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Com Sigmund no colo, Althea fechou o salão e serviu vinho.

— Há oito meses, Epidotes falou a inconstância de Ketu. Poucos sabiam haver civilização em Aakash — disse Agniprava, bebendo vinho. — Os irmãos de Burma sugeriram buscar os Nats em Popa.

A moça cruzou as pernas e falou:

— Saímos, parte à Popa, parte à Aakash. Os Nats deram um documento para ir à Aakash, avisando da natureza reclusa. Notamos a extensa proteção do lugar. O caminho dos mortos é caótico, logo, não usamos. Queríamos contatar, mas ninguém saiu da proteção.

— Os vegetais que a floresta não tem são plantados sobre o lago. Ir à floresta é desnecessário, mero luxo. As crianças vão mais que adultos ou jovens — disse Sigmund, tentando ajudar, desconfortável.

— Só observamos. Chegamos a ver o sétimo general, mas não o arguimos. Tudo houve... e estamos ajudando os Nats, lidando com os corpos. Não sabemos onde está Ketu e estamos tratando os vivos.

— Macária é boa! — Althea bem-disse.

— Erguemos algo entre Aakash e Popa, os Nats cuidam das buscas e nós cuidamos da saúde. Alguns terão sequelas, logo, levaremos ao Nepal para tratamento vitalício.

— Teve suicídio coletivo mesmo? — Sigmund indagou, curioso.

— Por Macária, suicídio coletivo!? — pasmou, aflita pela ideia.

— Ele cria que, ao verem sua terra maculada, seriam levados ao suicídio pelo líder — explicou Althea, recusando-se a aceitar tal ideia.

— Consideraremos... Os que não forem ao Nepal, vão à Popa. A vila e monastério estão sob os cuidados dos Nats. O perigo passou.

— Se Ketu ainda vive é perigoso! Ele matará todos e depois de novo... e de novo! — Sigmund suspirou, sentindo a letargia passar.

— Tem sido difícil lidar com Ketu? — perguntou Althea.

— Ele é escorregadio. Não sei o que o acomete, não é natural alguém como ele ser assim. Burma não está preparada, queremos cuidar de sua paz, já que são um dos poucos povos ainda ajuizados.

— Ficará conosco? — perguntou Althea, observando-a levantar.

— Sim, preciso ter com Epidotes, mãe. Quando foi à Mehdi, não esclareceu, então, se ele não puder falar, gostaríamos de ajuda.

— Contatarei Alexa e a comunico! Ao sair, deixe a porta aberta.

Agniprava a cumprimentou e saiu. Sigmund ficou no colo de Althea que retomou suas anotações. Logo, os rapazes voltaram.

— Não achamos nada — reportou Deke —, ainda estamos alerta!

— Obrigada, meus filhos. Perdoem sua mãe! Não aguardava a chegada de alguém do Nepal tão cedo. — Ela riu. — Vamos trabalhar?

Sigmund, buscando facilitar Althea, sentou em um dos sofás. Acabou cochilando e acordou com ela o pegando no colo e dizendo:

— Refeição... conseguirá comer sem voar no pescoço de Prava?

— Tentarei — respondeu, abraçando o pescoço de Althea.

Foram ao salão de jantar, onde a refeição já estava servida.

— Será que Samina encontrará Ava?

— Seria fortuito! — Althea sorriu. — Os primeiros já foram achados, agora é inevitável. Lembra se ela estava ferida?

— Não sei se a machucamos... é confuso! Não sei quando agi ou ele agiu. Ele estava irascível, intenso, e eu estava tomado de tristeza.

— Elevemos nossas orações por seu povo! — Althea sorriu, bem-dizendo todos os envolvidos no incidente Aakash em seu íntimo.

Durante a refeição, Sigmund não parou de olhar para Agniprava.

— Alexa virá com Ianos cedo. Descanse da viagem durante o dia — disse Althea para Agniprava, ao fim da refeição. — Descansarei agora, o pequeno Sigmund vem? — chamou, estendendo a mão.

Sigmund se apressou e, com Althea, foi ao quarto, se banhar.

— O que faz antes da sesta? — perguntou, observando-a.

— Dada a sacrossantidade é importante se concentrar para os olhos não se abrirem. Vou ao altar, agradeço pela manhã, faço minhas preces por toda vida que existe e acendo o incenso, iniciando a sesta aqui e em todos os templos espalhados mundo afora.

— Nossa! Eles não sabem!? Precisam que alguém avise.

— Claro que sabem. O que faço é abrir a porta para Macária, por seu doce perfume, caminhar pelos templos, nos trazendo sono, como um convite para nos juntarmos a ela em seu passeio. — Althea sorriu.

— É um hábito pouco estratégico, deve ser ruim em guerras — criticou Sigmund, sentando na cama.

— A depender da guerra, a sesta é ajustada. Dificilmente, não temos sesta. Macária nos é bálsamo diariamente. Sem a sesta, somos difíceis de lidar, dada a ausência de sua calma.

— Devem se tornar oponentes difíceis... — Ele riu.

Althea riu. Sigmund a observou ir ao altar, acendeu o incenso, apagou as velas e deitou. Velou o sono de Althea até o implacável sono o tomar. Ao levantar, Althea o acordou, beijando-o na testa.

— Boa tarde, pequeno Sigmund! Como foi a sesta?

— Foi bem. Vou ao quarto evitar a ascética e evitar problema!

— O que viveu na vila foi feito por um grupo, não julgue todos.

— Eles me tiraram tudo! A falsa complacência costurada em minha carne caiu. Não criarei planos auspiciosos de destruição, mas não lhes darei menos do que merecem.

— E o que crê que eles merecem?

— Meu eterno ódio.

Althea arfou, triste, beijou sua testa. Sigmund retribuiu, sorrindo, mas foi ao quarto, deixou a porta aberta e deitou-se.

Os pensamentos se acumulavam: votos de ódio... os olhos de Ava. Ordenar-se seria complexo. Pensando em Ava, saudade o invadia; pensando em Ketu, raiva bestial despertava. A busca por ordem em meio a tanta confusão, levaria tempo e seria difícil.

— Hora da refeição! — chamou Dieter, na porta do quarto.

Sigmund assustou-se, levantando em um pulo.

— Eu me julgava mais bonito! — Dieter gargalhou.

— Desculpa! Estava distraído. Obrigado por avisar.

Antes de pisar no salão de jantar, Sigmund suspirou. Sentou ao lado de Althea e ficou quieto, fitando a mesa. Durante a refeição, limitou seus olhares à mesa e Althea, ajudando com a tranquilidade.

— Tentarei ter uma noite de sono normal — disse para Althea.

— Qualquer coisa, vá ao meu quarto — disse, beijando sua testa. — Boa noite! Que Macária apazígue essa revolta em suas veias!

Sigmund foi ao quarto, deitou e dormiu. Não sonhou, mas não teve o sono perturbado. Ao acordar, se banhou e foi ao salão principal, onde Althea e Agniprava estavam sentadas, conversando.

— Olá, pequeno Sigmund! Bom dia! — Althea sorriu.

— Bom dia, criança! — Cumprimentou Agniprava.

— Bom dia! — Ele disse, fugindo o olhar. — Vou... sentar... ali — disse, indo à Althea e beijando-a no rosto.

Sigmund foi à porta do templo e sentou-se para observar o púrpuro céu, manchado por inúmeras estrelas, cintilando.

O silêncio findou com a chegada de alguém no salão. Olhando, Sigmund viu uma mulher de pé, portava algo como uma lança.

Seu corpo tremeu, seu instinto gritou para correr até Althea e impedir a ameaça, mas ele suspirou e foi até lá, com calma.

A moça era jovem, com traços gregos suaves, tinha longos cabelos brancos e olhos esbranquiçados evidenciavam a cegueira.

Ela trajava uma veste sacerdotal preta que parecia um vestido.

Ao aproximar-se, viu o cajado com um tecido estendido na ponta com a insígnia de Macária perfeitamente traçada. Os sinos nas pontas do tecido pareciam ramos de flores e não emitiam som.

— Minha irmã! — dizia a moça, cumprimentando Althea.

— Uma satisfação vê-la, Alexa! — Althea sorriu, indo abraçá-la.

— O rapaz é o herdeiro de Aldous? — perguntou.

Ambas sentarem enquanto Sigmund aproximava-se acautelado.

— Sim, Sigmund é seu nome — disse Althea, olhando-o. — Sigmund, esta é Alexa, nossa Grande Sacerdotisa dos Mortos.

Alexa o cumprimentou e, após servir vinho, Althea sentou.

— Bom dia! — cumprimentou, parando de pé ao lado de Althea.

— Qual é a ocasião? — perguntou Alexa, tomando seu vinho.

— Prava precisa ter com Ianos, é sobre Aakash — disse Althea.

— O herdeiro de Ianos acabou de chegar, mas chamarei.

— Obrigada, senhora! — disse Agniprava — Talvez precisemos de auxílio para lidar com o homem sinalizado por ele.

Alexa bateu o cajado no chão e os sinos ecoaram. O distante som de um violino respondeu. Althea serviu vinho e, devagar, a silhueta de um homem e um menino, de mãos dadas, surgiu.

— Senhoras! — cumprimentou o homem.

Ianos tinha fortes traços hindus, longos cabelos negros e olhos tinham cor de mel, como Vanhi. Carregava um violino branco com veios dourados que se encontravam nas cordas de mesma cor.

Energia escapava de Ianos e esse excesso, consumido pelos veios, vibrava as cordas, tocando uma baixa canção em Sol e Mi.

— Estávamos treinando. Este é Goenix, meu herdeiro.

— Olá, senhoras! Rapaz! — cumprimentou o menino, sorrindo.

O menino estava de olhos fechados, parecia ter oito anos; com aparência similar a Ianos, excetuando o cabelo bem loiro.

— Prava, uma satisfação vê-la! — Ianos sorriu. — Podemos ir ao grande salão, senhora? Infelizmente, não me preparei para vir.

— Eles te farão mal — sussurrou Sigmund, sentindo o ar faltar.

— Perdão, pequeno Sigmund! Tenho trabalho — disse Althea, beijando sua testa. — Não esqueça do exercício. Dieter virá.

— T-tudo bem — disse, respirando fundo —, toma cuidado!

— Ajudo... sente! — disse Goenix, prestativo, estendendo a mão.

— Não posso tocar enquanto louco — respondeu Sigmund, olhando-o com nojo, indo à grande estátua e sentando aos seus pés.

Goenix o acompanhou, sentando em posição de lótus à frente.

— Monge!? — questionou Sigmund, retoricamente.

— Não... por quê?

— Olhos fechados, lótus... coisa de monge!

— O treinamento exige postura. Até lidar com a forma que estes olhos veem o mundo, abdico deles... O que sente? Por que falta ar?

— Sou louco...

— Não soa louco. Quer ajuda? Posso observar e tentar ajudar...

Tsc. Na última vez que tentaram ajudar, nasci. Poupe-me! — Ele se afastou. — Estou tentando não ser hostil, sai de perto de mim!

— Perdoe a intransigência. Cuide-se e fique bem!

Goenix se afastou. Sigmund o observou, suspirando, recostou a cabeça, olhando para cima. "Preciso de ajuda!", implorou-se, sentindo o sufocamento intensificando. Despertou da agonia, ouvindo Dieter:

— Pequeno Sigmund, está bem?

— É... a tal... Loucura — respondeu, lacrimejando.

— Consegue lidar? — perguntou Dieter, sentando em sua frente.

— Não sei... é... difícil!

— Posso acompanhar — disse, bebendo e pondo a taça ao chão.

Sigmund olhou ao redor, viu Goenix sentado, em posição de lótus, distante, parecia meditar.

— Posso beber vinho? — pediu. — Talvez dê sono.

Dieter deixou e Sigmund pegou a taça, agitando o vinho. Após um suspiro, começou a taça e não demorou para ficar sonolento.

— Quer deitar? Acompanho para garantir que ficará bem.

Sigmund aceitou, com dificuldade, foi ao quarto, deitar. Dieter sentou ao chão para velar seu agitado sono.

***

Althea seguiu com Ianos, Alexa e Agniprava ao grande salão.

— Aldous não está bem? — arguiu Ianos, adentrando ao salão.

— Enquanto ele se cuida, cuido do herdeiro. — Althea disse.

— Deveria tê-lo levado à escadaria — disse Alexa, sentando.

— Não tivemos tempo. Em Aakash, induziram ao estado em que ele está. Lidamos com sua dificuldade há pouco — reportou Althea.

— Se está apegada a ele é um bom sinal! — Ianos sorriu.

— Sabia que o herdeiro de Aldous estava em Aakash, Ianos? — questionou Althea, quando todos se sentaram.

— Tive certeza há um mês. Senti leve e brevemente a presença de Algos, mas nada atestava a existência de um herdeiro em Burma.

— O que o levou a buscar Mehdi? Pode ajudar? — pediu Althea.

— Há uns anos, lidei com almas. Pareciam contato recente com Bodhi, ao me aproximar, temeram. Investiguei e encontrei o jovem Ketu. Foram sacrificadas para ele por rapazes tão novos quanto.

As sacerdotisas se entreolharam.

— Desde então, tento observar. Com supressão, proteções, não vi se a corrupção o tocava. Há oito meses, ele deixou a supressão e atestei a toxicidade. Com permissão de Alexa, recorri a Mehdi.

— Não conseguimos lidar com ele — lamentou-se Agniprava.

— São perigosos; pior que um ignorante buscando Bodhi é um iluminado sendo ignorante — disse Ianos —, deixe-me lidar.

— As buscas não acabaram, só encerraremos neste caso quando acharmos todos ou guiarmos todas as almas — afirmou Agniprava.

— Contem comigo! Estou particularmente envolvido.

— Não será ruim para o progresso do herdeiro? — arguiu Alexa.

— Não, senhora. Mesmo afligido por sofrimento, posso manter-me calmo e lidar cuidadosamente com a situação. Não se preocupe!

— Já não basta Aldous! — reclamou Alexa.

— Meu irmão tem dado trabalho, senhora? — Ianos riu.

— É só isto que ele faz: dar trabalho!

— Não seja cruel. Ele dá seu melhor! — Althea defendeu.

— Dando o seu melhor!? Os cinco herdeiros, que passaram por ele, morreram! O sexto acaba de chegar para aumentar a lista! — exclamou Alexa, incomodada com a incidência de mortes.

— Como guardião, ele decide como treinar os herdeiros. Não fale como se ele fosse um criminoso orgulhoso — defendeu Althea, triste.

— Não é um crime, mas a bússola moral deveria apontar que ele não deve matar seus aprendizes com esta constância. Esta é a geração de Algos que mais matou, Althea. Está defendendo o indefensável!

— A guerra nos tirou muito, minha senhora! Tenha compaixão de meu irmão — pediu Ianos, complacente.

— Não viemos falar de Aldous... mas, com o herdeiro envolvido é inevitável! — reclamou Alexa, tentando mudar o assunto. — Qual a situação do herdeiro? Sei que Algos interage com ele há alguns anos.

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