Capítulo 39. A Oitava Duquesa
Por favor, mantenha a calma, o fim chegou;
Não podemos salvar você agora, querida;
É o momento que todos estavam esperando;
Não chame isso de aviso, isso é uma guerra;
Parasite Eve - Bring Me the Horizon
Aiden e Pietro ficaram do lado de fora quando entrei — E fui empurrada — pela porta sem entender muita coisa.
"Ela te achou... interessante."
Aquele cômodo era grande demais para um quarto, branco demais, exceto os ladrilhos pretos e brancos do chão que se dispunham ali alinhados como um tabuleiro de xadrez.
Pisquei os olhos por causa da claridade exacerbada, engolindo em seco quando notei a presença da pessoa de véu sentada em uma cadeira em frente à mesa preta de mármore exatamente no meio do lugar. Ela se servia de chá em um bule branco de bolinhas pretas.
— Venha, coisinha insossa, sente-se comigo. — Murmurou numa voz entediada e feminina, talvez até infantil. — Não quer beber chá? Fique tranquila menina, não há nada da substância que meus afilhados bebem, é apenas chá. Chá e açúcar, ou leite se você preferir.
Juntei as sobrancelhas enquanto observava a pessoa baixinha com um chapéu de abas muito longas repletos de cristais transparentes, e na borda delas, escorria o véu branquíssimo em duas camadas.
— Você escuta mal? Achei que só tinha problemas com seu pulmão e estômago. Será que Aiden omitiu sua surdez? — Falou. A mão pequenina pegando a orelha da xícara.
Caminhei com cautela até a mesinha redonda, puxei a cadeira preta estofada de veludo e me sentei em sua frente. A poltrona dela era mais alta do que a minha.
Por algum motivo, eu estava sentindo um enorme peso no peito.
— Não sou surda. — Murmurei desconfortável. — Meu nome é Amélia.
Mesmo que eu não pudesse ver seu rosto, mordi os lábios observando seus movimentos lentos e quietos. As mãos enluvadas de preto se distinguiam de toda a roupa clara, do véu que lhe cobria da cabeça aos joelhos.
Aquela pessoa me inspirava temor apenas pela sua presença.
— Ah, você fala. Isso é bom. — Disse com certa alegria. — Eu sei o seu nome, sei tudo sobre você, aprendi ontem. Bem, contudo talvez você não me conheça. Eu sou a Oitava.
Formei uma ruga entre as sobrancelhas enquanto um vidrado com cabelos pretos dispostos em tranças, entrava e depositava biscoitos em forma de corações sobre a mesa. Virou o bico do bule de chá dentro de minha xícara e depois de encher, começou a adicionar os quadradinhos de açúcar lá dentro, afundando aos poucos.
— Existem oito Imaculadas Brancas, eu sou a Oitava, então este é o meu nome. — Ela pareceu rir da minha confusão mental. — Imagine que há uma monarquia, dentro dela somos as Duquesas, duquesas e sacerdotisas. Somos parte do grande Conselho.
Observei a xícara de chá de gengibre, o Vidrado continuou colocando açúcar até que Oitava lhe fizesse um gesto irritado para que parasse. Ele se curvou, deixou o pote de açúcar na mesa e tomou seu lugar na parede, observando o ambiente com os olhos arregalados foscos e o sorriso robótico..
Observei a montanha de açúcar se molhar e desmanchar no fundo da xícara.
— Oitava tem a audição incrivelmente aguçada, Ofélia. — Disse ela. — Seu coração está batendo como louco, o que teme?
— Não temo nada. — Não corrigi meu nome, as palavras eram escassas na minha garganta.
— Claro que teme. — Falou. — Você teme tudo ao mesmo tempo, mas a mistura de sentimentos a confunde e a faz achar que não teme nada. Você teme tanto tudo, que se autoflagela. — Ela sussurrou apontando para meu estômago. A gastrite nervosa. — Não gostamos de primitivos defeituosos, Oitava detesta primitivos em geral, mas você me chama a atenção, Ofélia. Já vi Diavols apegados a criaturinhas pequenas como você, mas como aquele Verdugo vive sobre você... é novo. Agora seriamente me pergunto se as coisas que Eris disse são verdadeiras.
Eris?
Semicerrei os olhos e rangi os dentes.
— Eris falou sobre mim? — Perguntei trêmula. Oitava riu sob o véu.
— De você? Não. Não acho que aquele garoto ambicioso, pecador e interesseiro tenha algo a falar sobre sua pessoinha. — Suspirou. — Enfim, eu a chamei porque você me lembra alguém. É realmente impressionante a semelhança.
— Perdão?
Oitava desceu de sua poltrona preta com ajuda de uma pequena escada grudada ao lado dela, os pingentes da aba do chapéu tilintavam conforme se movia sobre as pernas curtas. Se me perguntasse, eu diria que pela sua voz e estatura, dizia respeito a uma criança de doze anos.
Nas paredes, vidrados vestidos de branco se misturavam à sala brilhante e clara demais para meus olhos míopes e fotofóbicos. Unseliee se destacava no meio deles, suas vestes prateadas e brancas juntamente com o cabelo cacheado vermelho como fogo, fazia com que fosse óbvio o fato de que ela tinha o cargo mais alto em relação aos outros, começando pelo fato de seus olhos estarem vivos e sempre atentos.
A pequena mulher andou até um pequeno armário da mesma cor das paredes, o qual eu não tinha percebido. Ela passou por mim enquanto Unseliee calada, se movimentava junto com Oitava sem olhar para mim, revelando uma chave redonda nos dedos. Unseliee se curvou ao lado da pequena pessoa de véu e abriu o local.
Ousei olhar para trás da minha cadeira, onde Unseliee abaixada com os cabelos presos em um rabo de cavalo na nuca, remexia em alguns papéis, pastas e depois em bolsas. Oitava estava com as mãos juntas, tomando o máximo de cuidado para não tocar em nada com sua palma que parecia ser sensível. Imaginei que ela estaria machucada.
Embora aquela pessoa tivesse o ar adulto, sério e responsável, falasse como alguém de idade mais avançada do que eu, percebi que entre os montes de livros, todos possuíam capas coloridas e desenhadas. Livros infantis.
Unseliee, que parecia ser seu rosto e mãos, veio segurando vários livros pequeninos e os colocou sobre a mesa. Oitava se preocupou em escalar as escadas e se sentar ali, esticou o dedo das mãos que nunca se fechavam para me mostrar um em especial de capa preta com um lírio pequenino no centro desenhado à mão, me fez pegá-lo e me instigou a abrir.
Unseliee estava sorrindo. Ela era a expressão que Oitava estaria fazendo se eu pudesse ver seu rosto.
— São contos infantis. Minhas irmãs me dariam um sermão por pegá-los do Liceu Sagrado, guardá-los e trazê-los comigo. Oitava não é criança, mas Oitava gosta tanto de lê-los que não resistiu. Se pudesse, Oitava nem estaria aqui, festas barulhentas são totalmente o oposto do que ela gosta. — Ela falava em um tom tão informal e íntimo que acreditei que a pessoa que Oitava conhecia e se parecia comigo, fosse uma espécie de amiga, mas quando abri o tal livro, me deparei com uma imagem ilustrada um tanto perturbadora.
Uma mulher de pele escura, cabelos brancos, cheios e longos estava dançando em um campo florido e vermelho cheio de fadas coloridas ao seu redor. O vestido vermelho repleto de transparência flutuava ao seu redor em uma linda ilustração.
Me lembrei de Lilian, o sonho que eu havia tido com ela, seus cabelos sedosos, brancos e cheios, tão longos como uma cascata enquanto me observava com seu rosto tão parecido e ao mesmo tempo diferente do meu.
Nem percebi quando Unseliee apareceu ao lado dela, tomou o livro de minha mão com brusquidão e depois Oitava movimentou os pingentes da aba de seu chapéu.
— Este livro foi feito no século VII, essa é uma cópia da restauração. Enfim, você se parece muito com nosso Lírio. Oitava ficou surpresa quando viu você. — Falou com um pouco de surpresa na voz, murmurando o português de forma tão perfeita, que tive que respirar aliviada por ouvir minha língua materna sem ser puxada por nenhum sotaque, dita de forma tão natural e macia. — Porém você é uma fêmea humana imperfeita, Oitávia fica muito triste por isso. Se você fosse uma Esmerada, Oitava iria gostar de você.
Sua voz passou muito rápido de acolhedora para de advertência. Engoli em seco quando senti minha perna bambear mesmo sentada e escondi as mãos debaixo da coxa para que não me vissem tremendo.
Sua voz me fez encher o peito de um medo absurdo. Pânico e pavor, uma sensação horrível se abrigou em minha cabeça.
O que tá acontecendo?
— Mas como Primitiva, seu rosto é considerado uma ofensa para minha pessoa, para Daomi e para o Olho. — Engoli em seco. Eu estava começando a ficar com medo pela forma como aquela pessoa apoiou o queixo sob o véu nas costas das mãos enluvadas de preto para tentar olhar meu rosto vacilante por trás de seu véu grosso demais para permitir que qualquer coisa fosse vista através do tecido. Me perguntei se ela realmente me via.
Eu queria dizer algo, mas aquele medo que parecia pesar uma tonelada sobre minhas costas, me obrigou a abaixar a cabeça, não existia mais voz em minha garganta. Tudo era inútil.
— Isso será reportado às minhas irmãs. — Oitava continuava pregada em mim através do véu, Unseliee como se fosse ligada a ela, mostrava exatamente o tipo de expressão curiosa, surpresa e maravilhada ao mesmo tempo enojada que Oitava faria. — Acho que elas ficarão curiosas assim como eu fiquei. O rosto do lírio primitivo, que petulância de nossa mãe natureza! — Ela estalou a língua e virou a cabeça, fazendo os pingentes do véu tilintar. — Esta geração medonha de Esmerados, mais preocupados com bebidas, danças e canções que não reconhecem um rosto tão semelhante ao nosso Sagrado manchando o Lírio puro e branco debaixo de seu nariz! Sinto falta dos séculos antigos, sinto mesmo. É uma pena.
Unseliee baixou a cabeça e fez uma expressão tristonha, simulou uma lágrima imaginária sendo limpa na pálpebra inferior.
— Está dispensada, mocinha. Talvez eu a chame novamente depois, sentirei saudades de seu rosto. Quero tocá-lo qualquer dia desses.
●
Eu não conseguia encontrar Aiden, Mabel também não havia aparecido. Queria perguntar para alguém onde estava ela, mas qualquer olhar de desprezo ou curiosidade que alguém me dirigia, eu me afastava assustada.
— Eu tava te procurando! — Roberval apareceu no meu campo de visão, segurou meu pulso e me puxou para longe sem que eu tivesse tempo de assimilar qualquer coisa. — Eu preciso te dizer uma coisa! Vem!
Escutei alguns vermelhos gritando aos quatro ventos e com pressa "Onde ela está?" Ou "Onde ela se meteu?" Mas eu não dei atenção, estava preocupada com Roberval me arrastando para longe sem mais nem menos, com minhas coisas sumidas, com Pietro dizendo que me mandariam de volta para o Brasil sem mais nem menos e mais a forma como aquela pessoa... como Oitava falou.
Eu quase caí das escadas de pedra que ele me fez descer, minhas pernas ralaram feio no concreto quando virei o pé em um dos degraus pequenos. Roberval pareceu não dar a mínima enquanto continuava me arrastando.
— Espera! — Gritei para Roberval que parecia não me ouvir. Sinceramente eu deveria fazer algum exercício para aprender a usar melhor minha força.
Minhas pernas estavam bambas, meu couro cabeludo arrepiando e uma gota de suor ameaçando escorrer da nuca.
Quando paramos de andar, me apoiei nos joelhos cansada por correr. Aquele jardim gelado, o cheiro das flores estranhas e o meu suor estava me fazendo ficar tonta.
Ao meu lado esquerdo, arregalei os olhos ao ver montanhas enormes cobertas de neve, um grande lago azul servia como espelho para os pinheiros que se escondiam entre as rochas do outro lado do horizonte. Uma cerca de metal com rosas de ferro separava a estrada do penhasco do lago congelado lá embaixo.
Me aproximei para observar a queda mortal.
— Mas que merda, Roberval! Eu te disse pra não fazer isso, eu sempre te digo pra não sair me carregando de um lado para o outro! Qual o seu problema, seu merda? — Gritei olhando para seu rosto, me recuperando da tontura. — Ridículo, o que você quer? Você não tá vendo que eu vou embora?
Tive tempo apenas de me levantar e limpar o suor da minha testa quando mãos geladas cobertas por luvas azuis cheias de escamas, se fecharam em meus ombros, arrastando-se vagarosamente até meus braços como uma serpente. O cheiro amargo e de incenso cegou meu olfato.
Eris.
— Não... fique brava comigo. — Pediu Roberval de pé em minha frente observando Eris atrás de mim. Seu rosto tinha uma expressão de cautela. — Ele me ofereceu um acordo. Foi uma proposta interessante.
— O que? — Perguntei mais confusa do que tudo, me afastando com raiva das mãos de Eris e esfregando meus ombros, me virando para olhá-lo.
Eu estava em pânico, minhas mãos tremendo imaginando que aquela seria minha hora de morrer. Os olhos coloridos dele brilhando sobre mim e os cabelos ondulados nas pontas divididos no meio caindo sobre as pálpebras pintadas.
Se Eris queria mandar um recado antes de eu ir embora, podia ter mandado Madinson me dizer o que queria.
Talvez ele quisesse me atormentar pessoalmente, ou talvez não confiasse o suficiente na sobrinha?
Tendo o espírito tão venenoso e astuto quanto o de uma cobra, eu esperava tudo de Roberval, mas fazer uma parceria com Eris era a minha última teoria da lista. Porém pela forma como ele observava Eris, eu soube que Roberval esperava um bote a qualquer momento, ele tinha consciência de que o homem à nossa frente era tão confiável quanto promessa de político na época de eleição.
— Oh, Sunshine, que azarenta você é. — Ele estava coberto do queixo até a ponta dos pés, em seu braço pendia uma bolsa de couro. Percebi que a pouca pele do seu pescoço que aparecia, estava eriçada em um constante arrepio. — A Imaculada Branca chegou logo quando você estava aqui. Tsc, tsc. Eu deveria ter imaginado, também fui bastante imprudente. — Ele riu brevemente. — Poxa, isso não é do meu feitio.
Apertei minhas mãos em punhos e olhei para cima, observando a altura de Eris exagerada demais para um homem adulto, uma marca que pertencia à sua parte Diavol da família. Eu estava com tanto ódio que poderia socá-lo, e me perguntei se, com toda sua magreza, ele não cairia para o lado quando minha força o atingisse. Me enganei quando fechei os dedos e estiquei o braço com toda a força, mas ele segurou minha mão inteira dentro da sua enluvada como se minha força não fosse nada.
Ele olhou minha mão com uma expressão contida de dor e depois para o meu rosto com as sobrancelhas arqueadas. Quando tentei me libertar, Eris me rodou e me segurou por trás, travando meus braços cruzados nas minhas costas.
— Roberval, você é um filho da puta! — Gritei. — Você não conhece esse cara! O que ele te ofereceu?
— Amélia, não fique com raiva. Eu não traí você. — Sussurrou Roberval. Ele estava mordendo os lábios, mas não parecia muito arrependido. — Esse homem é muito sábio, tudo que nós conhecemos agora, tudo isso está prestes a mudar. Você deveria escutar o que ele tem pra nos falar. É... incrível!
— Ele tá usando a gente, seu burro! — Eris ainda me segurava. Eu odiei ser pequena e fraca naquele momento. — Ele é um assassino, mentiroso e manipulador! Você caiu na conversinha dele!
— Amélia- Continuou Roberval.
— Eu já deveria estar indo embora agora, o que você quer comigo?! — Gritei para Eris que não fazia esforço algum para me segurar.
Eu ainda tentei me soltar, pulei esperneei, gritei e empurrei Eris que fazia de tudo para que nada exercesse pressão sobre sua pele. Quando pensei sobre seu comportamento mais tarde, imaginei que ele estivesse ferido ou com alguma reação alérgica.
Acabei ofegante, meus cabelos grandes, cheios e cacheados caindo sobre o rosto, meus óculos pularam no chão. Eris ainda me segurava quando suspirou um pouco irritado.
— Minha paciência está contada hoje. Não estou nos meus melhores dias, Sunshine. Coopere comigo. — Perguntou com sua voz um pouco monótona, enrolando a língua nas pronúncias dos erres. — Você pode ir, garoto. — Falou Eris virado para Roberval quando não respondi. — Vá logo antes que eu mude de ideia e te atire desse penhasco.
Roberval não pareceu com medo, mas me olhou hesitante. Pensei que o mataria quando ele voltasse para o Brasil comigo, e se Caius interferisse, ia matar ele também.
Sinceramente eu estava com medo pela voz de Eris, me fazendo imaginar que bastaria apenas um movimento para que ele me passasse por cima da cerca e eu caísse na água congelada lá embaixo.
Quando Roberval se virou para ir embora, Eris suspirou.
— Você está brava comigo? — Riu como se eu estivesse fantasiada de palhaço, seu sotaque mais forte, puxando o "r" como um ruído de engrenagens. Havia algo estranho em sua voz, como se ele estivesse sentindo dor a cada movimento que fizesse.
— Isso é tudo culpa sua! — Gritei tentando escapar de seus dedos. — Quem é aquela Oitava? O que meu rosto tem a ver com isso tudo? Que porra tá acontecendo? O que você ofereceu a Roberval? Que besteiras você disse pra ele?
Eris pegou meu cabelo despenteado e cheio que caía no meu rosto, e o jogou para trás como se estivesse carregando um pedaço de pano molhado e pesado. Largou meus braços soltando um suspiro de alívio quando me afastei e me abaixei para pegar os óculos verificando se não estava quebrado.
— Você tem livre acesso à biblioteca de Aiden, não tem? — Eris olhou meu pescoço onde estava a chave da biblioteca de Aiden.
Fiz cara feia. Ele respirava fundo como se estivesse sob tortura naquele momento, mas seu rosto não demonstrava nada, a maquiagem azul e delineado branco estavam no mesmo lugar de sempre.
— Por qu- Comecei a perguntar.
— Não, Amélia. Não me pergunte, não me questione. Ao menos não quando estou... neste estado. Minha paciência se esgota fácil quando estou longe de minhas medicações e elas são as únicas que podem devolver minha paz de espírito, então simplesmente me escute com atenção. — Eris lamentou entredentes ao se aproximar rapidamente como uma cobra e apertar minhas bochechas contra suas palmas, seus olhos arregalados e a forma como pronunciou meu nome, me fizeram calar a boca. — Me escute, grave isso em sua mente. Você deve chegar na mansão de Aiden, especialmente em sua biblioteca e procurar um fundo falso naquelas paredes. — Sussurrou segurando meu rosto, me forçando a virar e olhá-lo nos olhos. Seu hálito amargo e doce batia em minha boca. — Dentro de um pequeno cofre, você vai encontrar um livro de capa preta, um livro de folhas velhas. Mas primeiro se atente a encontrar o cofre, descobrir qual o tipo de lacre e depois vamos dar um jeito de tentar abrir.
— O que? — Ele continuava falando com pressa como se eu estivesse entendendo tudo.
— Aiden pode ter mudado de lugar, mas enfim. Você vai procurar um fundo falso naquela casa, vai abrir e vai pegar o que estiver lá dentro. — Falou encostando a ponta de seu nariz gelado no meu, suas mãos se fechando em minha bochecha e as apertando. — O livro e os frascos. Faça isso na surdina, porque se você for pega, não vai poder contar comigo. A América Latina não me pertence e se caso eu consiga chegar até você, vai acabar me devendo a vida. Garanto, Sunshine, que você não vai querer ter esse tipo de dívida comigo.
Formei uma ruga entre as sobrancelhas, notando a luva de couro extremamente grossa em sua mão e repleta de escamas azuis metálicas que lhe cobria até os cotovelos.
— Mas eu-
— Mas nada, você vai pegar o livro assim que chegar ao Brasil. Você vai dá-lo para mim, entendeu? Você não vai abrir e não vai desfazer os cadeados. — Murmurou enquanto eu rangia os dentes. — Enquanto isso, menina, tente ficar longe de catástrofes.— Segundos depois ele levantou as sobrancelhas e suspirou com dificuldade. — Veja bem como é a vida, eu tenho o nome da deusa grega do caos e é você quem precede o armagedom.
— Você está me pedindo pra roubar, para roubar de Aiden e ainda me manda ficar longe da catástrofes? Você está se ouvindo? — Murmurei com as mãos em punhos.
— Pense nisso como uma reintegração. Aquele livro não pertence a Aiden nem aos Diavol. Aquele livro pertencia ao meu pai, e agora é meu.— Em um movimento rápido, Eris tirou o pendrive preso dentro de um saquinho da roupa de algodão e o fechou entre meus dedos. — Vamos pequeno muffin. Vou recompensar você, eu prometo. Eris nunca quebra uma promessa.
Mordi o lábio inferior com o pendrive entre os dedos, a raiva que eu sentia de Eris só aumentava. Queria dizer a ele que eu não ia fazer nada que ele mandasse, que eu já estava cansada, que me envolver demais havia se tornado um problema.
Naquele momento, tudo pareceu ser um erro. Eu estava sendo irresponsável.
— Não pense em me recusar, Sunshine, você não tem opção. — Falou lendo meus pensamentos. — Nunca houve opção alguma para você de qualquer forma.
Engoli em seco me lembrando daquele sonho perturbador. Absolutamente não deveria dizer aquilo para Eris e não sabia se deveria dizer para Aiden, então me senti burra ao lembrar apenas naquele momento de algo que não pensei antes: A única pessoa plausível para me dizer algo verdadeiro sobre Lilian, era a minha mãe.
— Oh, eu não te encontrei na enfermaria, estava procurando por você. — Eris piscou um dos olhos para alguém atrás de mim. — Você é realmente um cachorro fiel, pena que é tão fraco.
Ao olhar para a mesma direção que ele, percebi que entre as folhagens das roseiras meio escondida e meio aparecendo, estava Mabel com toda a sua estatura de gigante usando uma camisola branca e longa. A pele pálida e doente se misturava aos cabelos amarelos escuros e seus olhos pareciam cansados como alguém que não dorme por muitos dias.
Ela estava me vigiando com os olhos de pálpebras vermelhas, estava vigiando Eris agarrada aos espinhos para não cair sem forças. Olhei com pena e confusão para seus pés nus e vermelhos queimando na neve branca abaixo deles enquanto seus dedos se contorciam de dor e frio.
Eu não sabia bem o que poderia fazer, mas avancei na direção de Mabel para ajudá-la, porém Eris estendeu a mão e me impediu.
— Eu sou um homem com muita compaixão, Sunshine, e para que não se sinta sozinha com seus próprios segredos, você e seu doberman vão agir juntas nessa pequena missão. Mabel se mostrou inteligentíssima ao escolher se tornar uma das minhas pequenas pombinhas em troca da própria vida e da do irmão, e o melhor é que ele não faz ideia do seu sacrifício, não é meu amor? — Eris suspirou com dor, fechou os olhos por um curto momento e depois mostrou os dentes brancos para Mabel, que tremulou de ódio quando ele cravou os olhos coloridos nela. Eris deu pequenos passos calmos, desviou de mim e chegou perto da mulher, abrindo a própria bolsa pendendo de seu braço e de lá tirou um par de sapatos marrons, se abaixando vértebra por vértebra vagarosamente ao colocar ambos os calçados na frente dos pés já feridos de Mabel. — É por isso que não gosto de mestiços. Sua mãe Esmerada foi agraciada com o escasso dom da fertilidade e o gastou com um primitivo qualquer, é de dar pena. Enfim, siga meu conselho e calce os sapatos que lhe dei... ou escolha amputar seus dedos.
Mabel apertou os espinhos que segurava enquanto rangia os dentes. Suas mãos se feriram e sangue escorreu dos dedos, pingando na neve.
Eris não parecia estar falando apenas dos sapatos, e de qualquer forma, eles não representavam apenas calçados quentes, mas a chance que Eris havia dado para que Mabel não morresse intoxicada, para que a vida do seu irmão, que presumi ser Carlos, não estivesse em risco. Aproveitar ou não dependia apenas dela, e ela sabia as consequências de rejeitá-lo.
Eris fez novamente uma expressão de dor, fechou a bolsa e deu um sorriso de lado, piscando um dos olhos coloridos para mim antes de ir embora.
Mabel, bufando de raiva, calçou os sapatos.
♦♦♦♦♦
Oi gente!
Vocês estão curiosos pra saber como é o rosto da Oitava? Vou adiantando pra vocês que é bem... curioso.
A doida acabou marcando a coitada da Amélia que não tem culpa de ser bonita, agora só rezando pra ter paz nessa vida ( nem assim kk)
O Roberval também é um fdp quando quer, porém ele também não dá pingo sem nó. Ele e Eris são duas cobras.
Então, vocês devem ter percebido que tem xarás aqui na história, tipo dois Mateus, dois Carlos e etc. Isso não significa nada, tá? É que a autora tem memória de pombo, então se eu colocar xarás, eu lembro dos personagens com mais facilidade kskskskd
Até o próximo domingo aaaaaa
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