Capítulo O7. Máfia Italiana
"Eu não quero um namorado,
Só preciso de um astronauta,
Alguém que possa me levar
Até as estrelas..."
Chloe Black - Spaceman
Bem, eu já estava em casa trancada tendo sentimentos de autopiedade há uma semana, e sempre era aquela sensação ruim de impotência. Esperava ansiosa que alguém pudesse me ligar agendando uma entrevista de emprego, e fantasiava isso algumas vezes.
Mesmo que a Amélia psicóloga dentro de mim me mandasse ir pelo menos mercado para comprar comida com o resto do dinheiro, eu ainda continuava triste.
Atravessar a rua me deixava triste, puxar o carrinho com minhas compras me deixava triste, olhar para a atendente antipática do mercado me deixava triste.
A mulher sentada na cadeira de rodinhas me olhava desconfiada por baixo da sua sombra azul monstruosa enquanto passava as compras. Ela olhava mais desconfiada ainda para as milhares de notas de dois que usei para pagar. Esticava, passava os dedos por cima, colocava as notas na luz enquanto fechava um dos olhos para tentar ver alguma coisa.
– Moça, - Eu já estava possessa. Queria estrangular aquela mulher que já fazia a fila atrás de mim aumentar junto com as reclamações da demora. – Você acha mesmo que, se eu soubesse fazer dinheiro falso, eu estaria aqui comprando seis miojos e um saco de salsichas?
– Eu não disse... – Começou a tentar se explicar.
– Não! Eu não estaria comprando seis miojos e um saco de salsichas, eu estaria comprando terras e gado! – Nesse momento o mercado inteiro estava olhando para meu pequeno espetáculo. Tomei minhas compras das mãos da mulher estática e saí batendo os pés.
Enquanto caminhava para casa, uma das Amélias que vivem dentro de mim me questionava várias vezes o motivo pelo qual eu não aceitava logo o que Aiden queria, seria bem mais fácil do que sofrer do modo como eu estava sofrendo. Por mais que ele fosse divertido, me levasse para comer sempre que nos encontrávamos, não sabia muito bem como reagir ao tipo de “trabalho” que ele estava me propondo.
Me senti uma idiota por não aproveitar o que ele me oferecia, visto que minha luz já havia sido cortada há dois dias atrás e eu estava tomando banho de baldinho com água requentada no fogão. O que eu estava esperando? Ser despejada?
Já subindo as escadas e entrando no apartamento, olhei meu celular imaginando que poderia ligar para Aiden, mas quando digitei o número, meu telefone já estava cortado.
Ótimo.
Me perguntei onde estaria o burguês safado de Nebulosa, e lembrei que, na última vez que nos encontramos, ele me contou que trabalhava em um prédio azul no final do bairro que eu entregava meus currículos.
Depois de muito tempo, decidi que deveria aceitar o que aquele idiota falava, e naquele dia, eu iria conhecer o trabalho dele.
Joguei as compras no sofá e fechei a porta saindo novamente.
•●•
Nunca me arrependi tanto de uma decisão em minha vida.
Não tinha ideia de que o trabalho de Aiden ficava tão longe, e já que eu não tinha dinheiro o suficiente para passagem de ônibus, a Amélia burra decidiu que o caminho não poderia ser tão longo e poderíamos ir andando.
Meus pulmões já estavam gritando, além de que Nebulosa era fria, e eu não podia me dar o luxo de tirar o casaco e pegar uma pneumonia ou morrer de calor suando como um cuscuz dentro das milhares roupas de frio.
Tive de parar um pouco e suspirar, mas eu estava longe do bairro burguês, longe de casa, e mais perto da parte perigosa da cidade, porém eu ainda conhecia alguns manos que não me fariam mal naquela parte, alguns até me cumprimentavam algumas vezes, mas eu morria de medo que mudassem de ideia ao meu respeito e tentassem me roubar, por exemplo o senhor Noel, um senhor de barba branca, que mesmo que fosse velho ainda era um brutamontes, e sempre que me via, me pedia dez reais para comprar corote, e sem mencionar que ele não pedia realmente, era uma forma mais implícita de me roubar.
Naquele momento eu não tinha nada, nem uma moeda de dez centavos na bolsa, então não podia pechinchar com o ladrão.
O que eu fiz? Comecei a correr como se tivesse assaltado um banco, mesmo com meus joelhos pedindo socorro. A vista do lugar fedorento e cinza com montes de lixo pelas vielas, me fazia ter força ter vontade de continuar correndo e lembrar que eu teria uma vida longa pela frente casada com o amor da minha vida Henry Cavil.
Quando finalmente entrei na praça de algum outro bairro, pude colocar as mãos nos joelhos e suspirar. Já estava bem perto do prédio azul, e ajustando os óculos, continuei andando sentindo um comichão no peito.
Me perguntei se eu estava indo até o prédio certo, se Aiden tivesse apontado para outro lugar e eu tivesse arriscado minha vida para nada.
– Amélia, cala a boca sua pessimista! – Sussurrei para mim mesma, passando pelo gramado verde e pelas crianças alimentando as aves na água. Resisti a tentação de pular no lago junto com os patinhos e tentar me tornar uma também, ao menos a vida deles parecia mais fácil.
Continuei andando, até que vi finalmente de perto aquele enorme prédio de vidros azuis com outros prédios como ele aos lados, porém retorcidos como se alguém os tivesse girado. Acima, havia uma faixa discreta e escrita de prateado a palavra Chronos, me fazendo logo lembrar do cartão que Aiden me deu com seu número.
Aquele lugar era deslumbrante mesmo por fora.
Entrei deslumbrada de boca aberta com aquele lugar com uma movimentação muito grande em que pessoas entravam e saíam. Haviam quadros nas paredes com pinturas magníficas de paisagens, pessoas e de figuras um pouco surreais.
– Posso ajudar, querida? – Uma senhora sorridente de pele canela com cabelos perfeitamente alinhados, me perguntou atrás de um balcão depois de recolocar o telefone no gancho. – O que está procurando?
– Então... – Comecei me apoiando no balcão não sabendo como concluir aquela frase. – Eu queria falar com o Aiden. Ele ‘tá aqui?
Ela me olhou confusa por um momento, e eu até entendia sua expressão. Eu estava ofegante e suada como um porco, o cabelo da minha franja cacheada mal cortada grudada na testa e quase desaparecendo dentro das roupas de frio enormes.
– Com o senhor Aiden? – Ela perguntou levantando uma sobrancelha. – Por acaso quem seria você, moça?
– Sou Amélia. – Sorri sem mostrar os dentes. A senhora suspirou e umedeceu os lábios de batom dourado.
– Bem Amélia, o senhor Aiden está em uma reunião agora. Não acredito que vá terminar agora.
– Eu posso esperar? – Perguntei.
– Bom, pode se sentar ali.– Ela apontou para algumas poltronas. – Você quer alguma coisa?
Neguei sentindo calafrios ao imaginar que, por chamarem Aiden de “senhor", era muito possível que ele liderasse aquilo tudo, que ele fosse o dono.
Sentada descansando sobre as poltronas, comecei a tirar a roupa de frio sentindo a temperatura fresca daquele lugar e o ventinho da brisa do ar-condicionado passar pelas minhas pernas adentrando as meias calças. Estiquei a saia do vestido com estampas de girassóis vendo o tempo passar.
Achei estrando quando dois homens de terno olharam para mim e sussurraram algo entre si antes de subirem pelo elevador, mas não me atentei a saber o que era, só passei a ficar mais incomodada quando mais três homens estranhos me observavam de longe.
Com certeza eu precisava voltar para minhas aulas de defesa pessoal.
– Amélia? – Escutei a moça chamar segurando o telefone. – Você pode ir. Carlos, acompanhe a moça.
Um homem baixinho de roupas sociais me conduziu até um elevador e apertou o botão para subir. Uma música legal tocava no ambiente, e me segurei para não dançar na frente do estranho.
Saímos do elevador e andamos por alguns corredores, até virarmos e coincidentemente, os homens de terno que vi anteriormente me olhando como se eu fosse um alien, passaram por nós na direção contrária. Um deles virou o rosto e me encarou por poucos segundos antes de apressar o passo.
Eu parecia estar vendo coisas.
O garoto chamado Carlos me chamou, abrindo a única porta existente naquele corredor.
Na penumbra, atrás da mesa redonda, estava Aiden sentado segurando alguns cadernos, livros e ao mesmo tempo fazia anotações no notebook. Ele não levantou os olhos quando entramos, permaneceu fazendo o que julguei ser algo importante, mantinha um semblante sério e estranho para mim, quase uma expressão de raiva que eu nunca havia visto. Aiden sempre mantinha um rosto neutro. Quando não estava sorrindo, estava com uma sobrancelha levantada ou os olhos arregalados de surpresa, e quando não tinha nada em seu rosto indicando alguma emoção, Aiden era como uma estátua de gesso.
Me perguntei como ele conseguia escrever naquele lugar escuro. Se minha mãe visse aquilo, ele com toda a certeza ganharia um pescotapa e um sermão sobre ficar cego por isso.
Quando o homem fechou a porta de me deixando sozinha com Aiden na sala enorme demais para ser um escritório, aí pude ver um sorriso de lado se formar mesmo que ele ainda não tivesse olhando para mim, entretido no laptop.
– Eu achei que você fosse me ligar, mas vir até aqui foi o último pensamento que imaginei passar pela sua cabeça. Aliás, demorou bastante para que você aparecesse novamente. - Ele se levantou sorrindo, mas eu estava mais impressionada com o fato de que todas as paredes do lugar eram uma estantes repletas de livros. Tinham até escadas com rodinhas nos pés para se movimentarem entre as paredes.
– As vezes eu tenho uma boa memória. – Respondi procurando um lugar para sentar, mas antes olhei para o rosto de Aiden, que apesar de estar sorrindo, parecia indignado com algo, e minha insegurança começou a rir, me fazendo imaginar que minha presença estava sendo um incômodo. – Mas se eu estiver te atrapalhando em alguma coisa, - Comecei a pegar meus casacos nos braços e me apressei para sair. O rosto queimado de vergonha. – Eu posso ir embora e depois eu...
– Não, espera. – Ele segurou meu cotovelo por dois segundos. – Desculpe, eu estou feliz que esteja aqui, são... outras coisas incômodas que estão me atormentando.
– Espero que eu não seja uma dessas coisas. – Falei suspirando, sentindo um comichão forte no peito e acabei tossindo um pouco.
– É claro que não, você me faz esquecê-las, então é bom que esteja aqui. Chegou na hora certa. – Ele apontou para o sofá sentindo que eu queria mesmo me sentar. – Pensei que fosse me ligar.
– Meu celular foi cortado junto com a internet da minha casa. – Respondi colocando a mão no peito para tossir mais um pouco.
– Você está bem? – Ele perguntou quando comecei a procurar a bombinha de asma dentro da minha bolsa.
– Eu tenho bronquite. – Falei tossindo. – Ela atacou porque eu me molhei na chuva aquele dia. Acho que piorou porque eu vim até aqui correndo.
– Correndo? – Ele se aproximou desacreditado. – Você veio da sua casa até aqui, correndo?
– Meu bairro é perigoso, fofo. – Finalmente achei o remédio. Fiz a inalação três vezes e pude respirar feliz novamente. – Mas bem, eu vim aqui falar com você sobre a proposta. Sabe? Eu pensei bem, pensei até demais.
– E o que você decidiu? – Se recostou na beirada de sua mesa.
– Eu aceito.- Falei impulsiva antes de me arrepender, me perguntando mentalmente o que eu esta a fazendo da minha vida. Ele sorriu minimamente com o canto da boca e rodou os olhos azuis.
– Tem certeza? – Ele perguntou, colocando o sobretudo bege sobre os ombros acima do casaco preto de gola alta com certa euforia. Observando bem, percebi que Aiden tinha um brinco na cartilagem da orelha.
Colocou as mãos nos bolsos da calça preta que ia até o alto de seu umbigo com quatro botões dourados.
Agradeci ao fato de que Aiden não pudesse ler mentes para que minha dignidade continuasse intacta.
– Olha, eu aceito com algumas condições, a primeira delas é você realmente não ser um traficante de órgãos. – Ele sorriu pegando uma chave acima de sua mesa. – Er... aonde está indo?
– Nós vamos até minha casa, ligar para os meus advogados para assinarmos os contratos. - Suspirei. – Você já almoçou?
– Não.
– Engraçado que a gente só se encontra nos momentos em que as horas das refeições se fazem presentes. – Algumas vezes percebia um sotaque nos finais das palavras de Aiden, mas eu não conseguia identificar de onde era.
– Então você finalmente percebeu que faço isso de propósito? – Falei irônica. – Acabou de arruinar meus planos de fazer você pagar minha comida para sempre.
Ele revirou os olhos quando entramos novamente no elevador.
– Você realmente acha que faço parte de algum esquema criminoso? – Sorriu olhando para mim.
– Por que está rindo? – Perguntei cruzando os braços. – Não vi você negando nada.
– Só acho você engraçada. – Ele olhou para os botões dos andares, apertando para o subterrâneo. – E não, não faço parte de nenhum esquema criminoso. Sou apenas o dono de uma editora.
– Não sei, você tem cara de mafioso. – Ele olhou para mim e soltou uma gargalhada enquanto o elevador abaixava. - Esse seu sotaque estranho também me diz muita coisa.
– Eu nasci na Itália. – Revelou ele, me fazendo arregalar os olhos. – Porém moro há muitos anos no Brasil para sua informação. Tenho cidadania brasileira.
– Então você faz parte da máfia italiana? – Falei no intuito de uma piada, mas ele levantou uma sobrancelha ainda mantendo um sorriso discreto.
– Isso soou preconceituoso, sabia? – Eu ri enquanto saíamos do elevador no estacionamento subterrâneo daquela enorme empresa.
Aiden apertou o botão da chave nas suas mãos e o carro vermelho acendeu as luzes dos faróis. Não era mais a lamborghini preta de antes, e sim um carro longo e baixo.
– Onde nós vamos? – Perguntei me aproximando enquanto ele abria a porta do carro para mim, pegou meus casacos e os jogou na parte de trás do carro.
– Eu lembro de você dizer que gostava de ver asiáticos comendo. – Eu ri. – Vamos em um restaurante japonês, então você poderá tirar suas próprias conclusões sobre a comida asiática.
– O mais próximo que cheguei de comer algo asiático, foi o miojo que comprei hoje cedo.
Ele ligou o carro, acelerando como se estivéssemos fugindo da polícia.
•••••
OI GENTEEE
Obrigada pelos comentários, demorei pq com esse problema todo de quarentena, nunca tive tanto dever na faculdade, gzuis!
E aí, o que acharam do capítulo?
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