Cap. 35 - Elemento do fogo
— Quero que pare de encher a cabeça dele com suas teorias loucas!
A voz de Juliette rasga o ar como um trovão, e o ambiente responde ao seu comando. Uma corrente de ar começa a girar ao redor dela, uma manifestação física de sua raiva crescente.
— Capitã, eu não disse nada!
Cristina responde com a voz trêmula, quase inaudível.
— Ele apenas pediu os livros emprestados, e eu emprestei... não é esse meu trabalho como bibliotecária?
— Não me importa!
Juliette avança um passo, sua presença sufocante.
— Se eu descobrir que está tendo "conversinhas" com ele... entregar livros será seu último trabalho.
O tom de ameaça se eleva no final da frase, e o ar ao redor parece sibilante. Em um segundo, lâminas invisíveis cortam o espaço. O som afiado das rajadas de vento despedaça as mesas de madeira como se fossem feitas de papel. Metade das mesas caem ao chão, partidas ao meio, espalhando estilhaços.
— Tudo bem, capitã. Me perdoa, por favor.
Cristina se encolhe, mais frágil a cada palavra.
Juliette a observa por um longo momento, seus olhos faiscando com a fúria que ainda não se dissipou por completo.
— Dessa vez passa, Cristina. Mas não espere que serei tão piedosa da próxima vez.
Com essas palavras, Juliette inspira fundo, controlando sua raiva, e vira as costas, saindo da biblioteca. O som de seus passos ecoa pelo corredor até desaparecer.
Cristina solta o ar que parecia prender nos pulmões, sua postura relaxa, mas apenas por um instante. Ela ergue a cabeça lentamente e olha diretamente para onde eu estava observando. Um pequeno sorriso surge no canto de seus lábios.
— Parece que alguém herdou habilidades de projeção de consciência... Isso é bom, muito bom Jon.
Diz ela, de forma que me desconcerta.
A mulher que há pouco estava encolhida de medo, agora me encara, visivelmente tranquila e até satisfeita. O choque me atinge em cheio, e com um tremor involuntário, me vejo de volta ao meu quarto, sentado na cama. Meu coração ainda martela no peito, e uma pergunta lateja em minha mente.
Como ela pode me ver, se eu não estava lá de verdade? Penso, confuso.
"Essa Cristina, sempre causando entretenimento..."
A voz sussurra em minha mente, rindo.
— Você a conhece?
Pergunto, num murmúrio quase inaudível.
"Sim... aquela velha tem mais de 100 anos. Eu a conheci, e ela me ajudou bastante".
— O quê? O que ela é, afinal?
Pergunto, tentando entender o absurdo que estou ouvindo.
"Ela é uma Anciã do Tempo. Ela viaja pelas sombras do tempo, assumindo inúmeras identidades e colecionando segredos. Sempre que for necessário, ela virá até você sob diferentes rostos. Guardiã de segredos entrelaçados com o tempo... Ela é como uma bruxa".
Minhas sobrancelhas se arqueiam, o ceticismo me preenche.
— Bruxa? E você quer que eu confie nela? Bruxas não são... más?
"Isso é relativo Jon, algumas são, claro. Mas essa é diferente. E, acredite, ela vai te ajudar quando precisar".
As palavras da voz fazem pouco sentido, mas algo em mim reconhece a verdade nelas. E então, outro pensamento surge.
Richard escreveu o livro... Será que é ele quem fala comigo? penso, enquanto as peças parecem não se encaixar.
Antes que eu possa formular a pergunta em minha mente, a voz responde, como se estivesse sempre à frente dos meus pensamentos.
"Não sou Richard. Ele foi o primeiro do nosso tipo, o pioneiro. Eu fui um agente oculto antes de você, e graças ao elixir, ele criou uma ligação entre nós apenas, o que não faz muito sentido, pois, eu podia falar com diferentes ancestrais, entretanto você só consegue falar comigo. Confesso que essa conexão ainda é algo que não compreendo completamente..."
Essa revelação só aumenta a confusão. Há tanto a refletir, e a linha entre realidade e o inexplicável parece mais tênue a cada minuto. Está ficando insano, impossível de seguir com lógica.
***
Meus olhos se arregalam de repente, o peito acelerado pelo súbito retorno da memória do sonho. Era nítido demais para ser apenas uma ilusão, mas curto demais para ser compreendido por completo. A visão de Bia naquela floresta, envolta em uma atmosfera pesada e ameaçadora, me deixa inquieto.
Três homens... A missão dela. Os mesmos três que irão acompanhá-la. Meu coração bate mais rápido. Uivos de lobos. O som ainda ecoa em minha cabeça, carregado de algo sinistro.
Por um momento, fecho os olhos novamente, tentando forçar a mente a trazer de volta mais detalhes, mas tudo que sinto é um vazio. Foi como se o fragmento tivesse sido arrancado de mim, uma peça de um quebra-cabeça que eu não consigo montar.
Será apenas um sonho? Pergunto a mim mesmo, mas a sensação persistente de perigo faz com que duvide disso.
***
O que está acontecendo? Será que isso foi uma visão? E se for, por que está fragmentada? Espero que minha ruiva esteja bem e consiga completar a missão em segurança, penso, aflito.
— Pode me ajudar com esse sonho?
Pergunto para a voz, na esperança de alguma orientação.
"Na verdade, não".
A voz responde, com uma sinceridade incomum.
"Isso nunca aconteceu antes. É como se algo ou alguém estivesse interferindo para que você não veja com clareza. Mas conhecendo Bia, baseando nas suas interações, ela é forte. Vai ficar tudo bem."
— Assim espero
Murmuro, a incerteza ainda me corroendo.
Com os dedos ainda formigando de antecipação, desvio meu olhar para o livro mágico em minhas mãos. As páginas pareciam quase pulsar com uma energia própria, seladas por um feitiço que só eu, como agente oculto, poderia desvendar. Ninguém além de mim teria acesso àquela sabedoria secreta. Levo minha mão até a capa, e sinto a magia responder ao meu toque. O livro, relutante por um segundo, cede. A energia que antes bloqueava o acesso se dispersa em uma leve brisa, abrindo as páginas uma a uma como se fossem movidas por um vento invisível. O brilho sutil que emana do texto é hipnotizante, as palavras dançam diante dos meus olhos.
É isso... hoje eu termino isso, penso, minha mente já envolvida pelo poder que aquele livro promete.
[...]
Para os Escolhidos: Segredos e Encantamentos do Elemento do Fogo
"Se chegastes até estas palavras, caro Agente Oculto, é sinal de que possuis dentro de ti a chama do saber, o desejo ardente de dominar as forças que governam o universo. O fogo, entre os elementos, é o mais impetuoso, o mais feroz e o mais desafiador. Ele não se curva facilmente, mas, uma vez sob vosso comando, ele pode ser vosso mais poderoso aliado. Neste tomo, revelarei a vós os segredos antigos e ocultos do domínio das chamas. Estais preparado para caminhar por um caminho que muitos temem e poucos compreendem. Mas sabei, o conhecimento aqui contido é para aqueles que têm a coragem de usar a chama tanto para criar quanto para destruir.
O fogo é, por natureza, volátil e perigoso. Nas mãos de um mestre, ele pode tanto proteger quanto devastar. Nas mãos de um neófito, ele consome tudo, sem piedade. Deveis compreender que o fogo é mais do que um simples instrumento de destruição; ele é a centelha da vida e da transformação. Tal como a forja molda o metal bruto em uma espada afiada, o fogo molda o mundo ao redor, purificando o que deve ser renovado e destruindo o que não serve mais ao seu propósito. Neste tomo, desvelaremos as infinitas facetas do fogo. Desde a menor faísca que pode acender uma tocha até a tempestade flamejante que consome florestas e cidades. O domínio do fogo não é apenas uma questão de força; é uma questão de controle, disciplina e, acima de tudo, paixão. Pois o fogo responde àqueles que possuem chama interior, àqueles que sentem profundamente, seja em ira, amor ou desejo de mudança.
A Centelha do Fogo
O primeiro passo para vosso aprendizado é simples, mas fundamental: a criação da centelha. Sem esta habilidade, todo o resto será inalcançável. Para conjurar a centelha, deveis concentrar vossa energia interior, a força vital que habita vosso ser, e permitir que ela flua até vossas mãos. Fechai os olhos e visualizai o calor que cresce em vosso peito, como uma pequena chama que se alimenta de vossa força de vontade. Respirai profundamente e, ao exalar, soltai essa energia em um único ponto. Deveis ser capazes de ver uma pequena chama cintilar, uma centelha de vossa própria criação. Esta faísca, ainda que pequena, contém em si o potencial de um incêndio. Praticai este exercício até que possais evocar a chama sem hesitação, pois ela será a chave para todo o vosso futuro no domínio deste elemento.
Alimentando a Chama
Uma vez criada a centelha, deveis aprender a nutri-la, a fazê-la crescer conforme vossa vontade. O fogo responde às emoções mais intensas, por isso deveis convocar em vosso íntimo o desejo, a fúria ou a paixão. Estas emoções, uma vez canalizadas, serão o combustível para vossa chama. Visualizai a centelha tornando-se maior, mais brilhante, até que a pequena faísca se transforme em uma chama viva e pulsante em vossas mãos. Aqui, reside o perigo e a maestria. Deixar a chama crescer sem controle é um risco que todo Agente deve evitar. Mas se conseguirdes manter o fogo sob vossa égide, será um aliado fiel, obedecendo a cada comando vosso.
Moldando o Fogo
Quando tiverdes pleno domínio sobre vossa chama, é chegada a hora de moldá-la conforme vossa vontade. O fogo pode assumir diversas formas, desde a simples esfera de calor até a lâmina flamejante que corta o ar. Para criar uma bola de fogo, juntai toda a vossa energia em um único ponto e moldai-a em uma esfera perfeita. Concentrai-vos na forma e na estabilidade, assegurando que a chama permaneça coesa até o momento em que a lançardes. Para formas mais complexas, como uma lâmina de fogo, deveis ser ainda mais precisos. Visualizai a chama estendendo-se, como uma espada que se forma a partir do calor. Mantende vossa mente clara e o foco inabalável, pois qualquer distração poderá desfazer a magia.
Tempestade de Fogo
Para os que avançam no domínio do elemento flamejante, há a capacidade de evocar a tempestade de fogo, uma técnica poderosa e devastadora. Esta forma de magia exige que vós, como Agente, canalizeis vossas emoções mais profundas e intensas. A tempestade não é um simples jorro de fogo; ela é a manifestação de vossa própria fúria e determinação, liberada em um círculo de destruição. Concentrai vossa energia em vosso coração, o centro de vossa paixão, e deixai que ela se espalhe por vosso corpo. Quando sentirdes que o calor atingiu seu ápice, soltai essa energia em todas as direções, criando uma muralha de chamas que devorará tudo ao seu redor. Sabei, porém, que esta técnica é perigosa, e muitos Agentes se queimaram ao tentá-la sem o controle necessário.
O Fogo Curativo
Raros são os que conhecem este segredo, mas o fogo também pode curar. Assim como ele destrói, ele pode revitalizar, aquecendo e acelerando a recuperação. Para conjurar o fogo curativo, deveis abandonar a fúria e a paixão, e concentrar-vos na chama serena da renovação. Visualizai o calor suave, como o de uma lareira em uma noite fria, fluindo pelo corpo do ferido. A chama deve ser delicada, cuidadosa, restaurando o tecido e a energia sem causar danos. Este é o fogo em sua forma mais pura: não para destruir, mas para criar e restaurar. Praticai com cuidado e sabedoria, pois o fogo curativo requer um equilíbrio perfeito entre poder e controle.
Os Clones de Fogo: Espelhos da Chama Viva
"Entre os muitos segredos do domínio do fogo, poucos são tão complexos e impressionantes quanto a arte da criação de clones flamejantes. Ao vosso comando, vós sereis capaz de invocar duplicatas de vós mesmo, moldadas inicialmente a partir das chamas, e que, com o devido controle, tomarão a vossa forma exata, espelhando cada detalhe. Contudo, o processo demanda grande concentração, força interior e total harmonia com o elemento. A habilidade de criar clones de fogo não é para qualquer Agente Oculto; exige verdadeira maestria e uma mente calma, capaz de transformar a voracidade do fogo em precisão e perfeição. Para iniciar a criação de um clone de fogo, deveis primeiro convocar uma chama intensa, imbuída com vossa própria energia vital. Concentrai-vos profundamente e canalizai vossa vontade em uma única chama que se ergue diante de vós. Esta chama deve ser mais densa e viva que as outras, pois ela será a base do vosso clone. Visualizai essa chama pulsando com vida própria, e, enquanto observais, permiti que ela cresça, tomando forma. No início, a figura será apenas um esboço incandescente, como uma silhueta moldada no calor. Ainda sem traços definidos, será um corpo fluido de fogo, que dança e cintila, mas responde inteiramente ao vosso comando.
Com a chama estabilizada, deveis agora moldar o clone para que se assemelhe a vós em todos os aspectos. Este é o estágio mais delicado e requer concentração absoluta. Mantendo a chama estável, visualizai cada detalhe de vossa aparência, desde vossa estatura até a mais sutil expressão facial. Permitai que o fogo se transforme, alterando sua natureza volátil e furiosa para algo mais preciso e tangível. À medida que o clone se forma, a chama começará a se solidificar, tornando-se menos abrasiva ao toque e mais semelhante a carne. A energia do fogo permeia o corpo do clone, imitando a textura da pele, a cor dos cabelos, e até mesmo as roupas que estais a vestir. Aos olhos de qualquer observador, ele será indistinguível de vós. Contudo, lembrai-vos: ele não é mais que uma extensão de vossa vontade, e, sem vossa concentração, o fogo que lhe dá vida pode rapidamente se descontrolar e destruir tudo ao seu redor.
O clone, uma vez plenamente formado, não apenas possui vossa aparência, mas também simula vossos movimentos. Ele caminha, fala e age como vós, embora sua verdadeira força resida na conexão mental que compartilha convosco. Tudo o que o clone faz é reflexo de vossas intenções, e ele será capaz de executar ordens simples, como distrair um inimigo, lutar ou atuar como isca. Entretanto, não deveis esquecer que, por mais real que pareça, o clone ainda é fogo em sua essência. Em combate, caso seja atacado ou danificado, ele pode retornar à sua forma flamejante, explodindo em chamas devastadoras. Esta é a grande vantagem e o grande risco de usar tais clones: eles são armas disfarçadas, capazes de transformar a mais simples réplica em uma armadilha mortal.
Desfazendo o Clone: Retornando às Cinzas
Para desmanchar o clone de fogo, deveis simplesmente retirar vossa energia vital de dentro dele. O fogo, que antes imitava vossa forma, gradualmente perderá sua coesão, dissipando-se no ar em fumaça e calor. Podeis escolher desmantelar o clone de forma súbita, fazendo-o explodir em chamas intensas, ou de maneira lenta e controlada, como uma chama que se apaga ao fim de seu pavio. Sede prudente ao utilizar essa habilidade. A criação de clones é uma extensão de vossa própria força e poder, e seu uso excessivo pode esgotar-vos rapidamente. Contudo, em mãos hábeis, esses espelhos de chama podem se tornar tanto um escudo quanto uma espada, confundindo vossos inimigos e garantindo vossa vitória.
Agora que compreendeis os fundamentos, saibam que o verdadeiro poder do fogo só será revelado àqueles que forem capazes de controlá-lo plenamente. O fogo pode ser vosso aliado mais formidável ou vosso maior inimigo, e a linha que separa um do outro é tênue. Que vossa chama interior seja forte o suficiente para subjugar as forças que aqui aprendestes, e que o poder do fogo vos sirva sempre com sabedoria e responsabilidade."
Com quem vou praticar essa magia?
Penso enquanto me recosto na cabeceira da cama, o dedo deslizando sobre a borda áspera das páginas. A pergunta ecoa em minha mente por um momento, e então, uma ideia surge, trazendo um sorriso lento e malicioso ao meu rosto.
James, ah, ele seria perfeito. A ideia de replicar a habilidade dele, fazendo ainda melhor, de jogar seu próprio talento na cara dele, faz o sorriso em meus lábios se alargar ainda mais. Ele sempre foi tão arrogante, tão seguro de si, exibindo suas habilidades de controle de fogo como se fosse o único capaz de entendê-las. Imagino o momento em que eu o supero, os olhos dele se arregalando de surpresa, o sorrisinho irritante desaparecendo de seus lábios como se fosse apagado pela ventania que eu mesmo conjurasse.
Ele vai ficar louco, penso, com um calor de satisfação crescendo no peito.
O sorriso ainda está lá, largo e feroz, quando volto a minha atenção ao livro. As palavras começam a se mover mais rápido sob meus olhos, cada feitiço, cada técnica, se alinhando na minha mente com clareza.
[...]
Quando termino estou completamente cansado e com fome, olho para a bandeja que não tem mais comida, e decido ir ao refeitório.
Dessa vez, não me teletransporto. Decido sair do quarto e, assim que abro a porta, noto que a noite já caiu. O corredor está mergulhado em sombras suaves, mas a luz fria das lâmpadas ilumina o suficiente para guiar meu caminho. Subo as escadas em direção ao segundo andar, com passos firmes e tranquilos, atento às pessoas que cruzam meu caminho. Cada uma delas parece apressar o passo ao me ver, ou desvia o olhar assim que nossos olhos se encontram, como se eu fosse algo a ser evitado. Mais uma vez, ninguém ousa interromper minha caminhada.
Chego ao refeitório e escolho uma mesa vazia em um canto isolado. A única pessoa sentada ali é um garoto de cerca de 16 anos. Seus cabelos negros caem em cachos desarrumados, e sua pele morena contrasta com os olhos profundamente negros, como duas esferas de escuridão. Assim que me sento, ele se levanta, evitando qualquer contato visual direto.
— Isso tudo é medo?
Pergunto, mais para mim mesmo do que para ele.
Ele lança um olhar rápido e desinteressado na minha direção antes de se virar e sair, como se minha presença fosse irrelevante.
Bom, pelo menos vai sobrar mais comida, penso, observando a mesa repleta de pratos fartamente servidos.
Com isso, pego um prato e me sirvo com dois pedaços de torta, e um pouco de suco. Cada mordida traz uma satisfação física, como se meu corpo vibrasse com a energia que absorvo da comida. Quando termino, me levanto, satisfeito.
Mas, em vez de descer as escadas novamente, decido atravessar diretamente para a arena. A expectativa de testar o que aprendi do livro é forte demais para ser ignorada.
Assim que chego, percebo que a arena está quase vazia de luz, apenas o centro iluminado por uma luz fraca. Olho ao redor, e o lugar está deserto. As palavras de Bia ressoam na minha mente:
"...a área de treinamento só fica disponível durante o dia, à noite não é possível acessá-la, nem vê-la."
Franzo a testa. Então por que eu consegui entrar? penso. Será que os outros não podem atravessar como eu? Se bem que ficaram bastante surpresos quando surgir atrás de Gray pela primeira vez. Isso explicaria! Por um momento, reflito sobre isso, mas decido que agora não é hora para essas perguntas. Meu foco retorna à arena, e meu olhar se fixa num boneco de treinamento no centro.
Respiro fundo e concentro minha energia no ar ao meu redor. Sinto-o se agitar, quase como se fosse parte de mim. Um vendaval começa a tomar forma, girando e se intensificando, e eu guio toda essa força na direção do boneco. No momento certo, altero as correntes de ar, criando lâminas invisíveis dentro da tempestade. Elas passam despercebidas no meio do vendaval, até que colidem com o boneco, cortando-o em pedaços.
A sensação de poder é inebriante.
Decido testar o clone de chamas. Fecho os olhos, permitindo que a essência do fogo dentro de mim ganhe vida. Sinto o calor começar a se formar, um pulsar de energia queima suave sob minha pele. Respiro fundo, invocando uma chama brilhante à minha frente, suas cores dançando em tons vivos de laranja e vermelho. Devo dar-lhe forma. Com cuidado, começo a alimentar a chama com um toque da minha energia vital, sentindo um leve desgaste conforme ela absorve a força necessária. Meus dedos se movem no ar, como se fossem pincéis invisíveis moldando uma escultura incandescente. Cada gesto meu traz mais definição à criatura que começa a tomar forma. O fogo se ergue, lentamente adquirindo contornos, até que atinge minha estatura.
Lá está ele, um ser feito inteiramente de fogo, com braços e pernas bem delineados. As chamas crepitam em suas extremidades, mas ele permanece estável, como se a magia o mantivesse controlado. Observo a figura por um momento, admirando a forma bruta, e então, me concentro ainda mais. Meu foco se estreita, canalizando o poder com precisão. Aos poucos, as chamas se refinam. Minuto após minuto, vejo a criatura perder sua aparência primitiva e ganhar uma semelhança perturbadora comigo. Primeiro, suas chamas tornam-se mais densas, quase sólidas. As roupas que visto aparecem nele, os contornos de meus músculos visíveis sob o tecido flamejante. O calor que emana de suas formas começa a se misturar com o ar ao redor, mas permanece controlado. Por fim, ele sorri meu próprio sorriso refletido nas chamas.
Ataque aquele boneco, ordeno, mentalmente, testando sua lealdade e habilidade.
Sem hesitar, meu clone se move com agilidade, suas chamas ondulando enquanto avança até o boneco de treino. Com um único soco, o fogo explode de seus punhos, envolvendo o boneco em um inferno ardente. As chamas se espalham rapidamente, consumindo madeira e palha até não restar nada além de cinzas.
Impressionante, murmuro, antes que o silêncio seja quebrado por uma voz inesperada.
— Isso foi incrível. Mas você não deveria estar aqui nesse horário.
Diz alguém, cortando minha concentração como uma lâmina afiada.
Meus olhos se arregalam, e em um segundo, meu clone reage às minhas emoções tumultuadas. Ele explode em uma massa de fogo descontrolado, as chamas girando caoticamente antes de desaparecerem no ar. Meu coração bate forte enquanto tento recuperar o controle.
Das sombras, uma silhueta emerge. É Caio, o rapaz com quem eu e Bia trocamos algumas palavras outro dia, no café. Suas feições estão parcialmente ocultas, mas posso sentir a tensão no ar
— E o que você faz aqui?
Pergunto, rispidamente.
— Acho que as regras se aplicam a nós dois.
Caio não recua nem um centímetro. Seu semblante é sério, quase desdenhoso.
— Você está errado!
Ele responde, frio.
— Eu sou o vice capitão dos agentes do ar. Essas regras estúpidas não se aplicam a mim.
Só pode ser uma piada, penso, incrédulo. Esse garoto não deve ter mais que 18 anos, e já ocupa um cargo tão alto? Vice capitão? Isso não pode estar certo. Se for verdade, então eu fui pego em flagrante... Caio permanece parado, seu olhar fixo em mim, como se estivesse esperando minha reação. Não há vestígios de brincadeira em seu tom ou postura.
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