Ela
Oi gente, esse capítulos e os posteriores não haviam sido postados antes. Por favor, deixem muito amor nos comentários para eu continuar animada escrevendo srsrs
A busca por um emprego era cruel. Todos os dias eu acordava, vestia algo apresentável, passava blush na bochecha, um batom rosado nos meus lábios para melhorar a minha aparência que ultimamente não era a das melhores.
Eu ia pessoalmente entregar os meus currículos. Acordava cedo e ia no primeiro ônibus até a cidade, comprava os classificados na banca da praça e fazia uma seleção dos melhores empregos para mim, aqueles que se pareciam mais comigo. Era sempre o mesmo desafio. As pessoas percebiam que eu não tinha uma perna e achavam que por isso eu era incapaz de trabalhar em uma loja, ou ficar em pé no caixa o dia inteiro. É claro que seria difícil, mas eu me esforçaria, daria o meu melhor.
Depois de semanas recebendo olhares e tons de vozes carregados de desdém, passando por situações constrangedoras, tendo que responder perguntas ofensivas e invasivas, contando apenas com o dinheiro da passagem do ônibus e tendo que se decidir entre comer um mísero salgado ou voltar a pé pra casa, finalmente Deus se lembrou de mim e me arranjou um emprego em uma cafeteria no shopping.
O horário até que era bom, das 16:00 às 22:00 horas, minha mãe não ficou muito contente com isso, ela queria que eu trabalhasse de manhã, mas ignorei seus comentários e foquei no fato de que eu não teria registro durante seis meses, assim eu continuaria recebendo o seguro desemprego. Cláudio, o dono da cafeteria, havia sido bem generoso comigo nessa parte, mesmo sendo um pouco ranzinza e um tanto mal-educado, mas ele sabia que ter uma funcionária não registrada era bem vantajoso.
Na cafeteria eu era garçonete ao invés de operadora de caixa. O que era bem difícil, confesso. Ter que me movimentar de um lado para o outro durante seis horas era complicado, porque eu não estava acostumada a andar tanto. No primeiro dia fui treinada por Jessica, uma funcionária mais velha. Ela tinha trinta e dois anos, era mãe de três filhos pequenos que ela sustentava sozinha sem a ajuda de ninguém. O marido a abandonara para ficar com outra mulher e alegou na justiça de que não poderia pagar pensão. Parece absurdo, mas o juiz acatou a decisão dele e permitiu que ele não pagasse nada a Jessica e os seus filhos, até que ele conseguisse um emprego, já que fazia dois anos que ele estava desempregado e nenhum emprego ou bico a vista. Dois anos se passaram desde que o juiz tomou aquela decisão e assim as coisas permaneceram. O ex-marido de Jessica nunca conseguiu um emprego.
— Ele está envolvido com drogas. Eu sei que está — ela disse enquanto me ensinava como anotar os pedidos corretamente e a servir as mesas do lado certo. Eu achei estranho o fato de Jessica ser tão aberta. Eu era uma estranha para ela, e mesmo assim ela jogou em mim várias informações da sua vida, sendo que eu no máximo forcei um sorriso quando o Cláudio a apresentara para mim.
— Você é solteira? — ela inquiriu e eu meneei a cabeça. — Pois faz bem. Continue assim. Homem nenhum presta. Aquele traste do Gael me trocou por uma novinha quando eu estava grávida do meu terceiro filho. Pode uma coisa dessas? E ele se recusa a pagar pensão. Ele diz que não tem dinheiro. Ele sempre diz que está sem grana. Mas ele alugou uma casa chiquérrima na cidade jardim. Comprou um Jeep, e um Argo para a mulher dele. E tem a cara de pau de dizer que não tem dinheiro? Mas deixa ele, eu já procurei o meu advogado.
Enquanto ela tagarelava sobre o ex eu apenas assentia e emitia sons inaudíveis algumas vezes. Não que ela me irritasse ou algo do tipo, mas eu não queria conversar. Eu queria aprender o serviço, provar que eu era capaz para o Cláudio — porque quem sabe assim ele me coloca no caixa? — Servir os poucos clientes em paz e assim respirar o som do silêncio que costumava me rodear quando eu trabalhava no mercado.
A cafeteria era pequena. Tinha apenas quatro mesas à direita e o balcão de bolos e doces em frente à esquerda. E atrás do balcão a cozinha e uma sala para os funcionários. Mesmo sendo minúscula, era um lugar bem frequentado. Para se ter uma noção alguns clientes se sentavam no balcão para esperar uma mesa ou até mesmo já eram servidos ali de tanta a pressa e a fome que sentiam ao ver o bolo de Nutella da Luzia — a confeiteira —. Não demorou muito para eu perceber o nível de clientela que cafeteria tinha. O preço dos doces e bolos já denunciavam que quem consumia ali uma mísera fatia de bolo red velvet pagava em torno de vinte reais. Eram pessoas da classe média alta. Pessoas que se vestiam bem e que exalavam um perfume caro. Pelo porte dos homens que frequentavam aquele lugar não demorou muito para que Max voltasse com tudo para os meus pensamentos. Mas logo eu o afastei, porque era inútil ficar pensando em um cara que estava no topo da pirâmide e com uma plaquinha de impossível para você, Natasha.
— O que aconteceu com a sua perna? — Jessica perguntou de maneira súbita quando o expediente já havia encerrado e estávamos lavando louça para depois irmos embora.
Aquela pergunta era tão inconveniente. Tão invasiva. Senti-me tentada a dizer algumas poucas e boas palavras para ela, mas respirei fundo e engoli em seco. Eu era a garota nova e não podia fazer inimigos no primeiro dia de trabalho.
— Eu fui atropelada — falei evitando olhar no rosto dela, não queria que ela visse o quão furiosa eu estava, mas pelo tom da minha voz acredito que ela percebeu, pois encolheu os ombros desconfortável.
— Ah... Que coisa, né? — ela falou sem jeito.
— É — concordei. — Ele passou com o carro em cima de mim. Minha perna saiu na hora. Não teve jeito.
— E o que aconteceu com o motorista? Ele foi preso?
— Não. Não aconteceu nada com ele. Nem um arranhão, tanto na hora do acidente quanto na hora de receber uma sentença. — Minha voz saiu tão rancorosa. Eu não conseguia me conformar com o fato de que ele nunca pagou por ter roubado a minha vida.
— Que filho da mãe!
— Sim — concordei. — O filho da mãe não foi preso. Não aconteceu nada com ele.
Ela me olhou de um jeito estranho depois perguntou:
— Você conhece ele?
— Não — eu falei, eu não sabia nada sobre ele. Quando acordei minha mãe me poupou dos detalhes do processo. E de certa forma eu abandonei a ideia de um dia vê-lo frente a frente.
— Você não sabe nem o nome dele?
— Não — eu disse segurando um pano de prato. Talvez a minha mãe tenha falado o nome dele uma vez, mas eu não me lembrava, e nunca mais perguntei também.
— Se fosse eu no seu lugar teria matado esse merdinha! O que você diria pra ele se um dia vocês ficassem de cara um para o outro?
Eu abandonei o pano na pia e encarei a minha prótese. Tudo foi arruinado depois do acidente. Tudo foi destruído. E eu sabia que nunca mais iria ser a Natasha de antes. Você sabe o que é saber que o seu sonho nunca vai se realizar? Sabe o que é acordar todos os dias e saber que você nunca mais vai poder fazer aquilo que mais ama e que mais gosta de fazer na vida?
Eu fiquei em silêncio e não respondi a pergunta de Jéssica, pois aquela era a resposta para a pergunta dela. Se um dia Deus permitisse que eu conhecesse o meu atropelador, eu não diria nada. Nenhuma palavra conseguiria expressar o que eu sinto.
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