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— Já está sentindo a Loucura, monge? Que rápido — criticou. — Pense! Não é um animal selvagem. Use o treinamento ascético.
— Não me lembro! — Sigmund engoliu seco, levantando.
— Três segundos para a recuperação — disse Aldous, olhando-o.
Sigmund correu ofensivo, mantendo o exercício da respiração, sem sucesso dada a falta de prática. Mesmo com dificuldade, estendeu a ofensiva por meia hora enquanto o mestre defendia.
Quando a falta de ar tornou-se insuportável, Sigmund afastou-se, tentando lidar com o sufocamento que o fazia lacrimejar.
— Deixe-me ajudar, monge! — Aldous sorriu, sarcástico.
Desconfiado, Sigmund apenas o observou chegar. O mestre parou na sua frente e tocou sua testa com o indicador, descarregando um pouco de energia, que percorreu seu sistema nervoso.
Sigmund nem gritou! A intensidade com a qual a dor passeou por seu corpo o fez colapsar e ele caiu desacordado. Aldous o observou, deu as costas e sentou à pequena mesa.
— Himeros! — O mestre invocou.
— Meu pai! — surgiu, prostrada à sua frente. — Não está bem?
— Estou, agradeço a preocupação. Preciso que me ajude. Em dez horas, gostaria que servisse uma refeição para o herdeiro, tudo bem?
— Ele já caiu? — pasmou.
— Antes da Loucura seguir se alastrando, o apaguei.
— Quer que eu lhe sirva vinho?
— Seria fortuito! — Sorriu, gesticulando em agradecimento.
Ela o serviu vinho e saiu. A ressaca na taça o levou à outra taça. Quando se acalmou, ele tomou a lira, dedilhou, apreciando.
Encerrou a canção com um tom grave, como o emanado pelo sol e deu início a outra canção, investindo parte de sua energia, o que a fez ecoar pela área de treinamento e corredor afora.
Um tom púrpuro passeou pelas inscrições na parede.
Sigmund acordou com um intenso grito, ao sentir-se muitas vezes perfurado por agulhas trazidas pela canção.
Aldous sorriu, arrepiou-se, não somente com a dor do menino, mas a de todos, que ele podia sentir e ouvir com perfeição.
Após respirar fundo, cessou a canção.
— Dormiu muito! Trabalhemos? — Aldous pôs a taça na mesa.
— O que foi isso? — perguntou o menino, tossindo, trêmulo.
— Uma das minhas muitas formas de proporcionar dor. — Ele deu um sádico sorriso. — Ainda temos treinamento. Levanta!
— Pareço embriagado — reclamou com a visão levemente turva.
— Eu sei! Agora que fica bom.
Sigmund ficou confuso, correu para atacar Aldous que não defendeu. Atingindo-o, em resposta a dor, Aldous arrepiou, sorrindo.
Uma sensação de prazer pulsou nas veias de Sigmund que, inundado por uma sede descontrolada, seguiu atacando.
Quando o controle começou a esvair-se, Aldous tomou uma postura defensiva e, após longas sete horas, com olhos inundados por Loucura, o corpo de Sigmund simplesmente parou, extenuado.
Aldous suspirou, voltou à mesa e serviu sua taça. Respirava devagar, bebendo o vinho e apreciando o silêncio.
A moça latina chegou com refeições para ambos.
— Obrigado, Himeros!
— Disponha, pai. Nossos visitantes estão incomodados, logo pedimos gentilmente que se recluíssem — reportou, descontente.
— Onde está Pseudos?
— Estava no Salão Principal, devo chamá-lo?
— Não, queria saber o quão longe estava deles. Ele está só?
— Profasis não o deixa só. Basta os rapazes passarem perto para ele se estressar. Ofereci conforto, mas está cansado — disse, triste.
Aldous bebeu, descontente, e foi até Sigmund. Despertou o menino, aplicando dor com sua lira. Novamente, os gritos soaram.
— Hora de comer, monge! — anunciou Aldous, voltando à mesa.
— Não sou um monge! Por que não entende isto?
— Claro que é? Como não é? — questionou Aldous, sentando.
— Odeio eles. Não me compare a uma forma de vida tão pífia.
— Belas palavras para exprimir amor! — ironizou Aldous.
— Provarei que não sou um deles.
— Não pode fugir, nasceu de um deles, é um deles. Aceite!
— Nada justifica repetir erros. Não sou como eles!
Aldous riu, olhando-o. Bastou olhar para a comida e o estômago de Sigmund roncou, inibindo a raiva e dando espaço à fome.
— Coma devagar, você ainda morre disto! — aconselhou Aldous.
Sigmund comeu, combatendo o instinto que o mandava comer rápido! Ao fim, Aldous buscou uma taça de vinho e uma d'água.
— Nossa! Usam isto para tudo — reclamou. — Muito frágil!
— Temos uma relação de amor e ódio com taças. Nem por isso quebramos. Os irmãos na Alemanha produzem sob medida para nós.
— E onde fica essa Alemanha? — indagou, bebendo a água.
— Se meu senso geográfico não falha, sete mil oitocentos e vinte quilômetros separam Alemanha de Burma. — O mestre observou seu cansaço. — Ao fim da água, estudaremos. Lembra do treino?
— Pouco. Antes, o corpo agia só... agora, é mais confuso! A sensação estranha me impede de pensar, só vou! Às vezes nem quero.
— O nome disso é prazer. Sua cabecinha não consegue lidar, mas seu corpo já sabe como é... e gosta! — Aldous riu, saindo.
Sigmund bebeu sua água, lidando com suas feridas. Estava esgotado! Sendo difícil manter os olhos abertos dado o relaxamento da cura, logo, decidiu não beber vinho para não dormir.
Aldous voltou com livros, cadernos, canetas e tinteiros.
— Comportado, não dormiu! — elogiou, irônico, indo ao centro. — Sempre que dormir no estudo, será punido, temos um acordo?
"Tenho escolha?", o menino pensou.
Aldous era um sádico insano, mas também um bom mestre. Um momento de silêncio era sua ferramenta para testar a resiliência de Sigmund, que conseguiu ficar desperto por gostar de aprender.
Ao fim, Aldous pôs o material à mesa, bebeu vinho e voltou.
— Vamos à prática — anunciou —, me dê o seu melhor!
Embriagado de sono, o menino atacou Aldous, que o indagou sobre o estudo. Cansado, incapaz de lidar com multitarefas, ele errou muito e a cada erro, Aldous tirava uma agulha para lançar contra ele.
Quando as agulhas começaram a descarregar dolorosamente, o escarlate começou a tomar seu olhar, permitindo-o treinar por mais tempo... até o rubro tomar toda a íris e ele desmaiar de exaustão.
***
Aldous foi ao salão principal.
Fitz estava sentado, calmo, tocando seu contrabaixo, e um rapaz ruivo, nervoso e estressado, andava em círculos.
— Ainda nervosos? — perguntou Aldous, olhando o ruivo.
— Um pouco, meu pai... — respondeu Fitz.
— Pseudos! — chamou Aldous, caminhando até o ruivo.
Numa resposta automática à voz do superior, o ruivo curvou-se:
— Mestre Algos! — cumprimentou.
— Como estamos?
— Estressados, levemente irascíveis...
— O que houve, quer me contar? — perguntou Aldous, sentando.
— Nada, pai... deve ser a Loucura. Melhorarei, não se preocupe!
— Disse isso umas trinta vezes na última hora! — Fitz riu.
— Podemos conversar, onde está Epifron?
— No quarto — respondeu Fitz, levantando.
Eles seguiram ao grande e simples quarto. Fitz serviu o vinho.
— Epifron! — invocou Aldous, indo à sua cama.
— Mestre Algos! — cumprimentou Chase, chegando e olhando para os outros dois — Marcharemos para onde!?
— Ai, Chase! Por favor! Precisamos tirar este povo daqui antes que nosso estressadinho mate um deles — disse Aldous.
— Matarei um, pai! Não suporto estupidez, quiçá na minha casa!
— Byron, se acalma... as coisas estão difíceis para todos, se não quer dizer no que se meteu, ao menos, se acalme — pediu Fitz.
— Não houve briga, eu acho! Falaram em má hora. Não defendo, mas entendo. — Chase pegou sua taça e sentou, recostado na porta.
— Chamarei Althea. — O mestre disse. — Ela remove os resquícios da Loucura e tentamos falar com Alexa...
— Nossa! Quando ver — suspirou Chase — ficará chateada...
— Não quero vê-la — disse Byron, voltando a andar em círculos —, se ela ficar com aquele semblante chateado, mato um deles.
— Carregamos o fardo, juntos, e não matamos ninguém — sugeriu Fitz, descansando o contrabaixo na cama e sentando ao chão.
— Devagar! Ainda estou bem, Althea lida com vocês e, depois, fiquem longe da área de treinamento, se possível, do herdeiro!
— As coisas com ele são ruins assim? — questionou Chase.
— Não tão ruins, mas os primeiros dias são regados a Loucura, vocês sabem! Não há como acautelar-se, então para evitar incidente, é assim que faremos. Alguma objeção? — perguntou Aldous.
— Se a mãe ficar chateada, eu cego o Byron. — Sugeriu Chase, rindo. — Assim tudo dá certo, ninguém morre! — gargalhou.
— Claro... me cegar é a melhor solução!? — reclamou Byron.
— Tem alguma outra solução, gênio do mal!? — ironizou Chase.
— Tudo bem, pode me cegar... Momentâneo, não é!?
— Claro, Byron! Se tiro sua visão, você andará por aí como Alexa e ninguém merece — gargalhou Chase, tirando risadas dos outros.
— O herdeiro acabou de dormir... temos seis horas! Byron, reúna todos na cozinha. Fitz, chame Irvin e se junte a Byron. Chase, ocupe os inquilinos. Vou ao banho, talvez vá ao altar, mas a chamarei.
— Importante, não é, pai!? Vai que ela vê este monte de sangue do herdeiro em você... não faz bem para os negócios. — Chase riu.
Aldous dedilhou a lira, investindo energia para atingi-lo com dor. Chase gargalhou, apesar da dor lancinante. Os três rapazes saíram e Aldous banhou-se, realizou suas preces no altar, ao fim, ele suspirou e foi ao grande salão no templo.
***
Aldous foi à porta do quarto, vendo o salão vazio, mas antes de bater, Althea abriu. Ele cumprimentou, fitando seus olhos.
— Senhora! Perdoe-me atrapalhar seu sono.
— Não estava dormindo. Do que precisa? Está tudo bem?
— Vim pedir sua ajuda. Quero que cuide das crianças.
— Ajuda!? — riu, pondo a mão em sua testa. — Está bem?
— Não me faça repetir... — Ele riu, acanhado.
— Vamos agora!? — arguiu, entrando e começando a juntar insumos numa pequena bolsa de ráfia. — O quão ruim estão, Aldous?
— Pouco, eu acho... — mentiu, fugindo os olhos dela.
— Pouco!? — perguntou, parando e olhando-o. — Tem certeza?
— É complicado, perdão!
— Sétimo guardião, qual é a situação de sua horda?
— Senhora — hesitou. — O pior é Pseudos Byron. Himeros Latisha, parece calma, está afetada e afeta a gêmea, Hibris Laura. Epifron Chase está razoável, como eu, suporta! Profasis Fitz está bem, calmo, mas é uma qualidade de Profasis, não surpreende.
Com chateação no semblante, ele continuou:
— Pelo que senti, os outros: Ftisis May, Anesiquia Amos, Potos Aldric e Hormes Delano são os mais estáveis, possivelmente a distância ajudou. Calis Irvin está no plano vivo, logo, de todos, é o mais propenso a uma avaliação positiva de sua sanidade.
— Obrigada, guardião! Levarei o necessário para todos — disse Althea, arfando e beijando-o no rosto. — Deixe-me cuidar de vocês.
Aldous respirou fundo, a aguardou terminar e estendeu-lhe o braço. Althea tocou a flauta, "Estou saindo e volto logo!", disse a todos.
***
Na escadaria, os sacerdotes trabalhavam a mando de Chase.
— Reuni todos na cozinha. Os inquilinos trabalharão enquanto estamos ocupados — reportou Aldous.
— Inquilinos é tão feio, Aldous — reclamou Althea.
— É o que são, pagam sua estadia na minha casa com trabalho.
Todos cumprimentaram ambos conforme passavam. Na cozinha, a horda estava à mesa. Adentrando, Aldous tocou o portal da entrada e criou uma parede, fechando-o, anunciou:
— Privacidade, crianças. Trouxe Althea e ela cuidará de todos!
— Quem mentirá primeiro? — Ela riu, pondo o saco no balcão.
— Ninguém... — Chase riu. — Sério, gente, sem mentir!
— Você, rapazinho! — disse, tirando seu sorriso. — Como está?
— Eer... bem, mãe. — Chase respondeu, sem jeito. — Tenho tido pouca dificuldade... não se preocupa comigo. — Ele coçou a cabeça. — Byron tem estado mal, cuida dele primeiro.
— Vim cuidar de todos! Aldous, pode ferver água?
Althea tocou, investindo energia numa canção desafinada, atingindo-os com uma letargia, que beirava a extrema embriaguez. Ao fim, pegou os insumos e infundiu um chá inodoro.
Preocupada, caminhou pela mesa verificando-os, um a um.
A análise de Aldous fora pouco precisa. Apenas Irvin — típico irlandês jovem — estava pouco afetado; todos os outros estavam afetados a níveis perigosos.
Chase observando-a passando, encostou a cabeça no ombro de Byron e aplicou sua energia para nublar sua visão.
Althea foi incapaz de conter a tristeza em seu semblante, mas manteve o silêncio; voltou à chaleira e serviu uma xícara para todos.
— Ajuda — pediu, aproximando-se de Aldous —, preciso sentar.
Aldous a pegou na cintura, pondo-a sobre a bancada; riu, em silêncio. Althea acabou rindo do flerte despretensioso, suspirou, olhando todos, concentrou-se e tocou em oração, fechando os olhos.
Algumas lágrimas verteram de seus olhos, carregadas com a preocupação de vê-los sobre a corda bamba, prestes a cair. Os que consumiram o chá foram tomados por um forte sono. A Loucura acumulou-se em lágrimas negras, tingindo suas roupas e o chão.
Até que as lágrimas perdessem a cor, Althea tocou. Depois descansou a flauta ao seu lado e acariciou o rosto de Aldous.
— Perdão! — disse Aldous, pesaroso.
— Poderia ter me chamado antes — reclamou com a voz calma.
Ele silenciou, odiava ver seu olhar de reprovação, mas jamais estaria disposto a levá-la problemas constantemente.
— Descansem. Nem mais, nem menos. O que diz o necessário é seu corpo, respeitem! Ao menos esta vez — ordenou, firme. — Jamais os obrigarei a me chamar, mas, por favor, se cuidem hoje!
— Posso voltar ao plano vivo ao acordar? — pediu Irvin.
— Gostaria que descansasse um dia, mas se quiser, pode.
— Obrigado, minha mãe!
— Aldous, me ajuda a descer?
Ele a pegou na cintura para descê-la, parou com o rosto próximo ao dela, nariz com nariz, admirando seus olhos.
— Obrigado, senhora! — agradeceu.
— Sempre pode contar comigo, bobo — sorriu
Indo à mesa organizar a pequena desordem que fizera. Aldous foi à parede que erguera e a desfez, ordenando:
— Horda, dispensados. Descansem!
— Sim, mestre Algos! — cumprimentaram em uníssono, saindo.
— Horda de imprestáveis! — invocou Aldous.
Os rapazes do salão, surgiram, cumprimentando-o.
— Minha horda está descansando, logo, terão trabalho redobrado. Se sentirem-se incapazes de lidar, chamem e eu lido.
— Comunicamos Alexa e ela envia outros — sugeriu um rapaz.
— Coroar-lhe-ei o mais inteligente a pisar em minha casa — ironizou Aldous. — Dispensados... e não contatem Anaideia!
— Aldous, não seja mau! — pediu Althea, aproximando-se e pondo a mão em seu ombro. — Que tal deixá-los e beber uma taça?
— Depende... — Ele sorriu, virando-se para ela, mudando o semblante revoltado para uma feição mais dócil. — Só uma?
— Sim, só uma.
Ele assentiu, serviu as taças. Althea sentou, agradecendo-o.
— Vou... pleitear nossa liberdade quando as crianças acordarem. Juntarei todos na entrada para marcharmos, reivindicando nosso direito de sermos livres em nossa casa — disse Aldous, sério.
— Nossa, Aldous. Que exagero!
— Brincadeira! — gargalhou. — Realmente reunirei Epifron, Pseudos e Profasis para ter com Anaideia e pleitear nossa alta.
— Esta é a forma que Alexa entende de cuidar de vocês.
— Forma errada! Controladora! Medrosa! — reclamou, trincando os dentes. — Com o herdeiro, tenho argumentos, eles podem ser afetados dada a inconstância desta fase. Deve funcionar.
— Funcionou alguma vez?
— Tsc. Você está certa... mas, ainda tentaremos...
— Se estressará desnecessariamente, Aldous? — Ela riu.
— É o que posso fazer, mesmo sendo negado, tentarei.
— Juízo!
— Não se preocupe, senhora! Terei sabedoria. Se sabedoria faltar, terei silêncio — disse, solene. — Verá Anaideia ou eu a levo?
— Gostaria de ver Ianos antes de partir.
— Nossa! Fere meu coração... — Ele riu. — Trocado pelo monge do andar de cima... entendo a raiva de monges do herdeiro agora.
— Ai! — Ela suspirou. — Poderia levá-lo, mas não se comporta.
Aldous riu, foi até ela e a beijou na testa, abraçando-a forte.
— Cuide-se, Aldous... fico preocupada! — pediu, com um nó na garganta, deitando sua cabeça em seu peito.
— Estou sobrevivendo. Não pereci, nem perecerei! Confia em mim — pediu, arfando e soltando-a. — Vamos! Levo à porta.
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