
EXTRA: Com a palavra, Ícaro
oi, fantasminhas! tudo bem?
esse aqui é um capítulo extra (ou bônus, como preferirem). é a releitura do capítulo 11, só que do ponto de vista do Ícaro (alguém está lendo muito midnight sun, hehe). ler ou não, não vai afetar o percurso da história. porém, decididamente, vai esclarecer muita coisa, inclusive, quem sabe, o que aconteceu com Ícaro no capítulo anterior (o interlúdio tava aí pra sinalizar que agora é só ladeira abaixo, mas não desistam de nós).
e claro, vai deixar o coração de vocês quentinho (garantia de satisfação ou o seu dinheiro de volta, haha).
posso dizer com segurança que, até agora, foi o capítulo que mais amei escrever. coloquei todo o carinho que tenho pelo Ícaro aqui, tentando desfocar um pouco do modo que a Amélia vê o mundo e mergulhar no que esse xuxuzinho tá sentindo.
espero que gostem tanto quanto eu!
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Ao dar play na multimídia, você ouvirá: Dodie - Sick of losing soulmates
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Antes de Amélia chegar, Ícaro tinha lido e relido todos os contos que estavam escritos no seu protótipo de livro. Nunca comentou que todas as palavras despejadas ali o faziam ter a falsa sensação de que não estava totalmente morto.
Quando absorvia memórias, Ícaro podia experenciar todas com propriedade; naqueles segundos, ele realmente, realmente vivia. Era assim que se lembrava o que era sentir algo, algum vestígio de sangue bombeando seu coração.
Através dos outros, já havia visitado Verona, tido três filhos e um hamster, pulado de um penhasco, mergulhado num lago congelado e tomado remédios para depressão até ter uma overdose.
Claro, não eram suas histórias, mas ele não podia fingir que eram?
Sempre teve a impressão de que não roubava memórias, necessariamente, porque as pessoas pareciam não ligar para suas próprias vidas. Nenhuma delas tinha noção do que era continuar respirando; nenhuma delas tinha noção do quão precioso era só poder sair por aí; nenhuma delas tinha noção do quão eram sortudas por terem suas famílias por perto; nenhuma delas aproveitava, realmente, o ato de amar, ou até mesmo odiar.
— Nunca pensei que uma parede pudesse ser tão fascinante — disse Amélia, em voz alta, e ele se virou. Ela estava certa. Encarar a maldita parede não faria com que pudesse passar por ela sem voltar para o mesmo lugar.
— Achei que não apareceria. — Sorriu. Todo dia achava que ela não apareceria.
— Por que não? Você não me assusta mais — respondeu ela, pousando uma sacola e uma caixa no chão. Ele observou a moça suspirando, quase lembrando de como era poder suspirar, também.
— Pensei que esse dia nunca chegaria. — Ícaro colocou as mãos no bolso, tentando não transparecer sua felicidade. — Como foi o trabalho?
— Normal. — Ela encostou em uma das estantes. — Como foi o seu? Roubando muitas memórias?
Ela sempre fazia as perguntas certas, não é?
— Não muitas, na verdade.
— Precisamos arranjar coisas para você fazer — pronunciou, o que fez Ícaro arquear as sobrancelhas. — A infiltração não pode ser sua maior atração todos os dias.
— Acho que sinto falta de sair para ir a festas de vez em quando, realmente — admitiu, mordendo o polegar. A última lembrança que escreveu era relacionada a isso, e ele ficou nostálgico de repente. — Quer dizer, na época eu odiava.
— Por algum motivo, não consigo imaginar você dançando nem nada. — Amélia cruzou os braços. Ah, então iria subestimá-lo!
Estava totalmente certa.
— Que bom, porque eu nunca soube dançar bem. — Ele forçou um sorriso.
— Ah, nem uma valsinha?
Ícaro nem sabia o que responder. Quer dizer, já era deprimente o suficiente pensar que estava condenado para todo o sempre a permanecer na livraria, mas lembrá-lo de que havia desperdiçado a valsa com sua mãe, em sua formatura, era golpe baixo.
Bem, não era culpa dela. Não tinha como Amélia saber, afinal.
Ele estava pronto para se recuperar e fazer uma brincadeira qualquer, quando sentiu a ponta de seus dedos pegando fogo.
Sim, era assim que ele se sentia quando Amélia o tocava, e era melhor do que qualquer coisa que tinha experimentado em vida e em morte. Nunca pensou, em contrapartida, como deveria ser a sensação para a moça. Provavelmente, desagradável.
Exatamente por isso, ficou chocado com o toque voluntário.
— Hora de aprender, não? — disse ela, colocando uma das mãos no ombro do espectro.
Ícaro, sutilmente, se deixou contaminar pelas vibrações quentes emitidas por Amélia e, com muito cuidado, envolveu a cintura da moça. Foi o suficiente: iria sofrer uma combustão ali mesmo. Era como entrar em um banho quente depois de ficar exposto ao frio por doze horas.
Sim, ele tinha vivido por essa sensação.
— Isso realmente, realmente não é recomendável — soltou, com um medo irreal de que aquilo fosse acabar.
— Não mesmo.
Amélia riu. E, se ainda fosse possível, ele derreteu ainda mais dentro de seu corpo conflitante com o som.
A moça começou a murmurar uma música que Aneli, sua mãe, cantava pelos cantos enquanto fazia qualquer atividade dentro de casa. Era uma daquelas músicas meio velhas que ele acabou se acostumando a conhecer e gostar graças à constante repetição.
Amélia começou a obrigá-lo a dar dois passos para a esquerda e dois para a direita, e ele estava tão embriagado com o momento que errava até os movimentos mais simples. Amélia franzia os lábios em diversão, e vê-la se divertindo tanto quanto ele o permitiu rir, também, e se achegar a sua fonte particular de calor, extasiado.
— Essa música é muito antiga pra uma pessoa como você saber — brincou, se esforçando para não fazer mais um passo errado.
— Vai ver estou na época errada. — Ela coçou a bochecha.
Bem que podia ser verdade, não? Queria, mesmo, ter cruzado com ela na "época errada", podendo despender a mesma quantidade de satisfação que ela estava lhe oferecendo naquele momento. Queria tê-la conhecido desde que era uma menina tímida, como havia visto em suas memórias; iria se esconder no quarto com ela e ler todos os poemas de Drummond e Pessoa.
Queria ter estudado com ela e conhecido o jeito que segurava a caneta. Queria tê-la levado para concertos de piano e visto os olhos dela brilhando em admiração. Queria ter ouvido os sonhos dela em um restaurante qualquer, tendo a plena certeza de que eram a coisa mais interessante que havia escutado até então.
— O que foi? — A moça mordeu os lábios.
— Gostaria que estivéssemos na mesma época — respondeu ele, simplesmente. — Provavelmente, teríamos sido melhores amigos.
Amélia franziu as sobrancelhas.
— Sabe, você não parece tão velho assim. Quando foi que...?
— Por que você não passa a noite aqui? — interrompeu o espectro com sua ideia mais insana, não querendo remoer aquele maldito acidente. Não a interessava saber que tinha morrido há cerca de um ou dois anos.
— Como é? — Ela riu. — Tem algum colchão inflável escondido nessa livraria e eu não reparei?
— É sério. — Ícaro parou de dançar, apesar de se recusar a soltá-la antes do necessário. Sim, era sério, faria qualquer coisa para mantê-la ali pelo resto da noite. — Poderíamos montar uma festa decente.
— Uma festa? — Amélia deu um sorrisinho e balançou a cabeça. — De duas pessoas?
— E por que não? — Ela, com certeza, deveria conseguir ver o quanto ele precisava dela, não deveria?
A jovem lançou um breve olhar para as coisas que tinha trazido e que repousavam, agora, no chão.
— Além do mais, você mesma disse que não tem mais medo de mim — lançou o seu melhor argumento.
— Tem razão. — Ela deu de ombros. — Mas você não come, não é? Porque eu tenho cupcakes comigo e não pretendo dividir com quem não precisa.
Ícaro riu, em ebulição, e se forçou a se desvencilhar da moça. Imediatamente, sentiu o corpo retornando ao estado de nada de sempre.
— Miriam vai fechar daqui a pouco. Me dê uns minutos, vou falar com ela — declarou, andando e saindo da vista de Amélia.
Percorreu os corredores com empolgação, certificando-se de que a livraria estava vazia, e avistou Miriam preenchendo alguns papéis (o que deixava para fazer quando estava prestes a ir embora). Ele aproximou-se e esparramou as palmas das mãos na mesa da velha, que ergueu os olhos para encará-lo, claramente não querendo fazê-lo.
— Amélia vai ficar comigo hoje. A noite toda — falou ele.
A mulher piscou por um momento e se recompôs.
— Por que acha que é uma boa ideia? — rebateu.
— Por que seria uma má ideia? — contrapôs. — O que tenho a perder?
— O que ela tem a perder, Ícaro? — Miriam o fuzilou com os olhos. — Essa garota não sabe o que está fazendo.
— Ela é inteligente o suficiente — desafiou o fantasma.
— Você, claramente, não é — rosnou a velha. — Eu te contei tudo o que sei, inclusive todas as atrocidades...
— Não vou deixar ninguém fazer nada com Amélia. Nunca.
Era uma promessa.
Além do mais, nenhum outro ser do além o havia procurado até então, inclusive quando, de fato, ele queria. Duvidava que acontecesse agora.
— Lide com as consequências das suas escolhas — respondeu Miriam, voltando o olhar para seus papéis. — E não conte comigo.
Ícaro sorriu. Era o mais próximo de uma autorização que teria. Aproveitou a deixa:
— Sabe, você não teria um pano para colocar no chão ou algo assim?
Descrente, Miriam parecia querer desfazer a existência de Ícaro com os olhos. De má vontade, alcançou uma toalha de mesa numa gaveta do móvel e jogou em cima do fantasma. Ele fez uma careta para a estampa de vovó, mas não disse nada.
— Obrigado, Miriam.
Ela grunhiu e ele praticamente correu para Amélia de novo.
Encontrou a moça bufando enquanto tentava arrastar uma estante com as costas. Ela já tinha arrastado duas, e Ícaro achou a ideia de criar espaço livre muito perspicaz. Uma prova de que ela queria, afinal, estar lá. Com ele.
— Resolvido. Ela já estava indo para casa, aliás. Provavelmente ia te expulsar — pronunciou ele, colocando a toalha no chão. Ela riu, e ele supôs que fosse por causa do tecido. — Foi a única que achei — defendeu-se.
Como um bom cavalheiro, ele se prostrou ao lado dela e empurrou as últimas estantes com as costas. Nem estavam tão pesadas, e não é como se fosse se cansar.
— Sabe, sua ajuda teria me poupado trabalho — reclamou ela, colocando alguns cupcakes em cima da toalha e esticando ainda mais o tecido.
— Mil desculpas, senhorita. — Ícaro já tinha começado a fuçar no rádio para encontrar alguma estação interessante. Lembrava-se vagamente de uma, que Aneli amava... Ah! Pronto, havia achado. A música preencheu o ambiente, tão certeira e agradável como ele imaginou.
— Preciso me trocar — sentenciou Amélia, pegando uma sacola.
— Uau. Eu diria que você planejou isso antes de mim — respondeu o fantasma, passando a mão no pescoço, mas Amélia já estava se deslocando para outro corredor.
Algum instinto adormecido fez com que Ícaro virasse as costas em reflexo, para não pensar muito no que ela iria fazer. Não podia pensar. Subitamente, a toalha deveria ser mais esticada, e quem sabe deveria abaixar o volume da rádio...
O que não foi sua melhor ideia, já que diminuir a música o fez ter a impressão de ouvir as roupas de Amélia caindo no chão. Rapidamente, subiu o volume. No entanto, isso não o impediu, momentos depois, de ouvir a voz dela:
— Ícaro?
Ele nem sequer pensou para ir até ela, guiado pelo canto de Iara no fundo do rio. Percorreu os corredores com cautela, vasculhando os cantos em busca da jovem. Quando viu um pedaço do braço dela aparecendo, disse:
— Sim?
— Preciso de ajuda.
Ícaro parou quando conseguiu vê-la por completo.
Se ele tivesse um coração que funcionasse, estaria batendo como nunca.
— Não consigo fechar — murmurou ela, de cabeça baixa.
O fantasma se permitiu, indo contra todos os seus princípios éticos, admirar as costas nuas de Amélia. Ele queria passar o dedo em cada uma das pintas e manchas que ela possuía, uma por uma, como queria tocar suas constelações preferidas no céu. Ele queria poder fazer as poesias mais expressivas do mundo contando aos quatro cantos da Terra como ela era linda.
Se pudesse ter engolido em seco quando alcançou o zíper do vestido e o puxou para cima, teria feito. Amélia estremeceu sob seu toque, provavelmente ruim, o que o lembrou de não prolongá-lo. No entanto, a respiração dela também estava descompassada, e ele não queria se permitir imaginar que fosse pelo mesmo motivo pelo qual estava fora de si no momento.
Quando Amélia se virou, ele sorriu, focando sua atenção no piso.
— Suas manchinhas são bonitas — declarou.
Não, eram perfeitas.
Contudo, não forçaria a barra.
Sem querer uma resposta, imediatamente rumou para longe. Ouviu a moça o seguindo. Ainda se sentia meio desnorteado.
Uma vez no lugar anterior, a única coisa que restava era começar a "festa". Ícaro estendeu a mão, com apreensão pelo quanto não conseguia raciocinar. Ela segurou os dedos dele.
Pelos próximos trinta minutos, Ícaro se permitiu esquecer qual era sua real situação, e o quão assustadora ela era. Ele se permitiu aproveitar a companhia de uma moça incrível; se permitiu vê-la dançar (nem parecendo que era tímida, nessa hora), rir, fazer piruetas e comer cupcakes. Ela tinha noção do que fazia? Não precisava ter invadido a moça para descobrir o quanto a jovem era insegura consigo mesma. Será que percebia o quanto era engraçada? Inteligente? Gentil, altruísta, bonita? Ele permitiu que o ar da madrugada o envolvesse, como magia, enquanto todo o resto e todos os problemas eram sugados pela aura brilhante de Amélia.
Ele se permitiu, afinal, ter um vislumbre da existência que procurava quando estava vivo. Nem precisou roubar memórias, porque aquela era a sua história, e era melhor do que qualquer outra.
— Minha família sempre odiou esse tipo de canção — disse Amélia, em algum momento.
— Que azar o seu. — Ícaro balançava de olhos fechados. — Minha mãe me fazia cantar algumas com ela quando eu era pequeno.
Ele quase sorriu ao lembrar de Aneli puxando-o pela mão e rodopiando na sala de estar, assistida por Victor. Se fizesse muito esforço, poderia esquecer que não lembrava do timbre exato da gargalhada de seus pais.
— Sua mãe parece ser o tipo que mostra seu álbum de bebê para as namoradas — zombou ela.
— Para a minha sorte, ela nunca conheceu nenhuma. — Ele abriu os olhos, vendo a moça sentada, comendo um cupcake. Porém, não parou de se mexer. Ainda se sentia muito feliz. — Mas o Gabriel compensava por mim. Éramos quase irmãos, então toda semana tinha alguma garota dele pela minha casa.
Nem tentava se apegar às namoradas do amigo, sabendo que iriam ser trocadas dentro de sete dias.
— E seu pai?
Ícaro deu um último giro antes de se jogar na toalha ao lado dela. Apesar da adrenalina, todo momento perto de Amélia era um momento a não ser desperdiçado.
— Ele não se preocupava muito com esse tipo de coisa. A faculdade era mais importante pra ele, acho. Bem, eu terminei o curso, como já disse. — O fantasma passou a mão no cabelo. Obviamente, não havia nenhum vestígio de suor ou cansaço. — Podemos dizer que devo tê-lo deixado orgulhoso.
Pelo menos, gostaria de pensar que sim.
— Aposto que deixou várias pessoas orgulhosas — palpitou Amélia, finalizando seu cupcake.
Aquilo era um elogio?
— Você é mesmo boazinha comigo. — Ícaro a encarou, querendo desvendar todos os enigmas de sua alma, como ela fazia com ele. Se é que tinha uma alma.
— Acredito que deve sentir falta de todos eles. — Ela retribuiu o olhar e ele poderia ter perdido o fôlego.
— Não consigo nem dizer o quanto.
Ícaro não tinha saudades de inúmeras coisas, mas seus pais eram a coisa mais preciosa que ele tinha tido o privilégio de conhecer e amar. Esse foi um dos motivos pelo qual decidiu sacrificar seus sonhos em prol da felicidade do pai. Poderia ser um contador chato? É claro, se ser um contador chato estivesse incluído no pacote de "orgulhar Victor".
A arte, em todas as suas formas, sempre foi sua escapatória. A arte não se importava se ele era covarde demais para cavar os próprios caminhos. A arte apreciava a decepção e a dor. A arte o acolhia, mesmo que não fosse compartilhada com mais ninguém.
A moça desviou os olhos para amassar a embalagem do cupcake. Subitamente, parou.
— Por que não me passa o endereço da empresa do seu pai?
— O quê? — Se um fantasma pudesse empalidecer, certamente Ícaro estaria ainda mais branco. Uma visão nada agradável de Victor e Aneli analisando Amélia de cima a baixo invadiu sua cabeça.
— Talvez isso te ajude a ter algumas respostas... E se forem eles o motivo de você ainda estar aqui?
O locutor na rádio anunciava um barbeador. O espectro olhou fixamente para uma das estantes afastadas. Ela tinha razão: e se fossem? Miriam havia falado algo sobre pendências, e Ícaro tinha tantas que nem sabia quais deveria resolver primeiro, mas os pais poderiam ser um começo, de fato.
No entanto, resolver as pendências significaria que ele iria... Para onde? O espectro travou o maxilar.
— É uma ideia — concordou, contra sua vontade emocional.
— Ótimo! — Pelo canto do olho, presumiu que ela tinha se deitado na toalha. — Confie em mim.
Naquele momento, não havia ninguém que ele confiasse mais.
Quando Ícaro a analisou, esperava que Amélia não percebesse o quanto estava apavorado. Ambos ficaram em silêncio por longos minutos. Acordes e notas perdidas ressoavam nos ouvidos do fantasma.
Mais alguns minutos com ausência de sons e ruídos se passaram. O inevitável lhe ocorreu: por que Amélia queria saber se os pais de Ícaro poderiam ajudar em algo? Ela não o queria mais ali? A mera constatação trouxe um sentimento terrível ao seu peito morto, um sentimento semelhante ao de quando foi esmagado pelo caminhão no acidente de ônibus. Doía como o inferno.
— Você quer se livrar de mim tão rápido assim? — indagou, temeroso. Amélia estava de olhos fechados. Deus, ela era tão encantadora, mesmo jogada numa toalha de velha.
Ela suspirou. Ícaro entreabriu os lábios, hipnotizado.
— Não quero — murmurou. — Você faz eu me sentir viva.
Então, aconteceu.
O vulcão adormecido teve uma erupção, e Ícaro de repente não estava mais em um banho quente depois de um dia frio. Ele estava sendo empurrado para o sol depois de ficar enterrado na neve por meses. Ele era o fósforo que a gasolina transformava em incêndio. Ele era toda a queimada ilegal nas florestas ao redor do mundo.
Observando a moça cair na inconsciência, ele concluiu: Amélia estava enganada. Era ela que moldava seu corpo do barro, assoprava em seu nariz e dizia "viva". Era ela. A sua única esperança, desde que colocou os pés na livraria e voltou, consciente dos riscos.
Ele teve certeza de que faria qualquer coisa por ela, qualquer maldita coisa que o deixasse viver de novo por ela.
Foi nesse preciso segundo que a livraria ficou mais escura, como se as estrelas tivessem sido roubadas do universo.
Foi nesse preciso segundo que ele concluiu que não era ele o causador do frio incomum que começou a rodeá-lo.
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