Capítulo 7
- Sofia – finalmente cedi.
- Prazer.
- Prazer... – repeti a frase com ironia.
- Nunca tive um papo tão absurdo com uma fã.
- Agora quem duvida sou eu – falei incrédula.
- É sério.
- Você conversa muito com fãs?
- Às vezes – virou o olhar para as botas que ele cutucava com o indicador. Pareceu desconfortável.
- Sério? – sentei rindo.
- Sério o quê?
- Você fica com fãs?
- Eu não disse isso.
- Mas ficou bem claro.
- Bom, eu não existo. Heaven Strike não fica com fãs, eu fico.
Eu ri da gracinha. E depois suspirei negativamente pensando no absurdo da situação.
- É solitário. E algumas pessoas são legais. É normal ficar com pessoas, só acontece de algumas vezes elas serem fãs.
- É verdade, mas, sabendo o efeito que você tem sobre as pessoas, não sente aquela dúvida sobre o que realmente sentem por você?
- Eu sinto isso o tempo todo. Com amigos, empresários, mulheres... Todo tipo de pessoas com quem eu venha me relacionar.
- Isso é triste.
- É um pouco. Mas eu geralmente consigo sentir com o tempo. Porque nenhum fascínio dura para sempre. Amor sim.
Senti vontade de sentar do seu lado e segurar sua mão.
Ficamos quietos pensando no que ele disse. Trocamos alguns olhares envergonhados e um sorriso apareceu automaticamente nos nossos rostos.
- Eu sempre sofri de paixão platônica por astros da música. Desde pequena. Você está na lista.
- Fico lisonjeado.
- É sério.
- Eu também estou falando sério.
- Eu tentei desenterrar o Elvis no meu jardim quando descobri que ele estava morto. Eu tinha oito anos de idade.
- Você o quê?
- Eu sabia que enterravam as pessoas que morriam - me expliquei. Só não sabia que era sempre em cemitérios.
Ele fez uma cara estranha, mas sorriu em seguida.
- Eu te imagino pequena. Com a bochecha vermelha e cara de brava.
- Eu era um doce de criança.
- Podia ter continuado sendo um doce.
Eu ri.
- Desculpa por ser grossa. Você me entende, não é?
- Entendo. Não é fácil ser legal com nossos problemas – fez uma pausa – mentais?
- Eu não vou poder trabalhar mais – segurei a vontade de chorar.
- Por culpa disso?
- Sim.
- Que merda – falou o palavrão sem cerimônia.
- Merda? É muito mais que isso. Imagina que um dia você não vai mais poder cantar. É apavorante e desesperador.
- Eu sinto muito.
- E deveria.
Ele se espantou e eu continuei.
- Ninguém mandou você e esse infeliz aparecerem na minha vida – apontei para Carter imóvel.
- Pode ser que não dure para sempre.
- Pode ser – resmunguei pensando que eu provavelmente não veria o próximo ano chegar.
- Você me ama, não é?
- O quê?
- Ama Heaven Strike?
- Eu gosto bastante.
- Então aproveite pelo menos.
- Você está me cantando? – fiquei inconformada com a audácia do meu cérebro.
- Não! – ele se precipitou. – Só quero que pare de choramingar um pouco.
- Tudo bem, sei – respondi irônica.
- Uma alucinação não daria em cima de você – fez careta. – Seria incesto?
- Eu gosto da minha versão de você. É bem humorada.
- Eu gosto da versão que você criou.
- A mão está doendo?
- Para uma alucinação, pra caramba. Eu não devia ter fugido. Agora sinto falta dos analgésicos.
- Bem feito – brinquei.
- Pelo menos te encontrei.
- Achei que tinha sido uma coisa ruim.
- E foi. Nada como uma dor maior pra amenizar uma pequena.
- Fico lisonjeada.
Evitava olhar nos olhos dele. Me deixavam hipnotizada, perturbada até (mais). Cada detalhe que eu sempre quis ver de perto, minha cabeça estava recriando detalhadamente. E ele era ainda mais lindo segundo a minha perspectiva.
- Você já foi a algum show nosso?
- A um show do The Odds? Sim.
- Certo, alucinações não fazem shows.
- Fui em três. Em um, eu tirei foto com eles.
- Sério?
- Sim. Se minha bateria não tivesse acabado, eu mostraria. Aliás, cadê teu celular?
- Não peguei. Esqueci na correria.
- Bem típico de uma alucinação.
- Você é chata de um jeito meigo.
- Obrigada.
- Aposto que tem um humor incrível, poucos amigos, mas amigos muito próximos. Parece fria, mas se apega emocionalmente a pacientes e sofre por eles.
- Ótima leitura fria.
- Eu sou você, lembra?
- O tempo todo.
- Se eu fosse você, eu saberia como foi que essa cicatriz apareceu no seu braço.
Olhei para o meu braço que estava à mostra por eu ter arregaçado a manga da blusa.
- Eu caí de uma árvore. Minha mãe me chamou para almoçar e eu tentei descer correndo. Escorreguei e um galho rasgou meu braço. Meu primeiro contato marcante com o hospital.
- Eu caí do palco uma vez.
- Você cai bastante.
- Sim – riu. – Mas uma vez eu machuquei meu pé de verdade, e ninguém notou. Sou forte, continuei o show até o fim.
- Eu li sobre isso.
- Claro que leu – ergueu os braços como se nada do que ele dissesse pudesse me surpreender.
- Mas sempre me perguntei o que era realmente verdade ou não.
- Tem muita mentira.
- Eu imagino. Leio muita coisa e depois fico "não pode ser verdade isso!"
- Como aquela vez que disseram que eu comia fios de ouro?
- Sim! – ri empolgada
- Ou que eu preciso de mais de cem toalhas de rosto. Que como carne de cachorro. Que fiz plástica no nariz. Que saí com a Kim Kardashian. Que estou sendo cotado para o papel do próximo Batman.
- Você seria um ótimo Batman. Meu herói favorito.
- Eu sei que eu seria, mas nunca fui convidado. Algumas mentiras eu até queria que fossem verdade.
- Eu também.
- Qual, por exemplo?
- Essa de você estar bem aqui na minha frente.
- Eu não seria tão legal se não fosse essa mentira que você criou. Eu seria arrogante, pedante, convencido e mimado.
- Tem razão. E isso faria você conseguir qualquer papel para o cinema, porque sempre encena muito bem ser uma pessoa excelente. Pelo menos é o que eu sempre achei de você.
Ele ficou sério, mas os olhos estavam sorrindo.
- Não fosse pelo sumiço de uma criança, eu estaria feliz por todo esse tempo aqui – admitiu.
- Não fosse pelo meu cérebro descompensado, eu também estaria. Na realidade, ele está tão mal que eu realmente estou feliz.
- Eu gosto de você, Sofia.
- Eu não sei se eu gosto de você. Afinal, você é arrogante, pedante, convencido e mimado. E egocêntrico.
- Oba! Mais um adjetivo carinhoso.
Rimos e o som ecoou pelo corredor de uma forma maravilhosa.
- Já passou da hora de procurarem por quem quer que fosse aqui nesse pedaço do hospital – reclamei.
- Tomara que eles esqueçam da gente aqui.
- Você é doido.
- Eu? – fez uma cara engraçada de ironia.
- Tô morrendo de frio, e me sentindo um pouco cansada.
- Você está bem? – se assustou.
- Sim, só cansada, não se preocupe.
- Tente dormir um pouco – dizia enquanto eu deitava novamente no chão. – Eu até prefiro ficar te ouvindo me insultar, mas tenta descansar. Quem sabe eu não tenha sumido quando você acordar?
- Exatamente por isso que eu não queria dormir – senti uma tristeza entranha.
- Qual sua música favorita?
- Por quê?
- Fala logo, caramba.
Eu ri
- Adivinha.
Ele bufou contrariado.
Quando pensei que ele tinha desistido da resposta, começou a cantar.
- I don't need blue skies, if i have you...
O som entrou em mim me pegando de surpresa. Meus olhos se encheram de lágrima quando olhei para ele. Uma lágrima escorreu quando ele sorriu pra mim.
- You are enough.
Fechei os olhos enquanto ele continuava. Desejei que aquele momento durasse para sempre. Talvez fosse um presente de despedida da minha vida que Deus estava me dando.
Estava tão exausta que acabei pegando no sono. Mas não sonhei com nada. Sentia que tremia de frio em alguns momentos, mas não conseguia despertar.
Tive a sensação de que alguém havia me tocado. Abri os olhos assustada.
- Olá, dorminhoca.
Meu olhos estavam embaçados pelo sono e meu corpo doía por estar dormindo no chão duro e frio.
- Olívia? – sussurrei ao sentar.
- Sim, querida. Vamos levantar? Você está com os lábios roxos de frio.
Me levantei com certa dificuldade, olhando para os lados com esperança. Queria que ele ainda estivesse ali. Mas não estava. Nem Carter, nem Heaven.
Devo ter reproduzido minha tristeza na minha expressão facial, pois Olívia imediatamente me perguntou se eu estava bem.
- Tem algo errado?
- Não... não. Está tudo bem, fora o que está ruim e que nós já sabemos.
- Venha. Vou tirar você daqui – falou me abraçando pelo lado esquerdo do meu corpo enquanto abandonávamos meu sorvete derretido.
Andamos alguns passos em silêncio e senti que me esquentava enquanto caminhava.
- Ficamos preocupados com você.
- Desculpa, eu não sei o que me deu.
- Não precisa se desculpar, por favor. Só queremos você bem.
- Obrigada.
- Você quer que eu te leve para casa?
- Não. Quero ver Cristofer.
- Ele está em cirurgia, Sofia.
- Eu espero.
- Tudo bem – parecia contrariada, mas aceitou me levar até a galeria para vê-lo operar.
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