Toda nota musical nasce para ser sonora e apreciada.

Estar presa no escuro interior do instrumento é como ser uma imagem apagada em um televisor desligado, à espera para ser mostrada.

Estar dentro da flauta, ouvindo o som oco do instrumento que não está sendo tocado

É como ser uma grande ideia filosófica de um pensador, presa no cérebro oco de um ignorante.

Não vejo nada, ouço o nada, mas algo aguça meu olfato.

Sinto cheiro de excitação em saber que estou pronta para sair, para ser tocada.

Sinto o inconfundível gosto da euforia, que só será consumada quando eu, finalmente, sair.

Como uma criança, que almoça já pensando no gosto adocicado do pudim que a espera como sobremesa.

Quanto mais o tempo passa, mais eufórica fico.

Cada segundo que falta para que me ouçam é como anos-luz, que demoram uma eternidade para passar.

Mas sinto que a hora chegou.

Sairei da clausura e animarei o espaço infinito.