Capítulo XV
Rainha Fátima na mídia
*
Índia - Semanas depois
- Vamos! Levante-se! - Um dos guardas gritava para o prisioneiro - Mandei se levantar, homem! - Gritou outra vez desprovido de paciência.
- Já me levantei! - O prisioneiro retrucou ainda tonto de sono enxergando apenas o que parecia o vulto do guarda em sua frente - O que quer comigo tão cedo?! - Questionou irritado ajeitando as calças que ousavam em escorregar por sua cintura já fina por passar muitos dias comendo apenas os restos do castelo.
- Mandaram te levar - O guarda respondeu sucinto - Vamos - Disse abrindo a cela com o incomodo ranger do metal.
- Para onde? - Questionou novamente - Não fiz nada de errado! - Se defendeu de qualquer que fosse a acusação que poderia lhe causar um castigo.
O guarda se limitou a olha-lo de maneira voraz e negar com a cabeça como se não suportasse aquelas lamúrias infundadas do prisioneiro. Prende-o em um de seus pulsos com as correntes de prata para que não escapasse e o fez segui-lo pelo comprido e fétido corredor do calabouço. O prisioneiro já não se lembrava com clareza o caminho, nem se lembrava da última vez que havia visto a luz do dia. Quanto mais subiam as escadas mas o ar se tornava puro e ele sentiu que podia respirar de verdade em dias, como se seus pulmões tivessem desaprendido aquele feito.
Logo reconheceu a porta escura que separava o subterrâneo de todo o dourado e cristais que era feito o castelo indiano. Então outros guardas abriram a grande porta para que passassem e a primeira coisa que viu foi Jade o fitando com os imensos olhos verdes repletos de preocupação. A reação da jovem princesa ao vê-lo era esperada, imediatamente colocou as mãos na boca como se não pudesse acreditar na imagem do homem que via em sua frente. Da imagem do homem que um dia fora Robert Willians.
- Meu amigo... - Ela disse com lágrimas em seus olhos e logo ameaçou se aproximar dele, no entanto foi impedida pelos guardas que se puseram em sua frente. - O que fizeram com você? - Disse abismada em vê-lo tão acabado quanto estava.
- Jade... - Foi tudo o que ele disse enquanto tentava esboçar um sorriso gentil. - Eu... - Tentou falar mas novamente os guardas interferiram o mandando se calar.
- Você vai a julgamento! - Ela gritou antes que pudessem impedi-la outra vez - Vai dar tudo certo! Pedi a Allah que te protegesse - Falou sorrindo para ele embora estivesse muito receosa com o que realmente poderia acontecer com o joalheiro.
Assim sem tempo para responde-la Robert voltou a caminhar a mando dos guardas e saíram do castelo que estranhamente já não lhe parecia o lugar que tanto gostava de frequentar. E então pensou nela, Amber. A princesa não estava lá, ela havia ido embora de verdade e levado com ela todo o colorido e alegria existentes naquele lugar. Suspirou triste ao imaginar que nunca mais a veria outra vez e que muito provavelmente em poucas horas seria condenado a morte.
*
Império Otomano
A neve já derretia por aqueles dias e o barulho dos corvos negros podia ser ouvido outra vez. Aziz estava mais uma vez em sua sala de reuniões procurando maneiras de reerguer o Império e acabar com a fome que atingia seu povo.
- O senhor precisa se casar. - Um de seus conselheiros disse o vendo procurar uma saída para aquela triste situação - Não há outra maneira, precisa mostrar ao povo que é um homem honrado e isso somente uma esposa ao seu lado pode lhe dar. - Concluiu vendo o futuro imperador o olhar pensativo. - Somente assim voltarão a plantar nas lavouras e a trabalhar como antes.
- Precisam de um motivo para continuarem, alteza - Outro disse.
- Uma mulher ao seu lado mostrará a eles que o reino está prosperando e que Allah está ao seu lado. - Um dos mais velhos no grupo completou - Somente assim terão alegria em servir ao reino e voltaremos a enriquecer
- Não é tão simples quanto parece. - Ele respondeu - Muitas guerras estão acontecendo, a todo instante estão de olho em nossos territórios. Além disso... a princesa não quer se casar, senhores. - Disse para todos os conselheiros que o acompanhavam naquela tarde. - Como eu seria honrado se a obrigasse a se tornar minha esposa? - Questionou gesticulando com as mãos no ar.
- Ela já está aqui, senhor. Se não estivesse haveria uma saída, mas muitos já sabem da presença de uma nova princesa no castelo e o povo comenta sobre isso pelos aredores da cidade. - Outro deles disse fazendo Aziz suspirar.
- Sim, houve muitos comentários pelas casas de chá. - Outro senhor disse - A um murmúrio que dizem ser uma odalisca que trouxe de outro reino para satisfazer seus desejos. - Disse com desgosto em sua voz - Não podemos deixar que essas ideias infundadas se espalhem, ou irá manchar ainda mais a imagem de sua família, alteza.
- O que devo fazer então? - Perguntou embora no fundo soubesse a resposta. - Como posso fazê-la se casar por livre e espontânea vontade?
- Primeiro deveria convida-la para um chá - A voz de Samira invadiu o local assustando-os, e logo os homens reverenciaram a princesa e se retiraram da sala de reuniões - Ou então a leve para um passeio por nossos esplendorosos jardins - Disse em ironia, pois o castelo era desprovido de flora. - Não sei Aziz, pense em algo! Não pode ficar sentado conversando enquanto deveria estar fazendo alguma coisa a respeito.
- Samira... - Ele disse respirando profundamente outra vez - Não pode entrar assim em minha sala. Estava em uma reunião importante - Reclamou aborrecido com a irmã que sentava sem modos em um dos cantos da mesa. - Tenha modos... por Allah! - Disse passando a mão pelo rosto em um gesto cansado.
A princesa ruiva no entanto achava graça do irmão e sequer se importava com as reclamações dele. E então prosseguiu falando.
- Estavam falando sobre casamento... homens não entendem desses assuntos. - Fez o seu ponto - Vocês só pensam em honra, poder e sexo. - Disse fazendo Aziz arregalar os olhos para ela.
- Tenha cuidado com suas palavras, Samira... - A advertiu vendo a mesma balançar os ombros e sorrir divertidamente.
- Falo a verdade exatamente como ela é Aziz. Além disso se não quer obriga-lá a se casar apesar de já ter feito isso ao arrasta-la para nosso reino... - Disse o olhando para confirmar que estava certa - Deve ao menos tentar ser agradável com ela. A convide para fazer alguma coisa, mas não fiquem sozinhos por muito tempo. - Riu com a última parte.
- Isso é um absurdo... não vejo a necessidade de passar um tempo com ela. - Respondeu se jogando preguiçosamente em sua cadeira. - Ela não me suporta, quantas vezes terei que repetir isso?
- Ora Aziz! - Bugiu inconformada - Decida o que quer então! Não se pode fazer o que fez e depois jogar ao vento para que Allah resolva seus problemas! - Desta vez gritou com ele irritada - Seja homem e a convide para um passeio, ou então eu mesma me encarregarei de contar a mama e aos conselheiros que você esteve nu em seus aposentos e a princesa estava lá. - Disse fazendo o irmão arregalar os olhos para ela outra vez.
- Como você...
- Os criados não são cegos, Aziz. E também não são mudos. - Respondeu cruzando os braços - Tive que suborna-los para que ficassem calados. - Revelou se levantando e se colocando à andar pelo pequeno salão. - Devo dizer que seu tempo está acabando, nosso tempo está acabando. Você precisa se casar em breve. - Falou e Aziz bufou se sentindo encurralado. - Se quer ser um cavalheiro, dê um jeito de conquista-la ou estaremos todos perdidos. Do contrário mama fará Amber subir ao trono do seu jeito e ela não tem paciência ou piedade como você.
- Farei isso, Samira. - A respondeu embora seus pensamentos já não estivessem ali. Assim viu a irmã sair e não soube se ela havia dito qualquer outra coisa.
Aziz estava ficando sem tempo, mas como poderia conquistar a princesa se era claro que o coração dela estava fechado para o amor?
Como faria para que ela se afeiçoasse a ele de tal modo que desejasse se casar o mais depressa possível. Suspirou fechando os olhos sentindo as costumeiras dores de cabeça o atingirem outra vez. Aziz estava exausto e completamente perdido.
- Amber... Amber... o que eu faço com você? - Perguntou para o salão vazio.
Aziz passou o fim da tarde e o restante da noite trancado ali elaborando inúmeros planos para conquistar a princesa, embora não soubesse ao certo porque deseja fazer da maneira mais difícil. Ele não ousava admitir para si mesmo que se importava o suficiente para garantir que Amber seria cortejada como mandavam as tradições.
*
- Onde pensa que vai? - A voz da rainha invadiu os ouvidos que Amber que caminhava calmamente em direção ao seu pequeno refúgio nas últimas semanas.
A princesa respirou profundamente antes se virar para encarar a Fátima sentindo o vestido apertado e desprovido de cores vibrantes que foi obrigada a usar quase lhe tirar o ar que procurava. Esboçou seu sorriso falso, um que havia aprendido com Mimi naqueles dias turbulentos de sua estadia no império. Logo quis revirar os olhos, pois claramente não poderiam se encontrar. Se virou para encontrar uma Fátima vestida não com seu costumeiro tom vermelho estonteante mas com um traje verde que não deixava duvidas para ninguém que era a rainha, mantendo suas sobrancelhas arqueadas como se esperasse a resposta de Amber.
- Estava indo tomar um ar, senhora. - Disse com certo desgosto.
- Mudança de planos, então - Disse sorrindo cinicamente para a princesa - Me acompanhe - Falou logo tomando o caminho oposto ao destino anterior de Amber.
- Onde iremos? - Questionou curiosa enquanto novamente arrumava o vestido em seu corpo.
- Logo verá. - Fátima se limitou a dizer.
Caminharam por alguns minutos indo e vindo entre os corredores escuros do castelo negro, a princesa observava os criados pararem seus serviços e se afastaram rapidamente toda vez que a rainha adentrava o recinto onde estavam e aquilo a fazia odiar Fátima cada vez mais. Não entendia como a mulher com sua simples presença podia causar tanto medo nas pessoas.
Então antes que sua curiosidade a fizesse questiona-la outra vez, duas grandes portas se abriram e logo o conselheiro e a dama de honra da rainha se puseram ao lado dela enquanto a princesa ficou logo atrás quase não conseguindo enxergar o que havia no local.
Um cheiro agradável de incenso então invadiu suas narinas e um som ainda que muito baixo podia ser ouvido por ela. Tentava se colocar na ponta dos pés para que pudesse ver qualquer que fosse o que Fátima queria mostrar a ela, mas era em vão. Até que após alguns minutos parados estaticamente na porta a rainha fez um sinal com as mãos e então abriram passagem e todos entraram.
Duas fileiras de mulheres formavam um corredor para elas passarem. Todas devidamente vestidas com trajes de tons sóbrios e sem o véu cobrindo seus cabelos, uma a uma faziam reverencias às duas mulheres. Fátima parecia se agradar com tudo aquilo as olhando com profunda satisfação, mas Amber não sabia ao certo o que sentir.
- Seja bem-vinda ao hárem, princesa - Fátima disse se virando para olhar as mulheres enquanto se acomodava em um dos tronos postos ao fim do salão. - Sente-se aqui - Disse apontando para o trono vazia ao seu lado.
- O que estamos fazendo aqui? - Perguntou incomodada, percebendo o motivo das mulheres não usarem véus. Eram odaliscas e mulheres que haviam sido devolvidas por seus maridos por algum motivo, jamais poderiam ser vistas com respeito novamente.
Amber suspirou ao constatar aquilo. Tudo o que lhes restava era a aparente bondade da rainha em lhes oferecer abrigo, roupas e comida em troca de seus serviços no hárem. Sentiu profunda pena daquelas mulheres e pensava nos motivos que as levaram a ter aquela vida.
- Vê estas mulheres? - Questionou, embora não tenha esperado a princesa responde-la - Todas essas mulheres tem uma história, algumas não muito bonitas. Devo dizer que algumas sequer mereciam o que passaram. - Ponderou por um tempo e então prosseguiu falando - Todas elas tem sua reputação manchada, nunca terão um marido, nem herdeiros legítimos. Nenhuma dessas mulheres será princesa, rainha, imperatriz ou sultana. Elas não tem mais nada, princesa. - Concluiu vendo Amber a olhá-la com certo espanto e duvidas por suas palavras.
- O que está querendo dizer? - Perguntou séria, vendo que todas continuavam paradas ali como se não estivessem falando sobre elas. Enquanto o conselheiro e a dama da rainha as aguardavam em pé lado a lado.
- É esse tipo de mulher que deseja ser? - Perguntou ignorando o questionamento da princesa. - Gostaria de estar no lugar de alguma delas? - Falou arqueando outra vez as sobrancelhas ruivas
- É claro que não! - Respondeu afetada - Eu perderia tudo! - Disse em exaspero o que fez a rainha, por fim, tirar seus olhos das mulheres no salão e olhá-la.
Então Fátima se levantou e com um estalar de dedos as mulheres começaram a se movimentar, algumas se puseram a costurar vestidos no canto do salão, outras a preparar a mesa de chás que havia ali e outras começaram a dançar assim como os músicos começaram a tocar uma batida árabe lentamente.
- O que está fazendo? - Amber questionou achando aquilo horrível - Não pode tratá-las dessa maneira, não pode estalar os dedos como se fossem escravas suas! - Disse com visível raiva já se levantando do trono onde estava e indo em direção a rainha.
- Eu posso muitas coisas, princesa. - A respondeu de maneira altiva - Veja o que aconteceria a você se tivesse perdido sua pureza antes do seu casamento. Veja exatamente onde poderia estar, e agradeça por Allah tê-la livrado desse destino.
- Você sabe... - Amber tinha um vinco de completa surpresa se formando em sua testa - Espera... se sabe que... - A olhava com espanto e com um misto de ódio e irritação - Me tratou daquela forma e sabia de toda a verdade! - Gritou com a rainha que continuava impassível em sua frente.
Fátima sorriu em puro escárnio.
- Observe bem o destino que teria. - Disse novamente para a princesa olhar a vida que aquelas mulheres levavam - Jamais deixaria que subisse ao meu trono se não soubesse de sua honra, princesa. Os Ibrahim estragaram tudo neste reino, mas eu reergui tudo sozinha. Quero que veja e reflita sobre suas atitudes, sobre o caminho que estava levando ao se deixar levar pelas palavras doces e gentis dos homens. - Disse com certo amargor em sua voz. - Veja o que seria de você.
- Eu não entendo onde quer chegar com isso - Respondeu cruzando os braços em seu corpo.
- Sua mãe era uma odalisca, Amber. - Disse fazendo a princesa arregalar os olhos. Amber conhecia um pouco da história da mãe biológica, mas não esperava que Fátima fosse abordar aquele assunto e trazer aquilo tudo a tona para relembra-la de suas raízes. - E essa não era a vida que ela desejava para você, do contrário nunca teria ido atrás de seu pai. - Comentou despreocupada o que fez Amber se irritar ainda mais.
- Porque está fazendo isso? Está querendo me humilhar? - Disse com os olhos pesando em lágrimas, não suportava aquela história. - Me deixe ir para meus aposentos. - Pediu, pois não podia se retirar sem que Fátima permitisse.
- Não. - Ela respondeu levando uma das mãos ao queixo de Amber a fazendo olhá-la nos olhos. - Estou ensinando, te lembrando de onde veio. Esta será a última vez que pensará em sua mãe de sangue, que pensará que se tornaria uma odalisca como ela, que se lembrará do que deixou para trás. Sua vida é aqui agora, e eu te tornarei rainha, Amber. Sultana-imperatriz de todo esse império. - Disse séria e sucinta, e então a mesma se retirou do local, deixando a princesa submersa em suas palavras.
"Eu te tornarei rainha...
... Sultana-imperatriz de todo esse império".
Depois daquelas palavras e depois daquele dia, tudo mudou.
*
Olha eu aqui de novo!
Comentem bastante e deixem seus votos, quem sabe eu não volto com mais um capítulo durante a semana, hein?
Eu tenho uma séria relação de amor e ódio com a rainha Fátima, alguém aqui entende ela? Rsrs
Beijoooos ♡
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