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ÚNICO • bagunça sentimental


Música: Playlist feita especialmente para o conto no meu perfil do Spotify @mclarah, "After the love has gone" (preparem-se para viajar pelas décadas de 70/80 comigo haha)


After the love has gone

{ou melhor, bagunça sentimental}

Eu não sou muito organizado com as minhas playlists, ou com nada, vão dizer. A segunda já é uma observação mais impiedosa com o meu jeito peculiar de catalogar e depositar meus pertences, mas saibam que na minha cabeça faz todo o sentido. Cada objeto que enfeita essas estantes — miniaturas do caos: objetos de decoração, livros, plaquetas de metal, esculturas de madeira, artesanatos, peças de macramê, sapatinhos de bebês, porta-retratos e afins —, tudo ocupa um espaço fundamental. E mesmo que de fora pareça bagunçado, cada um deles faz parte de uma uma espiral de acontecimentos e memórias e sua organização diz mais sobre o que eu vejo quando fecho os olhos do que quando estão abertos. Eu poderia cunhar o termo organização sentimental como se fosse original, mas aposto que existe um acadêmico de algum dos sete continentes, de uma universidade renomada em que não fui diplomado, que o definiu melhor do que vou fazer.

As minhas playlists seguem essa mesma "lógica". Perdoem-me pela impropriedade terminológica. Sentimentos não seguem nenhuma linearidade e nem mesmo o delta, que quer indicar variação, explicaria como meus os meus vão de um ponto a outro daquela parábola quando uma sugestão do serviço de streaming, muito mais lógica e algorítmica do que os meus sentimentos, intromete-se na minha pré-seleção de músicas favoritas e referências "recentes". Sim, "recentes" é o nome da minha playlist. Sim, eu sei que em alguns meses esse nome não vai mais fazer nenhum sentido e que o que era recente vai se tornar antigo, mas agora elas são referências recentes e me acompanham enquanto rabisco algumas letras na madrugada e procuro deixar que o papel responda sobre aquelas coisas que sou incapaz de elaborar uma explicação racional.

Earth, Wind & Fire. Eu gosto da forma que eles harmonizam muitos elementos com leveza e swing e todas as pessoas tem que dançar quando September toca. Chamamos isso de clássico, um hit atemporal. Essa música não envelhece da mesma forma que a minha playlist intitulada  como recentes. Ela é sempre recente, mesmo que não seja mais setembro e que ninguém esteja dançando comigo quando as caixas do estúdio tem a honra de tocar esse som. É pretensioso dizer isso, mas quando escuto essa música tenho vontade de reproduzir isso, não os acordes, as batidas, o conjunto de metais ou o jogo de vozes fenomenal. Também. Mas me refiro ao sentimento de eternidade que soa quando o vocalista diz "Do you remember?" e sem querer me lembro de coisas que nunca vivi e não sei se as viverei, mas não é tão importante. O mais importante é para onde eu vou nesses poucos minutos. Era isso que eu queria alcançar com esses rabiscos que abandonei na escrivaninha quando as recomendações do serviço de streaming pareciam me perguntar, sem dizer, se eu me lembrava.

Eu, geralmente, recebo mal intervenções na minha bagunça, quero dizer, na minha organização sentimental. Não gosto quando alguém toca um dos objetos posicionados nas minhas estantes, supondo que foi deixado ali de forma aleatória, sugerindo com um suspiro discreto que ficaria melhor em outro lugar. Esse tipo de intromissão me incomoda um pouco e eu vou ser o primeiro a revirar os olhos, ainda que, no final, decida simplesmente ignorar. Não vou gastar palavras explicando que essa placa de metal foi comprada no dia dois de dezembro de 2017 e, mesmo que ela não tenha nenhuma relação temática com os sapatinhos adidas para bebês logo ao lado, foi nesse mesmo mês que a minha prima mais nova nasceu. Portanto, os sapatinhos me lembram dela e a placa foi comprada em dezembro, mesmo que contenha alguma citação aleatória de um livro que ainda não li, o que tem? Dizer tudo isso demora muito mais do que colocar tudo de volta no seu lugar quando a pessoa atravessa em saída a porta, me deixando sozinho para re-bagunçar da forma que estava antes.

Posso dizer que funciona de forma semelhante com as minhas músicas. Como elas também obedecem essa mesma bagunça emocional, quero dizer, organização, fico um pouco incomodado quando o aplicativo me sugere algo que não gravita entre as minhas projeções, pois, modéstia parte, eu sempre tenho uma escolha melhor para o que seguiria Tyler The Creator, Jorja Smith, Honne e, neste caso específico, para Earth, Wind & Fire. Se por um lado eu conhecia uma gama de músicas animadas que fariam sentido para dar continuidade à playlist "recentes", por outro, eu saberia o que não tocar.

Eram raras as vezes que eu aceitava que o algoritmo fizesse a escolha por mim. Talvez se eu estivesse impossibilitado de pegar o telefone e  a máquina agisse antes que eu tivesse tomado a iniciativa de adicionar algo na lista de reprodução, mostrando que ela poderia ser mais rápida e tão perspicaz quanto o meu gosto depurado para música. Nesses raríssimos casos, me sinto quase que na obrigação de parabenizá-la pela boa escolha, afinal, ela havia aprendido comigo, espertinha. Juro que nesses casos é possível me ouvir falando e à primeira vista pode parecer que o faço sozinho, mas eu só estou dizendo "mandou muito bem" para a inteligência artificial que havia conseguido me surpreender. Como se a criatura tivesse "superado" O Criador.

Quando aquela música tocou, eu só estava distraído navegando pela discografia do Earth, Wind & Fire, eu já disse, preso à ideia de fazer algo com aquele som de eternidade, essas coisas que pensamos escondidos do sol, quando ele está longe demais para nos fornecer qualquer lucidez. Portanto, desatento o suficiente para deixar a inteligência artificial se intrometer nas minhas pretensões para as próximas faixas, enquanto estava só querendo descobrir a fórmula para compor O hit, pensando no que, exatamente, eu deveria me lembrar para percorrer o mesmo caminho até aquele mês de setembro que inspirou o Earth, Wind & Fire. Todo esse meu processo, porém, foi frustrado e a minha organização foi por água abaixo quando o som daquele piano desenhou nas paredes do estúdio, impregnando-as daquilo, exibindo um pedaço da bagunça que estava escondida debaixo do tapete.

Essa música é brega, foram as minhas palavras. Lembro-me de apertar os olhos e dar um bom gole na cerveja já um pouco quente, fruto de goladas espaçadas e preguiçosas pelo alongar da madrugada. Eu bebia bem devagar e o copo deveria ter ficado um bom tempo esquecido ao lado do sofá em que eu estava praticamente deitado, quase deixando o sono me vencer. Sextas-feiras são, desde muito tempo, dias cansativos, ainda que da mesma forma, recompensadores, já que encerram o tal ciclo da semana. Estamos diante de uma janela excepcional para se fazer qualquer coisa, inclusive, nada. E o meu corpo cansado sempre sabia melhor do que eu sobre todas as coisas que já havia feito nos cinco dias anteriores. Um bom jantar, dois ou três copos de qualquer coisa com o mínimo teor alcóolico e já estaria pronto para dormir em absolutamente em qualquer lugar.

Essa música é linda, rebateu de forma categórica. A ênfase nos i's e na beleza da canção foi exagerada, seguida de uma comoção quase cômica. Eu me divertia, ainda que sonolento,  vendo-a dançar uma valsa sem par pela sala. Entre um rodopio seu e um piscar de olhos, algo acendeu quando a bateria entrou no final da segunda estrofe. Todo o cômodo foi preenchido por um sentimento curioso, uma cortina fina de melancolia. Seu copo de uísque já havia sido largado ao lado do meu de cerveja, agora vazio, e ela tomou minha mão em uma súplica quase irrecusável. Era sexta-feira, sabe, eu só queria cochilar no sofá e fingir que segunda-feira era uma ficção tão tão distante. Mas é claro que eu seria vencido pela insistência daquele sorriso que desconhecia os meus não's. Na ponta dos pés, ela cercou meus ombros em um abraço, levando meu corpo em um balançar discreto que durou o tempo até o segundo refrão em que me abandonou para cantar empolgada uma letra que havia acabado de aprender, sorrindo satisfeita com a forma que a música crescia e tomava cada canto da sua sala de estar.

Ah, a sua sala. O chá gelado que tenho em mãos até desce amargo quando me lembro das paredes preenchidas pelo conjunto inusitado de posters antigos, a estante cheia de livros que ela ainda não leu, mas com certeza vai (é o que dizia cada vez que adicionava mais um à sua coleção). A violeta apoiada em um copo de vidro preenchido de água até a metade que estaria murcha até a próxima semana e pronta para ser substituída por outra quando eu voltasse na sexta com um buquê em mãos que ela faria questão de espalhar pelos cômodos. A mesa redonda pequena, mas grande o suficiente para caber nós dois, dois pratos, duas taças, uma garrafa de vinho, um prato principal, e o restante poderia ficar sobre a bancada da cozinha americana, cercada de três cadeiras coloridas diferentes, uma sobrando para sua bolsa, é claro. O sofá branco em que eu estava prestes a cochilar, onde tivemos as melhores e as piores conversas, entre a manta de alpaca de alguma vila do Atacama, as almofadas estampadas de Marrakech, o tapete de qualquer loja de Atacado em Icheon que eu mesmo havia levado-a para comprar,  sobre o qual dançávamos nossa valsa desajeitada.

A sua sala poderia ser classificada como bagunçada por olhares muito rígidos, mas eu sempre achei-a muito boa com bagunças, desde as que ela fazia com os seus livros até com os meus sentimentos. E eu estava aos seus pés, aceitando e esperando que ela me bagunçasse,  entre o conjunto de vozes e batidas, quando ela decidiu parar, parar tudo, para colar repentinamente nossos lábios, uma urgência não premeditada que eu sempre recepcionava. Foi engraçado como naquela primeira vez a música foi capaz de criar uma outra atmosfera naquela sala e o meu comportamento sonolento foi anulado e minhas mãos foram atrás do seu corpo, enquanto meus lábios desceram por seu pescoço até chegarem, fundamentalmente, até seu colo. O aplicativo de streaming foi realmente sugestivo e Marvin Gaye soou nas caixas de som como se soubesse que eu puxaria sua blusa pelo pescoço e que ela nos conduziria até o sofá.

Era divertido saber que tínhamos ganhado uma música nossa e sempre que precisávamos de sorrisos compassivos um do outro, era nela que apostávamos. Mesmo quando tudo parecia estar perdido, nenhuma brigada ou chateação era forte demais que não conseguisse ser quebrada por aquele conjunto harmônico, suas mãos apertando as minhas, o sorriso brotando a cada estrofe para encerrar com um abraço apertado.

Por outro lado, eu sempre fui muito apegado a significados. Essa coisa de não existir palavra gratuita, compreende. No fundo, isso me incomodava. E eu cheguei a verbalizar em uma dessas noites, respeitando, é claro, a sua empolgação.

Você não acha que merecemos um tema mais otimista? disse bem humorado e  beijei as costas da sua mão, mas ela me fitou confusa. Essa é uma música de amor. Foi a sua resposta. De um amor que já acabou. Rebati e vi seus ombros balançarem e não era no ritmo da música. Assim você encerrou nosso curto embate, sem dizer mais nada, e meu coração se apertou, entre as goladas do vinho tinto, seus os olhos concentrados em escolher a próxima música que tocaria, os meus nos seus. Eu queria dizer que ainda éramos, sobre temores de antecipar o futuro, do apego que eu tinha por essas sextas-feiras, por ela que certamente acharia minhas palavras emocionada e embriagadas demais. Mas abri mão de tudo isso para entrelaçar nossas mãos e ouvir Daisy Jane, do America, para morar mais um pouco nessa atmosfera em que éramos presente e expectativa.

Agora eu era o presente e After the love has gone é uma trilha sonora atual. E nós passamos, tão rápido quanto os 4:39 minutos que dispersam aqui todas essas memórias antes escondidas debaixo do meu tapete.

Eu posso soar um pouco saudosista. Mas não é inevitável quando tentamos acomodar essas bagunças do passado aqui dentro?

Sinceramente, eu evito pensar muito mais nisso, até porque muito, muito, tempo, mesmo, já foi destinado às minhas divagações. Nos por quês, na construção de linhas cronológicas entre o início e fim que justificariam o destino daquela estrada. Viagens, sessões de terapia, astrólogo, cartomante, confidentes, amigos, amantes. Três caderninhos escondidos na última gaveta do móvel acoplado a essa bancada, 192 folhas cada. Se estimarmos que cada página cabem umas 60 palavras. Temos, portanto, 1152 páginas, 69120 palavras, tentando organizar essa bagunça.

Não há muita linearidade na nossa história e as tentativas falhas de desenhar as linhas cronológicas são a prova disso. Mas o que adianta desenhar se ela achava que não dava mais, palavras sem arrependimento e com muito medo, seu choro dizia por si, escapando teimoso mesmo quando apertava os olhos. Ainda dá sim, eu disse. Eu não concordava com ela, da mesma forma que nunca achei que After the love has gone era a melhor trilha sonora para nós, ainda que hoje ela cumpra muito bem esse papel. Ela era mesmo uma visionária, é o que penso hoje bem mais bem humorado do que quando terminamos.

E foi isso, terminamos. E lá estava ela me bagunçando mais uma vez, mas sem afago ou beijo antes de dormir, eu estava sozinho assim como estou hoje. Perdão aos curiosos, eu não vou listar os motivos, nem descrever nossas discussões. Vocês sabem, casais rompem, pessoas têm sonhos e planos diferentes, talvez tenha sido isso. Ou só não dava mais por qualquer outra razão e hoje ela está em alguma parte desse mundo, descobrindo restaurantes legais, visitando livrarias antigas, brechós, provando vinhos recomendados pelo sommelier que trabalha no supermercado, assistindo séries antes de cochilar no sofá, dormindo tarde e acordando cedo para trabalhar, metrôs cheios, as costas na parede lateral do transporte rápido, os sapatinhos oxford batendo no chão no ritmo da música, fones no ouvido, quando o aleatório vai tocar a nossa música. Talvez ela pule a faixa, o sinal de internet caia e a salve desse túnel de memórias. Ou  talvez ela escute até o final sem suspirar, sem amaldiçoar ou resmungar. Talvez no final da faixa ela esteja assim, sob o efeito expansivo do último refrão de After the love is gone. E pense: quer saber, essa é uma música muito brega, mas linda, mas brega. Linda e brega. E um sorriso discreto vai brotar nos seus lábios bonitos. Ela vai disfarçar, pois é possível que pareça que está sorrindo para um dos rapazes à sua frente, vai olhar para o chão e bagunçar os cabelos. Talvez ela se lembre de mim.

Eu que estou aqui, sorrindo. Eu que me rendi a intromissões não autorizadas na minha bagunça e, quer saber, essa música é linda. E brega, muito brega. Muito linda e brega. Não faz mal admitir, eu sinto falta da bagunça daquela sala e queria que o metrô onde ela poderia estar agora tivesse sinal de telefone. Vou pegar o celular e discar o seu número, torcer para que não tenha mudado, perguntar como ela está, dizer que ouvi a música agora. E ela vai dizer: que coincidência, eu também. Sua voz vai estar metálica, cortando um pouco, ela ainda está no metrô voltando pra casa, diferença de fuso, sabe. Um silêncio vai se instalar e vamos dizer ao mesmo tempo que sentimos a falta um do outro.

Voltei a encarar os objetos sobre a estante, de volta à minha bagunça, larguei o celular, não vamos a lugar nenhum. Retorno aos meus rabiscos, mas não tenho muita paciência para as palavras avulsas e, por ora, desisto. Isso de capturar a eternidade é complexo, talvez não seja nessa madrugada. Eu mesmo escolhi  Daisy Jane do America para tocar dessa vez, e essa música me emociona mais que a anterior. Impactos premeditados e selecionados por mim e para mim. Quem diria que eu estaria ouvindo America numa sexta-feira de madrugada insone. Respiro fundo e meus olhos agora voltam às estantes e focam na placa de metal, entre os sapatinhos de bebê, o objeto de macramê, miniaturas diversas, minha bagunça sentimental, quero dizer, organização sentimental. Tenho que me lembrar de pesquisar depois se alguém já usou esse termo para fazer a referência correta. E na plaqueta de metal estava escrito:

"Há coisas que são preciosas por não durarem."

Oscar Wilde

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Hello!

Obrigada por acompanharem esses produtos da minha bagunça sentimental. Ansiosa pra saber de vocês o que acharam de tudo isso!

Se cuidem!

Beijos da Maria ❤️

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