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|46| 𝗩𝗲𝗿𝗱𝗮𝗱𝗲𝘀 "𝘁𝗿𝗶𝘀𝘁𝗲𝘀" 𝗲 "𝗱𝘂𝗿𝗮𝘀"

Happy Birthday Pra Mimmmmmmm!!
Hoje, 16/06, estou fazendo 20 aninhos rsrs. 🥳

E para comemorar, um capítulo novo — embora pelo título não pareça ser tão alegre assim. Lembrando que tem a playlist no Spotify.

Boa leitura!
















🩸


















Isabella se arrependeu de combinar com Hob que iria junto com ele para a residência atual de Erasmus, poderia ter dito que iria na frente e que quando chegasse lá ela estaria o esperando junto do escritor de obras maravilhosas que para Isabella eram um problema de espírito.

O tempo fechou por dois dias e nesses dois dias Isabella se ocupou em fazer daquele apartamento, antes vazio, agora sua casa; um lugar aconchegante e confortável. Comprou comida mesmo sabendo que não era obrigada a comer, comprou algumas decorações e resolveu fazer uma reforma em uma das salas vazias no corredor do primeiro andar — concluiu que para se enteirar sobre o Novo Mundo deveria assistir filmes, então seria bom ter um cinema em casa, e era por isso que usava menos sua magia na sua nova casa porque tinha andanças de homens que carregavam uma coisa ali e adicionavam outra aqui — e ela insistiu para que eles almoçassem ali mesmo já que (por escolhe-los a dedo para pisarem no apartamento) concluiu que eram homens trabalhadores com o único objetivo de sustentar a família, cada qual com a sua, e as dificuldades financeiras. O trabalho estava demorando porque Isabella queria quase que uma réplica de uma sala de cinema, porém mais confortável e sem cadeiras estofadas que fizesse sua banda enquadrar. Mas, por causa desse tempo horrível, Hob a ligou pelo telefone fixo e em uma longa conversa concluíram que deveriam ir juntos no dia seguinte em busca de Erasmus.

Mas agora ela encarava aquele automóvel estiloso e preto estacionado abaixo do teto de concreto do hotel com um sorriso forçado. No banco do motorista estava o próprio Hob retribuindo o sorriso para ela, mas o dele era mais sincero.

Até então, ela sequer ousou entrar em um veículo desses.

E Isabella sentia seus músculos rígidos por baixo do cardigan branco com detalhes de pétalas de girassol na barra que vestia por cima de uma blusa branca um pouco justa de gola alta e sem mangas, a barra enfiada por baixo de uma calça folgada num tom cinza claro com elástico na cintura e em torno dos tornozelos e, nos pés, tênis de cor branco e cinza — com girassol desenhado artisticamente nas laterais.

Enquanto Isabella estava viva como um girassol, o tempo estava desabando mais como prenunciando a morte desse girassol.

Ela viu seu acompanhante descer do carro, contorna-lo, e parar do outro lado; estendeu o braço e abriu a porta do passageiro para ela ao seu lado e lançou um sorriso de contentamento.

━ As damas primeiro. ━ Fingiu uma mesura bem feita e com a mão livre indicou a porta que acabou de abrir.

Se era para ela se sentir como uma princesa da realeza britânica, seria mil vezes mais fácil se ela não encarasse aquele automóvel como uma jaula improvisada.

━ Nesse caso ━ Isabella apontou o carro inteiro com o dedo esticado. ━ seria o passageiro primeiro. Não as damas. ━ Arregalou minimamente os olhos. Não deu um passo sequer.

Hob encarou o carro e voltou-se para ela com as sobrancelhas franzidas. Ele a mediu disfarçadamente de cima a baixo apenas com o olhar.

━ Por acaso não está com medo de entrar, está? ━ Arqueou uma sobrancelha enquanto a estranheza bailava nas iris castanhas.

Isabella puxou o ar e obrigou-se a olhar para ele: ━ Claro que não. ━ Forçou um outro sorriso e andou, passando por ele e entrando meio sem jeito no banco do passageiro.

Se continuasse com tantos sorrisos forçados assim, até o fim disso tudo sua boca iria reclamar de dor.

Ela não falou mais nada e Hob não complementou com alguma piada para quebrar um pouco da tensão que ficou pairando no ar por culpa do olhar nem um pouco acolhedor que ela lhe lançou antes sentar. Fechou a porta do carro com um baque — que fez Isabella pular no assento não esperando por aquilo — e deu a volta para sentar do lado dela.

O ponto foi: ela o observava e imitava o que podia. Quando ele pôs o cinto, ela se deu conta de que tinha que fazer o mesmo e que provavelmente era um tipo de proteção — que ridiculamente a fez se sentir mais presa do que de fato protegida —, mas quando ele ligou o motor e pousou as mãos na roda — que se chamava volante —, ela notou que a única coisa que podia fazer era ficar parada e não fazer absolutamente nada. O automóvel tremeu e ela afundou as pontas dos dedos nas coxas cobertas pela calça, e quando começou a se movimentar, ela grudou as costas no estofado macio do assento no qual estava e encarou a estrada.

Se Hob havia notado a tensão no qual ela mesma se enfiou, não falou nada.

O carro lentamente foi entrando na chuva; cada gota batendo contra a lataria polida e negra era um baque ameno, repetido, e abafado.

━ Você sempre anda de carro? ━ Ela não desgrudou os olhos da estrada e não encontrou pergunta melhor. Mas surpreendentemente sua voz não soou falha.

━ Na maioria das vezes, sim.

A pergunta pareceu um tanto deslocada para ele porque não conhecia ninguém nessa cidade que não andasse de carro e pelo tom e jeito que ela falava parecia que haviam pessoas que baseavam seu dia-a-dia sem nenhum carro para uma locomoção rápida — os mais pobres e necessitados, Hobert! Ele se auto repreendeu internamente.

Porém ao espiar Isabella pelo canto do olho nem sequer passou por sua mente que a mulher ao seu lado se tratava de algum cidadão necessitado e muito menos ainda pobre.

━ Você não é de andar muito de carro pelo visto. ━ Segurou a risada.

Ela franziu o cenho e virou o rosto para ele — que havia flagrado as pontas brancas dos dedos dela apertando as coxas — e comprimiu os lábios.

━ Atenção na estrada. ━ Alertou, apertando os olhos.

Seus dedos suavizaram antes mesmo dele erguer o olhar para ela e depois desviar para a estrada num gesto rápido assim que encontrou duas iris esverdeadas como se fossem duas esmeraldas lapidadas em formato de flechas e apontadas para ele em um pedido muito "sutil".

━ Sim, senhora.

Ela bufou e remexeu as pernas, ainda meio tensa.

━ O termo certo nesse caso é senhorita. ━ Refutou.

Seu mau humor era mais porque o "local é menos espaçoso" do que realmente porque "está andando pela primeira vez em uma tecnologia humana" e depois da experiência que teve com os últimos humanos durante anos, ela ainda tinha dificuldade de confiar — conversar com Johanna era fácil porque ela conhecia seus antepassados, conversar com Hob também era fácil porque ela tinha noção de que apesar de 100% humano, ele não era como os anteriores que a manteram presa.

Presa, era assim que esse carro a fazia se sentir. Em um espaço minúsculo, com algo a pressionando contra o banco, sem espaço para o ar entrar, e sem conseguir poder ter controle de espaço para os seus movimentos. Isso a fazia recordar de quando esteve presa no sótão — claro que o sótão era maior em comparação a esse carro e tantos outros, mas o círculo de amarração no qual estava presa era o suficiente para serem paredes sem muros visíveis (diferente do carro, pois estes "muros" eram bem visíveis) e o cinto (apesar de não estar enroscado em seus tornozelos e pulsos) a fazia recordar das pesadas correntes frias que a queimavam todas as vezes que ousava usar sua magia. Enfim! Agora ela sabia que um trauma havia se estabelecido por culpa do velho Roderick e seu fanatismo iludido de pensar que capturando a Morte conseguiria controlar tudo o que quisesse e trazer seu filho mais velho, Rendall, de volta para o mundo dos vivos.

Tolice!!

━ Não precisa me chamar de senhora. ━ Tentou de novo. Fez uma breve pausa para ouvir o som abafado dos pneus molhados em atrito com o asfalto encharcado. ━ Não sou casada.

Hobert fez que sim, concordando.

━ Quantos anos você tem?

Embora tenha erguido de leve as sobrancelhas, seus olhos permaneceram firmes na estrada com o intuito de querer passar uma certa segurança para ela. Não foi imediatamente, mas ele se arrependeu de prender o riso e principalmente de ter vontade de rir ao vê-la um tanto apavorada daquela forma; não sabia pelo o que ela poderia ter passado para estar assim e foi muito insensível de sua parte querer rir de algo que para ele pode não ser nada, mas para ela pode ser o início de uma avalanche.

Dessa vez Isabella pôde passar a ponta da língua pelos lábios.

━ De acordo com a data disponibilizada no meu documento... ━ Parou para recordar. ━ 32.

Hobert sucumbiu ao ímpeto de virar a cabeça para ela com os olhos arregalados, porém quase de imediato voltou para frente, mas sua boca abria e fechava, sem voz e várias vezes.

━ Tudo isso!?

Ele parecia escandalizado. Ela o encarou — moveu a cabeça como um robô enquanto seu corpo está com os músculos rígidos e duros sem se mexer. O peito era uma excessão por causa da respiração.

━ O quê?

Ele lançou um olhar rápido de canto.

━ Não parece nem de longe ter 32 anos. Eu chutaria uns 25 ou 27, mas 32?

Isabella puxou uma lembrança de um momento recente que acabou tendo à noite com aquela enorme TV na sala. Um sorriso largo se abriu na direção dele.

30 é a idade do sucesso. ━ Deu de ombros. ━ Não chega a ser exatamente 32, mas ainda está válido. ━ Arqueou uma sobrancelha, provocativa e irônica ao mesmo tempo. ━ Você não sabia?

Dessa vez Hobert pôde rir, sentiu o ar um pouco mais leve do que antes.

━ Pelo visto você parece gostar de clássicos. ━ Falou com tom de aprovação. ━ Gosta de literatura clássica?

Não demorou nada e Isabella fazia que sim ao balançar a cabeça. Logo o sorriso e o brilho nos olhos de Hobert já permitiam que ela enxergasse sua euforia antecipadamente.

Há escuridão e luzes na vida, e você é uma dessas luzes. A luz de todas as luzes.

Isabella franziu as sobrancelhas o encarando e esperando por algo a mais; poderia ter entrado na mente dele mas seria uma baita trapaça e no momento estava tentando não ser uma mentirosa compulsiva como tem sido ultimamente.

━ E essa é de.... ? ━ Ela levantou as sobrancelhas, deixando as palavras arrastadas sumirem pouco a pouco no ar.

Ele a olhou pasmo. Agora sua aprovação estava perto de ser soterrada pela avalanche que ela própria prenunciava quando entrou e se "acomodou" no carro.

━ É do Drácula, de Bram Stoker. ━ Lançou diversos e rápidos olhares furtivos para ela e esperou por uma resposta positiva que nunca veio. ━ Sério!? Sério mesmo que você nunca assistiu? Ou talvez leu o livro?

Bom... Isabella torceu o nariz; foi mais um gesto de provocação para vê-lo mais indignado do que já estava.

━ E além de livro tem um filme?

Ele bateu a mão direita no volante e negou com a cabeça.

━ Não acredito que você não conhece. Faz parte dos clássicos junto com Frankstein, O Médico E O Monstro, O Fantasma Da Ópera, e O Homem Invisível.

━ Ei! Esses são clássicos de horror. ━ Apontou o óbvio e fez que não com a cabeça. ━ Você tem mais o estilo de quem gosta muito de comédias românticas, não livros e filmes de terror e horror. ━ O mediu de cima a baixo de vagar sem se importar se ele notaria ou deixaria de notar. Então resmungou: ━ Parece um romântico incurável e compulsivo, isso sim.

Hobert soltou uma gargalhada vibrante que não conseguiu conter e agitou seu peito, o esquentando e afastando o frio — não que o aquecedor já não estivesse ligado para manter o ar quentinho. Mas era mais sobre estar indo conhecer seu ator menos favorito do que o frio que açoitava a tintura negra de seu carro lustroso e, no momento, encharcado.

━ Acredite, você não é a primeira a dizer isso e tenho certeza que não será a última. ━ Suspirou; um suspiro meio entrecortado para tentar se recuperar do recente riso. A observou de relance por alguns segundos antes de voltar a falar: ━ Mas, para rebater a sua descrença, respondo que posso ser versátil quando quero ou quando alguma obra literária desperta meu 'eu' devorador de livros.

Aquilo parecia ser novo e intrigante para um ser humanamente imortal, como ele de fato é aos olhos dela. Isabella inclinou a cabeça para o lado e repuxou os lábios, o observando. Ele parecia muito confortável dirigindo e não tinha nenhum receio de estar naquele carro com uma mulher que conheceu faz 5 dias e só teve dois momentos de conversa — descartando aquela que estavam tendo agora.

━ Sinceramente, prefiro o Hobert Gadling compulsivo e incurável romancista, ━ Ele lançou um olhar de "sério mesmo?!" com as sobrancelhas arqueadas. ━ porém, posso abrir uma brecha para esse Hobert Gadling das trevas.

━ NooOoOossa! ━ Destoou um pouco; naquele momento Isabella soube que ele seria um péssimo cantor e a careta que ela fez demonstrou muito bem essa sua opinião. ━ Me sinto muito grato e sortudo. ━ Rolou os olhos, brincalhão. ━ Obrigado.

Isabella abriu o mais lindo sorriso quando quase cantarolou: ━ De nada.

Eles mergulharam num silêncio no qual de plano de fundo tinham trovões, relâmpagos, e gotas grossas de uma água trincando de fria. Isabella virou o rosto — movimento ainda de robô — para a janela e observou a paisagem de prédios irem se dispersando para casas cada vez menores até darem lugar à árvores e mato aparado, até que depois de um tempo começou a ser alto em meio às raízes que se aprofundavam na terra molhada. As folhas eram loucamente agitadas, os galhos mais fracos batiam uns nos outros ou quebravam, o mato estava em polvorosa, o céu era um cinza-escuro em algumas partes e em outras o mais profundo breu, e o vento forte açoitava tudo: desde os galhos abarrotados de folhas às gotas da chuva que despencava.

Não, de fato o cenário não era o mais bonito e aconchegante; era um pesadelo para quem não tinha nenhum tipo de abrigo, mas para Isabella era mais um problema mental. Conseguia facilmente lembrar do ar frio e sujo de partículas de poeira no ar, da falta de luz, e do silêncio que a deixava tanto incomodada como com raiva, inquieta, e insatisfeita. Quando presa, só pensava no que faria quando saísse — sua mente estava em Davi na maioria das vezes — mas agora que finalmente conseguiu se libertar de seu cárcere, sua mente em tempos nublados e cinzentos a fazia relembrar esses anos tortuosos.

Quando matou a primeira pessoa — não! Sykes não foi a primeira pessoa que ela matou, foi seu tio. Foi quando o atirou contra a parede e quebrou uma de suas costelas — que entortou e perfurou o coração frágil de ser humano normal. Mas os dois casos tinham algo em comum: o medo mesclado com desespero. No fundo, estava com medo de nunca sair; no fundo, estava desesperada para sair.

━ Gosta de verdades nuas e cruas? ━ Indagou Hobert, a fazendo sair de seu transe de pavor que havia feito com que seu sangue escorregasse para longe de seu rosto a deixando pálida com os olhos atormentados.

━ O que?

Ele abriu um meio sorriso reconfortante quando ela virou o rosto para ele. Isabella tocou sua alma e sentiu ali a esperança e vida vibrante que Hobert guardava em seu interior, então ela respirou fundo e usou como âncora para afastar os devaneios em forma de pesadelos traumáticos enraizados.

━ Bom, a verdade pode ser dita de várias formas; alguns preferem serem grossos e rudes, outros preferem omitir partes e contar a meia-verdade, e tem aqueles que simplesmente tentam contar a verdade mas de um jeito mais gentil e doce para que a compreensão não cause um escândalo ou feridas profundas, dependendo dos casos. ━ Mordeu o lábio, pensando direito no que falar. ━ A verdade nua e crua é quando você diz literalmente a verdade, sem ser grosso, mas também não ser tão doce ou gentil demais. Nunca omitir partes, apenas resumir sem inventar ou esconder ou ter vergonha por mais pesada que a verdade for.

━ E qual é a sua verdade nua e crua, senhor Gadling? ━ Encostou a cabeça no encosto do banco idealizado para escorar a cabeça, ainda o assistindo dirigir e sentindo sua esperança.

A voz dela soou tão calma e despreocupada que ele soltou uma lufada quente de ar pelos lábios entreabertos. Se sentia estranhamente bem em falar de qualquer coisa com ela. Muito confortável.

━ Estou apaixonado por uma mulher que não me ama. ━ Pausou, para comprimir momentaneamente os lábios um no outro. ━ Ela não sente o mesmo por mim, tem um amor cego por outro homem que, se eu não estiver completamente criando uma fanfic na minha cabeça, é abusivo, possessivo, agressivo, ciumento, e podre de rico. ━ Ele ri, mas não havia graça no timbre. ━ Mas ela sempre passa o pano para as besteiras que ele faz. ━ Olhou para ela; um olhar pela primeira vez triste. Seu tom foi baixo quando falou: ━ Besteiras essas que não deveriam ter perdão.

Então voltou a olhar para frente. O peito de Isabella apertou e de repente se viu refletindo sobre como funcionava o emocional e a mentalidade dessa mulher. O que a fazia ainda querer estar com um homem que não a trata como realmente merece — com carinho, fidelidade, amor, e esmero —, e o porquê "passar pano" para todas essas besteiras que, pode ser que na visão dela, parecem deslizes sem importância quando na verdade são defeitos catastróficos.

Isabella queria conversar sobre isso, saber um pouco mais, porém supôs que Hobert não queria se aprofundar muito naquele assunto. Então umedeceu os lábios e pensou em algo. Mas ela era péssima em dar conforto em meio a "verdade nua e crua". E somente agora podia perceber — ou nem tanto. Talvez ela pensasse que por ele estar sendo tão aberto com ela, então ela pudesse ser assim também com ele.

Qualquer deslize era só apagar a memória.

━ Muito bem, então. ━ Murmurou pensativa. ━ Verdade nua e crua..... ━ Ergueu os olhos para o teto forrado e soltou o ar de vagar. ━ Já tentei tirar a minha própria vida diversas vezes.

Foi breve, mas o suficiente para Hobert olhar de soslaio para ela e a palavra "psicólogo" brilhar em vermelho néon em sua mente.

━ Em uma delas, me atirei do alto de um penhasco. ━ Começou a recordar a cena, como se fosse um flashback de um filme de drama. ━ Ainda consigo sentir exatamente como era a sensação de desespero e desolação, de desesperança e depressão. À noite, quando estou sozinha e com muito tempo para pensar, consigo sentir o vento batendo nas minhas costas enquanto despenco rumo a escuridão; consigo sentir como foi cada osso se chocar contra as rochas, o som deles se partindo, o cheiro metálico de sangue começando a ficar forte, e da presença dos tubarões sendo atraídos pelo meu próprio sangue. ━ Balançou a cabeça. ━ Acho que eles pensaram que eu era uma delícia. Um belo banquete que nunca foi banqueteado de verdade. ━ Abaixou os olhos e rosto para as coxas juntas.

Hobert ficou em silêncio por muito tempo absorvendo tudo; diante disso não sabia o que falar porque nunca tentou tirar a própria vida — até porque ele sabia que se atirar de um penhasco ou levar um tiro não adiantaria de nada — mas ainda assim nunca lhe passou pela mente uma ideia dessas como uma hipótese a ser realizada na prática.

Mas a ideia da Morte e de ser o "autor" da morte de alguém com uma alma valiosa fez com que memórias jorrassem e sua garganta brevemente se fechasse.

━ Eu matei minha filha. ━ Soltou o ar, deixando os ombros caírem. Isabella virou um pouco a cabeça, sua atenção havia sido 100% atraída. ━ Foi uma doença, na verdade, mas o culpado fui eu. Me meti com pessoas perigosas, ela ainda era um bebê de colo quando tive que sair correndo de casa, fugindo no meio de uma tempestade como essa, mas à noite. ━ Seus olhos desfocaram por milésimos de segundos. ━ Ela pegou pneumonia e.... pouquíssimos dias depois.... ━ Então se calou.

Isabella assentiu, sabia que ele não precisava prosseguir porque tinha certeza de que ficaria mais sensível do que já aparentava estar só por tocar nesse assunto deveras delicado. Era claro que apesar de sua alegria de viver e emoção, ele nutria certa culpa por esse ocorrido e que no início essa culpa o corroeu e quase o destruiu, mas ali estava ele, firme e forte com as mãos no volante e piscando os olhos para afastar as lágrimas dos olhos.

━ Eu... ━ Limpou a garganta. ━ Eu já fiz amizade com um lobo muito esperto e coloquei o nome dele de Banana, apesar de ser cinza e de temperamento duvidoso. ━ Deu de ombros.

Hobert riu, os olhos inevitavelmente lacrimejando, mas não era de alegria.

━ Um lobo? Com nome de Banana?

Isabella concordou.

━ Ele era diferente, ao invés de roubar os poucos animais que eu tinha, roubava minhas bananas. Então o apelidei assim até o dia que ele morreu por causas naturais, nada de flechada ou tiros. Cuidei dele desde filhote até a velhice e ele me protegeu muito bem. ━ Arregalou minimamente os olhos e os estreitou de leve. ━ Expressava seu carinho com mordidas amorosas, sabe.

Ele balançou a cabeça, ainda rindo e assimilando essa informação, quando uma lágrima grossa porém solitária deslizou para fora de seu olho esquerdo e escorreu rápida e veloz pela maçã corada da bochecha bronzeada. Depois dessa, mais algumas vieram até que seu riso foi sendo abafado e, aos poucos, sumindo.

Sentindo, agora, sua dor, Isabella se sentiu tocada e pousou a mão no ombro dele, inclinando a cabeça para frente o suficiente para que ele conseguisse vê-la ao menos um pouco — já que focava na estrada.

━ Tenho certeza que esse mundo perverso não merecia ela, Hob. ━ Acariciou sua pele por cima do tecido do sobretudo castanho claro e da camisa branca com listras fininhas e pretas que ele vestia.

Hobert apertou as pálpebras, assentindo com a cabeça, e Isabella tomou frente no comando do carro; embora seja as mãos dele que estivessem no volante, quem estava mesmo conduzindo e controlando o carro sem nem mover um único dedo era ela.

━ Sabe... ━ Umedeceu os lábios e soltou um riso soprado. ━ É a primeira vez que você me chama de Hob.

Ouvir pela primeira vez o som da risada dela naquela manhã turbulenta e emotiva o fez se sentir menos mal; seu coração sacolejou e aquiesceu lentamente como se estivesse sendo preenchido pela primavera e suas belíssimas flores e cores.

Nada mais precisava ser dito. Hob ainda precisou de um tempo para focar na estrada e nesse momento Isabella foi dando aos poucos o controle do automóvel para ele. Ficou um silêncio bom, nada constrangedor, mas ainda assim havia aquele peso que só Hob sentia que deveria segurar e aquele incômodo claustrofóbico que só Isabella sabia que tinha que ser obrigada a suportar.

Mas no final, ela tinha um amigo; e no momento ele era a âncora dela e ela era a presença de conforto que ele precisava.

Então tudo ficaria bem.

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