CAPÍTULO 34 - JAIME
Celina me ligou apenas para saber se cheguei bem. Foi complicado explicar para ela que tive que sair à noite passada para evitar que Lolla fizesse merda na rua. No fim, falei a verdade. Bom, pelo menos algumas verdades.
Precisava mesmo ficar perto da Lolla nesse início. O mesmo fiz para explicar que deveria acompanhar Lolla nessa viagem. Os seus olhos tristes ficaram marcados em mim.
Fugi da Catarina que me mandou mensagem e ainda não tive coragem de respondê-la. Ela deve estar imaginando um milhão de coisas.
Agora estou aqui, com Lolla sentada na minha frente no restaurante, esperando o almoço ser servido.
Olho para ela que está entretida em responder seus seguidores.
Mas o que me incomoda foi o fato de ficar escancarado o interesse do Mateus por ela. É claro que uma mulher como ela despertaria isso dos homens. Eu mesmo fui um desses. Não poderia julgar Mateus por isso. Seu excesso de perguntas e elogios me deixaram mais do que aborrecido.
— Posso ir à Rua 25 de março?
— Por que quer ir lá, Lolla?
— Sei lá. Sempre ouvi falar que tem coisa baratinhas!
Eu sorrio.
— Não precisa mais comprar coisas baratinhas.
— E gastar com coisas caras, nem pensar! Pelo menos não por enquanto. Tenho coisas para conquistar, sabia?
— Como o quê?
— Uma casa própria. Um carro. Claro que primeiro eu preciso ter carteira de motorista e... um documento que me permita isso, mas...
— Logo você terá.
Lolla é logo assediada pelos fãs.
Almoçamos e vamos para nossos compromissos que se estende por todo o resto do dia. À noite vamos para o hotel Unique.
Faço nosso check-in e Lolla fica arrebatada com o local.
Subimos o elevador juntos.
Lolla agora está com o seu celular na mão e sorri.
— Do que está rindo?
— Ah, nada demais... seu amigo, Mateus, ele me adicionou. Só isso — digita sem desviar os olhos do aparelho.
— E só ele ter te adicionado é algo engraçado?
Enfim, ela me olha.
— Não. É porque ele achou graça das carinhas que eu mando.
— Emojis — corrijo. Ela também me faz rir quando conversamos pelo WhatsApp.
— Sou capaz de conversar apenas com eles — sorri mais um pouco.
Eu amo o seu sorriso, mas agora ele está me irritando.
Chegamos ao andar que ficaremos hospedados.
— Você quer jantar comigo? — pergunto antes que ela entre no seu quarto.
Meu celular toca e é uma chamada de vídeo da Celina.
— Eu... — aponto para o quarto.
— É melhor eu ir dormir, Jaime. Boa noite.
Sem poder insistir um pouco mais, sinto que esse é o certo a se fazer.
Não consigo atender a Celina com a cabeça na Lolla.
Recuso a ligação e entro no meu quarto. Deixo meu corpo cair sobre a cama. Não adianta. Eu teria que ser mais forte do que isso.
Já caí em tentação uma vez, não poderia deixar isso acontecer novamente. Eu tenho Celina. Celina é a minha família.
Mando uma mensagem para a minha noiva explicando que já retorno.
Tomo um banho e recebo uma ligação na qual estava adiando atender.
Sem querer estender mais o problema, resolvo solucioná-lo. Estou cansado de só acumular merdas.
— Alô.
— Jaime? Está se escondendo de mim?
— Oi, Cata. Não estou.
— Hum... sei. Como você está?
— Estou bem.
— Fui atrás de você e encontrei Celina sozinha na sua casa. Ela me disse que você viajou com a Lolla.
— Sim. Eu sou o seu empresário.
— Não se faça de burro, Jaime! E não finja que eu sou também.
— Desculpe, Cata... eu não sei o que te dizer.
— Pelo que reparei, Celina não percebeu o que percebi ontem.
— Você percebeu errado.
— Errado? — indaga com um sussurro. — Você não deixou a entender, cunhadinho. Você disse com todas as letras.
— O que quer que eu diga?
— Não quero que se confesse, nem nada disso. Apenas fiquei preocupada. — Ouço um burburinho ao seu lado. — Calma... eu... está bem.... Jaime, seu irmão quer falar com você.
— Não acredito que você...
Sinto que o aparelho é dado para ele.
— Fala aí, irmão.
— Oi, Henrique.
— Cara, o que está pegando?
— Não está pegando nada.
— Não é isso que eu estou sabendo. Catarina me falou que...
— Catarina não deveria ter falado nada.
— Ela é minha esposa, Henrique. Não temos segredos. E você é o meu irmão, então...
— Já disse que estou bem.
— Cara, você pegou a Lolla?
Não respondo. Quase desligo a porra da ligação.
— Jaime, eu sei que a Lolla é quente pra caralho, mas... — Consigo escutar um tapa. — Ai, mulher! Eu preciso ser claro. Quero ajudar meu irmão, pow! Jaime?
— Oi.
— Você tem noiva.
— Eu sei.
— Cara, isso não se faz.
— Porra, eu não... — Quero mentir. — Quem é você para me dar lição de moral, Henrique? — Sei que melhor tática é atacar.
— Ei! Menos, viu. Eu sou um homem fiel. Sei que você é também, por isso achei que a Cata tinha fumado algo estragado.
— Lolla ia fazer merda ontem. Só fui protegê-la.
— Hum... entendi. Tipo um Jaime quando ia atrás do Henrique. Ou um Henrique que ia atrás da Catarina?
— Não seja idiota, cara. Estou cansado. Preciso ligar para a minha noiva.
— Então preciso levar minha mulher para uma clínica de reabilitação por que ela está doidona e imaginou que você trairia sua noivinha? — Ouço ele receber mais um tapa. — Ai!
— Não fala merda.
— Tem certeza de que não quer conversar com a gente sobre isso?
— Não há nada para dizer.
— Tudo bem. Qualquer coisa estamos aqui, viu. Catarina está mandando um beijo para a Lolla.
Arfo.
— Ela está no quarto dela, cara.
— Ah, que pena... digo, tá bom então, irmão. A gente se fala. Boa noite.
— Boa noite pra vocês também.
Desligo a ligação.
É bem isso. Eu não tenho muito o que dizer. Pronunciar em voz alta que trai uma pessoa que amo, me deixa enojado.
Ligo para Celina.
Ela atende no primeiro toque e vejo o seu lindo rosto. Ela arruma os cabelos curtos e sorri quando me vê.
— Oi, meu amor.
— Oi. Desculpe não atender naquela hora.
— Já estou com saudades — fala e fico feliz com isso. Celina nunca foi de ligar muito, principalmente quando sabe que estou trabalhando, mas só hoje foram duas ligações.
— Eu também estou. Está indo para o trabalho.
— Acabei de chegar. Estou guardando minha bolsa. Cadê a Lolla?
— Como cadê a Lolla? Estou no meu quarto, Celina.
— Ah, sim. Já jantou?
— Não. Ainda não. Vou pedir aqui no quarto mesmo.
— Está cansado, amor? Dá para ver no seu rosto.
— Exausto. Vou só comer e dormir.
— Te amo, tá?
— Eu também. Bom trabalho pra você.
— Obrigada. Beijos! — Ela acena um tchauzinho e eu também.
Deito-me na cama. Fecho os meus olhos.
Tento relaxar. Quando estou quase caindo no sono ouço a porta ser batida.
Coloco um short e vou abrir a porta.
Assim que abro vejo Lolla. Seu rosto não tem a leveza de sempre.
— Jaime... você precisa ver isso! — Ela me entrega o seu celular aberto em um site.
"LOLLA ESTARIA SENDO FINANCIADA PELO TRÁFICO?
Todos conseguem ver que o novo boom da música brasileira e influencer digital, Lolla, começou sua carreira em bailes funks. O que poucos sabem é que os bailes eram financiados pelo tráfico das favelas do Rio de Janeiro. O envolvimento vai além de shows. Seu primo, Jorge Freitas, é um condenado da justiça por tráfico de drogas na região do Morro do Vidigal com várias passagens pela polícia por envolvimento com bandidos da região e..."
Coloco Lolla para dentro do meu quarto e a boto sentada na cama. Ela está pálida.
Pego o meu celular e tento ligar para o meu advogado, mas, pela hora, ele não atende.
Mil coisas passam pela minha cabeça. Lolla já havia me contado sobre Minga e, claro, fiz as minhas pesquisas particulares para não ser pego de surpresa.
— É sério demais, Jaime! Já era... já era tudo! — Ela está nervosa.
— Calma, Lolla! Precisa ter calma. Vamos descobrir quem colocou uma notícia falsa dessa e...
— Não é falso. Não tudo.
— Como assim?
— Eu fazia shows nos bailes, você sabe, mas não sei ao certo se era financiada pelo tráfico. E Minga foi mesmo preso da forma como falaram. Já te contei isso.
— Mas ele cumpriu a pena, certo?
— Sim. Três anos. Eu... eu preciso ligar pra ele, Jaime. Se ele ver isso vai ficar arrasado. Morro de medo de que ele tenha recaídas e...
Entrego o meu celular para ela.
— Ligue.
Ela fica alguns minutos tentando.
— Ele não me atende — Lolla começa a chorar com a mão no rosto.
— Não fique assim. — Sento-me ao seu lado e passo o braço pelo seu corpo. Quero poder tirar seu martírio. — Isso faz parte da sua história. Minga vai ficar bem. Já passei por coisas piores enquanto agenciava o Henrique. Acredite.
— Pior do que ser associada ao tráfico? Não vejo nada pior do que isso, Jaime. Isso é o fim.
— Ei! Cadê a Lolla que eu conheço?
— Eu estou com medo.
— Não deixarei isso acontecer. Só precisamos pensar em algo para amenizar a situação. As pessoas te adoram, Lolla. Já te conhecem pelo o seu dia a dia nas redes sociais. Sabem que você é de origem humilde e o quanto é verdadeira. Não se preocupe tanto.
— Eu preciso desmentir que sou financiada pelo tráfico. E só tem um jeito...
Ela pega o seu celular novamente.
— O que vai fazer?
— Vou tentar amenizar a situação. Confia em mim?
Sua pergunta me causa aflição e faço que sim.
Ela se levanta e vai até o banheiro e se olha no espelho, ajeitando o cabelo.
— Como estou? Não posso parecer que estava chorando.
Levanto-me e vou até ela.
Passo a mão no seu rosto para tirar uma lágrima da sua bochecha.
Ela me olha e aperta os lábios.
— Não deixarei nada de ruim acontecer com você, Lolla.
— Não é só comigo que me preocupo.
— Eu sei.
Solto seu rosto e a deixo fazer o que deve ser feito.
Ela se senta em uma das poltronas e pede com um dedo na boca para que eu fique em silêncio.
Lolla coloca o celular rente o rosto e sorri.
— Olá, galera, como vocês estão? Bom, vocês sabem que eu só venho aqui para falar de coisas boas, não é? Mas acabei de ler algo que está sendo espalhado por aí e preciso apenas desmentir algumas coisas e deixar claro outras, tá bom? Sim, é verdade que comecei minha carreira nos bailes Funks das comunidades e... olha, não tenho vergonha disso não. Foi ali que as pessoas me deram força e me deram oportunidades. Eu era contratada por amigos, pessoas que eu conhecia, não por traficantes. Se os bailes eram financiados por eles, não era algo que eu tinha ciência. Claro, sei que eu deveria ter me aprofundado mais nisso e procurado saber, mas quando a gente não tem nada, a primeira oportunidade sempre é agarrar com unhas e dentes qualquer coisa que cai do céu. Foi o que eu fiz. Outra coisa que li foi sobre o meu primo, Jorge. Ele teve problemas com drogas há alguns anos e isso o fez ir para um caminho errado. Mas ele foi julgado e cumpriu a pena que foi determinada pela justiça. Não nos orgulhamos disso, mas eu entendo e acredito que todos merecemos uma segunda chance. Minga, ou melhor, Jorge, meu primo, me prova isso todos os dias. Ele é o homem mais honesto e integro que conheço na vida, então, vamos parar de aumentar as coisas e culpar as pessoas por algo que elas já pagaram. A vida é curta para vivermos do passado. Eu não sou financiada por nenhum traficante e jamais fui. Batalho todos os dias para conquistar o meu espaço. Eu e o meu empresário, Jaime Soares, estamos juntos para mostrar a minha música e espalhar felicidade para vocês. Então, vamos que vamos que só estou começando. Obrigada a todos pelo carinho que recebo diariamente. Vocês são incríveis!
Ela desliga a live e me olha, respirando pela primeira vez depois que iniciou.
Sorrio e ela se levanta para me abraçar forte.
Sinto seu pequeno corpo embalado ao meu, estremecer de nervoso.
Acaricio seus cabelos sentindo o seu cheiro.
Não deveríamos ficar tão perto.
— Estou orgulhoso de você, Lolla — digo, em seu ouvido, sem afastá-la, sem me privar de tê-la em meus braços mais uma vez.
— Obrigada por não me deixar sozinha.
— Jamais deixarei. Jamais.
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