Capítulo 15
- Arthur tem que ficar bom logo pra vim aqui - digo enquanto eu e Lorenzo jogávamos totó.
- Nem precisa pedir para o dono - Enzo diz soltando uma risada e revirando os olhos.
- Ele é legal. Tenho certeza que vai deixar - também digo sorrindo, mas sem tirar a minha atenção do jogo - GOL! - grito animada por fazer mais um ponto - 15 à 9 - digo com um sorriso vitorioso.
- Eu deixei você ganhar - ele cruza os braços.
- Não precisa dar desculpas, meu amor - dou a volta no jogo, rodo meu braço nos ombros de Enzo e deito minha cabeça na curva de seu pescoço.
- Aiai... - ele suspira forçado e sorri no final.
- Bom. O papo está muito bom e já ganhei de você na maioria desses jogos. Agora, infelizmente, preciso voltar pra casa, dormir e poder encontrar Arthur amanhã.
- E que tal você dormir aqui e amanhã cedo nos encontramos com ele. Afinal, ele receberá alta amanhã, certo?
- Certo.
- Então? - Penso por um estante. É mil vezes melhor do que voltar pra casa.
- Ok... - Enzo abre o sorriso - Mas - levanto meu dedo indicador - Não será no seu quarto - dito isso, ele cai na gargalhada.
- Quarto é o que não falta aqui, meu amor.
- Mas preciso ligar para a minha tia primeiro - estendo a minha mão e ele me passa seu iphone - Obrigada - digito o número - Tia. Vou dormir na casa de um amigo. Ok? - digo de uma vez.
- Ok meu amor.
- E eu não estou nem aí... "Meu amor"? - começo já com o meu discurso de menina rebelde, porém, reparo melhor em sua fala e repito com uma careta, para ver se eu escutei corretamente.
- O quê? Não gosta? - ela estava com uma voz doce até demais.
- Você nunca me chamou assim.
- Não posso mudar? - eu ia responder, entretanto, ela foi mais rápida - Preciso ir. Divirta-se.
- Mas...
- Tchau - ela desliga.
- Então? - Enzo diz com uma cara esperançosa.
- Vou ficar - eu ainda estava absorvendo o que foi dito na conversa.
- Perfeito! - ele sorri - Minha mãe vai chegar daqui a pouco. Está com fome?
- Para falar a verdade, sim - saio do meu estado catatônico.
- Então vem. Vou aproveitar para te mostrar as minhas artes culinárias.
- Quero só ver, ou melhor, experimentar - descemos para a sua cozinha e o vejo pegar e lavar os ingredientes - Você tem quantas cozinhas? - pergunto encabulada, por essa não ser a mesma que fui antes.
- Eu prefiro essa pra cozinhar - ele diz como se não fosse nada demais.
- Só falta você me dizer que tem uma sauna aqui - ele me lança um sorriso - Você tem!?
- Minha mãe gosta - ele fica de costas pra mim.
- Não me espanto mais com nada em relação a você - rio - Então? O que vai fazer? - me apoio com as mãos cruzadas na bancada de granito e fico na ponta dos pés, tentando saber o que ele está fazendo.
- Macarronada vegetariana - faço careta.
- Tem que ser vegetariana...? - inclino um pouco a minha cabeça.
- Minha mãe não come carne.
- Por falar nisso... Não é possível que seja apenas você e sua mãe aqui.
- Não. Tem os empregados...
- E cadê eles?
- Clara está no quarto e os outros eu dei o dia de folga - ele sorri e eu faço cara de peixe morto.
- Quê...?
- O quê? - ele finge de desentendido e eu prefiro ignorar.
- Que seja. É você quem vai cozinhar mesmo... - esboço um sorriso travesso.
- Nananinanão - ele segura o meu pulso de leve - Você vai ser a minha ajudante.
- Ninguém mandou querer ficar com a casa toda para si e ser independente, agora aguente - empino o nariz - Além do mais, não sei cozinhar - ele ri.
- Nunca é tarde para aprender.
- Se ficar ruim, não será culpa minha - levanto as palmas das mãos.
- Não vai - ele sorri, me solta, termina de colocar os ingredientes na bancada e foi lavar as mãos.
- Me explica uma coisa - ele faz um som com a garganta, em sinal para eu prosseguir - Se vocês têm cozinheiros, como sabe cozinhar? Pensei que você nem pisaria em uma cozinha.
- Eu queria ser independente. E se alguma vez eu quisesse morar sozinho, iria precisar saber fritar pelo menos um ovo. Então, eu ficava observando Simão, o cozinheiro, cozinhar.
- Entendi...
- Você pica os legumes e as verduras - abro a boca para protestar - Não vai me dizer que nem isso sabe?
- Então não digo - ele acaba gargalhando - Não sabe que faca é perigoso? Sou procurada pela polícia por causa da última vez - ele continua a rir.
- Será que tem recompensa? - ele estreita os seus olhos.
- Vai me entregar? Então, acho melhor eu não deixar pontas soltas... - lanço um olhar mortal em sua direção.
- O que pretende fazer comigo? - ele se aproxima mais de mim.
- Você será meu escravo - sorrio malandramente - Você vai ter que cozinhar para mim todos os dias, me fazer massagens... essas coisas.
- Já aviso que posso ser bem rebelde.
- Te aconselho a não me contrariar.
- Você sabe ser bem sombria.
- Por isso. Não me contrarie - sustento o meu olhar no seu - Então, vai querer mesmo me entregar uma faca? - mudo meu tom e me afasto.
- Vou correr o risco. Você terá a mim - Enzo sorri e pega uma tábua de madeira e põe na bancada - Porém, primeiro, lavar as mãos. Higiene é super importante - acabo soltando uma risada envergonhada.
- Claro! - lavo e volto para a minha posição de antes.
- Agora... - ele fica atrás de mim, sua respiração me fazendo cócegas na nuca. Sinto sua mão direita pegar na minha, enquanto que a outra, era mantida em cima da esquerda, apoiada ao lado da tábua - Assim - ele diz suave em meu ouvido. Meu coração acelerou, me deixando apavorada dele conseguir escutá-lo.
- Entendi. Obrigada - me afasto rapidamente, quebrando o clima. Mantenho meu olhar longe do dele e foco apenas em não cortar o meu dedo.
Enzo parece meio constrangido no começo, no entanto, ele volta a relaxar no decorrer que fazia outras coisas. Me deixando até mais aliviada. Então, prefiro nem cortar o silêncio.
- Pode diminuir mais nos tamanhos - Enzo pega uma cenoura e dá uma mordida, me deixando com uma cara bastante surpresa - Você vive em que planeta?
Novamente o flashback:
Você vive em que planeta?
- No mesmo que o seu, porém, em outra dimensão.
- Amora!? - pisco demoradamente ao ouvir a voz de Lorenzo, me fazendo desequilibrar, e se não fosse por seus braços, eu teria ido de encontro ao chão - Caramba! - olho para as minhas mãos e vejo que cortei meu dedo anelar - Você está bem!?
- Eu? Han...
- Vem cá. Vamos lavar isso - ele me leva até a pia e liga a torneira, deixando a água fria tirar o excesso de sangue.
- Tem água oxigenada? - acordo de vez e presto atenção no que está acontecendo ao meu redor.
- Vou pegar - ele, com receio, me deixa sozinha com os meus pensamentos e, quando voltou, trouxe uma maleta de primeiros socorros.
- A água oxigenada vai limpar qualquer sujeira que estiver lá dentro - ele me entrega e eu jogo no meu dedo.
- O que aconteceu?
- Minha pressão deve ter caído. Só isso - ao terminar de limpar, passo pomada e tampo com o esparadrapo - Então? - mostro o curativo e sorrio.
- Do jeito que você faz, até parece que tem experiência - ele ri - E te conhecendo como eu te conheço, sei que não é a primeira vez.
- Nem a segunda - solto um riso pelo nariz.
- Eu termino de preparar o jantar. Já está quase pronto - Enzo me leva até a bancada, puxa o banco pra mim e sorri.
- Que cavalheiro... - digo ao me sentar.
- Eu sempre sou - ele pisca e beija minha mão onde machuquei, fazendo eu ruborescer.
Ele continuou a cozinhar, mas agora, cantando, arrancada várias risadas minhas. E ao terminar, decido arrumar a mesa, mesmo ele dizendo que não precisava.
Mas sério, desde quando eu recebo ordens?
E como se fosse contado no relógio, assim que terminamos tudo, a mãe de Lorenzo chega.
- Lorenzo, cheguei! - ouvimos sua voz vinda da sala de entrada, então, fomos ao seu encontro.
Me deparo com uma mulher idêntica ao Enzo. O mesmo preto de cabelo, porém, o dela batia na cintura, os mesmos olhos azuis escuro e até as mesmas sardas.
- Olá, mãe. Como foi de trabalho? - Enzo não perde tempo e a recebe com um abraço.
- Foi cansativo. Mas produtivo - ela sorri.
- Mãe, temos visita - Enzo me puxa para mais perto - Essa é Amora - Enzo abre mais o sorriso.
- Prazer - sorrio e levanto a minha mão para cumprimentá-la. No entanto, ela não aperta a minha mão e sim me abraça. Levo um tempo para entender o que estava acontecendo, não sou muito desse gesto...
- Prazer, Viviane - ela sorri amigavelmente. Vejo que ficou um pouco sem graça por eu não ter retribuído, mas compreende e ignora - Enzo fala muito de você - Ela entrega o filho, me fazendo rir.
- Espero que só coisas boas - dou um empurrãozinho de leve no braço dele.
- Não tem o que falar de mal - ele sorri, me fazendo ficar envergonhada.
- Bom. Vou tomar banho e depois jantamos, pode ser? - eu e Enzo assentimos juntos - Não demoro. Clara! - Viviane grita e logo aparece uma senhorinha com o cabelo vermelho em um coque. As duas cochicham algo e depois Viviane sobe as escadas.
- Olá. Desculpe não te cumprimentar antes - Clara lança um olhar repreendedor para Enzo antes de sorrir genuinamente para mim.
- Sem problemas - retribuo o sorriso.
- Agora, se me deem licença - ela faz uma mini reverência - Preciso ir - ela novamente sorri e entra em algum corredor.
- Quem era? - espero ela sair do nosso campo de visão e pergunto para Enzo.
- A governanta.
- Sabe? - mudo de assunto - Se eu não estivesse aqui, vendo com os meus próprios olhos. Eu nunca que ia acreditar que você é rico - ele ri e se joga no sofá.
- Já falei que é a minha mãe - dá uma pausa - Mas..., isso é bom?
- É mais que bom. Você não é um daqueles playboyzinhos nojentos de nariz em pé - também me jogo no sofá ao lado dele - Sabe até cozinhar!
- Vou encarar como um elogio - ele deita a cabeça no encosto do sofá e fixa o seu olhar no lustre.
- Cara. É um elogio! - faço o mesmo gesto seu.
- É sempre bom confirmar - bufo.
- Então quer dizer que você fala de mim para a sua mãe...? - o provoco.
- Sim. Eu digo que você só vai me levar para o mal caminho - jogo uma almofada nele.
- Idiota. Que mentira! - ele gargalha.
- É a mais pura verdade - Enzo joga a almofada de volta em mim.
- Então vai querer se afastar de mim? - jogo novamente, mas agora fico de pé e cruzo os braços numa tentativa de ficar séria.
- Isso nunca - Lorenzo se levanta, nossas testas quase encostando uma na outra.
E novamente o flashback do garoto. Nossas testas quase encostando uma na outra.
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