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Capítulo XXX


— Não acho que irá me entender se eu disser a verdade. - encarou o chão.

— Tente. - levantei seu rosto - Prometo me esforçar para compreender.

 Finley suspirou outra vez, se sentou na ponta da cama e pediu para que eu fechasse a porta. Mesmo estando levemente desconfiada de sua reação, fiz o que ele pediu.

— Alguma vez John já lhe disse como nos conhecemos?

— Ele me contou que vocês se conhecem a muito tempo, mas nunca fez especificações sobre o assunto.

— Éramos crianças, nossos pais trabalhavam juntos, por isso vivíamos indo na casa um do outro e isso fez ele se tornar meu melhor amigo, e vice-versa, então fazíamos praticamente tudo juntos. O tempo foi passando, nós fomos crescendo e eu acompanhei de perto como John se tornou um rapaz tão bonito... - sorriu de leve.

Como é?

— Ele tinha 14 anos e eu 21, mas ainda assim comecei a olhá-lo de um jeito diferente. - seu sorriso sumiu - Sabia que era errado ter esse tipo de sentimento por ele, sabia que não devia nutrir isso, mas foi impossível... - disse com lágrimas nos olhos ao me encarar - Eu tentei, Ayla. Juro por tudo que é mais sagrado que tentei pôr fim a esse pecado tão absurdo, mas não consegui. Fiquei com diversas mulheres ao redor do mundo e até desvirtuei moças para alcançar tal feito, mas foi inútil. - percebi suas mãos bagunçando seu cabelo - Sei que deve estar pensando que sou uma aberração imunda e não discordo de você, mas peço para não revelar meu segredo pois é minha maior vergonha.

 Pisquei algumas vezes pela surpresa.

 Confesso que não esperava ouvir o que ouvi. Nunca havia passado pela minha cabeça que Finley poderia ser apaixonado por John, mas depois de sua confissão, muitas de suas atitudes passaram a fazer mais sentido.

— Você não é uma aberração, Cedric. - afirmei depois alguns instantes em silêncio.

— Diz isso porque não foi você que se apaixonou por uma pessoa do mesmo sexo. - me encarou com os olhos inchados devido ao choro forte - Tem noção do quanto isso é nojento, Ayla?

— Foi o padre que te disse isso?

— Sim, por que?

— O mesmo padre que alegou ser certo escravizar os negros e chamá-los de demônios? - ele engoliu seco ao me encarar outra vez - Não conheço muito a religião dos brancos, e prefiro não conhecer, mas já escutei algumas passagens que diziam que somos iguais e amados da mesma forma por seja lá qual força nos rege.

— O que quer dizer com isso?

— Não escolhi nascer negra e imagino que você também não tenha escolhido sentir algo que te machuca tanto. - lhe encarei de volta - Se não temos capacidade de controlar, não deve ser tão errado ser quem somos.

— Então, não sente nojo de mim? - sorri de um jeito sarcástico.

— Finley, você é o homem mais educado, sensato e sábio que já tive a oportunidade de conversar. Me acolheu, foi meu amigo e me protegeu sem nem mesmo me conhecer direito. - sorri - Não existe nenhum motivo para sentir nojo de você!

— Nem depois do que fiz com você?

— Foram só algumas respostas grosseiras por causa de ciúmes, não ficarei ressentida por algo tão relevante.

— Não falei disso! - franzi o cenho.

— Então o que era?

— Ayla, por favor, você precisa me entender. - disse se ajoelhando a minha frente - John já dormiu com diversas mulheres, mas nunca se interessou por alguém como se interessou por você, e isso me deixou inseguro, enfurecido e cego...

— Finley, levante-se. - pedi tentando puxar seus braços - Está me deixando sem jeito.

— Fui eu quem convenceu John a levá-la para a fazenda do Sr.Jones! - fiquei paralisada.

Essa segunda confissão conseguiu me deixar muito mais surpresa que a primeira. Finley já havia ido naquela fazenda com John, ele sabia como era o tratamento com os escravos e mesmo assim convenceu John a me levar até lá?

— Ele não queria levá-la dizendo que era perigoso demais e que não queria te expor dessa forma, mas fui eu quem o convenceu de te levar. - as lágrimas rolavam por seu rosto enquanto eu me mantinha imóvel - Fiquei com a inveja da atenção que você estava recebendo dele, e achei que, dessa forma, ele poderia te deixar lá e voltar a ser o John que eu conheço.

— Como é? - perguntei enfurecida - Queria que ele me vendesse?

— Eu estava cego, Ayla. Não pensei nas consequências, agi por impulso.

— Você sabe o que tive que passar naquele lugar? - me levantei com pressa - O que tive que ouvir? Quanto precisei trabalhar?

— Ayla, por favor...

— Achei que você se preocupasse comigo, que gostasse de mim da mesma forma que gosto de você, Finley. - foi minha vez de começar de ter os olhos invadidos pelas lágrimas - Achei que você era meu amigo.

— Não chora, por favor. - tentou se aproximar e eu me afastei - Eu sou seu amigo!

— Que tipo de amigo deixa o próprio sentimento prejudicar outra pessoa a esse nível?

— Eu estava confuso, desesperado e só pensei em mim, mas já me arrependi um milhão de vezes desde que você voltou. - ele segurou minha mão em frente ao seu rosto - Por favor, me perdoe.

 Afastei nossas mãos, mas continuei encarando seus olhos sem dizer nada.

 Cedric é um homem tão educado e sensato, já alegou ser contra a escravidão mais de mil vezes e, ainda assim, queria que John me vendesse?

 Como ele teve coragem?

— Tudo bem por aqui?

 Olhei para a porta e fiquei, minimamente, mais aliviada por ver Joseff parado com a expressão claramente confusa.

 Pelo menos, não é o John.

 Finley pareceu perder a fala, não conseguiu responder, o que deixou Joseff levemente desconfiado.

— Sim. O capitão me pediu para pegar uma caixa pesada e chamei Finley para me ajudar. - me apressei em responder, antes que ele começasse a imaginar coisas demais.

— Hum, tudo bem. - encarou Finley rapidamente - Não demore, Adam está precisando da sua ajuda.

—Sim, senhor. - respondi em forma de respeito, já que, na hierarquia da tripulação, Joseff estava abaixo apenas de John e Finley.

— A tripulação também precisa de sua ajuda, Cedric.

— Voltarei ao trabalho assim que terminar de ajudá-la. - o mestre do navio assentiu e se retirou logo em seguida.

Suspirei com força e enxuguei as lágrimas em meu rosto ainda surpresa com a confissão que acabara de ouvir.

— Ayla...

— Volte ao trabalho, Finley. A tripulação não pode ficar sem um imediato na ausência do capitão! - me movi até a cama e me abaixei para pegar a caixa.

— Obrigada por me encobrir, não consegui pensar rápido o bastante para responder Joseff sem parecer suspeito. - me concentrei no que estava fazendo - Não me ignore, por fav...

— Pedi para ser sincero comigo, e você foi, fico grata por isso. - encarei seus olhos - Mas, não me peça para ser benevolente com o homem que disse ser meu amigo e depois torceu para que eu fosse vendida.

 Sua expressão triste demonstrou um certo nível de arrependimento, mas não fui capaz de perdoá-lo naquele instante.

— Contará a alguém? - suspirei.

— O segredo é unicamente seu, Cedric. Não cabe a mim espalhá-lo! - foi sua vez de suspirar.

— Obrigada, mais uma vez. - falou com receio - E peço que me perdoe, mais uma vez.

— Vá, Cedric! - respondi sem nem ao menos encarar seus olhos.

 Ele saiu do quarto com certa pressa depois de ficar me olhando, mas não me dei o trabalho de retribuir os olhares.

 Quando ele se foi, me sentei no chão por causa da tristeza e das lágrimas que ameaçavam sair de meus olhos.

 É isso que dá confiar em brancos.

 Balancei a cabeça com a intenção de esquecer, temporariamente, as confissões do imediato. Puxei a caixa que John havia falado, peguei as peças de roupa que ele havia comprado pra mim e me vesti ali mesmo.

 Mesmo tendo algumas saias e vestidos, escolhi uma calça justa da cor preta, uma blusa branca e um corset preto que usei por cima da blusa. Calcei as botas, peguei algumas peças para Eva também se trocar e depois saí do quarto trancando a porta.

 Enquanto caminhava de volta para baixo do convés, ouvi o barulho extremamente alto de algo se chocando com o navio e caí pelo impacto forte, poucos segundos depois vi estilhaços de madeira se espalhando pelo ar.

— ESTAMOS SENDO ATACADOS! - Finley gritou de longe - POSIÇÃO DE GUERRA, HOMENS! 




*Relevem os erros, por favor.*

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