Capítulo 2
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Sr. Veríssimo voltou a se sentar na ponta da mesa, enquanto Liz sentava do seu lado direito e o Thiago a esquerda do chefe. Eles não haviam conversado ainda, apenas trocaram apertos de mão e agora se olhavam por cima de suas xícaras. Já estava tarde e eles precisavam realizar a reunião o mais rápido possível.
Thiago estava com uma aparência diferente do esperado. Liz esperava ver o amigo entrando pela porta com um bronzeado saudável, um sorriso no rosto, cabelos e barbas bem cuidados e sem o odor de cigarro. Mas ele parecia tão acabado quanto a perita. Talvez o paranormal e os dias na UTI tenham o afetado mais do que deveria. Não parecia o mesmo Thiago que costumava conhecer. Algo nisso deixava Liz triste e levemente irritada.
O jornalista também estava surpreso com a aparência de Liz. As olheiras eram novas em seu rosto, seu cabelo estava um pouco mais comprido e a franja tapava seus olhos, mas mesmo assim continuava cheia de confiança. A garota lutou dia após dia para não se deixar levar pelo luto e pela solidão. Não queria passar a imagem de desleixada, então se cuidava até onde conseguia. Infelizmente, suas olheiras já eram tão profundas que não dava para se cobrir com maquiagem de forma sutil. Preferia apenas aceitar que isso fazia parte de seu visual. Torcia para as pessoas as interpretarem como algo digno de uma mulher trabalhadora.
-Jovens, os convoco aqui para mais uma missão.
-Escuta Sr. Veríssimo. Eu não sei se estou apto para o serviço e não sei se quero me envolver com toda essa coisa de paranormal- Interrompe Thiago balançando a cabeça.
-Mas dessa vez é diferente. Talvez seja divertido para vocês.
-Divertido?- Thiago quase cospe o café- Eu não chamaria a experiência de quase morte de divertido.
-Não vou enviá-los a uma missão perigosa. Não antes de passar pelo que vou explicar agora- O senhor olha do Thiago para a Liz e volta a tomar seu café frio- Como vocês sabem, tivemos uma perda em nossa última missão. Não dá para enviar apenas vocês dois para combater criaturas. Creio que acabariam mortos nos primeiros minutos de batalha. Não estou duvidando do potencial de vocês, mas existem monstros muito piores e mais fortes do que os que vocês viram.
-Aonde você quer chegar com isso?- Pergunta Liz inclinando- se sobre a mesa. Ela sente o olhar de Thiago nela.
-Bem, quero dizer que chamamos mais pessoas para a Ordem. Mais pessoas aceitaram fazer parte do nosso grupo.
-Com todo respeito, mas você não poderia ter dito isso por E-mail? Eu tive que atravessar a cidade para vir aqui- Nessa parte Liz concordava com Thiago. Não era possível que o chefe da Ordem tenha feito os dois saírem de casa apenas para dizer que haveria um novo grupo de investigadores paranormais. Ela não queria ter contido toda aquela ansiedade em vão.
-Não vim aqui para contar algo a vocês. Chamei-os aqui para fazer um convite.
-Convite? Vai ter festa de comemoração de "50 anos combatendo o paranormal e deixando jovens morrerem em missões em troca de uma membrana intacta"?- Thiago diz abrindo um sorrisinho de lado. Dava para ver que ele não estava levando aquela situação a sério e parecia não querer estar ali.
-Não é uma má ideia, mas não é isso Sr. Fritz. Entendo que está nervoso, mas se me deixar falar as coisas vão andar mais rápido- Sr. Veríssimo troca olhares com Thiago que joga o corpo para trás e cruza os braços- Bom, como eu estava dizendo, estou aqui para convidá-los para treinar o novo grupo de investigadores. Preciso que preparem o psicológico deles e vejam quais estão aptos para prosseguir. Depois, vem o treinamento com armas.
-Tudo bem, mas porque escolheu a gente?- Pergunta Liz apontando para seu peito e depois para o de seu colega. O olhar caramelo do jornalista se ergue para a figura confiante de Liz. Sua pele branca brilhava com a luz que entrava da janela.
-A Srta. Weber demonstrou lealdade à missão e aos parceiros. Mesmo quando corria risco de vida, garantiu que seu amigo desmaiado chegasse em casa com vida. Sua dedicação unida a esperteza do Thiago fazem de vocês uma boa dupla. E os novos membros vão para as próximas investigações com vocês. Nada é mais justo do que deixa-los escolherem quem vai lutar ao lado dos dois.
-Eu não sei se quero participar dessa palhaçada- Fala Thiago negando com a cabeça. Ele ainda tinha os braços cruzados junto ao corpo. Liz repara que o rapaz estava mais magro do que quando se conheceram e parecia desaparecer dentro do moletom.
-Se precisar de mais tempo Sr. Fritz, eu entendo. Mas creio que não...
-Pra mim chega. Eu não quero escolher mais pessoas para participar dessa merda. Eu vi meus amigos morrerem e não quero que mais pessoas passem por isso. Colocar jovens cheios de sonho nessa Ordem é impedirem eles de sonharem- Thiago bate os punhos na mesa e se levanta. Caminha até o elevador, mas desiste de esperar, decidindo seguir pelas escadas. Sr. Veríssimo tenta chama-lo de volta para a mesa, mas Liz o impede.
-Deixa que eu converso com ele- Então sai correndo para as escadas. O Thiago que ela havia conhecido era diferente daquele que tinha surtado na sala. O Thiago que conhecia era determinado, saudável, cheio de vida e engraçadinho. Liz estava enganada ao pensar que a vida dele estava perfeita enquanto ela se afundava na solidão de sua casa- Thiago! Espera!
-Liz?- O rapaz, que já estava no segundo lance de escadas, olha para trás e encontra a figura descabelada de Elizabeth. Suor se acumulava em suas têmporas e ela ofegava.
-Espera! Você não pode ir- Ela finalmente alcança o amigo e se apoia nos joelhos para recuperar o fôlego. Estava ficando sedentária com o tempo que ficou em casa- Não pode me largar sozinha nessa.
-Liz, eu não vou embarcar nessa loucura para ver gente morrendo.
-Você sabe que ignorar o problema não vai fazê-lo desaparecer- Agora a perita se via frente a frente com Thiago. De perto, ela conseguia analisar seus olhos cor de mel que estavam profundos e sentia o leve cheiro de cigarro agarrado ao seu moletom. Pela sua aparência, ele deve ter mergulhado em seus vícios novamente- Mesmo que a gente resolva não treinar os novatos, eles vão manda-los combater o paranormal. Se formos, teremos a chance de salvar os que não estão aptos para a tarefa ou treinar aqueles que querem para não serem eliminados com facilidade.
-Isso é ridículo. Isso é suicídio!
-Escuta. Eu sei que sua cabeça não está boa depois de tudo que a gente passou, mas não é só a sua que está pirando. A minha também. E tenho lutado todo dia para voltar ao normal. Mas eu reparei que não tem como. Não dá pra viver sabendo que existem essas criaturas soltas por ai. O paranormal sempre me atrai. E por mais que mexa com nossas cabeças e faça a alma doer, precisamos enfrentar. Acho melhor enfrentar isso de frente do que ficar em casa se entupindo de cigarro.
Thiago não responde. Apenas encara os degraus daquele local abafado enquanto tenta conter a vontade de fumar. Situações estressantes tem lhe causado uma ansiedade muito grande que só conseguia conter com um cigarro.
-Eu não vou deixar você voltar para casa para ficar largado no sofá apodrecendo. Nós passamos por coisas terríveis juntos, então não é agora que devemos abandonar um ao outro. Eu prefiro morrer a voltar para minha casa sozinha com toda a angústia.
-A gente só pode estar ficando doido- Thiago passa mão pelos cabelos grandes e sem corte.
-Qual é?- Liz segura seus ombros fazendo seus olhares finalmente se encontrarem- Nós fomos corajosos uma vez. Não é agora que vamos amarelar, é? E você sabe que não tem outra saída.
Os dois se encaram por um tempo. Liz consegue perceber como Thiago está perdido apenas pela forma que ele a encara. Não era o mesmo olhar corajoso de antes. E Thiago percebe o medo no olhar de Liz. Sabia que a amiga estava sendo forte e a odiava por ser assim. Talvez se os dois desistissem, Sr. Veríssimo os deixassem em paz, mas sabia que não seria tão fácil assim.
-Tudo bem. Eu posso tentar.
-Beleza- Liz o solta e sobe um degrau- Pode ir. Eu vou falar para o Sr. Veríssimo que vamos aceitar o convite.
Thiago assente e enfia as mãos nos bolsos. Estava louco para chegar ao lado de fora para acender um cigarro, mas sabia que isso iria demorar um pouco, já que a sala de reunião ficava no sétimo andar do prédio.
-Thiago?- Liz o chama novamente. Ele já havia descido cinco degraus, mas se vira para ver o que a perita tinha a dizer. Seus cabelos negros estavam grudados na testa pelo suor, mas mesmo assim ela conseguia ser bonita.
-Sim?
-Corta esse cabelo.
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