A Divina Providência
Charles Bingley decidiu que era chegada a hora de ir embora. Depois que Elizabeth expôs seu desejo de ir à procura de Lydia, ele percebeu que os Darcy enfrentariam um extenso debate pela frente. Com a desculpa de que revelaria as novidades à Jane — no que fora sincero — partiu rapidamente de Pemberley.
Tão logo despediram-se do amigo, Lizzy e Fitzwilliam subiram as escadas e foram direto para o quarto.
— Enlouqueceste! — esbravejou Darcy, girando a maçaneta de ouro da porta do quarto e permanecendo de costas para Lizzy — Como podes imaginar que virás comigo e com Charles à procura de Lydia? Isso não tem cabimento.
Fitzwillliam voltou à fitar a esposa. Elizabeth viu lágrimas de medo brotando nos olhos dele, e titubeou. Não queria fazê-lo sofrer. Ela ficou calada por alguns segundos, analisando as possibilidades. Por fim, respondeu ao marido:
— Veja bem, Will, Lydia é minha irmã. — disse, caminhando lentamente até ele — Imagine se isso estivesse acontecendo com Georgiana: conseguirias ignorar?
— Isso não está acontecendo com Georgiana, não sou uma mulher e nem estou grávida! — apontando para a barriga de quase nove meses de Elizabeth — Não percebes que essa ideia é absurda? Não faz o menor sentido te arrisques desta maneira.
— Pois eu não vejo o menor sentido em ficar em Pemberley, de braços cruzados, enquanto tu e Charles partem atrás da minha irmã. Eu tenho o direito de revê-la, e verei, quer tu aceites minha decisão ou não.
— O que pretendes insinuar com isso, Elizabeth? — questionou Fitzwilliam, dividido entre a irritação e o temor.
— Eu não sou mulher de insinuações e sabes bem disso. O que eu fiz foi afirmar claramente que com ou sem o teu consentimento, eu buscarei Lydia. Li as informações que o Sr. Holmes trouxe e sei onde ela está, portanto não podes me impedir.
Darcy deu um longo suspiro e deixou-se cair numa poltrona. Inclinando o corpo para a frente, com o intuito de ficar mais próximo de Lizzy que o encarava ainda de pé, Darcy desabafou:
— Não deveria ter permitido a tua presença durante a conversa com o investigador. Teria sido melhor para todos nós que tu não soubesses onde ela está.
— Fale por si só, Darcy — irritou-se Elizabeth — Não tinhas o direito de esconder-me informações sobre a minha irmã, e eu descobriria mesmo que não estivesse presente na conversa. Trarei-a para junto de nós e assunto encerrado.
— Esta é a tua última palavra? — ele perguntou, torcendo para que, por obra de algum milagre, ela mudasse de ideia.
— Sim, é a minha última palavra. — replicou Lizzy, irredutível.
— Pois bem. — disse Darcy, levantando-se — Sendo assim, iremos todos juntos: eu, tu e Charles.
— Obrigada, meu amor! — aproximando-se, colocou os braços em volta do pescoço dele — Sabia que me compreenderias. — dando um selinho carinhoso.
Darcy afastou-se, arredio. Lizzy ficou tensa, pois ele permaneceu de costas para ela novamente, sem pronunciar uma palavra sequer. Quando ela pensou em dizer algo, Fitzwilliam olhou-a novamente e afirmou, sério:
— Aceito a tua loucura apenas por não me restar outra alternativa. Como tu própria disseste, procurarás por Lydia com ou sem o meu consentimento. Apenas quero que saibas que caso morras, parte de mim morrerá junto contigo; e caso algum mal atinja nosso filho, jamais lhe perdoarei por tamanha insensatez. Estás avisada.
Dito isto, ele fechou a porta novamente, deixando uma Elizabeth solitária olhando para o vazio.
***
— E é isto o que tenho para lhe dizer sobre Lydia. — disse Charles à esposa, encerrando os comentários sobre sua cunhada mais nova — Quanto à Elizabeth, achas mesmo que ela teimará em vir comigo e com Fitzwilliam? — perguntou, incrédulo.
— Se bem conheço a minha irmã, temo que sim. Lizzy é muito impulsiva, e o papai sempre permitiu que ela fizesse tudo o que queria. Não é que eu a considere mimada, mas uma pessoa voluntariosa certamente ela é.
— Vejo que Darcy terá momentos difíceis daqui para a frente... — Bingley lamentava a sorte do amigo.
— São os momentos difíceis que fortalecem os relacionamentos, querido. Acredito que quando tudo isso passar, todos nós seremos muito mais unidos do que antes. Tenhamos fé.
Jane aproximou-se de Charles, e os dois abraçaram-se carinhosamente.
***
Alguns dias depois...
Georgiana decidira passar um tempo indeterminado na casa da tia, Catherine de Bourgh, pois pretendia voltar para Pemberley apenas quando o irmão e a cunhada retornassem com Lydia.
Nesse ínterim, Darcy continuava tentando convencer Elizabeth a esperar pelo desenrolar dos acontecimentos na segurança do seu lar.
— Ainda há tempo para desistir, Lizzy, não precisas correr este risco. Eu e Charles traremos tua irmã sã e salva, lhe prometo. — Darcy suplicava.
Alheio ao diálogo dos patrões, um criado passou levando as malas da patroa para a espaçosa carruagem, onde as bagagens do patrão e de Charles já haviam sido colocadas.
— Fitzwilliam, não será agora que está quase tudo pronto para irmos que mudarei de ideia. Quero e vou até Lidya: está decidido. — Lizzy dizia, ao mesmo tempo em que recebia a ajuda do marido para subir no veículo.
— Se tens um defeito, sem dúvida, é a teimosia. — resmungava Darcy, sentando ao lado de Bingley, que nada dizia, apesar de estar entre o casal.
— Idem. — retrucou Elizabeth, fingindo-se de ofendida mais do que realmente estava.
— Hu-hum... — pigarreou Charles, constrangido por estar no meio do "fogo cruzado" — Preferem ir ao lado um do outro?
— Não! — o casal respondeu em uníssono, como duas crianças birrentas.
Logo depois, o cocheiro deu partida na diligência, iniciando a viagem.
***
O percurso era longo, portanto os três tiveram que pernoitar em hotéis, retornando à estrada durante o dia. Além de descansarem, protegiam-se dos perigos noturnos.
Todas as noites, antes de apagar a vela no quarto das hospedagens pelas quais passavam, Darcy perguntava se Lizzy gostaria de retornar à Pemberley, e a resposta era invariavelmente a mesma: "Não!"
Fitzwilliam percebia que a esposa estava cansada, mas para a sua tristeza Lizzy era orgulhosa demais para admitir.
***
Transcorreu uma semana desde que o casal Darcy saiu de Pemberley e Charles deixou Jane provisoriamente para trás.
Agora os três passavam por uma estrada deserta e lamacenta, em que o cocheiro sentia dificuldade para passar sem atolar as rodas da carruagem.
Ninguém estava confortável nestas condições, porém Elizabeth, grávida, era a que mais sofria com os constantes solavancos. Darcy franzia o cenho, preocupado com a expressão de desconforto no rosto da esposa.
— Ora, vejam só! — exclamou Charles, distraído com a paisagem e apontando pela janela da diligência — Há uma casa logo mais à frente. Creio que é nela onde Lydia está!
— Graças a Deus! — Lizzy gemeu, falando com dificuldade. — Só pode ter sido a divina providência, porque a minha bolsa rompeu agora: o bebê já vai nascer.
O abalo que essa informação gerou nos dois amigos, principalmente em Darcy, foi indescritível.
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