38. sobre amor.
Nicholas caminhou pelos corredores silenciosos do hospital, com um ar pesado sobre ele. As luzes frias e o cheiro de desinfetante o faziam sentir-se ainda mais desconfortável. Ele vinha visitar Warren quase todos os dias, e a cada vez que o via, parecia que o homem envelhecia mais. Nicholas sabia que Warren estava piorando, mas o que o perturbava era que, além de seus cartões de melhoras vindos de empresários e treinadores do clube, ninguém mais o visitava. Ele era a única pessoa ali.
Entrando no quarto, Nicholas notou o mesmo cenário solitário. Warren estava deitado na cama, com uma aparência frágil e abatida. Ao ouvir Nicholas entrar, ele abriu os olhos com esforço e esboçou um sorriso cansado.
—— Ah, é você de novo —— disse Warren, com a voz rouca e fraca. —— Você é mais frequente que os enfermeiros por aqui.
Nicholas se aproximou e sentou-se ao lado da cama. —— Eu vim ver como você está. Parece que ninguém mais faz isso... Sua família não veio?
Warren soltou um riso curto, que logo se transformou em uma tosse leve. Ele se ajeitou na cama, com dificuldade.
—— Família? —— ele repetiu com amargura, olhando para o teto. —— Vai ser mais fácil eu ir ver minha família em breve, se continuar assim...
Nicholas franziu o cenho, sem entender. —— O que você quer dizer com isso?
Warren virou o olhar para ele, seus olhos de repente mais escuros, cheios de uma tristeza profunda que Nicholas nunca tinha visto antes. Ele respirou fundo antes de responder.
—— Meu único filho e minha esposa morreram há dez anos... em um acidente de carro. —— Sua voz ficou suave, quase um sussurro. —— Estava chovendo naquele dia. Uma tempestade horrível. E eu estava lá, no escritório, trabalhando, enquanto eles iam me buscar... Nunca chegaram.
Nicholas ficou em silêncio, o peso da revelação tomando conta da sala. Ele nunca soubera disso. Aquele homem forte e inabalável, que parecia ter controle de tudo, carregava uma dor imensa que ninguém via.
—— Eu sinto muito, Warren —— Nicholas disse, com sinceridade, sentindo-se ainda mais conectado àquele homem solitário.
Warren balançou a cabeça, como se as desculpas não importassem mais.
—— A vida é assim, garoto... A gente perde o que é mais importante, e tudo o que sobra são... cartões de empresários que mal sabem o que dizer.
Warren olhou para Nicholas, percebendo o peso nas feições do jovem. Mesmo em sua condição frágil, ele conseguia ver que algo mais profundo o atormentava.
—— E você, garoto... —— Warren murmurou, com a voz rouca. —— O que está te atormentando? Está claro que tem algo aí dentro que não te deixa em paz.
Nicholas hesitou por um momento, evitando o olhar de Warren. Ele mexeu nas mãos, como se as palavras fossem difíceis de sair. Depois de alguns segundos de silêncio, ele finalmente falou:
—— É... amar alguém que eu não posso ter. —— Sua voz saiu baixa, quase como se estivesse confessando um pecado. —— Não importa o quanto eu tente, parece que sempre tem algo ou alguém no caminho. E isso está... está acabando comigo.
Warren, apesar da dor que sentia fisicamente, sorriu levemente, como se a situação de Nicholas fosse mais simples do que ele acreditava.
—— Ouça, garoto —— começou ele, com a mesma gravidade de sempre. —— Se você quer algo, ou alguém, persista. Não desista. A vida pode te derrubar, mas é você quem decide se vai ficar no chão. Se você persistir o suficiente, pode ter o que quiser.
Nicholas balançou a cabeça, olhando para o chão.
—— Nem tudo... — ele murmurou. —— Não posso mudar quem eu sou. Não posso mudar o mundo em que ela vive, nem as regras que nos separam. Isso não é só sobre lutar... é sobre entender que algumas coisas nunca vão acontecer, não importa o quanto eu queira.
Warren franziu a testa, inclinando a cabeça.
—— Quem disse que você não pode mudar as regras? —— ele perguntou, com um brilho determinado no olhar. —— Se o amor vale a pena, você faz o impossível. Você quebra as regras.
Nicholas suspirou, ainda sentindo o peso das circunstâncias. Amélia estava presa em um mundo que não a deixava ser livre, enquanto ele estava destinado a viver à margem desse mesmo mundo. Mesmo que quisesse lutar, ele sabia que, às vezes, o amor sozinho não era suficiente para vencer todas as batalhas.
Nicholas olhou para Warren com uma expressão pensativa, como se estivesse tentando encontrar algum tipo de resposta nas histórias daquele homem que sempre parecia ter as coisas sob controle.
—— Você... amou sua esposa? —— perguntou Nicholas, sua voz um pouco hesitante, quase com medo da resposta.
Warren fechou os olhos por um momento, como se a pergunta o tivesse levado de volta ao passado. Um leve sorriso curvou seus lábios, um sorriso triste, mas genuíno.
—— Sim —— disse ele, abrindo os olhos devagar. —— Ela era o amor da minha vida. Claro, houve outras mulheres ao longo dos anos, mas nenhuma delas significou o que ela significou.
Nicholas manteve o olhar fixo em Warren, esperando que ele continuasse.
—— Ela era além de ser minha esposa —— Warren continuou, sua voz carregada de memórias. —— Ela era a mãe do meu filho. Quando você tem uma vida juntos, constrói uma família... é algo muito maior do que qualquer outro relacionamento. E quando eles se foram, eu perdi tudo.
A dor no rosto de Warren era evidente, mas ele estava acostumado a carregá-la. Ele havia aprendido a viver com isso, a enterrar aquela parte da sua vida para poder continuar em frente.
—— A verdade, garoto —— Warren disse com um suspiro —— É que quando você ama de verdade, nada mais se compara. Talvez você vá encontrar outras pessoas, talvez até consiga seguir em frente, mas o amor verdadeiro? Esse é o que te muda para sempre.
Nicholas ficou em silêncio, absorvendo as palavras de Warren. A história do homem à sua frente era um reflexo do que ele temia: a possibilidade de perder Amélia e de viver o resto de sua vida com um vazio que ninguém mais poderia preencher.
Warren olhou para Nicholas com um olhar astuto, seus olhos envelhecidos, mas ainda carregados de vivacidade, como se estivesse esperando algo há muito tempo.
—— E então, garoto... trouxe o que eu pedi? —— ele perguntou, quase em um sussurro conspiratório, como se estivesse tramando algo em segredo.
Nicholas hesitou por um momento. Ele sabia o que Warren estava pedindo, mas tinha lutado contra a ideia o tempo todo.
—— Warren, eu não acho que isso seja uma boa ideia —— Nicholas respondeu, tentando ser firme. —— Os médicos estão te monitorando. Isso pode piorar as coisas.
Warren riu baixinho, uma risada amarga e cansada.
—— Piorar as coisas? —— ele murmurou. —— Estou velho demais para me preocupar em ser saudável agora. Isso aqui —— ele apontou para os aparelhos que monitoravam seu corpo —— só me mantém respirando, não me mantém vivo.
Nicholas suspirou profundamente. Ele sabia que o velho tinha razão, de certa forma. Warren havia sobrevivido a perdas inimagináveis, e parecia que, de algum jeito, ele havia desistido de lutar. Nicholas então puxou uma pequena garrafa de whisky de dentro de sua jaqueta, sentindo o peso moral daquela decisão.
—— Aqui está —— disse Nicholas, entregando a garrafa para Warren. —— Mas você sabe que isso não vai te ajudar a longo prazo.
Warren sorriu, seus olhos brilhando com uma gratidão silenciosa. Ele pegou a garrafa e a girou em suas mãos por um momento, como se estivesse apreciando a memória do que ela representava.
—— Não estou pensando no longo prazo, garoto — ele respondeu. —— Só no agora.
Warren abriu a garrafa, tomando um gole, como se saboreasse cada segundo. Para ele, aquele momento era mais do que apenas uma quebra de regras, era uma forma de sentir que ainda tinha algum controle sobre sua própria vida, mesmo que fosse pequena e fugaz.
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