Prólogo
Era mais um dia normal, meus alunos prestavam atenção em minhas palavras, mas uma vez ou outra, a distração colocava fim ao meu trabalho árduo.
— Pode fazer o que eu pedi, Kayin? - perguntei e o menino me olhou surpreso.
— Sim, senhora.
— Então continue a leitura de onde parei, por favor. - me encarou por instantes sem saber o que fazer - Preste atenção, Kayin. Esse assunto é importante para vocês!
— Sim, senhora.
Ia retomar o raciocínio, mas notei meu pai ao fundo da sala, me observando. As crianças acompanharam meu olhar e logo se apressaram em fazer os devidos cumprimentos.
— Oba wa (nosso rei)! - disseram em uníssono ao se curvarem.
— Okay crianças, vamos dar um intervalo. - disse em voz alta e eles se levantaram agitadamente - À que devo a honra da presença ilustre de vossa majestade em minha humilde classe?
Ele sorriu e veio até mim me abraçando.
— Gosto de te ver ensinando eles. - sorri - Sua mãe pediu para avisar que quer a presença do seu noivo no almoço de hoje.
— Por que o senhor não falou diretamente com Akin?
— Queria uma desculpa para vir até aqui.
— Como se um rei precisasse de permissão para visitar lugares do seu próprio território. Mas, eu aviso ele. - olhei rapidamente para a porta - Ou ele pode ter ouvido a nossa conversa.
Akin é meu noivo, mas também é o líder dos guerreiros da nossa tribo. Nos conhecemos ainda crianças, por isso aceitei bem a ideia do casamento.
— Oba wa! - ele disse se curvando.
— Akin. - meu pai falou em um tom de respeito - Suponho que já tenha ouvido meu convite e de minha esposa.
— Sim, senhor.
— Pois então, esperamos você. - ele assentiu - Vou deixar vocês a sós.
— Às vezes ainda me sinto um pouco pressionado por ser noivo da princesa da tribo. - disse depois que meu pai saiu.
— Eu sou uma mulher como qualquer outra. Não tem motivos para se sentir assim!
— É, tem razão. - disse ao me abraçar.
— Preciso recomeçar a aula, meus alunos estão ... - um grito alto interrompeu minha fala.
Rapidamente, Akin ficou em posição de alerta ao ver as crianças correrem de volta para a sala.
— Fica com eles, eu já volto. - disse e se afastou.
Usei aqueles poucos instantes sozinha para acalmar meus alunos, mas momentos depois Akin voltou com sua lança em mãos.
— Vamos, rápido. Precisamos sair daqui!
Peguei meu arco, juntamente com algumas flechas, que se encontrava abaixo da minha mesa, depois saímos pelos fundos da sala. Meu noivo foi na frente para checar o caminho, e eu fui atrás das crianças para não sermos pegos de surpresa.
Depois de caminhar rapidamente por um tempo, paramos embaixo de uma árvore grande onde poucos tinham acesso devido ao matagal.
— O que aconteceu lá?
— Invasão. - falou ofegante e eu me preocupei.
— Preciso voltar! - disse me levantando e ele segurou meu braço.
— Não vou deixar que faça isso. - me olhou com repreensão - Eu quem devo voltar, sou o guerreiro da tribo.
— É exatamente por isso que eu preciso que fique com eles, ninguém vai protegê-los melhor do que você! - disse me referindo às crianças - É dever de uma princesa proteger sua tribo!
— Ayla ...
— Isso é uma ordem, Akin! - proferi as palavras em um tom autoritário e ele se curvou - Fique aqui por um tempo, vou pedir aos sobreviventes para que venham até você, depois ache um lugar seguro e mantenha-os à salvo. Caso algo aconteça, você está no comando!
Me levantei e me virei para sair, mas ele puxou meu braço outra vez, depois me abraçou e encostou nossas testas.
— Mo nífẹ̀ẹ́ rẹ (eu amo você)! - mesmo com os olhos fechados, senti vontade de chorar.
— Mo nífẹ̀ẹ́ rẹ! - falei.
Voltei correndo para a minha tribo e, assim que cheguei, precisei disparar duas das minhas flechas para salvar um grupo de meninas que fugiam dos invasores.
— Estão vendo aquela árvore grande no meio da mata? - assentiram - Corram até lá sem olhar para trás, o guerreiro Akin espera por vocês!
Me certifiquei que elas fizeram o que eu pedi, depois voltei para a minha missão.
Não sei ao certo quantas pessoas consegui salvar, mas comparado ao número total da nossa tribo, não era quase nada.
Avistei uma mulher em luta corporal com mais dois homens, olhei mais atentamente e percebi que se tratava de minha irmã.
Minha flecha acertou a cabeça de um deles com perfeição, depois usei meu arco para me defender do outro e, como ensinado em batalha, ela pegou uma lança para pôr fim à vida do invasor.
— Nala, preciso que você vá até a árvore mais alta do matagal.
— Não posso. Preciso ajudar a tribo! - exclamou.
— Akin está sozinho, ele vai precisar de apoio para proteger os que sobreviverem. - ela ia revidar, mas interrompi - Nosso tempo está acabando.
— Ayla... - percebi seus olhos se enchendo d'água e tive que travar meu choro na garganta.
Me aproximei e, sem rodeios, abracei seu corpo com força.
— Faz o que estou pedindo, por favor. - segurei seu rosto para encarar seus olhos - Nossa tribo já perdeu demais!
— Assim disse a princesa de Ekom! - ela falou fazendo uma leve reverência com a cabeça.
Antes de me afastar, me certifiquei em dizer que a amava.
Nala e eu somos as únicas descendentes do rei. Por ordem cronológica, eu é quem deveria assumir o trono depois dele, mas com esse ataque surpresa, tenho certeza que as coisas irão mudar.
— VÁ E CONVOQUE TODOS OS GUERREIROS QUE ENCONTRAR!
Voltei a correr quando ela se distanciou, mas fiquei paralisada ao ver as casas em chamas e as pessoas sendo amarradas como animais. Minha alma sangrou ao encarar toda a história da nossa tribo ser resumida à cinzas.
Levei uma pancada forte na cabeça e fiquei zonza, ao cair no chão percebi minhas mãos sendo amarradas quando meu arco foi arrancado de mim. Fui levada até o meio do acampamento, onde a maioria do meu povo se encontrava de joelhos em frente aos invasores.
Me colocaram de pé, na frente deles, e quando retomei minha consciência, vi meus pais ajoelhados à minha frente com as mãos amarradas atrás do corpo. Me debati nos braços daqueles que tentavam me segurar, mas foi em vão.
— Temos aqui Nkosi e Kieza, rei e rainha da tribo Ekom. - um homem disse ironicamente - E logo ali temos ela, a tão formosa e desejada princesa Ayla.
Olhei para minha mãe desesperadamente, temendo pelo que iria acontecer em seguida.
— Espero que tenha tido tempo de se despedir, princesa. - um dos que segurava meu braço disse sorrindo.
O homem agarrou o cabelo da minha mãe com força para trás, e vendo a lágrima escorrer, pude perceber seus lábios formarem:
— Resista!
A lâmina afiada de uma faca cortou lentamente sua garganta.
— NÃO! - gritei chorando ao ver seu sangue se misturar com o terra - MÃE!
— Agora é sua vez, meu rei.
Assim que meu pai foi colocado de pé, pude sentir a tristeza e o medo da minha tribo em ver aquela cena. Meu coração estava aflito, palpitando descompassadamente enquanto as lágrimas rolavam pelo meu rosto até molharem a terra por baixo dos meus pés.
— Omo̩ obìnrin (minha filha), - falou tranquilamente em alto som ao encarar meus olhos - Íja (lute) !
Proferindo essas palavras, a lâmina que antes tirava a vida da minha mãe, agora cortava milimetricamente o pescoço do meu pai. Ao ver seu corpo sem vida se chocar com o chão, meu coração se despedaçou ao ponto de eu não conseguir me manter de pé.
O homem se agachou para ficar na altura do meu rosto, depois encostou a faca cheia de sangue em meu pescoço. Por um instante, pensei que aquele também seria meu fim.
— Fica tranquila, princesa. Meus planos pra você são outros! - se levantou - Acorrentem todos juntos, os brancos já vão chegar para buscá-los!
*Se virem algum erro, relevem por favor.*
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