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— O amor por sua mãe era storge, um amor pronto, imposto por um elo biológico. Há um raio de storge em meu amor por Pseudos.
— Eram irmãos da mesma mãe ou pai!?
— Biologicamente não, mas Profasis e Pseudos carregam esta proximidade e isto reflete-se em nossa excelente relação!
— Interessante...
— Existe agápe, o amor incondicional, contrasta com philos, não exige, não pede, apenas doa. É como o que manutenimos com a mãe divina, a mãe carnal, o pai Algos... uns com os outros na horda.
— Incondicional é uma palavra forte...
— Agápe é uma palavra forte!
Ambos assentiram, tomando seu vinho.
— Philia é o amor desapaixonado. Desconhece eros, o romântico, luxurioso, que tem como traço a apreciação carnal, a independer de sexual ou não. Amor entre amigos, irmãos do coração, é philia.
— É possível que uma relação carregue mais de um destes?
— Sim. Almas são particulares, têm uma identificação única, como um livro e suas informações. A criatura Amor também e, em suas viagens pelos corações, pulsantes nas raças, ganhou identidade ao ser alimentada por diferentes combustíveis, apesar de não mudar.
— Muita filosofia, não!?
— O que é vida, senão filosofia!? Milhares! — sorriu. — Há pragma, o amor maduro, conhece eros, mas independe. Pragma é como agápe, apesar de ser condicional: é necessária maturidade. Como o pai e a mãe. Um amor longínquo que vence o tempo.
— Também parece agápe...
— Também é! Falamos de ludus daqui há alguns meses... Xênia é o amor que cedemos com a receptividade, a hospitalidade; parecida com philos, porém, como o próprio nome evidencia, com xénos.
— Desconhecidos!?
— Sim. Por último, temos mania! O amor insano, a obsessão... não há muito o que dizer sobre... Mania é autoexplicativo.
— Fascinante! Mania, storge, ludus, agápe, philos, eros, philia, filautia, xênia e pragma... — Contou nos dedos. — Dez! — concluiu, tirando risadas de Fitz. — Não é difícil? Sei lá, não confunde saber de tantos; ou torna o amor inconstante; ou a forma de amar superficial?
— O amor é inconstante. Assim como novas informações são inscritas em nós a todo o momento, em relações também. É normal o ser Amor mudar, adquirir ou perder características. Basta ser amor para não ser superficial. Não há superficialidade no amor ou no ódio.
— Fascinante! Você tem um ponto!
— Amor e ódio mudam tudo, consertam e destroem. Concertam e desconcertam! Conhecer seu poder é o mínimo exigido de nós. Observar a si e ao outro em busca de seu equilíbrio é cuidar do todo!
— Entendo...
— Crimes passionais têm penas distintas, a depender da face do amor ou ódio. Entendemos a psiquê do transgressor para puni-lo.
— Isto soa perigoso!
Fitz riu.
— Concordo. Cuide da boa filautia! Não se deixe prejulgar. Nem se torne o louco estereotipado! Essa forma pouco bela de se enxergar, o afogará em trevas e, uma vez imerso, é difícil emergir.
— Pensar no amor e suas faces é o suficiente para você lidar?
— Não... sentir o amor e suas faces me é suficiente, manifestá-lo em suas diferentes formas me é suficiente... sê-lo é suficiente!
— Obrigado! — Sigmund sorriu, cumprimentando Fitz. — Sempre terei algo para refletir — afirmou, reflexivo.
Fitz sorriu, recostou sua cabeça e voltou a tocar, vez ou outra, parando para beber seu vinho e a noite passou com tranquilidade.
O único trabalho de Fiz foi com uma alma e ele nem sequer levantou, uma aguda nota tocou a alma e seu grito ecoou junto a canção, que ele tornou a tocar, sem nem esboçar uma reação.
Chase foi o primeiro a chegar, se espreguiçando bastante.
— Bom dia, herdeiro! Acordado cedo!?
— Por que se estica tanto se nem dormiu!? — Fitz riu.
— Estava me vigiando, Profasis!? — arguiu, franzindo o cenho.
Fitz riu, mas silenciou-se.
— Não dormi... estava sem sono... então acompanhei Profasis. Foi fascinante, ele me deu muito o que pensar — justificou Sigmund.
— Profasis é assim, esquisito. O pai está bem.
— Macária é boa! — bem-disse Fitz.
— Muito! — Chase sentou próximo aos dois.
— E Pseudos, sei que ainda dorme, viu como ele está?
— Vi, ele está bem... só dormindo muito, deve acordar renovado!
— Que bom! — sorriu, pesaroso.
— Não fique tão fúnebre tão cedo, Profasis... por Macária!
— Vou deixá-lo cuidar do salão e vou ao quarto me banhar... assim é melhor, general!? — ironizou, levantando.
— Claro... me deu trabalho... vai, antes que eu me jogue daqui!
Fitz meneou a cabeça e os deixou. Sigmund permaneceu pensativo. Quando ouviram a horda na cozinha, ambos se juntaram.
Sigmund os cumprimentou e sentou, observando-os em silêncio, com a mente distante o suficiente para nem sequer ouvi-los.
Despertou da longa viagem quando Aldous sentou ao seu lado e pôs a taça de vinho cheia em sua frente.
— Bom dia, monge! Mais um pouco e a alma deixava o corpo...
— Desculpa, mestre... Não era a intenção que isto me ocorresse.
— Nunca é... até que acontece! Cuidado. — Aldous riu.
— É realmente possível!? — indagou, curioso.
— Não ocorre frequentemente, mas é possível... principalmente com aprendizes descuidados — alertou Aldous.
— Serei precavido. Perdão, mestre!
Ao fim da refeição, todos cumprimentaram e Aldous levantou.
— Vou ao Grande Cemitério, preciso que Althea me ajude com o trabalho que teremos... Epifron, cuida do monge, por favor!
— Sim, senhor, meu pai!
— Comporte-se, Epifron — pediu Aldous.
Chase riu, mas não respondeu, só o cumprimentou e ele partiu.
— Não, não pode! — Chase olhou Latisha, que se chateou.
— Podemos passear — sugeriu Chase. — Não pode surtar, claro!
— Estou bem, Epifron. Não surtarei, eu acho...
— Aguardarei na entrada, tome o tempo que precisar.
Sigmund foi ao banho, nem reparou a diferença no tamanho das roupas, afinal eram todas iguais. Cauteloso, ele foi ao salão principal.
Chase começou a caminhar quando ele chegou. O assunto nos degraus era a fictícia gestação de uma guardiã e um fictício desamor.
— Epifron, posso perguntar? — O menino quebrou o silêncio.
— Depende... se for sobre suicídio, está proibido... se for sobre homicídio, posso pensar... — Chase riu.
— Não, não é sobre morte de ninguém...
— Numa sociedade de mortos sempre será sobre morte!
Sigmund silenciou, intrigado e confuso com a afirmativa.
— Herdeiro, volte para a realidade e diga...
— Conversei com Profasis e ele dissertou sobre as faces do amor, penas diferentes... Pensei e conclui parecer efetivo, mas vocês diferem... então... queria entender como é para ti, como se ancora.
— Nossa, herdeiro! Você tem que parar de conversar com Profasis. De repente, sai esse tipo de coisa estranha — reclamou.
— Desculpa.
— Não falo sério! — repreendeu Chase, rindo. — Senta.
Eles sentaram em um dos degraus.
— É bom observar tudo para ter uma base de como sobreviver a loucura que é viver. Podemos tirar ótimas lições ao fazê-lo, mas nada nos preparará, se não quisermos, genuinamente, viver!
O semblante de Chase ficou sério, atípico para o cotidiano.
— Você é complexo! — O menino franziu o cenho, olhando-o.
Chase riu.
— Os épicos, contos, lendas, romances, narram um único evento ou experiência pelos olhos de outro, outra perspectiva. Parece rodeio, mas é só para concluir dizendo que ter amor e amados como âncora é valiosíssimo, mas não deve ser a principal ferramenta para lidar.
— Como você faz? Está sempre rindo. É intrigante, observá-lo cotidianamente. Parece impossível alguém manter-se como você!
— Pois, eu agradeço, herdeiro! — Chase riu, cumprimentando-o.
Sigmund riu da brincadeira, mas Chase suspirou, solene.
— Como Epifron, general, devo estar pronto para apoiar meu pai, para ser julgado e punido por deslizes que cometo ou que outros apontam. É muita responsabilidade! Sou como um regulador de Algos e é uma alcunha pesada! Já carrego a morte de um Algos.
Chase engoliu seco, suspirando, melancólico.
— Carregar essas lágrimas é tortuoso. O pai não suportou a queda do mestre Esmond. Fui julgado e penalizado após perder o maior exemplo que tinha; para preservar o mestre Algos, assumi, afinal, era importante para nosso bem-estar preservar seu luto.
Com lágrima nos olhos, terno, Chase sorriu, fitando o horizonte, desacreditando das próprias palavras, ou desejando ser mentira.
— Um concílio foi convocado e numa decisão injusta e cruel, me julgaram inapto para liderar a escadaria, enquanto o mestre Algos se recuperava. Com isso, me vi obrigado a levar o pai, insano, instável, para um campo de guerra. Disseram ser meu dever não deixá-lo cair... e brincaram, dizendo que eu já não era bom nesse trabalho!
As lágrimas levemente azuladas caíram dos olhos de Chase, ele as enxugou rapidamente, preocupado que tocassem alguém.
— Com isso, lidei com a pior das imagens que qualquer Epifron pode ter. Meu pai sofreu, como eu não sabia ser possível! — arfou. — Era impossível "manter de pé", alguém que não conseguiu levantar.
— Nossa! — intrigou-se Sigmund, franzindo o cenho.
— O inevitável aconteceu, é claro! Frente às barbáries do óbvio, me obrigaram a ver o pai ser julgado e punido; me julgaram e puniram! Pagamos, segundo a decisão de todos, e seguimos com todas as dificuldade e sequelas tentando ter uma "rotina normal".
Chase suspirou, tentando lidar com os soluços acumulados.
— Quando o pai era uma criança num corpo grande, eu devia ser seu pai e fiz o meu melhor, mas não pude protegê-lo dos desígnios dos outros. Apesar da tragicidade, não é só amor que mantém de pé.
Fitando o horizonte, Chase silenciou por alguns instantes. Relembrar tudo era doloroso, mas também motivo de orgulho.
— Fico de pé por precisar, não posso falhar. É dedicação e fé em Macária; Epifron que ilumina minh'alma; Algos que guarda meu pai. A fé em meu pai, que nunca me faltou, apesar da voz abafada ao se posicionar ao meu favor ou a favor dos irmãos. Lealdade é a chama que dá força à minha morte e me protege da minha vida.
— Como ri tanto, se tanto chora? — O menino perguntou, aflito.
— Por que levá-los lágrimas, se posso fazê-los sorrir? Por que enchê-los com aflição e angústia, se posso, ao menos uma vez, dá-los um motivo para viver? Que eu faça todo o dia... e vivam eternamente... Minhas lágrimas são pesadas e, de fardo, estamos cansados.
Sigmund observou os azuis olhos enlouquecidos de Zarina e sua negra pele, mas, fechando e reabrindo-os, tornou a ver Chase.
— Está bem, herdeiro? — Chase sorriu, amparando-o.
— Creio que não... podemos voltar? — sugeriu, confuso.
Chase assentiu, estendendo-o a mão e seguindo de volta.
— Por que azuis? — indagou Sigmund, olhando-o.
— O quê!?
— Os olhos... as lágrimas...
— Loucura. — Ele riu de canto de boca. — Acontece. Um lapso.
— Mas por que azul?
— Kuanos é a representação física da Loucura de Epifron... há alguns anos, escuro, negro... hoje, azul!
— Como assim? — indagou, curioso. — Azul-escuro?
— Não! — riu. — Até uma convenção social afirmar que a cor do céu era azul, poucos tiveram a oportunidade de lidar com o azul na natureza. Kuanos era a palavra para escuro, negro... mas já não o é. Diz-se que a sofisticação da sociedade invoca a necessidade de uma palavra para essa cor... algo muito curioso! Kuanos...
Sigmund abismou-se. Chase, ao chegar, sentou e recostou na parede, enquanto o aprendiz serviu-lhes água e sentou próximo.
— Pode fazer bem — sorriu.
Chase agradeceu, acenando com a cabeça e tomou da água.
— Mediante a uma história tão ruim vivida aqui nos degraus... Como consegue não ser rebelde, não sei!? Não tentar lutar contra...
— Tenho um dever. É comum ansiar por mudança. Tiraram as forças do pai e ele não pode, logo, não faço. Do que adiantaria buscar melhorar sacrificando o bem-estar dos meus? O que eu ganharia? Que bem faria? Que legado eu deixaria? O que eu ensinaria?
"Nada", concordou seu eu, em seu íntimo, deixando-o arrepiado.
— Ele concorda! — Sigmund riu, esfregando os braços.
Chase riu, terminando a água.
— E a pele escura e olhos claros!? O que vi?
— Não podemos conversar sobre isso ainda. Que tal estudar? Tenho um instrumento para fazer, então, sem combate até lá.
— O que houve com a bandura?
— Descansa e o morin khuur quebrou. Preciso produzir outro!
— Naquela sala não tem!? Tinha tantos...
— Tem, mas houve todo um dispêndio de energia e vida para produzi-los, não vou simplesmente quebrá-los num instante.
— Nossa! Gosta mesmo deles... — O menino riu.
— Hehehe, engraçadinho. Busque suas coisas de aumentar o cérebro e eu buscarei minhas coisas de aumentar o coração.
Sigmund intrigou-se. Buscou seu material de estudo, que diferia com adição de números e ciências, além do básico do grego, páli e algo identificado como sânscrito, após observar por um tempo.
Quando voltou, Chase trabalhava na caixa acústica de madeira.
— Sânscrito!? — indagou Sigmund, sentando próximo.
— Sim, seu idioma nativo e o sânscrito comunicam-se bem entre si, logo, depois da língua nativa e do grego, é a que aprenderá.
— Podem se comunicar com todos... por que aprender o idioma?
— Aprende-se muito de um povo com suas palavras. Precisa sempre produzir e, como não pode trabalhar, estudará. Apesar de falarmos com todos, não temos nenhum artifício para tocar num papel e lê-lo, logo isto ainda é feito da boa e velha forma, aprendendo.
— Posso começar com esta parte?
— Está fugindo dos números, herdeiro!? — Chase riu.
— Sim. — Sigmund riu, timidamente, virando o rosto.
Chase gargalhou.
— Deixo só hoje, não conta para o mestre.
Sigmund começou o estudo com a ajuda de Chase que, mesmo distante, ainda parou o que fazia para tirar todas as suas dúvidas.
Alguns eventos históricos estavam junto ao ensino dos idiomas, o que atiçou sua curiosidade e o manteve absorto por horas, sem sentir fome ou perceber quando Chase o dava uma caneca d'água.
Antes do jantar, Aldous chegou. Chase já terminara o corpo do instrumento e trabalhava no arco. Prostrou-se ao ver o guardião.
— Meu pai, sem ocorrências em casa. O herdeiro estudou após um passeio nos degraus. Trabalho com meu pequenino. — Acariciou o instrumento recém-nascido. — Pseudos e Profasis lidaram com as poucas pendências, Himeros e Hibris estão bem... Hormes, Potos, Ftisis e Anesiquia lidaram com as almas do dia. Como o senhor está?
— Bem, Epifron. — Aldous o escusou, sorrindo.
— Como foi? Problemas? — indagou, voltando a se ater ao arco.
— Nenhum... ela ajudará, claro! Fiquei detido durante a sesta, mas foi bom. Senti problemas, o que houve? Não disse no relatório.
— Nada, meu pai. Uma conversa amarga apenas... Passou!
— Ótimo, me banharei e comemos. Presumo que não comeram.
— Não é tão necessário comer, sabe!? — Chase riu.
Aldous seguiu ao quarto, meneando a cabeça.
— Ouviu o homem, herdeiro. Precisamos comer! Banho.
Na refeição, Aldous estava reflexivo, absorto em pensamentos.
— Algos está pensando tanto que fico com medo e excitada — disse Latisha ao fim da refeição, olhando-o de canto do olho.
— Dormiremos! — disse Laura, abraçando-a e indo ao quarto.
— Imagino que não dormirá, deseja algo? — ofereceu Chase.
— Tomarei vinho, já terminou o arco?
— Não, senhor. Terminarei agora e preciso afiná-lo.
— Eu o acompanho. Descanse, herdeiro! — dispensou Chase.
O menino apenas assentiu e seguiu para se recolher.
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