Imperecível
Segui sem rumo pelas ruas por horas, tanto que nem notei quando escureceu. Eu só queria acordar daquele pesadelo, porque, obviamente, devia ser um sonho muito ruim. Não era possível, que, de fato, tinha perdido o amor da minha vida para sempre.
Não podia ser definitivo, eu sentia do fundo do meu coração que Hinata ainda me amava. Por que estava fazendo aquilo comigo, conosco?
Era tão surreal saber que não mais a sentiria em meus braços, que nunca mais apreciaria a sensação de ter seus lábios nos meus, muito menos teria o calor de seu corpo para me aquecer nas noites frias. Assim como ela fazia, quando dormíamos na mesma cama.
Eu só queria voltar atrás, para o dia em que ficamos em minha casa enquanto nevava lá fora. Aqueles dias foram tão perfeitos, nos beijamos pela primeira vez, eu aprendi o que era amar... Por que tudo não podia voltar a ser como antes?
Lágrimas lavavam meu rosto e minha alma, enquanto eu dirigia sem rumo. Até que decidi parar em um barzinho de cultura brasileira, eu sempre frequentava esse tipo de bar quando morava no Brasil. Tinha acostumado àquele tipo de cultura. Assim sendo, estacionei o carro, limpei o rosto com o dorso da mão e desci. Eu iria encher a cara, não havia nada mais que eu pudesse fazer.
Cumprimentei a atendente, com meu português carregado de sotaque e ela me sorriu grande. Na real, eu poderia me passar perfeitamente por um brasileiro, para qualquer desavisado. Era só não abrir a boca. Porque não tinha conseguido perder o sotaque durante esses anos que morei fora.
Sentei e pedi uma caipirinha, notando olhares curiosos de várias mulheres em mim. Ignorei todas, só queria curtir a minha fossa. O local possuía dois ambientes, eu estava onde dispunha de um karaokê; inclusive, algumas pessoas cantavam desafinadamente, músicas que eu aprendi como o ritmo sertanejo. Até gostava, eu tinha um vizinho, aliás, que só ouvia esse tipo de música. Consequentemente, decorei algumas na marra.
Passei os olhos ao redor, observando diversos casais namorarem naquela luz fraca, enquanto eu sofria. Respirei fundo e vi a mesma atendente trazer meu pedido, agradeci em português e ela sorriu novamente, me dando uma piscadinha antes de ir embora.
Sorri de volta, só por obrigação e virei a caipirinha de uma vez só, sentindo o líquido descer queimando pela minha garganta e anestesiar minha dor. Depois disso pedi outra e mais outra... Quando dei por mim, estava um tanto quanto bêbado. Mas, quem se importava?
Nesse momento, o karaokê desocupou e eu levantei, apesar de alto, conseguia disfarçar bem. Tinha tolerância à bebida e ainda estava razoavelmente lúcido. Escolhi a música, vendo os olhares das mulheres se virarem para mim imediatamente. Por certo estavam estranhando encontrar um japonês naquele local.
Eu era descendente de alemães, graças ao meu avô por parte de pai, por isso os traços diferentes. Meus olhos azuis, o cabelo loiro, tais características eu herdei do meu pai, que, obviamente, herdou do finado avô que casou-se com uma japonesa. Minha mãe também não tinha somente sangue japonês. Ou seja, eu era uma perfeita mistura.
O Brasil mesmo tinha o povo bem miscigenado, eu estranhava muito no começo. Eles eram todos diferentes uns dos outros, não seguiam um padrão como no Japão. Por isso, eu me encaixei tão perfeitamente lá, o país me acolheu muito bem. Claro, graças a meu padrinho, que já morava no Brasil há bastante tempo.
Porquanto, não foi muito difícil me enturmar. Eu sempre fui bastante curioso, no que tangia a outras culturas. Por consequência, logo tinha me acostumado aos costumes do país, que eram, de certa forma, muito diferentes do país onde nasci e me criei.
Mas, deixando esses pormenores pra lá, finalmente iniciou a minha música e eu comecei a cantar, ignorando a vergonha que estava passando. Eu não estava em aí, eles iriam me ouvir, acaso não quisessem, que fossem para outro lugar.
Tantos anos no Brasil me ensinaram uma coisa. Eu estava na sofrência. E, a música que escolhi, só constatava isso.
Ela ligou terminando
Tudo entre eu e ela
E disse que encontrou
Outra pessoa
Ela jogou os meus sonhos
Todos pela janela
E me pediu pra entender
Encarar numa boa
Como se o meu coração
Fosse feito de aço
Pediu pra esquecer
Os beijos e abraços
E pra machucar
Ainda brincou comigo
Disse em poucas palavras
Por favor entenda
O seu nome vai
Ficar na minha agenda
Na página de amigos
Como é que eu posso ser amigo
De alguém que eu tanto amei
Se ainda existe aqui comigo
Tudo dela e eu não sei
Não sei o que eu vou fazer
Pra continuar a minha vida assim
Se o amor que morreu dentro dela
Ainda vive em mim... - minha voz saia arrastada, devido ao álcool, mas eu seguia cantando.
No meio da música, algumas pessoas começaram a cantar junto comigo e a balançar os braços, pareciam estar, gostando? Quanto terminei, ouvi muitas palmas e uma mulher loira e alta chegou perto de mim com um sorriso insinuante.
— Quer que eu te ajude a esquecê-la? - sua voz soou rouca e sensual.
— Não, obrigado. - fui curto e grosso e coloquei outra moeda para liberar uma nova música.
Ainda não estava satisfeito.
A vi afastando-se emburrada e sorri de canto, coitada, como se ela pudesse me fazer esquecer a minha hime.
Suspirei e a música iniciou:
Não aprendi dizer adeus
Não sei se vou me acostumar
Olhando assim nos olhos seus
Sei que vai ficar nos meus
A marca desse olhar
Não tenho nada pra dizer
Só o silêncio vai falar por mim
Eu sei guardar a minha dor
E apesar de tanto amor vai ser melhor assim
Não aprendi dizer adeus
Mas tenho que aceitar que amores
Vem e vão, são aves de verão
Se tens que me deixar
Que seja então feliz
Não aprendi dizer adeus
Mas deixo você ir
Sem lágrimas no olhar
Se o adeus me machucar
o inverno vai passar
E apaga a cicatriz... - no final da música eu já sentia várias lágrimas escorrerem pelo meu rosto.
Aquilo não estava adiantando, segui até o caixa do bar, ainda com diversos olhares em cima de mim, agora um misto de pena e solidariedade, por fim, paguei a conta e fui embora. Minha cabeça girava e eu tinha noção de que não estava em condições de dirigir, o que faria? Claro, ligaria para o teme, ele viria me socorrer, ainda éramos amigos, apesar do tempo em que ficamos sem nos vermos. Aliás, eu até tinha ido visitá-lo há alguns dias, só para ver que ele estava feliz e devidamente casado com a mulher que amava, ela mesma, Sakura.
Bom, ele era minha única opção, se eu ligasse para o meu pai, ouviria um sermão eterno e ele me levaria diretinho pra casa, o que não era meu plano para o restante da noite, ou melhor, madrugada.
— Teme? - falei e minha voz saiu toda engrolada, tipica voz de bêbado.
— Dobe, o que aconteceu? - respondeu parecendo preocupado.
— Está preocupado? - ironizei e ele bufou.
— Encheu a cara, não foi? - me repreendeu. - Está sozinho? De carro?
— Estou... - cuspi as últimas palavras. - Vem me ajudar, por favor. - pedi e comecei a chorar ao telefone.
— Liga o GPS do celular, estou a caminho. - ouvi em resposta.
— Obrigado, Sasuke. Você é um amigo. - eu ri, tinha ficado ainda mais idiota morando no Brasil por tanto tempo.
Sasuke não tardou a chegar, eu estava no carro, com a cabeça apoiada no volante. Mesmo alto, sabia que não devia dirigir naquele estado.
— O que você está fazendo, Naruto? - Sasuke bateu no vidro do carro. - Sabe o que eu estava fazendo com a Sakura?
— Não me conta, pelo amor de tudo o que é mais sagrado! - exclamei derrotado. - Eu tô na merda, não está vendo?
— Sai desse carro e vai pro carona, vou te levar em casa.
— Eu não quero ir pra casa. - revidei. - Me leva até Hinata.
— Tá louco? O que vai fazer lá a essa hora e caindo de bêbado?
— Se não me levar eu vou sozinho. - fiz menção de ligar o carro.
— Sai fora, eu te levo, cacete! - Sasuke respondeu entredentes.
— Obrigado. - sorri fraco e fui para o outro banco. - Lembra quando me ajudou a invadir o quarto dela?
— Lembro sim, até meu cu congelou naquele dia! - vociferou. - Nem pense em subir ao quarto da Hinata assim, você vai cair e quebrar o pescoço feito uma galinha. - ele riu. - Que merda, Naruto; esquece a Hinata e segue sua vida!
— Você esqueceria a Sakura?
— Jamais.
— Então me leva até lá e cala essa boca!
Sasuke me deu um cascudo no cocuruto e eu ri.
— Velhos tempos. - recordei.
Ele também riu.
— Senti sua falta, dobe. - confessou na sequência.
— Eu também, teme. - afirmei nostálgico. — Me ajuda a subir. - pedi, tentando me manter sóbrio, apesar da quantidade absurda de álcool que corria pelo meu sangue.
— Quer se matar? - ouvi em resposta. - Você está caindo de bêbado, não é mais fácil chamar Hinata aqui? Pior, vai que ela está com o noivo, você é masoquista? - gritou, apoiando meu corpo para que eu conseguisse avançar.
— Dane-se, não dá para doer mais do que já está doendo. - respondi sem emoção. - Se não der certo essa última investida, eu pego um avião para o Brasil amanhã mesmo, lá tem mulheres, carnaval, eu me torno meu padrinho e já era.
— Você nunca conseguirá ser assim, Naruto. - Sasuke retrucou. - Seu coração é romântico.
— E o que ganho em troca?
— Não se torne um homem amargurado porque perdeu um amor.
— Cala a boca e me ajuda a subir. - vociferei e ele bufou.
— Por que ainda te ajudo? - resmungou. - Eu deveria estar nos braços da Sakura, não aqui passando frio contigo!
— Pelo menos a terá pela manhã, isso é bem mais do que posso esperar.
Por fim, depois de muito custo, consegui avistar a janela do quarto. Era como retornar ao passado, quando eu morria de saudades de ver minha hime, quando eu pensava ter perdido-a para sempre. Só que, naquela época, ela me amava de volta, coisa que eu não tinha mais certeza dada a situação.
Quando meus olhos fitaram Hinata, quase me desequilibrei e caí para trás. Teria sido uma queda e tanto! Ela estava linda; porém, agora, não mais vestia um pijama fofinho como antigamente. Pelo contrário, Hinata se tornara uma mulher de beleza ofensiva, tanto que senti todos os meus músculos retesarem, ao vislumbrá-la vestindo apenas um baby doll de seda, que deixava quase todo seu corpo à mostra. Naquele instante, eu fiquei envergonhado. O que estava fazendo da minha vida? Invadindo a privacidade dela daquela forma? Me arrependi no mesmo segundo e tentei descer, contudo, ao fazê-lo, realmente escorreguei e iria me esborrachar no chão. Acaso não tivesse conseguido me segurar em uma rachadura no telhado.
— Ufa. - suspirei e dei uma gargalhada forçada.
Lembrando de Sasuke falando sobre eu quebrar o pescoço feito uma galinha. Com o susto, decidi que estava na hora de assumir minha derrota.
— É soldado, você lutou bravamente... - tentei consolar a mim mesmo.
— Naruto? - ouvi a voz doce e surpresa de Hinata. - O que faz aqui?
— Desculpe, Hina. - pedi constrangido. - Já estou indo embora, não precisa me chutar.
— Pelo amor de Kami, entra aqui, você vai cair desse telhado!
Obedeci e adentrei o quarto, dessa vez, não sei se Sasuke me esperaria. Bom, agora, pelo menos, ele poderia ficar dentro do carro, que tinha aquecedor.
— Hinata, eu... - iniciei temeroso. - Só queria me despedir, estou voltando para o Brasil.
— Você vai embora do Japão novamente? - sua voz soou baixa e aflita.
— Vou, o que eu vim buscar aqui já não é mais meu. - olhei em seus olhos, que estavam muito brilhantes.
Hinata estava querendo chorar?
— Me perdoe... - ela pediu. - Eu sempre vou te amar, Naruto. Mas, eu estraguei tudo na adolescência, nunca deveria ter escolhido Toneri ao invés de você. - Hinata desatou a chorar e eu corri para ampará-la.
— Ei, eu errei muito também. - confessei puxando-a contra meu corpo. O dela, por sinal, tremia em meus braços, graças ao choro compulsivo. - Volta pra mim? Vamos passar uma borracha no passado? - implorei, acariciando suas costas por cima do tecido fino.
— Não dá mais... - a frase saiu inconclusiva.
— Por que não? - indaguei desesperado. - Ainda dá tempo, hime. - eu sorri, sentindo novamente uma centelha de esperança me invadir. - Ainda podemos ser felizes juntos!
— Toneri não permitiria algo assim jamais. - respondeu fungando. - Ele tomaria meu filho...
— Que filho, Hinata? - estremeci.
— Eu estou grávida, Naruto.
— Grávida? - repeti, enquanto meus pensamentos tornavam-se incoerentes, anuviados.
— Sim. - afirmou afastando-se de mim. - Toneri me ameaçou, disse que se eu deixá-lo, dará um jeito de pegar a guarda do meu filho, assim que ele nascer...
— Eu jamais permitirei que Toneri faça isso. - a tomei novamente em meus braços. - Hime, ele está blefando para te manter presa. - afaguei seus cabelos, tentando consolá-la. - Podemos resolver isso, nenhum juiz tiraria a guarda do seu filho dessa forma.
Hinata me olhou nos olhos e sorriu.
— Você ainda conseguiria me amar, mesmo diante dessas circunstâncias?
— Meu amor por você é imperecível, Hinata. - afirmei e, aos poucos, fui aproximando-me dela.
Hinata não recuou, apenas se entregou ao beijo.
— Eu não quero mais ficar com Toneri, finalmente entendi que não devo estar com alguém só porque meu pai queria. - segredou, assim que separamos nossos lábios. - Eu compreendi que ninguém teve culpa pelo que aconteceu, me casar com o homem que meu pai queria inicialmente, não o trará de volta. Eu preciso aceitar e seguir em frente, abandonar essa culpa para finalmente conseguir ser feliz com o homem que eu amo. E, Naruto, esse homem é você...
— Naruto, Naruto? - ouvi uma voz soar ao longe, após a declaração de Hinata.
Não podia ser Sasuke, ele não subiria aqui. Todavia, enquanto eu conjecturava de onde vinha aquele som, aos poucos, Hinata começou a desaparecer na minha frente. Sua imagem tornou-se distorcida e eu tentei tocá-la em vão.
— Hinataaaa! - gritei desesperado.
O que estava acontecendo?
— NARUTO! - novamente alguém me chamou, parecia aflito.
Era... Meu pai?
Abri meus olhos, com muito custo e não mais estava no quarto da Hinata. Pelo contrário, me encontrava em um lugar todo branco, preso a diversos aparelhos e respirava com dificuldade.
— O que... Aconteceu? - questionei sofregamente.
Minha voz mal saia, eu sentia que minha cordas vocais estavam enferrujadas.
— Por Kami, você acordou! - ele começou a chorar e me abraçou de um jeito desengonçado. - Kushina, Hinata. Naruto acordou!
Vi as duas adentrarem meu quarto desesperadas, enquanto eu permanecia sem entender uma vírgula do que estava acontecendo. Foi tudo um sonho? O que eu fazia preso naquela cama de hospital?
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