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 — Ser tão acolhida por levá-la a confundir o que sente quanto ao mestre. — Goenix esclareceu. — Alternar é para guardá-la disso.

— Entendo; é realmente um momento vulnerável.

— Bastante. Preciso ir, antes que o mestre chame! — riu, como se estivesse aprontando. — Cuide-se! Vença o desafio.

— Sobreviva ao seu! — Sigmund o ajudou a levantar.

Ambos seguiram ao salão principal e Goenix partiu.

Sigmund seguiu para a biblioteca e estudou até a refeição. Os monólogos foram muitos em meio aos estudos. Usar outro ponto de vista ajudou para o bom esclarecimento de tudo que lia.

Na refeição, todos se reuniram. Apesar de estável, Aldous guardou o silêncio para não ser rude ou hostil com os seus. Ao fim, permitiu o descanso a Sigmund e o acordou cedo para o treino.

Fitz os acompanhou e o aprimoramento dos cristais foi o objetivo. Era intensa a diferença entre as personalidades. Nada conduzido pelo mestre, agora no controle, era sutil ou suave; a natureza sádica não era apenas latente, ele a vivia com prazer!

— Profasis, Moderato! — disse Aldous em meio ao treinamento.

Fitz aumentou a velocidade do combate. Não o suficiente para ferir, mas a incidência de dor aumentou, exigindo maior concentração. Usar os cristais era cansativo o que levou Aldous a encerrar o treino ao observar extensos sinais de fadiga no menino.

— Dou-lhe misericórdia, criança. Descanse!

Sigmund assentiu, deitou ali mesmo, exausto.

Aldous e Fitz saíram e o silêncio adormeceu o menino rápido.

***

— Herdeiro... — A voz de Latisha despertou Sigmund.

O cheiro de comida fez seu estômago agitar-se.

— Himeros!? — Sigmund sentou, estranhando.

Latisha estava ajoelhada próxima a ele e a refeição, responsável por agitar seu estômago, estava sobre uma bandeja ao lado dela.

— Está bem? — indagou com olhar curioso.

— Sim. O que houve?

— Não sei. Trouxe sua refeição. O mestre deixou. — Ela sorriu.

— Obrigado. — Sigmund tornou a estranhar o cuidado.

— Não está envenenada, não se preocupe!

— Jamais pensaria que me envenenaria...

— Que bom que sabe! Hibris e Ftisis te envenenariam... — riu. — Talvez Epifron... mas com ele é fácil saber, se observá-lo agitado, pode ter certeza que ele está pensando nesse tipo de brincadeira.

— Envenenar alguém é brincadeira!?

— Nem sempre ele sabe o limite... mas, se um dia te envenenar em uma brincadeira, ele ajudará, é claro, após rir bastante.

— Nossa! Creio que, de todos, Epifron é o mais louco!

— Concordo um pouco. Como está? — arguiu, observando-o.

— Bem. Foi um forte dispêndio de energia, mas nada de mais.

— Sente alguma dor? Teve vertigens?

— Não, por que teria?

— Há um tempo não crio máscaras... então... me preocupo.

Hm... Estou bem, Himeros. Obrigado pela preocupação.

— Ótimo, agora coma! — Latisha sorriu, deitou de barriga para baixo, apoiando a cabeça nas mãos e olhando-o.

Sigmund começou a comer. Incomodou-se com ela olhando-o.

— Se trouxesse algo para si, não ficaria encarando — reclamou.

— Já estou comendo... — sorriu, mordiscando o lábio. — O prazer da sua saciedade é saboroso... — corou, gemendo baixo.

— É exótica essa condição, não!?

— Um pouco. Tem bons momentos e maus momentos...

— Que sabor tem?

— Doce... levemente cítrico. Um pouco gelado, mas não ruim.

— Li nos relatórios que algumas tinham certa predileção. Isto causava uma avidez que propiciava o descontrole. Vive algo parecido?

— Não por predileção, mas o controle não gosta de mim. Quando quebramos, a fome agiu como válvula de escape. Então, sempre que alguém era atraído pelo perfume, não conseguia me conter, o instinto me fazia comer cada gota de sua energia vital.

— As facetas surgiram a partir disso?

— Diria que muito as causou — arfou, tragando coragem. — Era brutal. Lidar com sua violência, com minha violência pela fome. Tudo instabilizava... então, para fugir deles, da fome, começamos a nascer. Conforme nascíamos, mais ela nos tocava. Impossível fugir!

— Vi suas cicatrizes... é lastimável! — compadeceu-se.

— Sobrevivemos! — sorriu, timidamente. — O mestre cuidou das físicas e vem cuidando das emocionais, psicológicas, espirituais, com o passar dos anos. Tenho paz em meio aos meus machucados.

— Quando dizem que você é forte, não mentem! — riu.

— Nem forte, nem frágil. Sou suficiente — disse, lasciva.

Para não estimulá-la, Sigmund silenciou e voltou a comer. Conseguiu suportar a incômoda sensação de tê-la encarando-o.

— Cuide de si! — Latisha disse, tomando a louça.

— Obrigado. Preciso de um banho, me sinto amassado.

— Se quiser, eu amasso mais um pouco no banho...

O menino meneou a cabeça, rindo; mas saiu, ignorando-a.

— Seu mau! — brincou, vindo logo atrás.

Após seu asseio, Sigmund seguiu ao salão.

Aldous estava à mesa, observando o local, atipicamente vazio.

— Mestre — cumprimentou o menino —, está tudo bem?

— Sim, criança. Como estás?

— Bem... o salão vazio é estranho!

— Concordo que a horda faz falta... estão trabalhando!

Sigmund aproximou-se.

Algumas manchas brancas passeavam no chão abaixo de Aldous.

— Serviço grande?

— Pequeno, mas complexo. Dado o pedido dela, não fui.

— Treinaremos?

— Após o retorno da horda. Por ora, preciso observá-los.

— Estudarei. — Sigmund o cumprimentou e foi à biblioteca.

Latisha seguiu mimando-o, servindo-o vinho e algo para comer. Apesar de ser incapaz de conter a lascívia, ela ainda deixou claro, abaixo de seu predatório olhar, que o cuidado era fraternal.

A refeição deu-se, atipicamente, com a ausência da maioria da horda, com exceção de Amos e Irvin. A preocupação tirou o apetite de todos, mas ainda assim, Aldous impôs que comessem, mesmo pouco.

Sigmund voltou a estudar e, no fim do dia, quando todos chegaram, Aldous, Sigmund e Amos foram para o treino.

— Onde estamos, meu pai? — consultou Amos.

— Marcial. Moderato.

— Sim, senhor.

Amos suspirou e iniciou, levemente ligeiro. Usou só uma das mãos, mantendo seu tin whistle na outra, seguro contra seu tórax.

Havia um padrão na valsa aplicada por Amos e Fitz no combate e Sigmund finalmente notou. Isso o permitiu desviar seu foco de concentração aos cristais após criar o próprio padrão para a esquiva.

— Anesiquia, Allegro!

Amos assentiu e impôs mais velocidade ao combate. Num primeiro momento, Sigmund atrapalhou-se, mas se adaptou. O treinamento arrastou-se por dias, interrompido por Chase.

— Precisa banhar-se, criança. Epidotes chegará e sairão! — disse Aldous, sinalizando o fim do treino com o cessar das notas na lira.

— Sair? — indagou Sigmund, confuso.

"Eu irei. Você descansará!", disse seu revoltado eu.

— Ajudarei com o traje, herdeiro. Sou a escolta! — Chase sorriu.

— Obrigado, eu acho! — riu da própria confusão.

Sigmund cumprimentou Amos e Aldous para sair.

No banho, a porcelana quebrou. Ele se banhou com calma, tentando manter a ordem em meio ao insano ódio que permeava sua mente, alimentado meramente pela ideia de ver Ketu.

Enquanto o menino se banhava, Chase destacou um quíton sóbrio e formal — que se assemelhava a um manto renascentista; uma sandália resistente, proposta para andar em lugares florestados.

O lírio de Macária sobre o Zeta num broche identificava o menino como sétimo sacerdote, usado para fins políticos, por ora.

O púrpuro olhar estava tocado pela Loucura ao fim do banho.

— Herdeiro. Que agressividade! — brincou, gargalhando.

Estou bem! — respirou fundo, convencendo-se, ou tentando.

— Ajudo com o cabelo.

Obrigado, Epifron!

— Se não puder, me avisa e voltamos. Não distribua selvageria... nem se deixe nublar. — Chase disse. — Basta sinalizar e partimos.

Sigmund assentiu, com um tímido sorriso; sentou à cama e Chase cuidou de seu cabelo como um irmão mais velho.

— Pronto para casar! — brincou ao terminar.

No salão principal, Ianos conversava com Aldous.

— Meu pai. Epidotes. — Chase cumprimentou.

— Um salão de meditação em Popa foi destacado para chegarmos, isto nos poupará de subir a montanha — disse Ianos. — Cuidarei de meus sobrinhos, não se preocupe! — sorriu para Aldous.

— Qualquer negligência com minhas crianças, tem suas consequências... é natural! — Aldous riu de canto de boca.

Ianos riu, o cumprimentou e os três seguiram a Popa.

***

Chegaram a um salão luxuoso vazio; motivos budistas dourados tornavam o lugar bem claro, incomodando a visão de Sigmund.

Precisarei vê-lo? — O menino indagou, desejando receber resposta negativa com todas as suas forças.

— Sim. Ele está presente, apesar de preso.

Sigmund engoliu seco e uma negra lágrima manchou seu rosto.

O local era belo, verde e adornado com a maior manifestação de diversidade cultural birmanesa. Estava vazio e alguns poucos, trajando sanghatis, permaneciam parados, responsáveis pela guarda.

Sigmund respirou fundo.

Ianos cumprimentou todos por onde passou. Com passos lentos, Sigmund se combateu e conseguiu seguir, sem olhar para os lados, muito concentrado em manter sua calma e sanidade.

Homens e mulheres trajando sanghatis com detalhes em ouro caminhavam no interior; cumprimentavam sóbrios, mas quietos.

Foram três câmaras e chegaram ao destino onde trinta e sete grandes tronos estavam nas extremidades do luxuoso lugar.

Um homem estava sentado num trono com um leque na mão direita e a mão esquerda sobre as pernas; ele olhava Ketu, solene.

Um complexo selamento no centro era onde Ketu estava. Sentado de olhos fechados, com a mesma das memórias de Sigmund.

O ar faltou para Sigmund e dar um passo a frente foi impossível.

Ele parou, olhando na direção de Ketu, o vermelho passeou pelos seus olhos com maior intensidade e velocidade.

— Herdeiro! — Chase chamou, despertando Sigmund do exótico transe imposto a ele, não somente pelo ódio, mas também pelo pavor.

Alguns dos outros, agora rapazes, que treinaram com ele também estavam no salão, sentados atrás do trono, guardados.

— Quer voltar? — perguntou Chase.

Consigo — disse com olhar marejado. — Basta não olhá-lo.

— Um passo por vez, então.

Sigmund assentiu, combateu o instinto que o mandava atacar ou correr, seguindo um passo por vez com Chase.

— Mintara! — Ianos cumprimentou o homem. — Trouxe o rapaz, Sigmund é o nome. Dada a necessidade de interromper seu treinamento, meu sobrinho Epifron Chase, veio como sua escolta.

— Bem-vindo de volta. Bem-vindos à Popa! — sorriu doce. — Visto a vontade de Mintara em Burma. Fico feliz em conhecê-los.

— O mínimo aumento na instabilidade me fará levá-lo, comunico agora. Agradecemos a hospitalidade. — Chase disse.

— Imagino que seja delicado. Ianos comunicou brevemente.

C-como posso ajudar? — Sigmund perguntou, impaciente.

— Conhece aquele homem? — perguntou, olhando para Ketu.

Sim — respondeu, abaixando a cabeça, contendo o inconsciente impulso de olhar na mesma direção que o homem.

— Preciso que me diga: quem é ele e de onde o conhece.

Ketu, grão-mestre de Aakash.

— Com isto, posso presumir que és nativo de Aakash?

Infelizmente, sim.

— Qual era tua relação com ele?

Eu era só uma criança... como eles! — disse Sigmund, olhando na direção dos outros. — Ele me prendeu, me calou... Por sua causa minha garganta arranha sempre que falo...

— Qual era a atribuição de tua família em Aakash?

Ranna estava sempre se envenenando... devo dizer suicídio?

— Mitridatismo?

Sim.

— Gostaria de se sentar?

Não, posso piorar se me sentir mais vulnerável que já estou.

— Refere-se ao estado particular brevemente explicado a mim?

— Possivelmente, senhor — disse Chase.

— Não objetivo ser invasivo; não se preocupe! Pode narrar quando e como ele o lesou? Poupe-se de aprofundar-se nos detalhes.

Sempre me torturaram. Sei que o único com entendimento era ele! Se sabia da minha condição, só me estressou... Quando perdi a batalha, ele me prendeu... fez outro... mas não parou... nunca parou!

— Confeccionou outro... — repetiu, franzindo o cenho, curioso.

Outro vinnana, me prendeu próximo a sankhara, abaixo de tantas mandalas que nem lembro o número dito pelo mestre!

O complexo selamento expandiu, soando como engrenagem enferrujada. Instintivamente, Sigmund deixou a supressão e olhou.

— Herdeiro — chamou Chase.

Perdão, Epifron!

Sigmund demorou para conseguir suprimir novamente.

Bodhi? — indagou o homem para Ianos.

— Sim, entretanto, não são virtudes.

— Compreendo. Há algo mais a adicionar na lista de abusos perpetrados por este homem contra ti, criança?

Não.

— Foi-me dito que uma criança de olhos púrpuros foi quem vitimou alguns dos que encontramos. Você é essa criança?

Sim e não, porém sim.

— Pode explicar-me a complexa resposta?

Não posso dizer que éramos donos de nós. A desistência me tocou. Quando alastrou ao outro, ensandecemos e matamos. Não só pela Loucura, mas por estamos sedentos pelo sangue de uma vítima.

— Pode me dizer quem?

Sigmund apontou para o, agora crescido, Tarendra que não negava ser irmão de Tarusa dada sua similaridade.

Irmão mais velho dele. Tarusa. Em algum momento, foi covarde conosco, sobre o manto da proteção e omissão dos aldeões.

O homem olhou na direção de Tarendra.

— Verdade, rapaz?

— Sim, senhor. Meu irmão envolveu-se num conflito. Após isso, ficou obcecado e nos convenceu, um finado e eu, a emboscarmos ele.

O ranger do selamento ecoou no salão.

Novas escrituras embaralharam-se tornando o globo maior.

— Há algo que deseja adicionar, criança?

Não. Posso ir? — pediu.

— Está livre para ir! — O homem sorriu. — Tenha uma ótima vida... há um rico e sábio caminho a frente, usufrua!

Sigmund cumprimentou ele e os antigos colegas de treino.

Ao virar-se e ver Ketu olhando-o e sorrindo, ele estremeceu, mas Chase o auxiliou, pegando-o pelo ombro e seguindo para fora.

Ianos seguiu logo atrás deles.

O que acontece com ele agora?

— Estamos percorrendo os lugares onde cometeu crimes. O complexo selamento guarda cada uma das infrações, sejam locais ou não. Ao fim, lidarei com a punição pessoalmente. — Ianos disse.

— Entendo...

— Foi forte, herdeiro... ótimo! — elogiou Chase.

Vamos para casa? — pediu Sigmund, olhando para Chase.

— Vamos. — Chase sorriu. — Podemos partir daqui, Epidotes?

— Podem. — Ianos assentiu, gentil. — Obrigado pela ajuda!

— Maung Sigmund! — Ouviram uma voz animada chamar.

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