Capítulo 6
Em comemoração ao Dia das Mães, vou disponibilizar um capítulo da história. Amanhã tem mais. <3
Beijos e boa leitura.
A.C. NUNES
***
Nos próximos dias eu não sou capaz de esquecê-la.
Corrigindo: de esquecê-las. Embora eu tenha tomado a decisão de parar com meus encontros extraconjugais com Victória e voltar para minha vida com Lívia, há quase uma semana ainda estou dormindo no meu antigo quarto na mansão Hauser. Eu precisei de mais alguns dias para pôr meus pensamentos em ordem antes de encarar minha mulher outra vez nos olhos. Decidi manter certa distância muito por medo de ela descobrir minhas traições somente através dos meus olhos e postura, muito porque ainda precisava digerir os últimos dias e as coisas que fiz.
No entanto, a decisão de não me encontrar mais com Victória não me impediu de contatá-la. Eu enviei algumas mensagens ao longo desses dias, dizendo-lhe sobre como eu me sentia em relação a ela, a nós. Antes de enviar, claro, eu me esforçava para não fazê-lo. Mas a vontade era mais forte do que eu, e por fim, eu lhe enviava minhas sinceras palavras. No segundo seguinte, como eu já esperava, me sentia arrependido e pensava em Lívia. Não era justo com ela, não era certo e nem honesto. Por mais que minha mulher estivesse tão empenhada a ajudar meu irmão - quem eu odeio com uma força esmagadora -, uma traição não era justificável, tampouco aceitável.
Assim, eu passei os últimos cinco dias dividido em pensamentos entre as duas mulheres. Preocupava-me com Lívia, pensava nela e queria retornar para nossa casa, nossa vida, nossa rotina. Em contrapartida, queria Victória, seus beijos, suas mãos, seu corpo.
- Ainda não foi ver seu irmão - mamãe diz, me puxando de volta à realidade.
Guardo meu celular no bolso, discretamente. Eu o peguei depois de ele vibrar em meu bolso, e vi que era uma resposta de Victória à minha mensagem enviada antes de chegar para o jantar; lerei quando tiver uma oportunidade. Seguro um sorriso prestes a se manifestar para não dar brechas a questionamentos sobre por que estou rindo. Olho para minha mãe na ponta oposta da mesa e dou mais uma garfada no meu peixe.
- Eu o verei amanhã, prometo. Aliás, já lhe deram a notícia?
Alfredo acordou do coma já tem alguns dias, mas como mamãe já ressaltara, eu ainda não fui lhe fazer uma visita. Mas também não agi como um insensível quando, toda esperançosa e emocionada, ela veio me contar. Quis saber do meu irmão e do seu estado, e, pelas informações, apesar de acordado, ele ainda balbucia entre a lucidez e a inconsciência.
- Ainda não. - ela responde, pousando a taça de vinho sobre a mesa. - Alfredo ainda está confuso, desnorteado e despreparado psicologicamente para saber da morte de Sophie e Lauren.
Aceno em positivo, dando um gole no meu vinho, também. Ainda pelos relatos de mamãe, Alfredo não se recorda de nada sobre seu acidente.
- Eu irei até o hospital amanhã - reforço. - E, aliás, estarei voltando para casa hoje.
Mamãe abre um enorme sorriso com a taça de vinho em seus lábios, os olhos acinzentados reluzem esperançosamente e de uma alegria genuína. Ela está radiante pela recuperação de Alfredo, mas parte dessa felicidade em seus olhos também se deve às minhas últimas palavras.
- Isso é ótimo, querido. Você e Lívia se entenderam?
- Sim - minto, apesar de tudo. Ainda não sei como está minha relação com Lívia, nem sei se ela me aceitará de volta em nossa casa depois de três semanas fora. Mas eu não quero decepcionar minha mãe com esse comentário. - Após o jantar, voltarei para Lívia.
Ela me responde apenas com um enorme e feliz sorriso. Depois do jantar, jogamos um pouco de conversa fora, sentados no sofá. Por volta das 21h, eu decido ir pra casa, rever Lívia - isso é, se ela estiver em casa e se ela me aceitar.
Dentro do carro, antes de eu dar a partida, confiro meu celular para ler a resposta à minha mensagem.
Henrique: Pensei em você hoje o dia todo. Queria estar na sua cama, em cima de você, fazendo nosso sexo gostoso.
Victória: Também pensei em você o dia todo. Sinto sua falta, Henri. Não é certo, mas eu sinto, sinto muito a sua falta.
A mensagem me tira do meu eixo. Ela sente muito a minha falta, assim como eu sinto dela. Não a vejo, não a toco e nem falo com ela há quase uma semana e nunca me senti tão desesperado como agora, tão vazio e solitário. Eu sei que tomei uma decisão dias atrás, a decisão de voltar para Lívia e para minha vida com ela. Mas eu tenho uma enorme necessidade de ver Victória pela última vez antes de eu retomar minha vida com Lívia. Antes de definitivamente cortar minha relação com ela, preciso vê-la pela última vez.
Desvio meu percurso para o apartamento de Victória. Quando chego, ela me olha um pouco espantada e surpresa, o lábio inferior sendo mordido constantemente.
- Oi - digo apenas, sussurrando. Droga, eu não deveria ter vindo.
- Oi. - responde, também murmurando. - O que está fazendo aqui? Disse que não voltaria.
- Eu sei. Mas você me mandou uma mensagem, dizendo que sente muito a minha falta. Acredite, Vic, eu também sinto muito a sua.
- Já falamos sobre isso, Henrique, e decidimos dar um basta. - fala, olhando para as próprias mãos. - Não é certo.
Apenas aceno em positivo. Estou ciente de tudo isso, mas, ainda assim, sinto como se Victória fosse uma força invisível me atraindo fortemente de volta aos seus braços, sem me fazer pensar em certo ou errado, nas consequências ou em arrependimentos. Dou um passo à frente, me juntando a ela, e toco seu rosto suavemente. Ela ergue o olhar e me encara, os olhos verdes tão brilhosos iluminam o meu ser e mexem comigo de uma forma indizível. Acaricio sua face com o polegar, olhando-a dentro dos olhos, incapaz de me esquivar deles.
- Desculpe - sussurro. - Vou embora.
Estou prestes a me virar e deixá-la para trás, mas ela segura forte em meu punho, me impedindo de continuar com meu trajeto. Victória me olha profundamente dentro dos olhos, e os seus parecem suplicar para eu ficar, da mesma forma como ela parece pedir para eu ir embora, pois minha presença lhe é uma tentação. Assim, eu não sei o que fazer, não sei qual decisão tomar: ir ou ficar?
- Me diga o que você quer, Vic, e eu atenderei a sua vontade. Seja ela qual for. - digo-lhe, umedecendo os lábios. É ela quem deve tomar essa decisão. Eu a procurei para ter meu último instante com ela, mas se ela não me quer, então eu irei embora e voltarei para Lívia. No entanto, se ela me pedir para ficar, terei este último momento. Embora seja covarde não ser honesto sobre todas as minhas intenções.
- Fique. - Victória sussurra em resposta.
Meio segundo depois, já avancei sobre sua boca e estou beijando-a com força, vontade e intensidade, enquanto a empurro para dentro do seu apartamento. A porta atrás de nós se bate com um baque forte quando ela me empurra contra a madeira. Sua boca explora a minha, esfomeada, voraz, arrancando-me todo o ar, como se ela me beijasse para compensar todos os beijos não dados nos últimos dias.
Viro-a de costas para mim e tiro sua camisa regata - como sempre, ela está sem sutiã, e isso me ensandece, enrijecendo-me sobremaneira. Victória deixa sua cabeça cair contra meu ombro e inclina levemente o pescoço para o lado, dando-me completo acesso. Molho-o com meus lábios úmidos e quentes, distribuindo beijos cândidos e lascivos por toda sua pele branca; minhas mãos descem por seu corpo e por um instante brincam com seus seios, beliscando suave e sensualmente seus bicos amarronzados. Ela geme e contorce seu corpo contra o meu, e o gemido se torna mais esganiçado e constante quando desço minha palma por sua barriga e entro em sua calça jeans, procurando pelo seu ponto sensível.
Minha ereção cresce contra sua coluna, meus dedos a acariciam sobre a calcinha, mas eu quero me enveredar mais, encontrar seus lábios vaginais, sentir sua umidade e excitação. Afasto a peça um pouco para o lado, o suficiente apenas para tocá-la com dois dedos e sentir tudo o que anseio - e, caralho, ela está tão molhada! Seu quadril se remexe de encontro aos meus dedos, minha boca ainda trabalhando em seu pescoço. Andando, a conduzo até sua cozinha, onde a deito sobre sua mesa de vidro e puxo sua calça jeans. Dobro suas pernas, fazendo-a apoiar os pés na superfície, e as afasto, expondo-a toda para mim. Toco sua parte íntima e encontro seu olhar no mesmo instante, e no mesmo instante ela geme contra meus dedos, olhando-me profundamente, umedecendo os lábios. Não tiro sua calcinha; a peça, assim, afastada um pouco para o lado, me dá um tesão incontrolável. Tudo o que faço é afastá-la um pouco mais e inclinar-me para chupar sua vagina rosada. Victória geme alto, as pernas tremulam intensamente, e ela se agarra aos meus cabelos para me forçar a ir de encontro ainda mais com sua parte íntima.
Seus gemidos preenchem a cozinha, e quando a penetro com dois dedos sem deixar minha língua em seu clitóris, seu corpo entra em espasmos, e ela goza em minha boca. Depois disso, subo meus beijos, conhecendo e tocando cada parte da sua pele, sem me esquecer de nenhum centímetro. Chego à sua boca; penso em respirar um segundo antes de sugar seus lábios, mas ela é mais rápida e me puxa para sua boca; ponho-me entre suas pernas e rapidamente abro meu zíper, liberando meu pênis duro e a penetro com força, movimentando-me rápido contra ela, querendo enterrar-me dentro dela cada vez mais.
Nós transamos sobre sua mesa e em diversos cômodo do apartamento, experimentando novos lugares e posições. Ela me ensandece e me tira do meu eixo de uma maneira que nunca pensei ser capaz. O sexo se arrasta por quase toda a noite, e nós fazemos apenas algumas paradas para comer e descansar. Estávamos recuperando a semana que estivemos longe, e isso era evidente. Nossa última parada é em seu quarto, sobre a cama, numa posição mais clássica, já que estamos exaustos. Suas pernas me abraçam a cintura enquanto entro e saio dela vigorosamente, sentindo meu quarto ápice se aproximar. Céus, acho que nunca gozei tanto em um noite como hoje.
Sua vagina faz pressão contra meu pênis, e suas pernas se fecham mais em meus quadris, ela belisca a ponta da minha orelha com seus dentes e arranha minhas costas, proferindo sussurros obscenos. Com estocadas fortes e gemendo alto, gozo dentro dela, e um pouco de sêmen escorre por suas pernas. Victória não para, é insaciável, mesmo depois de ter gozado diversas vezes. Ela segue movendo seus quadris para frente, fechando fortemente os dedos longos em meus cabelos e gemendo, pedindo-me para ir mais com mais força, mais rápido, mais fundo. Eu a ajudo a gozar atendendo seus pedidos e também a estimulando, tocando seu ponto sensível, beijando sua boca, dizendo-lhe palavras indecorosas, chupando seus seios. Em segundos, ela está se desmanchando e gozando forte e muito.
Exaurido, solto meu corpo sobre o dela, enfiando-me na curva do seu pescoço, inspirando ar para os pulmões - o ar que tem o cheiro dela, de suor, de sexo, de perfume.
Victória me beija serenamente nos lábios quando me afasto e acaricia minha face com delicadeza. Sorrio para ela e deixo um estalinho em seus lábios. Olho para o relógio sobre seu criado-mudo. São mais de três da manhã. Levanto-me de cima dela e vou até a sala. Ela vem atrás de mim um segundo depois.
- O que está fazendo? - indaga, fechando um roupão branco em torno do corpo, ao me ver vestindo minha calça.
Olho para ela sem saber como dizer isso. Eu resolvi ficar - com seu consentimento -, mas não fui completamente sincero sobre isso. Eu não posso ficar; quero, mas não devo. Eu deveria ter sido honesto com Victória sobre ter vindo procurá-la com a intenção de ser a última vez. A última vez definitiva. Eu sabia que minha omissão criaria uma falsa esperança, mas se eu tivesse sido completamente honesto, ela talvez não teria permitido que eu ficasse. E eu precisava dela só mais uma vez. Só mais uma noite.
Soará completamente cruel e canalha, mas eu já tive o que precisava. E agora, preciso ir pra casa. Voltar para Lívia.
- Eu preciso ir, Vic - respondo, colocando a camisa social e fechando os botões.
- Henrique - titubeia, dando um passo em minha direção. - Nós acabamos de transar. Você pode... pode ficar se quiser. Passe a noite aqui, está tudo bem e...
- Não, Victória - corto-a, suspirando. - É melhor eu ir embora.
Ela fica muda alguns instantes, mordendo constantemente o lábio inferior. Por fim diz, meneando a cabeça em positivo:
- Ok. Já entendi. Você e Lívia ainda estão brigados, mas você precisava dar uma aliviada. Então me procurou só pra dar uma fodida. E agora vai embora. Daqui a dois dias estará na minha porta, querendo apenas me comer de novo porque provavelmente Lívia ainda estará preferindo passar o tempo com seu irmão.
Todas essas palavras me doem profundamente na alma, e a dor me provoca uma irritação insólita e desconhecida.
- Não é isso, Vic - rebato, entre os dentes, vestindo meu paletó. - E, olha, nem sei por que se incomoda tanto. É só sexo, e você, mais do que ninguém, deveria saber disso. Eu conheço você e gente como você. Vocês não gostam de passar a noite depois do sexo. Só estou te poupando do trabalho de me dispensar.
- Eu quero que você fique e passe a noite - diz, mais suavemente. - Está tudo bem, Henri. - Dá mais alguns passos até estar perto de mim, seus olhos verdes intensos penetrando minha alma.
- Sinto muito, Victória. - sussurro, realmente sentindo muito. - Mas eu não posso.
- Não pode ou não quer? - questiona, elevando a voz. - E as mensagens, Henri? E nossa conexão, nossa química, nossa saudade um do outro? Ou isso tudo é unilateral?
Não, não é. Eu sinto o mesmo. Minhas mensagens foram todas sinceras. Senti uma vontade e uma saudade dela enlouquecedora; e eu sinto nossa química, nossa conexão. Entretanto, eu ainda amo Lívia e é desonesto com ela esses encontros.
- Eu realmente senti sua falta - confesso. - Vic, mas tem a Lívia. Não é correto.
- Não, não é! Ainda assim fazemos. O pior de tudo nós já fizemos, Henri; não passar a noite comigo não amenizará as coisas, não tornará sua traição menos errada.
As palavras estão aqui, presas na minha língua. Quero dizer-lhe que estou voltando para Lívia, mas antes disso eu precisava revê-la, ter mais uma noite com ela, matar minha saudade, porque depois de eu e Lívia nos acertarmos, esses encontros não acontecerão nunca mais. Nunca mais. Mas eu não posso proferir essas palavras, pois a magoarei profundamente, muito mais do que estou fazendo agora.
- Me perdoe. - É tudo que posso dizer antes de sair e deixá-la para trás.
Entro no hospital com apenas um pensamento: procurar Lívia.
Depois de sair do apartamento de Victória, eu não tive a audácia de ir ao nosso apartamento às quase quatro horas da manhã saber se ela me aceitaria de volta. Além de ser madrugada, eu ainda cheirava a sexo com Victória - cheirava à traição. Por isso, passei a noite em um quarto de hotel. Depois, fui trabalhar na Hauser e ocupei minha cabeça com um pouco de trabalho. Só então, no fim da tarde, resolvi procurar por Lívia; e eu sabia onde exatamente encontrá-la.
Adentro a recepção e me encaminho até o balcão para perguntar se Lívia está no quarto com Alfredo; no entanto, pela visão periférica, vejo minha mãe surgir. Vou ao seu encontro, e ela me parece abalada. Quando me vê, minha mãe se joga em meus braços e chora por algum tempo. Quando consigo acalmá-la, ela me fala sobre terem dado a notícia da morte de Lauren e Sophie ao meu irmão, e ele entrou num estado de choque e histeria. Ela não suportou vê-lo chorando, sucumbindo à sua dor da perda.
- Meu coração de mãe não aguentou, Henrique - diz, secando suas lágrimas e saindo dos meus braços. Sentamo-nos no sofá da recepção e mamãe ainda segura minhas mãos. - Se eu pudesse tomar toda a dor dele para mim, eu o faria sem nem pensar.
- Eu sei. Mas Alfredo é forte. Vai passar por isso - digo, mais como forma de consolá-la.
- Você veio visitá-lo. - afirma e me abre um sorriso contido.
- Sim. - minto outra vez. Vim por Lívia, mas aproveitarei e entrarei no quarto para vê-lo. Mais por minha mãe do que por Alfredo.
- Não perca mais tempo - incentiva-me.
Um minuto depois, já estou no elevador, subindo para a ala de Alfredo. Caminho a passos vagarosos pelo corredor; não quero adiar meu encontro com Lívia, nem minha conversa com ela, mas, depois de três semanas fora de casa e com pouco - ou quase nada - de contato, evitando-a a todo custo, por raiva, ciúme, ódio e medo, preciso me preparar para sua reação quando ela me vir e eu lhe pedir para voltar para nossa casa.
Do outro lado, de repente, eu a vejo. Caminha cabisbaixa, abalada, parece chorar compulsivamente. Aperto os passos em sua direção, e ela ainda não me nota. Penso em chamá-la, mas, pelo seu estado - seja lá o motivo por estar chorando tanto -, eu quero antes de qualquer coisa abraçá-la. Ela continua andando até esbarrar em mim e, finamente, notar minha presença. Lívia ergue os olhos lacrimejantes em minha direção, e há dor neles. Muita dor.
- Lívia, por que está chorando? - pergunto e a abraço imediatamente, findando com a minha vontade de tê-la outra vez em meus braços. Ela não me responde nada por alguns segundos, fica apenas envolvida nos meus braços chorando. Talvez eu saiba o porquê, talvez seja por Alfredo, ainda assim, arrisco perguntar: - Lívia, está me assustando, o que aconteceu? - insisto, mais apreensivo, e a afasto de meus braços para olhá-la.
Lívia seca as lágrimas e recupera a postura, inspirando fundo.
- É o Alfredo... - responde, e, como supunha, é sobre Alfredo. É por causa dele o seu choro. Não consigo não mudar minha expressão e, tentando de todo modo esconder meus sentimentos, pergunto:
- Ele está bem? Estive com a mamãe há pouco, ela me contou da reação dele quando soube... - eu tento soar preocupado, mas falho. Minha voz sai sem emoção.
Ela balança a cabeça em positivo, ainda tentando conter as lágrimas.
- Ficou abalado... em choque. Foi horrível vê-lo naquele estado. Ele ficou muito nervoso, pediu pra ficar sozinho; eu relutei um pouco pra sair, e ele acabou gritando comigo, praticamente me expulsou do quarto. - Funga e passa as costas da mão no nariz.
Eu a envolvo em outro abraço e acaricio seu cabelo. Apoio o queixo sobre seu crânio e lhe digo que tudo irá se resolver e ficar bem, assim como disse à mamãe, mais para não vê-la nesse estado por causa do meu irmão. Toda essa comoção dela por causa dele ainda me machuca, mas agora, com Alfredo fora de perigo, nossa vida voltará a ser o que era antes; assim, me agarro a essa esperança e jogo meu ciúme para o fundo da minha mente.
Ela olha para mim, enxugando outra vez as lágrimas e recuperando a postura.
- Veio ver o seu irmão? - pergunta.
- Também... - respondo, um pouco seco, mentindo outra vez. Passamos a caminhar pelo corredor, nos levando para longe da ala dos quartos. - Mas também vim para conversar com você. Sabia que estaria aqui. - Faço uma pausa, suspiro, baixo os olhos. - Eu queria saber se posso voltar para casa.
Lívia se vira para mim, me encarando. Ainda caminhamos lado a lado. Tomamos um elevador para o térreo.
- Claro, Henrique. A casa também é sua. - Sua afirmação me deixa realmente animado, mas não demonstro.
- Eu sei, mas, depois de tudo, tenho medo de não querer mais nada comigo.
Depois de tudo secretamente eu me refiro à minha traição, e não aos meus dias longe de casa. Lívia segura em minha mão e me acaricia, e o toque é tão bom e confortante. Olho para baixo, apenas para me certificar de que esse toque e essa aproximação são reais.
- Me diz, tudo o que desejou ao Alfredo, foi no calor do momento? - sussurra, se referindo à noite em que discutimos e eu desejei a morte dele.
Mas por que porras ela sempre tem de trazer Alfredo para o meio de nossas conversas, de nossas vidas? Com raiva, me esquivo do seu toque com brutalidade. Volto a olhar para frente, para o LED do elevador indicando os andares, e não a respondo. Lívia suspira, está aborrecida, e se encosta ao espelho do elevador. Descemos em silêncio, e eu tenho alguns segundos para pensar. Eu não quero continuar brigando com Lívia, permitindo que Alfredo esteja entre nós, interfira na nossa relação e no nosso humor. As portas se abrem, caminhamos em silêncio pela sala de espera em direção à saída.
Quero voltar para Lívia, por quem eu sempre batalhei, mas não poderei fazer isso se eu não, ao menos, me desculpar por minhas palavras. Mesmo que eu não seja sincero. Decidido, fecho minha mão na sua e logo tenho sua atenção. Esboço um pequeno sorriso no rosto e afago sua mão.
- Fui um idiota, sei disso - declaro, começando minhas falsas desculpas, e paramos numa balaustrada do lado de fora do hospital. Está tarde e venta gelado.
- Sim, você foi. Mas ainda não me respondeu. Você foi sincero quando...?
- Não, Lívia! - Aumento o tom da voz e aperto os dedos entorno da proteção; ela se cala. Por que minha admissão não lhe é o suficiente? - Eu não queria ter dito aquilo. Só fiquei nervoso porque sempre quando estamos indo bem, alguma coisa acontece, e você se aproxima dele outra vez! - Preciso inspirar fundo, pois quase perco o fôlego; é esse o nível de raiva que o assunto "Alfredo" me causa.
Ela fica ali, parada, me olhando - eu noto pelo canto do olho.
- Não vamos mais discutir sobre isso, pode ser? - sussurra, finalmente, me dizendo as palavras que há muito eu queria ouvir. Eu apenas aceno, concordando, mas a tensão ainda paira no ar.
Ficamos em silêncio por algum tempo, apenas apreciando o entardecer, o movimento de entra e sai do hospital. Então me viro para Lívia, pego na sua mão e a beijo. Murmuro alguns pedidos de desculpas, dessa vez, sou mais sincero. Ela sorri em minha boca e afaga meus cabelos. Mamãe surge um segundo depois, segura um copo de café nas mãos. Os olhos injetados, denunciando seu choro há pouco.
- Achei vocês. - nos diz, sorrindo fraco. Ela me abraça e me dá um beijo antes de me cobrar duramente: - Já entrou ver seu irmão?
- Ainda não. Lívia disse que ele pediu para ficar sozinho. Resolvi esperar.
- Entendo... ele está tão chocado. - suspira, e então nos olha com amor maternal nos olhos. - Aliás, fico feliz por terem se entendido - mamãe diz, ainda acreditando que de fato eu voltei para casa ontem à noite para me entender com minha mulher.
No entanto, eu não voltei. Estava transando com Victória, em vez disso. E sei que as palavras de mamãe despertarão questionamento em Lívia, e ela vai perceber que eu menti, vai querer saber onde estive a noite passada, porque em casa eu não estava.
- Mãe... - começo uma frase para, de alguma forma, tentar impedi-la de me entregar, mas ela continua, se voltando para Lívia:
- Ele passou todas essas semanas lá em casa, me disse que brigaram. Mas ontem, quando Henrique saiu de casa pra voltar para a de vocês, porque se entenderam, eu fiquei muito feliz, de verdade.
Lívia me encara com olhos inquisidores. Ela sabe que não voltei para nossa casa, e nós também só nos entendemos hoje, agora, há menos de dez minutos. Eu devolvo seu olhar, e não consigo disfarçar como a situação está me deixando aturdido. Ela vai me questionar agora mesmo sobre isso, eu posso até prever, no entanto, ela não o faz na frente da minha mãe e diz:
- É. Agora... estamos bem. Não é, amor? - Ela força um sorriso e abraça minha cintura. Apesar de não me contrariar na frente de mamãe, continuo desconfortável, já sabendo que em algum momento ela vai me perguntar sobre isso. Droga! Por que fui tão descuidado? Como resposta, apenas maneio a cabeça e aperto um sorriso.
Voltamos para dentro, mamãe quer ir ao quarto de Alfredo, na esperança de que ele já esteja melhor e aceitando a presença de alguém. Então ela me convida para acompanhá-la.
- Eu já vou alcançá-la, mãe. Só vou tomar um café forte na lanchonete. - garanto, realmente precisando de uma cafeína antes de ter de encarar isso tudo, e também acreditando que Lívia a acompanhará, e eu terei algum tempo para me esquivar de perguntas. Antes de ir, ela me dá um beijo. Lívia fica, para meu azar.
Faço menção de caminhar até a lanchonete, querendo me esquivar das perguntas iminentes, mas ela me impede segurando em seu braço.
- O que foi? - pergunto, dando um de desentendido.
- Não se faça de idiota, Henrique! - Cerra os dentes - Mentiu para sua mãe sobre ter dormido em casa, mas você não dormiu. Por que mentiu? Onde esteve?
Nada respondo, procurando por uma desculpa convincente. Mas meu maldito silêncio me entrega, e Lívia sabe que estou mentindo.
- Henrique, onde esteve a noite passada? - pressiona-me, mas eu continuo em silêncio.
- Eu saí pra beber - respondo de súbito; estou nervoso.
- Saiu pra beber? - pergunta, duvidando de minha palavra. - Passou a noite bebendo? Te vi na empresa hoje, não parecia ter bebido a noite toda.
- Porque eu não bebi a noite inteira. Tomei algumas doses e depois dormi em um hotel - minto e limpo a garganta depois de lhe responder, sem coragem de olhar em seus olhos.
Lívia respira fundo. Droga!, não consegui convencê-la. Ela parece prestes a me bombardear de perguntas quando uma voz feminina nos interrompe.
Victória.
Porra. Mil vezes porra!
O sangue drena do meu rosto, e o coração entala na garganta. O que diabos ela veio fazer aqui? Por que procurar a Lívia? Deus, ela vai confessar tudo!, deduzo, amedrontado.
Ela anda em nossa direção segurando uma bolsa transversal. Lívia vai em sua direção e a abraça.
- Oi, amiga. Saudade - Victória diz, retribuindo seu abraço.
- Oi, Vic. Eu também senti saudade - Lívia responde e beija sua bochecha.
- Vim ver o Alfredo. Não consegui vir antes depois que me ligou me avisando da recuperação dele. Aquele restaurante está uma loucura ultimamente.
- Não se preocupe. Alfredo só está mais lúcido desde hoje cedo. Se tivesse vindo outro dia, ele nem se lembraria.
Victória acena e lhe dá um sorriso seguido de um suspiro. Então, olha pra mim. Eu sinto como se o mundo começasse a desabar sobre meus ombros, de forma lenta e dolorosa, quando nossos olhares se encontram. Ela veio dizer tudo a Lívia. Em dois minutos estarei sozinho.
Mas que porra!
- Oi, Henrique - cumprimenta-me.
Lívia me olha. Ela nota minha postura diferente, tenho certeza.
- Oi... - digo seco, desviando meu olhar do de Victória.
Victória pergunta mais sobre Alfredo, sobre se ele já sabe da morte de Sophie e da Lauren. Lívia afirma e lhe conta da sua reação, não só da morte delas, mas também da perda dos movimentos das pernas - e isso me é novidade. Alfredo, paraplégico? Por um segundo, eu começo a sentir compaixão por ele. Vic quer entrar para vê-lo, no entanto, a amiga a aconselha a esperar pela volta de mamãe sob o pretexto de ela precisar de um momento a sós com meu irmão.
- Certo, enquanto esperamos, podemos conversar, Lívia? - Victória pergunta, para o meu desespero. Não posso de maneira alguma permitir que Victória conte sobre nós dois. Não posso perder Lívia. Por isso, antes de Lívia a responder, aproximo-me, segurando-a pela cintura.
- Não, ela não pode. Vamos entrar para ver o Alfredo a qualquer momento. Mamãe não vai demorar.
Ela se esquiva de mim, ralhando:
- Não gosto quando respondem por mim! - protesta, fuzilando-me com o olhar, depois volta sua atenção para Vic. - Claro, Victória, nós podemos conversar. Precisamos mesmo colocar nossa conversa em dia - diz, sorrindo, mas Vic não lhe devolve o sorriso.
Ela está tensa; talvez porque vai contar tudo a melhor amiga.
- Vamos até a lanchonete. Estou morrendo de fome - Lívia se pronuncia, segurando em seu braço e, antes de sair, se vira para mim - E você não pense que vai escapar. Ainda precisamos terminar nossa conversa - declara e sai com Victória para a lanchonete do hospital.
Eu penso em segui-las e ficar junto de Lívia para evitar essa conversa fatídica e reveladora. No entanto, se eu bem conheço Victória, ela o faria com ou sem minha presença.
Se ela fará isso, eu não quero estar presente para presenciar a fúria de Lívia.
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