Minha triste vida - pt.1
Horas antes...
"Está tudo bem aqui, mas volto mês que vem. Estou sentindo muita saudade de você, seu cheiro, seu corpo no meu."
Dou uma risada, ouvindo as palavras carinhosas ao telefone. "Também sinto sua falta. Mas tenho que ir para aula de violoncelo, conversamos mais tarde, já estou atrasado!"
"Tudo bem, meu amor. Te ligo antes de fazer o turno noturno. Te amo!"
"Te amo também." Desconecto a ligação com um sorriso no rosto, sentindo uma mistura de saudade e determinação. A vida continua mesmo quando os corações estão distantes.
Entro no carro onde o motorista me espera. O trânsito está caótico, um reflexo da véspera de Natal em Palmas. As ruas estão iluminadas com decorações festivas, as pessoas andam apressadas, carregando sacolas com presentes, e o clima é de celebração e correria. As luzes piscando e as vitrines decoradas criam uma atmosfera de expectativa e agitação que parece quase palpável.
"Senhor Schimutz, chegamos. Boa aula!" – diz Rogério, o motorista, enquanto o carro para em frente ao prédio onde tenho minha aula.
"Rogério, não precisa me esperar. Vou dar uma passada na casa de meu pai, não precisa se preocupar. Vou andando!" – respondo, tentando soar mais confiante do que realmente me sinto.
"Tem certeza, garoto?" – Rogério pergunta, com um tom de preocupação genuína.
Confirmo com um gesto afirmativo da cabeça, tentando transmitir que está tudo sob controle. "Sim, tenho certeza. Obrigado."
Saio do carro e fecho a porta atrás de mim. O frio da manhã de Natal parece uma pitada de realidade no meio da festividade. Meus pensamentos se voltam para o que está por vir, misturados com um pouco de apreensão.
Enquanto caminho em direção ao prédio da aula de violoncelo, não posso deixar de refletir sobre a importância dessa aula para mim. É um refúgio, um espaço onde posso canalizar minhas emoções e me conectar com a música. Sinto que, apesar do caos exterior, a música me oferece um momento de tranquilidade e foco, uma pausa na confusão das festividades.
O trânsito e a agitação das ruas contrastam fortemente com a serenidade que espero encontrar na aula. Sinto uma pontada de nostalgia ao pensar em como as coisas eram diferentes antes, quando os momentos simples pareciam mais fáceis de serem vividos. Mas, ao mesmo tempo, há uma sensação de determinação. Cada passo que dou é um lembrete de que estou buscando algo maior, algo que me permitirá enfrentar os desafios e encontrar um equilíbrio entre o caos e a calma.
Chego ao prédio e olho para o meu reflexo nas portas de vidro. Ajusto minha roupa e dou um último suspiro de preparação. É hora de me concentrar na aula e me permitir um momento de paz em meio à agitação do mundo exterior.
•••
Minutos antes...
"Vamos ver se conseguimos voltar com as aulas no começo do ano. Assim não perdemos tanto tempo." – Filipe me diz enquanto me leva até a saída de seu prédio.
"Okay, só que a próxima aula pode ser na minha casa, se estiver tudo bem por você?"
"Ah, tudo bem. Percebi seu grande avanço. Meus parabéns!"
"Obrigado. Te agradeço por deixar meu violoncelo aqui. Vou andando hoje..."
"Não precisa, vou te levar. Pego a chave do carro rapidinho..."
"Não precisa, vou para a casa do meu pai. Volto para casa só amanhã!"
Ele sorri. "Tchau."
"Até mais!"
Exato momento...
Caminho até o centro de Palmas para comprar uma bebida para levar para a ceia que haverá na casa do meu pai. O trânsito continua caótico, com as pessoas apressadas em busca dos últimos preparativos para as festividades. Ao sair da loja de conveniência, sou abordado por um homem que pede dinheiro. Dou alguns centavos e continuo pela calçada, respondendo mensagens de Gael e de minha mãe.
"Não, mãe, estou indo para a casa do meu pai. Gael chega amanhã, estarei em casa!" – envio um áudio explicativo.
Enquanto respondo, me esbarro em um garoto. Ele usa uma blusa xadrez azul e tem uma tatuagem no antebraço esquerdo, com uma escrita em cursivo. Seus olhos azuis e o porte físico bem trabalhado chamam minha atenção.
"Me desculpe..." – falo, olhando para ele.
"Está tudo bem..." – ele responde, seguindo seu caminho.
Começa a pingar algumas gotas de chuva, e o céu está escurecendo. Entro em uma rua, faltando pouco para chegar ao prédio onde o Doutor Miguel Schimutz, o renomado advogado de Palmas, mora.
"Oi, garoto, vem sempre aqui?"
Penso que poderia ser algum conhecido, mas quando me viro, não vejo ninguém. Continuo andando tranquilamente, mas um quarteirão e estarei no prédio de meu pai.
A mesma voz me chama pelo nome, e eu aumento os passos.
"Não fuja de mim, não."
Dou de cara com um homem grandão, seus músculos saltando da blusa de manga. Seus cabelos são grisalhos, e ele aparenta ser de meia-idade.
"Calma, está correndo de quê?"
"Pensei estar sendo seguido por alguém... Pode me dar licença? Preciso ir a chuva vai engrossar..."
"Calma, não vou te fazer nenhum mal. Posso te acompanhar até sua casa?"
"Não vou para casa!"
"Vai para onde? Se não estiver me entremetendo muito?"
"Me dê licença, por favor!"
"Deixa o garoto passar, Tiago!" – diz outro homem que se aproxima.
Ele é loiro, alto, usa cavanhaque, uma blusa cinza escuro e calça jeans clara.
Ele toca meu ombro e sorri para mim. "Ele está com medo..."
"Não estou com medo, só quero ir embora!"
O fortão chamado Tiago pega minha sacola com a bebida que comprei.
"Vodca, você bebe, garoto? Deve ser de menor."
Não respondo.
De longe, vejo dois caras sentados em uma cadeira na porta de um bar simples. Um deles ergue o copo meio cheio de cerveja para mim, enquanto o outro, usando xadrez e óculos, está encolhido no canto.
"O que vocês querem comigo?"
O fortão bica a vodca, fazendo uma cara fechada. "Gostosa! Você deve ter pago uma fortuna nessa vodca."
O homem do bar confirma com a cabeça.
Foi quando o homem loiro me atacou. Ele tampou minha boca e nariz com um pano branco, e a sensação de pânico começou a tomar conta de mim. O mundo ao redor ficou turvo e, enquanto a escuridão me envolvia, a última coisa que ouvi foram os sons abafados das ruas e dos carros passando, antes que tudo se apagasse.
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