí-lo para sempre.
Amélia olhou para o pendrive, um mix de emoções passando pelo seu rosto. —— Andrew, isso é... é muito perigoso. Você tem certeza de que quer fazer isso?
Andrew assentiu, sua expressão determinada. —— Sim, eu estou cansado de viver com o medo do que Marvim pode fazer. Se isso pode te ajudar a escapar, eu faço. Mas... —— Ele hesitou, um brilho de tristeza em seus olhos.
A confusão e a dor estavam visíveis no rosto de Amélia. —— Vem comigo, a gente pode ser feliz.
—— Não, Amélia. —— A firmeza na voz de Andrew era inabalável. —— Mamãe precisa de mim. Se eu for, ela ficará sozinha com nosso pai, e eu não posso deixar que isso aconteça. Ela não aguentaria sozinha.
Amélia sentiu uma onda de frustração e desespero. —— Mas e você? E a sua vida? Você não merece estar preso aqui também!
—— Eu sei —— ele respondeu, seu tom mais suave agora. —— Mas minha prioridade é cuidar dela. Eu vou encontrar uma maneira de lidar com Marvim, e você... você precisa ser livre. Use isso. —— Ele apontou para o pendrive. —— Faça algo com sua vida. Eu acredito em você.
As lágrimas começaram a se formar nos olhos de Amélia, a mistura de gratidão e desespero inundando seu coração.
Andrew sorriu tristemente. —— Só diga que vai lutar por você. E nunca se esqueça que você é mais forte do que pensa. —— Ele a abraçou por um instante, um abraço cheio de promessas e despedidas. Amélia segurou o pendrive em suas mãos, um símbolo de esperança e um peso de responsabilidade, enquanto pensava em tudo que estava prestes a perder e tudo que ainda podia conquistar.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro