Visões opostas
Elizabeth e Jane encontravam-se sentadas — de frente uma para a outra — sobre a cama da primeira. Lizzy, animada, iniciou a conversa:
— E então, minha irmã, como te sentes? Suponho que estejas deveras ansiosa para ver o rosto deste pequeno ser que cresce ai dentro — falava, enquanto tocava carinhosamente o ventre de Jane.
— Sim, estou — colocando a mão sobre a de Lizzy, que permanecia sobre a sua barriga —, mas sei que ainda falta algum tempo até que a gravidez fique aparente. A tua se evidenciará antes. — retribuindo o gesto carinhoso que a outra lhe fazia.
- Isto me deixa contente, mas também apreensiva... — tornou Lizzy, com uma sombra de preocupação à encobrir seu rosto — Fitzwilliam ainda não recobrou a memória, de modo que eu ainda não tive a oportunidade de dizer-lhe sobre o nosso filho.
— Sei o quão delicada é a situação de ambos - massageando as mãos de Lizzy ternamente — contudo, tenho fé em Deus que teu marido logo se recordará de todos os fatos passados, e tu poderás lhe informar deste feliz acontecimento.
— Sei disso, porém... - neste ponto, foi interrompida por Jane.
— Porém tu deverás ter paciência e compreender as atuais limitações do teu esposo. — completou a mais velha — Quase não te reconheço mais quando vejo-te assim, abatida. Logo tu, que sempre fostes a mais vivaz dentre as cinco irmãs Bennet! Este desânimo não condiz com tua personalidade.
— Acontece que dúvidas rondam a minha mente com frequência. Por exemplo: por vezes imagino que Will está se reaproximando de mim, entretanto noutros acho que tudo não passa de fruto da minha imaginação, do meu desejo. Antes de me visitares, inclusive, sentia-me sedenta de uma terceira opinião. Tua vinda me foi, além de; como sempre, querida; providencial. — com o olhar quase suplicante, questionou — Que tu achas? Estou imaginando coisas ou há fundamento para as minhas suspeitas?
— Sem dúvida alguma que Darcy demonstra sentir algo por ti novamente. Inclusive vi alguns olhares que de tão significativos fizeram-me supor que ele havia readquirido as lembranças. Só vi minhas expectativas frustradas ao perceber que, no decorrer da conversa, nenhum de vocês dois tocou no assunto, e acredito que ambos nunca esconderiam tão boa notícia de mim e de Bingley — afirmou Jane.
— Decerto que não - e abrindo um sorriso — Que felicidade me dá que tu tenhas tido a mesma impressão que eu. Ainda que de maneira hesitante, Fitzwilliam parece-me cada dia mais próximo de mim.
— De fato, foi o que eu imaginei... — e fechando um pouco a expressão —, Lizzy, tenho que falar-lhe também sobre Lydia. Bingley já está à par das ajudas de custo que eu e tu enviava-mos para ela e Wickham. De início, ele pareceu um pouco magoado por eu ter-lhe escondido este fato, mas depois compreendeu. Semana passada, ela mandou-me esta mensagem. — tirando um singelo pedaço de papal da bolsa que levava consigo, depositou-o nas mãos de Elizabeth.
Lizzy correu os olhos sobre aquela caligrafia quase infantil, tornando à observar a face tensa da irmã mais velha ao fim da leitura. Exclamou:
— Mas este valor que ela pede é uma exorbitância! Sim, tu e eu nos casamos com homens de posses, entretanto não considero justo que dilapidemos toda a sua fortuna por conta da gravidez de nossa irmã. Eu não irei compactuar com este despautério! — decretou a Sra. Darcy, resoluta.
— Peço que pondere, Lizzy. É nossa irmã caçula que está passando por dificuldades. Wickham sempre aprontou das suas. Certamente continua acumulando dívidas com jogos, bebidas...
— E mulheres — foi a vez de Lizzy interromper a irmã. Ao ver a expressão chocada desta, acrescentou - O que crês? Que um homem de caráter defeituoso como o de nosso cunhado é capaz de manter-se satisfeito com uma única mulher? Não é possível que sejas tão ingênua a este ponto!
— É difícil digerir tal ideia. É bem possível que tenhas razão, mas se for mesmo verdade esta tua suposição, talvez seja mais um motivo para ajudarmos à Lydia. Coitadinha, deve estar penando nas mãos daquele desalmado...
— Pois eu já penso o contrário. Se continuarmos mantendo suas despesas, estaremos incentivando-os ainda mais ao ócio. Wickham, ao se ver na penúria, terá que andar com as próprias pernas, e daí talvez amadureça. Eu não estou de modo algum disposta à depenar os bens de meu marido para satisfazer os caprichos daquele salafrário.
— Considero tudo isso muito complicado. De um lado há o oportunismo de um homem sem qualquer resquício de ética, mas por outro há nossa irmã e este bebê que — assim como os nossos — cresce em seu ventre.
— Se é que de fato existe essa tal gravidez... — divagou Elizabeth, pensando em voz alta.
— Crês que Lydia seria capaz de nos fazer uma desfeita dessas, simulando uma gravidez para nos extorquir dinheiro?! — indignou-se Jane.
— Não creio que tal ideia partisse daquela cabeça oca, já quanto à Wickhan, tenho cá minhas reservas. Ele exerce forte influência sobre ela. Sempre foi assim, e certamente continua sendo.
— Oh, sinto-me perplexa! — Jane constatou, levantando-se da cama — Como pode um ser humano ser tão baixo e mesquinho? Usar de um meio tão vil para conseguir dinheiro sem esforço.
— Veja bem, é uma possibilidade que surgiu em minha mente agora, não estou afirmando nada. Apenas desconfio porque desde que surgiram os rumores desta suposta gravidez, não mais vimos nossa irmã.
— Isto é bem verdade... — concordou Jane.
— Por isso aconselho-te a suspenderes tuas ajudas de custo. Farei isso, pelo menos por algum tempo. Se ao menos nós tivéssemos um dinheiro que de fato fosse nosso, sem que precisássemos dar satisfações aos nossos maridos... Não que Fitzwilliam me cobre algo. Ele é até exagerado de tão generoso, mas creio que nada se compara à receber um dinheiro que saibas o quanto lhe custou conseguir. Isso engrandece uma pessoa, torna-a digna de considerar-se um indivíduo. — analisava, sonhadora.
— Queres dizer com isto que te agradarias se pudesses trabalhar? — sorriu Jane, divertindo-se com a visão vanguardista da irmã.
— Sim, e por quê não?Acredito que as mulheres são tão capazes quanto os homens de aprender uma profissão, expandir sua capacidade intelectual. Nossa sociedade nos priva de muitas oportunidades, enclausurado-nos dentro de casa.Ingressar numa Universidade não deveria ser algo restrito aos homens, por exemplo. Privar um ser humano de progredir, independentemente de quaisquer razões e seja em qual aspecto for, é um ato de extema covardia, considero até mesmo uma brutalidade! — finalizando o discurso.
— Pois eu acho que o mundo nunca avançará ao ponto que tu imaginas. Homens e mulheres tem papéis bem específicos desde os primórdios da humanidade e assim permanecerá sendo. — externou Jane, conformada como sempre.
— Nada como o tempo para responder tais questionamentos... Grandes impérios que pareciam indestrutíveis em épocas passadas ruíram sem deixarem vestígios. Seguindo por esta mesma linha de raciocínio, ideias antigas podem ser sepultadas para ceder lugar a ideias novas. Bem, claro que esta é apenas uma suposição da minha parte. E por falar em relações entre os gêneros, como tu e Bingley estão? — entrando noutro tópico que muito lhe interessava.
— Estamos bem, agora mais do que nunca por causa do bebê. Por que perguntas? — interrogou, um pouco incomodada com a pergunta da irmã mais nova.
— Serei direta: não compreendo porque tu se referes ao teu esposo como "Bingley". Parece-me tão impessoal e frio. Soa estranho aos meus ouvidos. — esclareceu Lizzy.
— Ora, porque este é o modo habitual. Todas as senhoras que conheço referem-se aos seus maridos do mesmo modo que eu ao meu. Tu me provocas grande estranheza quando chamas Darcy de Fitzwilliam ou pior, apenas por Will — considerou.
— Percebes o que acabas de dizer? Nossa sociedade mantem-se limitada porque as pessoas persistem em repetir os velhos erros dos seus antepassados. Não é porque todos agiram e agem de tal maneira que isto seja correto. Sou íntima do meu marido, e por isso não o trato com distanciamento. Nosso casamento é, na medida do possível, igualitário.
— Esta questão não me incomoda. Eu e Bingley vivemos bem. Ele jamais reclamou disto e eu nunca me incomodei.
As irmãs prosseguiram nesta amigável discussão sobre as relações entre homens e mulheres, e sobre elas próprias em relação aos seus respectivos esposos; enquanto seus maridos discutiam sobre outros temas em noutro cômodo da casa.
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