Família furiosa
Aquela era uma situação inesperada e constrangedora para todos os presentes. Lizzy, Georgiana e principalmente o Sr. Phillips; responsável pela administração do imenso patrimônio dos Darcy; não sabiam como agir diante de tal revelação.
Fitzwilliam ouvira acidentalmente o final da conversa entre Lizzy a Georgiana, mas fora o suficiente para deixá-lo transtornado diante do fato. Tornou à pressionar:
— E então, ninguém me diz nada? Estou esperando uma resposta. — com um olhar que oscilava de Elizabeth à Georgiana.
— Fitzwilliam, por favor, seja razoável. Respeite ao menos a presença do Sr. Phillips, que nada tem a ver com este assunto. — tentou contemporizar a Sra. de Pemberley.
— Peço desculpas ao Sr., à Sra. e à Srta. Darcy por estar aqui presente. Apenas segui meu patrão ao escritório para analisar alguns documentos, jamais poderia supor que presenciaria uma conversa de familia. No entanto, garanto-lhes que saberei guardar o mais absoluto sigilo. Sou funcionário de confiança desde os tempos do falecido Sr. Darcy, que Deus o tenha, como todos aqui sabem. — explicou-se o Sr. Phillips.
— Sim, sabemos. Não és tu quem deves explicações por aqui, Sr. Phillips. — observou Darcy, numa clara indireta à irmã e à esposa. — Inclusive, estás dispensado de suas obrigações por hoje. Orientarei um criado, que o avisará sobre outro dia em que eu estiver disponível para tratarmos sobre os assuntos pendentes. Por motivos óbvios, meu interesse foi inteiramente desviado para questões familiares. — decidiu Fitzwilliam, autoritário.
— Obrigado, Sr. Darcy, estarei às ordens. — e fazendo uma reverência respeitosa às damas — Com licença Sra. e Srta. Darcy.
Ambas fizeram um leve meneio de cabeça, numa resposta silenciosa. O administrador saiu da presença dos proprietários do palacete.
Darcy fechou a porta atrás de si, e chegando no meio do escritório, tornou à falar:
— Ainda espero uma resposta para as minhas já citadas dúvidas. — tentando controlar a irritação.
— Meu irmão, eu... — Georgiana tentou falar, mas foi impedida por um gesto de mão da cunhada.
— Este diálogo será entre mim e meu marido, Georgiana. És muito jovem para este tipo de conversa. — explicou Elizabeth, sensata.
— Mas este foi um erro provocado por mim, Lizzy. Tu não mereces sofrer o impacto de minhas decisões equivocadas. Além do mais, estás grávida. Pense no seu bebê. — implorou a moça, quase chorando.
— Ninguém aqui irá sofrer, Georgiana. Entretanto, tua presença não se faz necessária. Vá para a sua alcova. A encontrarei tão logo termine a conversa com o seu irmão. — orientou a Sra., pondo fim à discussão.
— Está bem. Se é assim que preferes, assim o farei. Com licença. — conformou-se Georgiana, saindo de cabeça baixa.
Passou pelo irmão, mas não teve coragem de olhá-lo. Ela não teria como saber, mas foi melhor assim. Se o tivesse feito, encontraria raiva, decepção e tristeza nos olhos dele.
Georgiana fechou a porta do escritório aparentando tranquilidade, porém subiu correndo as escadas até o seu quarto, quase tropeçando nos degraus.
Jogou-se na cama e chorou de vergonha, arrependimento e revolta. Considerava injusto ter de enfrentar mais uma vez a raiva de Darcy por causa de um romance que nem sequer se concretizou.
"Maldito seja o dia em que Wickham pôs os pés em Pemberley!", a garota sussurrou, amaldiçoando seu antigo "pretendente" enquanto enxugava as lágrimas que molhavam o seu rosto, com as próprias mãos.
***
No andar de baixo, o casal Darcy iniciava uma discussão que não seria fácil para nenhum dos dois.
— Fitzwilliam, uma coisa me chamou a atenção. Disseste-me que tinhas lembranças até os 18 anos. Como não te lembras de George Wickham? O conheces de longa data: ambos cresceram juntos — ela observou, perspicaz.
— Recordo-me de alguns fatos e de poucas pessoas, principalmente de Georgiana ainda menina. Pensei que conhecia o bastante sobre mim até os meus 18, mas agora percebo o quanto é difícil delimitar a minha memória... — constatou Darcy, pensativo.
—Entendo. — lamentou Lizzy, consternada — Agora lhe peço que me acompanhes à nossa alcova. Não serei eu que esclarecerei tuas dúvidas, e sim tu mesmo. — levantando-se da cadeira de espaldar alto.
— Como pode ser isso?! Zombas de mim: esta é a única explicação plausível! — exclamou indignado, sem compreender o raciocínio da esposa.
— Se tu recordastes o mínimo que fosse de mim, sob hipótese alguma cogitarias tal possibilidade. — transperecendo a mágoa na voz, prosseguiu — Siga-me e logo entenderás o que lhe digo.
Fitzwilliam seguiu-a, apesar da própria incredulidade.
***
Chegando ao quarto, Lizzy retirou um quadro da parede — pintado com extremo capricho por Georgiana — que retratava uma paisagem campestre ao entardecer. Por trás do objeto havia um prego, onde estava pendurada uma chave mestra.
Com ela, Elizabeth destrancava as gavetas sem pronunciar uma única sílaba. Darcy, que olhava a cena com os braços cruzados sobre o peito, impacientou-se com a demora:
— O que tanto procuras? Necessito apenas de um esclarecimento sobre este Wickham e sua suposta relação com minha irmã. Tenho o direito de saber. — resmungou ele, exigindo uma resposta.
— Aqui está! — exclamou Elizabeth, empolgada por encontrar duas folhas levemente amarelados dentro de um livro, no fundo de uma das gavetas do criado-mudo.
— E o que significa isto? — interrogou Darcy, apontando para os papéis, desdenhosamente.
— Esta é a carta que tu mesmo escrevestes, antes que eu me apaixonasse por ti. Nela, tu me alertas sobre o mau-caratismo de Wickham e o envolvimento que existiu entre ele e Georgiana. Tu havias me pedido; quando já estávamos noivos; para que eu desse um fim nela, contudo eu nunca tive coragem de fazê-lo. Bem ou mal, foi a primeira carta que recebi de ti. Embora o tema não seja dos mais agradáveis, ela tem para mim um valor sentimental. Agora sua existência tornou-se providencial, e tu mesmo poderás responder às tuas dúvidas. — passando os papéis para ele.
Fitzwilliam pegou as folhas, com as mãos levemente trêmulas. Reconheceu a própria caligrafia de imediato. Seria estranho ler um manuscrito seu, do qual não fazia ideia do conteúdo. Era como manter contato com um lado desconhecido de si mesmo.
Sentando-se na própria cama, passou os olhos por todas as letras, atentamente.
***
— Desgraçado, ordinário! — esbravejou Darcy, tão logo concluiu a leitura da carta, ficando de pé.
— Acalme-se, meu amor. Tamanha fúria não te fará bem. — Lizzy tentou tranquilizá-lo, em vão.
— Como poderei ter calma?! Este salafrário que atende por Wickham seduziu a minha irmã — espalmando a mão direita sobre o lado esquerdo do peito —, quando ela tinha apenas 15 anos!Aproveitou-se da inocência dela na tentativa de aplicar um golpe, e ainda por cima tentou enlamear a minha imagem diante de ti. Canalha, merece a morte! — andando de um lado para o outro, irado.
— Não me digas que tu serias ... — Lizzy travou antes de completar a frase.
Ela temia ouvir o pior, que não tardou em invadir-lhe os ouvidos.
— Sim, seria capaz de matá-lo. Um duelo limparia a minha honra e a de Georgiana, e livraria o mundo deste verme. — Darcy afirmou, esmurrando o criado-mudo onde a carta estivera guardada.
Elizabeth sentiu como se o chão lhe escapasse sob os pés.
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