Capítulo O4. Oferta Inusitada
"Queria que eu pudesse
Queria que eu pudesse achar meu único amor verdadeiro essa noite
Você acha que ele poderia ser você?"
Lana Dei Rey - Serial Killer
Sentada sobre as cadeiras confortáveis da lavanderia da senhora Helena, eu lia uma revista de fofoca sobre meu marido. Na verdade ele não sabia que éramos casados, então estávamos em um relacionamento aberto no momento, até porque ele morava do outro lado do mundo, então eu e Henri Cavil não nos encontraremos muito cedo.
— Por que está com essa cara boba, Amélia? – A senhora de pele morena e cabelos brancos e óculos enormes passou em minha frente segurando várias cobertas nos ombros. – Namorado novo?
Eu gargalhei observando a foto do ator nas folhas da revista. Oh, Deus, quem dera, mas eu não estava pegando nem resfriado, quanto menos um homem daqueles.
— De quem é a roupa que você colocou para lavar? – Levantei o rosto para observar as máquinas azuis trêmulas. – Eu sei que é de homem por causa do perfume, e a etiqueta tem o nome de uma pessoa para encomenda. Acho que está escrito Adam, Adiam...
— É Aiden, vó Helena. – Sorri para a mulher, que semicerrou os olhos e inclinou a cabeça. – E a senhora deveria fazer parte do FBI ou investigadora da polícia. O que mais descobriu sobre ele apenas observando o sobretudo?
— Ele é rico, não é? – Ela colocou as roupas dentro de uma máquina de vapor.
— Podre de rico. – Respondi.
— Foi por culpa dele que você se envolveu em uma briga? Estou vendo as suas cicatrizes. Isso me lembra meu tempo de quando eu era jovem. – Olhou para cima suspirando. – Oh deuses, por pouco não disputei o mundial de boxe, uma pena que não me aceitaram por ser mulher.
— Ah, isso foi outra coisa, Dona Helena. Eu dei uma surra em um estrume. Gostaria de tê-la chamado para me ajudar.
— Foi merecido?
— Acho que o que eu bati foi insuficiente. Arranquei apenas um dente.
— Mas que pena, minha menina. Vou lhe conseguir um daqueles instrumentos... Como se chamam? Ah, um soco inglês! Isso! – Eu ri.
— Está tudo bem agora, Senhora Helena. Acho que ele não vai mais me importunar.
Lembrei do rosto de Aiden dizendo que eu havia encontrado um problema maior, e um frio na barriga interrompeu a conversa.
— E então? Onde conheceu esse homem misterioso e rico?
Contei tudo para ela, menos é claro, a parte sobre quem eu surrei. Cleber era um homem conhecido em Nebulosa e no mundo inteiro.
— Ele me pagou salgadinhos porque eu estava triste. – Folheei a revista. – Foi em um bar de pessoas ricas. Nem sei o motivo de ter entrado lá.
— Amélia, tome cuidado com essas pessoas pagando as coisas para você. Ele podia ser um traficante de órgãos.
— Meu Deus, sim! Exatamente o que eu pensei!
Respondi enquanto ela me devolvia o sobretudo bem guardado em plástico transparente e gargalhava. Coloquei as notas acima de sua mesinha do balcão e me virei para ir embora, levando a revista discretamente e me despedindo.
Ainda estava frio, muito frio.
Apertei minhas mãos enfaixadas no bolso do casaco e suspirei com a dor, andando rápido para onde Aiden provavelmente estaria. Bem, acreditava eu que o lugar seria aquele bar luxuoso que nos encontramos pela primeira vez, porque se ele não estivesse lá, definitivamente eu voltaria para casa com aquela roupa e decidiria se ficaria com ela ou venderia no mercado negro.
Meu nariz estava machucado por soar tantas vezes em um lenço de papel, a garganta doía como o inferno, e onde estava eu? Andando para pegar um ônibus e ir atrás de um burguês safado preguiçoso que poderia muito que bem me perguntar o endereço e pegar seu sobretudo, já que eu estava mais pobre do que tudo, ainda gastei dinheiro na lavanderia, e o pior é que ele sabia que eu estava pobre.
Por um momento parei de andar e imaginei um plano para sequestrá-lo e pedir um resgate milionário, mas eu não tinha um carro, armas, um rosto ameaçador e nem nada do tipo para que o plano desse certo ao menos pela metade, e continuei andando dando sinal para o ônibus lotado.
Espremida no meio daquele tanto de gente, imaginei que eu sairia daquele lugar grávida de gêmeos, e invejei o sobretudo quieto e confortável dentro do plástico sem uma gota de suor alheio, o que eu já havia tomado um banho e com toda a certeza passei gripe para todos os presentes.
Na frente do bar, tive a maravilhosa surpresa da plaquinha escrita de que ele seria aberto apenas seis horas da tarde, ou seja, teria que esperar duas horas lá, triste e solitária. Dei meia volta e me sentei sobre o mesmo banco de praça que lembrava da minha desgraça na chuva.
— Ué, o que você está fazendo aí? Chegou muito cedo? – Falou o bartender segurando um molho de chaves. Ele tinha o mesmo rostinho simpático, os cabelos agora estavam pintados de rosa e com sombras coloridas entre lilás e vermelho.
— Olá! – Sorri. – É que eu estou esperando o cara que encontrei na última vez que vim aqui. Você sabe, quando eu estava chorando como uma condenada.
— Ah, sim! Você está esperando o Aiden? – Ele levantou uma sobrancelha e olhou para o sobretudo. – Ele não costuma chegar aqui tão cedo. Você quer entrar?
Sorri timidamente o acompanhando quando abriu a porta de vidro e a fechou novamente.
— É, acho que aqui está mais quente. – Ele tirou o casaco e olhou para mim enquanto limpava o nariz com a manga do meu. – Bem, você quer um chá de hortelã? Sua garganta está péssima.
— Eu não quero te dar trabalho.
— Mas imagina! Claro que não! – Ele sorriu colocando sua bolsa sobre o balcão e ligando o som com um pendrive conectado. – Geralmente eu fico aqui sozinho, então é bom ter uma companhia.
Ele ligou uma máquina e colocou um potinho pequeno dentro dela, que começou a fazer um barulho estranho quando me sentei na cadeira do balcão.
— Você conhece Aiden há muito tempo? – Perguntei. Seria bom saber mais sobre o Burguês, já que eu não tinha a menor ideia de onde vinha sua fortuna, talvez eu conseguisse tirar da minha cabeça a ideia do tráfico de órgãos que me assombrava.
— Sim, há alguns anos. Ele vem aqui sempre que viaja para Nebulosa. – Olhou novamente para o sobretudo. – Depois daquele dia que vocês ficaram cochichando na mesa ali do lado, ele pareceu mais animado do que o costume e passa a maioria dos dias aqui.
— Talvez porque ele percebeu que tenho um fígado saudável. – Sussurrei.
— O que?
— Eu tenho que devolver a roupa dele, porque ontem ele me livrou de ser presa. – Comecei a tagarelar de nervosismo. - Eu queria muito ficar com ela, porque acho que nem mesmo eu valho tanto do que essa roupa que ele ostenta por aí. Deveria dizer a ele que ele pode ser sequestrado se continuar andando assim, não sabe quanto Nebulosa é perigosa. Uma vez eu quase fui assaltada, mas quando o garoto apontou a arma, ele me reconheceu do ensino médio em que eu fazia os deveres dele e me poupou. Ainda bem, porque eu estava indo pagar a conta de luz.
O garoto ficou me olhando como se eu fosse uma louca em quanto eu ofegava de cansaço.
— Oh, desculpe, estou nervosa, quando isso acontece, não consigo parar de falar. - Suspirei. – Sou Amélia.
— Ah, eu sei seu nome. Eu sou Caio. – Ele riu e mexeu no telefone, olhando para a porta por alguns minutos depois de ir até a caixa de som e mudar a música. – Aiden me contou tudo sobre você, disse que você deu uma surra em Cleber. Ele mereceu, viu? Não sabe o quanto eu morri de rir imaginando a cena.
— Conhece Cleber? – Perguntei me segurando na bancada quando ele colocava a xícara fumegante perto de mim, o cheiro quente e doce de hortelã.
— Muito bem. – Respondeu fazendo uma careta. – mas isso foi há muito tempo, nem vale a pena falar sobre isso. – Segurou o queixo sobre os punhos. - Muitas pessoas passam por aqui, e bem, muitas delas viram minhas amigas próximas. Aiden e alguns membros de sua família são um exemplo, exceto Cleber, obviamente.
Conversamos por muito tempo, sobre coisas banais e coisas importantes enquanto ele arrumava as garrafas de bebidas nas estantes atrás de si enquanto conversávamos sobre nossos gostos em comum, e sem perceber, havia conseguido um novo amigo.
Nem percebi quando começou a escurecer e o bar encheu de pessoas. Não queria dividir a atenção de Caio em seu trabalho, saí do balcão e sentei em uma das mesas espelhadas de lilás e vermelho desocupadas. Algumas pessoas me olhavam torto, cochichavam nos ouvidos umas das outras enquanto eu me perguntava o que eu comeria no jantar: Macarrão instantâneo de tomate ou macarrão instantâneo de tomate. Muitas opções.
— Você parece tão concentrada. – Escutei a voz de Aiden puxando a cadeira em minha frente se sentando. – Em que está pensando?
— Por quanto eu venderia seu sobretudo na internet se você não pedisse de volta. – Ele riu, jogando os cabelos para trás com os dedos. Usava sempre roupas pretas, agora um casaco com cachecol cinza quadriculado passado pelo pescoço.
Olhou para minhas duas mãos enfaixadas de branco.
— Sua mão está melhor? - Perguntou. Coloquei-a em minha frente e movimentei os dedos.
— Dói um pouco, mas está melhor. Obrigada. – Lembrei do bilhete sobre o sobretudo que estava em meu bolso, e toquei por cima do casaco o papel dobrado. – Então, acho que você ficou com meu celular.
Ele sorriu e colocou o aparelho por cima da mesa, antes de olhar para cima e sorrir para um garçom mostrando algo do cardápio. Sinceramente minhas quatro personalidades estavam torcendo para que ele nos pagasse o jantar, e na torcida, quase não prestei atenção no celular, que funcionava muito bem, como se tivesse sido retirado da loja.
— Oh, mentira que você mandou arrumar mesmo! Até mesmo meus arquivos de livros estão aqui! Ah, obrigada! – Abracei o aparelho e peguei o sobretudo para devolver ao dono.
— Na verdade eu não queria o sobretudo de volta. – Disse sorrindo e levantei a sobrancelha. – Era mesmo apenas uma desculpa para você vir até aqui.
— Mas.. ué? – Perguntei, e antes que palavras feias e de baixo calão saíssem de minha boca, o garçom trouxe uma bandeja e a colocou na minha frente, com o hambúrguer mais alto que eu havia visto em minha vida, junto com várias batatas fritas e ao lado um grande copo de chocolate quente com marshmallows. Aiden colocava apenas vinho em uma taça e se contentava com aquilo.
— Eu queria conversar com você. – Pediu colocando vinho em sua taça enquanto eu devorava o hambúrguer, fazendo um tremendo esforço para parecer civilizada usando talheres e não uma galinha caipira enfiando tudo na boca para sujar o rosto. Meu Deus, eu estava babando de um modo surreal.
— É sobre Cleber? Saiba que eu não me arrependo e se ele vier reclamar eu quebro as pernas dele.
— Não, É sobre você. – Levantei a cabeça olhando Aiden balançando a taça de vinho. O rosto dele estava corando, então semicerrei os olhos. - Eu vim fazer uma oferta.
— Oferta? – Perguntei e balancei a cabeça.
— Eu iria oferecer um modo de você pagar sua faculdade.
Seria aquele homem um anjo?
— Um emprego? – Sorri.
— Bem, mais ou menos. – Levantei uma sobrancelha. – Eu pagarei sua faculdade, suas despesas em geral, contratarei uma empregada e um motorista. O que você quiser, deve apenas falar comigo e eu vou providenciar.
— Tá... bizarro, mas o que você quer que eu faça? – Cruzei os braços. – Não me diga que quer que eu trabalhe em sua rede de tráfico?
— Não. Eu quero que você fique comigo em seu tempo livre. Quando não estiver em semanas de provas ou quando não tiver trabalhos para fazer de seus estudos.
Eu sorri e abri a boca para tirar sarro dele, mas fechei quando percebi que ele estava falando sério. Seu rosto estava um tanto vermelho, e ele evitava olhar meus olhos. Parecia arrependido de ter me pedido aquilo, e a qualquer momento se viraria para ir embora.
— Olha, não sei que tipo de impressão você teve de mim ontem, mas eu não faço esse tipo de coisa. – Ele levantou uma sobrancelha. – Você me pagou um lanche legal, e tal, mas não vou vender meu corpo ao preço de um hambúrguer.
— Não estou pedindo para você dormir comigo. Que tipo de pessoa acha que sou? – Ele suspirou. – Você me faria apenas companhia. Geralmente eu preciso de alguém para ir comigo em eventos de minha empresa, então eu conheci você.
— Que tipo de companhia? – Cruzei os braços. – Me explique isso direito.
— Bem, acredito que companhia que pessoas normais fazem umas às outras. – Olhou o relógio em seu pulso e bebeu o vinho. – Amélia, você é uma mulher bonita, corajosa e incrivelmente divertida.
— Eu adorei os elogios, fiquei até emocionada, mas você quer me pagar para que eu ande com você para cima e para baixo? – Me aproximei desconfiada, enfiando o hambúrguer na boca. – Que tipo de trabalho é esse? Você por acaso é uma rainha que precisa de dama de companhia? Na verdade, parece que você até está me pedindo em casamento.
Bem, o homem era rico, isso era claro como água. Ele era rico, muito rico. Eu podia ver pelo cheiro do perfume provavelmente francês que ele usava.
— Não precisa me considerar como nada. Não precisamos ser amigos de verdade. – Ele disse aquilo com naturalidade, e imaginei que tipo de homem carente ele era, a tristeza que era recorrer a pagar alguém para ter companhia, ou talvez ele fosse uma pessoa insuportável.
Mas ele era rico.
— E você vai pagar minha faculdade? – Perguntei bebendo o chocolate. Ele estava desesperado, era visível, porque quem ofereceria dinheiro para passear com alguém? Se eu fosse rica como ele, nunca que iria querer companhia de seres humanos. – Meu aluguel?
Mas ele era rico.
— Isso mesmo.
— Como vou saber se está falando a verdade? – Olhei as suas mãos. Não havia aliança e nem marcas de anel.
— A qualquer momento você pode desistir, não é como se eu estivesse lhe prendendo em uma torre com um dragão.
Eu não tinha muito tempo para pensar, minha bolsa acabava naquele dia caso eu não pagasse a mensalidade, se eu atrasasse o aluguel, estaria despejada.
Suspirei observando o homem em minha frente, e o desespero tomou conta de mim, como se minhas quatro personalidades Amélias se juntassem em uma reunião falando em uníssono que não tínhamos como fazer nada se não aceitar o que o Burguês Safado estava dizendo, a não ser que quiséssemos voltar derrotadas para casa sem concluir a faculdade.
— Nós não nos conhecemos direito, cara. – Falei bebendo o chocolate quente.
— Acho que se já fossemos amigos, o que estou lhe propondo não daria certo. Seria moralmente correto para você?
— Acho que não. – Ele sorriu.
— Não precisa me responder agora. – Retirou um cartão dourado parecido com o que encontrei em seu sobretudo e escreveu algo com uma caneta. – Agora que você tem celular, pode me ligar quando quiser, tudo bem?
— Não me dê tanta moral, é capaz de que, quando eu tiver insônia, seu celular toque às três da manhã.
— Estarei esperando ansiosamente por esse dia. – Sorriu enquanto eu funguei. – Bem, acho que devo levá-la para casa agora. Esse tempo não está ajudando sua gripe, e fui um indelicado ao pedir que viesse nesse estado. Peço perdão.
Com toda a certeza minha mãe me mataria se me visse entrando no carro de Aiden naquele dia.
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Gente, obrigada pelos votos, comentários e tudo mais, espero que estejam gostando!
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