Capítulo 8 - Passado
Ps.: Sorteio no final!
Capítulo 8 — Passado
Por mais que eu gostaria de afirmar que me perdi nos braços de Luca, isso não aconteceu. Não por mim, eu teria continuado ali mesmo, entre pneus velhos e carros enferrujados. Luca, por outro lado, tinha alguma veia enraizada de cavalheirismo, vindo de um passado remoto, e se afastou, dizendo que eu merecia mais do que um chão duro e sujo.
Seria romântico, se eu não estivesse louca para arrancar suas roupas. Literalmente. Minhas mãos tinham virado garras durante o nosso beijo e eu só tinha a agradecer por não ter transformado minha boca em focinho. Isso seria muito estranho! Luca, então, limpou uma sujeira em minha bochecha e levantou uma sobrancelha ao notar a mudança em meus braços.
— Tenho uma proposta, cara mia — disse em sua voz sedutora. — Nós dois vamos caçar hoje e depois irei te levar a um lugar especial.
— Isso é um encontro? — questionei.
Geralmente, encontros envolviam jantar em restaurantes chiques, não no meio do mato. Se bem que em nossa condição, seria difícil manter as aparências no momento que eu pedisse algo muito mal passado. Ele apontou para outro carro e pediu que eu levantasse.
— Eu matei o único vampiro que fornecia sangue para mim. — Luca continuou a falar enquanto eu me esforçava para tirar o veículo do chão. Gentilmente, ele não pontuou que matou o amigo porque achou que ele estivesse me atacando. — Não tenho mais ingerido sangue de vampiro há um tempo e sinto minhas forças enfraquecerem.
Consegui levantar o carro e todos os meus músculos tremeram quando eu o ergui acima da minha cabeça. O meu cérebro, então, foi o que mais se rebelou, tentando ignorar a impossibilidade física que era eu fazer aquilo.
— Você poderia beber de mim... — sugeri ao lançar o carro meio metro à frente.
Eu nunca havia bebido uma quantidade substancial de sangue. Apenas algumas gotas de Luca e os animais pequenos sem sorte que cruzaram comigo na forma de loba. Imaginei nós dois nos alimentando um do outro como tinha visto em alguns filmes de vampiro. Não me parecia uma má ideia...
— Não posso arriscar, Tita. — Ele se encostou no carro que eu tinha acabado de arremessar. — Nós não sabemos o efeito do seu sangue em humanos ou em vampiros. E em mim, que sou a mistura dos dois, o resultado pode ser imprevisível.
Cruzei os braços e fiquei ao seu lado, imitando sua posição. A parte científica de mim desejava fazer testes para descobrir o que aconteceria e todas as variações possíveis. No entanto, não poderia fazer tal coisa sem o risco de libertar no mundo um ser sobrenatural forte demais. Luca retirou do bolso um papel dobrado.
— Tenho um trabalhinho e gostaria de saber se você quer ir comigo. — Me passou o papel com a imagem impressa de um homem de cabelos vermelhos arrepiados para cima, pele pálida e magro. Ele usava roupas pretas, com diversas argolas em sua orelha e batom preto. — Um vampiro gótico? Ele poderia ser mais óbvio?
— Um predador. Ele matou uma garota mês passado e como a justiça humana não funciona para pessoas como ele, o pai dela me pagou para resolver o problema.
Era a primeira vez que Luca falava abertamente do seu emprego. "Mercenário pelo preço certo", ele tinha dito. Assassino de aluguel seria o nome mais correto. Eu não tinha me permitido pensar muito sobre esse assunto, mas a facilidade com que Luca matou o amigo sem questionar me causou desconforto. O vampiro gótico era um ser sobrenatural tanto quanto eu. Será que ele não tinha direito a um julgamento e à vida?
Se eu me descontrolasse, Luca me mataria também?
— Por "resolver isso" — fiz aspas com as mãos —, acredito que você esteja se referindo a assassinato, não?
— O que você sugere? Colocá-lo na prisão? Não se iluda, Tita, sou um damphir e é meu dever como mestiço proteger os humanos. Somos carcereiros, júri, juízes e executores de vampiros desde a época dos Bálcãs, tantos séculos atrás. Se eu não fizer isso, quem fará? — Ficou em frente a mim e segurou meu rosto entre suas mãos.
Suspirei, lembrando-me da minha pesquisa na internet. Pessoas como ele viviam perambulando entre os vilarejos, comumente viajando com grupos de ciganos. Ofereciam-se para caçar vampiros em troca de moedas de ouro. Claro que depois foram desacreditados e tratados como charlatões. Os vampiros passaram a ser mito e os mestiços ficaram excluídos da sociedade, nem filhos da noite e nem humanos.
— Como você sabe que o vampiro é realmente mau? — questionei. — E se não foi ele que matou a garota?
Luca sorriu e não havia nada caloroso, era puramente predatório.
— É por isso que tenho uma cela em minha casa. Mas com você ao meu lado, talvez a gente consiga tirar a verdade dele mais rápido.
— E se ele for um assassino? — questionei.
Luca deu de ombros.
— Neste caso, o jantar estará servido e teremos mesa para dois.
*****
Acredite quando eu digo que de todas as possibilidades que eu havia pensado de um encontro romântico com Luca, nenhuma incluía espiar um vampiro gótico. Estávamos a quilômetros de distância, longe o suficiente para que ninguém do bar cheio de seres sobrenaturais conseguisse detectar nossa presença. Para ser sincera, a gente também não conseguia ouvir muita coisa.
Não podíamos arriscar chegar mais perto. A espécie de Luca tinha sido proibida séculos atrás, quando os vampiros cansaram de ser caçados e exterminados em plena luz do dia. Isso já garantiria um passe livre para matá-lo. Somado ao fato dele ser um mercenário, podia supor o quanto Luca não era bem quisto ali.
— Tinha esperança que isso pudesse ser um encontro... — Tentei me fazer confortável entre as telhas.
— E quem disse que não pode ser? — Ele se encaixou atrás de mim e me fez apoiar minhas costas nele. Suas mãos me envolveram, protegendo os meus braços do frio. Luca beijou o meu pescoço. — A primeira parte de um encontro é a conversa. Me diga, cara mia, como foi o seu dia?
Luca sabia perfeitamente bem como havia sido o meu dia. Afinal, além da aula que havia ministrado pela manhã, o resto do meu tempo livre tinha sido com ele.
— Minha mãe está estranha, ela passa a maior parte do tempo no laboratório e até deixou de acompanhar algumas das minhas aulas. Acho que ela está testando o sangue — disse o que vinha rondando minha mente.
Ela sempre me ligava e perguntava se eu estava bem, porém nunca a tinha visto tão ausente. Por um momento, achei que ela pudesse estar com medo de mim, mas duvidava que minha mãe tivesse notado as poucas gotas do sangue que usei para temperar o meu sanduíche.
— Você acha que ela bebeu do frasco também? — Luca perguntou.
Minha respiração ficou presa em meu peito. Será? Nisso eu não havia pensado.
— Como posso saber?
Ele deu de ombros.
— Não sei ao certo, nunca fui humano para provar. Pelo que eu vi, entretanto, o primeiro sinal é um estado de alegria e torpor. Como se fosse a melhor droga do mundo. Depois tem uma melhora na saúde e até um acelerado poder de cura, mas só enquanto o sangue estiver na circulação dela — relatou.
Ótimo, eu tinha apenas que esfaquear minha mãe para ver se ela sangraria! Fechei os olhos, poupando-me da visão distante do nosso alvo e do seu estrelado. Eu estava nessa vida há poucos dias e já me encontrava cansada dela.
— Quantos anos você tem? — Queria saber há quanto tempo ele estava daquele jeito. Escondendo-se das pessoas e vivendo no escuro, espreitando becos.
— Meu espírito deve ter uns trinta anos e meu corpo parou de envelhecer por volta dos vinte e cinco. — Se esquivou de responder. Fez silêncio e eu estiquei o pescoço para trás. Seu rosto estava sério e contemplativo, olhando para o nada.
— Você nunca me disse como nasceu.
Eu não queria pressioná-lo a compartilhar o passado. Mas, Luca havia me prometido respostas quando aceitei ser treinada por ele.
— A minha mãe era uma mulher linda, a mais bonita da cidade. Ao menos, era o que o meu pai dizia. Eles moravam em Nápoles, mas tinham ido a Roma para comemorar o aniversário de casamento. Era noite de ópera, mas enquanto eles assistiam ao teatro, outra pessoa os observava.
— Quem? — O interrompi, ansiosa.
Ele me abraçou mais apertado e apoiou seu queixo em minha cabeça.
— Uma vampira... Uma mulher sem nome que, aparentemente, se ressentia de grávidas. Já que ela nunca poderia ser uma. Ela atacou primeiro o meu pai e o derrubou no chão, fazendo-o bater a cabeça contra a pedra. — Luca respirou fundo, precisando de um tempo para se recompor. — A vampira se alimentou da minha mãe e antes que levasse o seu último sopro de vida, um damphir atravessou seu coração com uma espada de prata e fez com que o sangue dela caísse na boca de minha mãe.
Suspirei, imaginando a cena do pai nocauteado, da mãe desmaiada em um beco e no salvador sanguinário que se tivesse chegado um pouco antes, poderia ter salvado a família inteira.
Ele continuou:
— Matteo, o mestiço, fez com que minha mãe engolisse o máximo de sangue que podia. Ele fez o mesmo com o meu pai. — Luca voltou a se calar e fungou em meu pescoço. — Enquanto a vampira queimava com os primeiros raios de sol, os meus pais se transformaram. Eu nasci na tarde seguinte. Matteo foi com minha família para Nápoles e lá se tornou nosso amigo leal, ensinou meus pais a se alimentar sem matar e tudo ficou bem por alguns anos.
— Até que?
Mais uma vez, o interrompi.
— Até que fomos descobertos. Eu tinha treze anos e Matteo havia decidido me ensinar alguns truques de damphir e me levou para floresta. — Assim como treinava a mim, não precisou acrescentar. — O cheiro de queimado chamou nossa atenção e quando olhamos por cima da copa das árvores, uma rua inteira estava em chamas. Nós corremos o máximo que pudemos e Matteo foi mais rápido, eu o segui, engasgando com a fumaça.
Eu me virei, ignorando o bar que deveríamos estar vigiando e o abracei. Parte de mim sentia que Luca precisava de apoio. Seus braços me envolveram mais apertado, como se eu pudesse protegê-lo daquela lembrança ruim.
— Não precisa contar se não quiser... — sussurrei ao notar a sua voz embargada.
— Faz tanto tempo, Tita! Tanto tempo que não falo sobre isso com alguém. — E apesar de parecer que ele estava determinado a falar, ainda precisou de um tempo em silêncio para finalmente se abrir. — Quando eu finalmente cheguei na minha rua, a minha casa estava tomada pelo fogo. Os gritos... Eu ouvi os gritos da minha mãe. Nunca vou esquecer dos gritos dela. O meu pai já tinha sido silenciado. Matteo lutou, mas eles eram muitos. E tão rápidos! Mais rápidos do que meus pais jamais haviam sido. Matteo se virou para a floresta e me viu na borda dela, congelado de medo. Seus olhos se arregalaram e a última palavra que disse para mim foi "fuja". Uma lança foi atravessada em seu coração e eu fiz exatamente isto: fugi, como um covarde.
Coloquei a mão na boca, contendo o grito que tentou irromper pela minha garganta. Ele estava chorando, lágrimas escorreram por seu rosto e eu beijei o seu peito.
— Você era só uma criança, o que poderia fazer contra vampiros fortes? Seus pais e nem Matteo puderam pará-los — consolei-o. — Foi assim que você veio parar aqui? — perguntei, querendo tirá-lo do humor sombrio.
— Eu corri e me escondi por dias na mata, depois fui pegando carona e fugindo de cidade em cidade. Perdido, roubando para me alimentar. Passando fome e frio. Desde pequeno sempre tive uma dieta de sangue de vampiro. Meus pais mantinham a mim e a Matteo bem alimentados. Minha força começou a cair e eu passei por abstinência, mas eu tinha um objetivo. Matteo sempre foi precavido e todos havíamos memorizado sua rota de fuga para sair da Europa se fosse necessário. Para uma terra longe, do outro lado do oceano, onde se dizia que os deuses haviam deixado uma última dádiva para a humanidade.
Franzi a testa. Era a primeira vez que ouvia algo parecido.
— Uma dádiva?
— Não lembro de todas as antigas histórias, era muito novo e faz muito tempo que as ouvi. Mas sim, um presente dos deuses surgiria aqui no novo continente. Então, eu vim, na esperança de ser abençoado e me salvar. Fiquei desacordado por quase toda a viagem. O que era bom, já que eu estava escondido junto das bagagens. Ratos eram meus companheiros no porão do navio e eu só sobrevivi à viagem porque não era totalmente humano.
De repente, Luca secou o rastro de lágrimas do seu rosto e cerrou a mandíbula, olhando compenetrado para um ponto distante.
— O nosso alvo finalmente apareceu — disse.
Olhei na direção do bar e vi o chamativo cabelo de longe. Sim, era ele. No entanto, antes que pulássemos do telhado, segurei sua jaqueta.
— Você encontrou o que procurava? — questionei. — A tal dádiva dos deuses?
Seu semblante era triste e ele acariciou a minha face com o dorso dos dedos.
— A única dádiva que encontrei aqui foi você, cara mia.
E, então, Luca saltou em busca de sua presa. Depois eu poderia pensar em sua história e nas suas palavras. Naquele momento, tinha uma caçada a executar.
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FELIZ PÁSCOA, MEUS AMORES!
Independente da religião, que sejam abençoadas hoje! Para comemorar a páscoa, vou sortear um kit de mimos.
REGRAS:
1 - Comentar #Omega
2 - Comentar o que quiser, quantas vezes quiser. Cada comentário vale um ponto
3 - Colocar Alfa e Omega na lista de leitura
4 - Marcar amigos (para marcar basta colocar o @eonickdapessoa (cada amigo vale 5 pontos)
5 - Residir no Brasil!
Boa sorte!
O sorteio será realizado na próxima postagem.
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