Capítulo 3 - Revisado
** Primeira revisão 01/05/2021. Contém 4.688 palavras **
Era uma quarta feira e as meninas estavam combinando que roupa usaria na festa enquanto eu lia o Diário de Anne Frank. Já o havia lido antes, porém aquele papo sobre roupa parecia tão monótono e cansativo que não me preocupei em me lembrar de detalhes do livro, adorava as historia sobre o nazismo, não como encanto pelo regime nazista em sí, mas por pensar que aquilo realmente aconteceu e não fazia tanto tempo assim. Então encarei firme a historia. Davi não apareceu na escola. Escutei atentamente quando Lis começou a falar de batom. Eu tinha uma pequena queda por batons. Era o tipo de vaidade que eu adorava. Deixei o livro de lado, até que o sinal bateu dando por encerrado o intervalo. A próxima aula seria de sociologia e o professor daria a largada para o começo do trabalho.
- Tudo bem queridinhos os professores irão pegar leve com vocês nesse primeiro bimestre, porém não sou como eles. Acho que a energia toda de vocês estão nesses primeiros meses e quero aproveita-la. Formarei grupos de quatro pessoas. Sem mais e sem menos. O projeto é o seguinte: Chamei de "Modificando padrões". Sabemos essencialmente que vivemos em uma sociedade tradicional e ética. Temos diversas culturas, porem seguimos as mesmas regras. Quero que modifiquem isso de uma forma para o bem. Vocês estão em uma escola onde a opressão começa logo cedo. Utilizem isso de forma coerente e absorvam os resultados iniciais. Quero que criem o ambiente perfeito para que vocês tenham ótimos desempenhos. Quero algo clássico, porém criativo. Nada de apresentações bizarras, pois nem pretendo perder meu tempo. Por modo simples separei vocês por fileira. Percebi que cada fileira tem quatro pessoas, então esse são os grupos de vocês. Quero que me entreguem uma folha com o nome de vocês ate o fim da aula. Boa sorte.
Olhei para Lis que abriu um sorriso, ela se sentava atrás de mim. Depois encarei o menino logo atrás. Ele tinha o capuz sobre a cabeça e mantinha a cabeça abaixada. Teria que falar com ele, mas não o fiz, estava distante demais. Depois olhei para ultima ocupação da fileira e era a Tamara. Era indiferente com ela e imaginava que ela expressava a mesma coisa por mim.
No fim eu e Lis entramos em uma discussão sobre ideias e planejamentos e nem percebemos a hora que o sinal tocou. O professor se levantava pra ir embora e eu desesperadamente comecei a escrever os nomes em uma folha, mas logo surgiu a minha frente um papel branquíssimo escrito com letras firmes.
Grupo
Anne Soffy
Lisa Marionne
Tamara Santos
Richard Benjamin
Reconheci de imediato a letra era a mesma do pedaço de papel abandonado no chão da sala o outro dia. Olhei para cima só para ver um vulto. Richard já se dispensava diante da porta da classe. Imaginei que esse fosse seu nome, mas como ele sabia o nome e sobrenome de todas nós? Entreguei o papel para o professor e Richard não voltou mais para aula.
Lis foi comigo até em casa. Pegamos um ônibus e paramos no mercado para comprar baboseiras. Andy não quis ir conosco pois iria ao salão fazer qualquer coisa desinteressante no cabelo. Estávamos andando pela minha rua com sacolas nas mãos quando Lis puxou o assunto da festa.
- Você acha que ... Vai ter muitos garotos nessa festa? - Lis era tímida quando falava sobre esses assuntos. Ela abaixou o olhar e chutou uma pedrinha.
- Com certeza, Jaque não faria uma festa sem uma boa orgia. - O rosto de Lis ficou da cor do seu cabelo, tentei corrigir meu erro. - O que eu quis dizer é que essas festa sempre rola bebida, gente se pegando, pessoas passando mal e joguinhos idiota. Essa é a diversão
- Eu sei! - Ela sorriu - Não é como se nunca tivesse ido em uma – Encarei-a - Ok, eu nunca fui, mas ninguém precisa ficar sabendo disso né. E eu ia em muitas festa naquele joguinho habbo. - Começamos a rir histericamente
- Caramba! Você é muito festeira menina.
Quando chegamos em casa fui mostrar meu quarto para Lis e ela ficou amando todos os meus livros e cremes os quais nem usava tanto assim. Sentamos na sala e ficamos conversando sobre a festa, garotos e comemos. As horas passaram sem a gente perceber. Até que ela disse:
- Aquele garoto é meio estranho. - Eu sabia que ela estava falando do Richard, porém não conseguia seguir a conversa sem perguntar.
- Que garoto?
- O que esta no nosso grupo. Eu nunca vi o rosto dele completamente, porque ele sempre esta com aquele capuz imenso cobrindo seu rosto! Será que é deformado?! - Ela fez uma cara de assustada.
- Talvez, mas não me importo desde que ele ajude no trabalho.
- Sem eu ver o rosto dele já sinto medo, imagina se eu ver.
O assunto sobre Richard morreu e a tarde passou sem grandes problemas. Quando meu pai voltou levou Lis pra casa. Minha mãe não retornou pra casa naquela noite.
Não vou retornar pra casa hoje. Houve uma complicação em um caso e terei que passar a noite no escritório. Avise seu pai.
Ela mandou um SMS as 20:00hrs.
Não respondi e ela não ligou e ficamos por isso mesmo.
Na quinta feira as meninas estavam tão animada que esbanjavam hormônios. Eu continuei minha leitura de Anne Frank, mas não conseguia desgrudar os olhos de Davi. Ele estava com uma blusa bege e uma calca jeans clara, simplesmente lindo. Uma menina de blusa justa e sapatilha abraçou ele e ficaram conversando durante um tempo. Não teve como conter o ciúmes, tentei mudar meu foco.
- Anne vem para minha casa se arrumar sábado e traga Lis. - Concordei com a cabeça - Animação menina! Não estrague tudo!
- Uhuul - Fingi uma breve animação - Tudo bem.
Na ultima aula pedi pra ir ao banheiro. Fui seguindo pelo corredor vazio. Quando estava próxima do banheiro escutei sussurros. Fiquei alguns instantes parada esperando identificar o que falavam. Não reconhecia as vozes, elas pareciam alteradas, mas consegui entender o que elas falavam.
- Vai logo mano, se alguém descobrir a gente vou pegar mais uma suspensão! - A primeira disse.
- Eu ainda não acredito que você pegou suspensão por esta catando a Stephany na sala de aula. - A segunda riu.
- Nem eu, aquela vadia tinha que gemer tão alto? Enrola essa merda logo.
- Calma Davi! Caralho mano.
Ficaram em silencio, não acreditava no que estava pensando. Tentei permanecer quieta do lado de fora da porta, mas fiquei espantada quando a mesma se abriu rapidamente e eu não pude nem ao menos me esconder. Encarei o rosto de um menino moreno com sobrancelhas grossa.
- Qualé guria! Espiando?! - Ele se aproximou de mim e eu vi ele colocar um pacotinho com algo no bolso, dei um passo para trás, negando com a cabeça. Foi nessa hora que Davi saiu do banheiro me observando. Ele sorriu e distanciou o menino ficando de frente comigo.
- Relaxa Alex, ela não vai dizer nada. Não é mesmo, Anne? - Ele sorriu novamente, meu coração teria acelerado se a magia não tivesse acabado com o cheiro que se seguiu. Forte cheiro de cigarro. Não abaixei a cabeça, porém senti um nojo intenso. Ele passou as mãos no meu cabelo parando o polegar na minha bochecha. Eu lembrava daquele toque. Era familiar, mas não carinhoso. Continuei encarando seus olhos e eu senti seus dedos se encaixarem nos fios do meu cabelo. Levantei minha mão até segurar a dele e a empurrei. Voltei com passos firmes para sala de aula. Sentia-me horrível, meu Davi estava fumando...
Quando cheguei em casa ainda sentia o toque de Davi no meu rosto. Tudo parecia tão complicado. Na maioria dos casos sonhos se formulam rapidamente e sem maiores problemas, só que aquele sonho podia ser tudo, só não era normal.
Quando estava me dispensando da escola algo inusitado aconteceu. Lis estava do meu lado e sussurrou:
- Acho que Andy encontrou um novo amigo - Ela apontou para o local onde Andy estava, ela se mantinha em pé segurando um livro, enquanto Davi fazia pose com uma das mãos encostada na parede e um sorriso cativante no rosto. Andy sorria também. Em um breve momento ele passou os dedos pelo cabelo dando um volume para os fios. Andy parecia toda derretida. Algo como raiva passou pelo meu corpo e eu teria ido até eles se não ouvisse a voz da Jaque atrás de mim.
- Andy sempre me surpreendendo. Davi Thonson. O gato do 2C. O que foi Anne, você parece meio pálida? - Ela sorriu de modo irônico e completou. - A não, você sempre teve essa cor sem graça. - Eu teria esmurrado o rosto dela, porém a calma era um dos meus dons. Apenas virei e sorri dizendo de modo apático.
- Droga! Passei as minhas férias no sitio e nem assim consegui uma cor. Obrigada por me informa Jaque. Mande lembranças a Andy.
Sai pela rua esquecendo-me completamente de Lis. Só queria chegar em casa.
Minha mãe já estava em casa quando cheguei. Ela não falou comigo e eu não falei com ela. Fui para o meu quarto e incrivelmente entrei no chuveiro de roupa e tudo. Sentei-me no box e fiquei encarando o teto branco. Imaginei Davi e Andy juntos. Tais pensamentos revirou meu estomago.
Quando voltei ao quarto dormi de modo desengonçado em cima da cama, mas logo acordei com o meu celular vibrando histericamente na mesinha do computador.
- Alô - Não olhei o visor para saber quem era.
- Anne amor, você esta bem? Lis disse que Jaque andou de irritando. - Andy falou do outro lado da linha.
- Ah sim, estou ótima. Só estava cansada, ou melhor estou cansada. - Usei um tom firme para completar.
- Ah - Ela pareceu decepcionada, talvez quisesse fofocar - Desculpa ...
- Tudo bem Andy, mais tarde eu ligo para você.
- OK ... Beijos.
Desliguei, sabia que tinha sido grosseira, porém não pude me conter. Enfiei minha cabeça no travesseiro e voltei a dormi. Quando acordei, não liguei pra Andy. Continuei escrevendo no diário e quando já se passava das uma da manhã, voltei a dormi.
Na sexta as meninas tinham planos. No sábado teria a festa e claro elas queriam chamar atenção, menos eu e Lis. Mesmo que Lis ainda estivesse empolgada, eu estava mais pra o dilema " Dane-se tudo".
Ouvi Andy contar para Lis parte da conversa dela com Davi, dizendo que ele disse o quanto ela era linda e que ele parecia muito legal. Tentei me controlar e ser indiferente com o assunto. Eu amava Davi e ele me amava. Apenas isso. E aquilo só era um bendito sonho interminável.
Porem não conseguia distinguir o que era mais doloroso. O fato do sonho esta tomando caminhos errados ou da realidade ter simplesmente encurtado os caminhos certos.
Richard ficou até a segunda aula. Não fui falar com ele por que temia a algo. Ele era estranho pra mim e eu não conseguia me sentir espontânea próxima dele. Me perguntava como seria sua aparência, se ele realmente tinha alguma deformação em seu rosto...
Fui para casa mais cedo e quando cheguei não me importei com o vazio, sabia que não teria ninguém. Fui na cozinha beber algo e fiquei observando o céu pela janela. Não me sentia atraída pelo céu de dia. Ele me chamava atenção durante a noite, mas naquele momento ele estava me tranquilizando.
Atendo três telefonemas procurando pela minha mãe. Um telefonema do meu pai perguntando se estava tudo bem. No decorrer do dia abasteci meu tempo assistindo programas na TV, depois me dei por vencida e fui procurar alguma roupa para a festa.
Sabia que iria encontrar meninas com vestidos curtos demais, shorts, decotes, blusas apertadas ou transparentes... Mas nada daquilo fazia meu estilo. Escolhi minha melhor calca jeans preta justa e uma blusa do Evanescence. Obvio usaria all star. Tentei me animar na escola do batom, mas decidi escolher na hora.
Voltei a ler e acabei o livro de Anne Frank. Recomecei um livro da Marian Keyes. Uma das minhas escritoras preferidas. Também já havia lido aquele livro (Sushi), porém a leitura era tão leve que me entretida facilmente.
Lis ligou duas vezes para mim. Aparentemente sofria de ansiedade e eu só queria dormi.
Por fim a mãe de Lis brigou com ela e a mesma foi forcada a pegar no sono.
As nove horas meu celular me acordou. Teria que esta na casa de Andy as onze.
Tomei um banho, peguei minhas coisas e saí.
Não tinha ninguém em casa.
Desci apressada para a cozinha.
Não tinha ninguém em nenhum cômodo.
Porem achei um bilhete que quase me fez ter um infarto.
Menininha, sei que prometi leva-la na casa de sua amiga, porém na madrugada sua mãe teve uma típica emergência. Teria uma audiência urgente e por ser uma viagem de seis horas eu me ofereci a ir com ela. Não se preocupe. Falei já com a mãe da Andy e você pode dormi na casa dela, deixei um dinheiro pra você se manter. Provavelmente estarei de volta na madrugada de segunda. Amo você. Se cuida.
Não era possível ... Ele ... O bilhete ... Era idêntico ao que ele deixou .... Antes do acidente...
Por instinto peguei o celular, mas lembrei daquele fim de tarde. Meu coração acelerou. Tudo aquilo tinha acabado com a morte do meu pai, não aguentaria passar por aquilo novamente.
No dia do acidente do meu pai eu achei um bilhete com as mesmas palavras grudado na porta da geladeira. Dizia do imprevisto ocorrido no trabalho de minha mãe e que ambos teriam que fazer uma viagem. Ele disse que me amava e pediu pra eu me cuidar. No momento não me importei. Era tão comum eles saírem assim... Quando estava escurecendo eu liguei para o telefone do meu pai e ele atendeu no terceiro toque.
- Oi menininha. - Ouvi a voz concentrada dele do outro lado da linha.
- Esta tudo bem?
- Claro, estamos quase chegando. Sua mãe esta dormindo no banco de trás. Dei um trégua para ela - Escutei a risada leve dele. - E você ? Comeu direito?
- Sim pai, acha que volta para casa quando?
Ele não respondeu. A ligação devia ter caído. Foi o que imaginei, porém ao retornar dizia que o numero chamado estava desligado ou fora de área.
Na madrugada daquela noite o telefone fixo tocou e minha vó me deu a noticia. Um dos meus tios foram me buscar. Fui levada ao hospital, não quis entrar no quarto para ver minha mãe. Não chorei, nem na hora da noticia. Nem no velório. E nem no enterro. Não chorei na hora que vi pessoas jogando flores no túmulo. Só pensava que não tinha me despedido que pelo o que imaginava eu teria sido a distração que teria causado o acidente.
Naquele momento meu pai poderia esta a caminho da morte. Mas ... Não podia ligar, por que poderia cometer o mesmo erro. Então com o meu coração ainda pesado pela angustia fui pegar o ônibus.
Lis me esperava na frente da escola e eu estava perdida em pensamentos. Estranhamente eu rezava, não me importava de não ter a mesma fé da maioria das pessoas, só tinha fé naqueles que eu amava.
Me perdi dezenas de vezes na conversa compartilhada entre Lis e Andy. Não participei na hora de fazer as unhas, o cabelo e limpar a pele. Fiquei deitada escutando música até dar a hora exata de começar a me trocar.
Não queria ir naquela festa. Não tive vontade desde o inicio e agora não tinha nem mesmo paciência. Estava pronta pra desistir quando meu telefone tocou.
- Menininha? - Meu coração bateu devagar no peito. Era meu pai ... Ufa.
- Oi! - Quase gritei.
- Calma! - Ele riu - Vejo que esta ansiosa pra festa.
- Ah ... Claro.
- Ótimo, só queria saber se está bem. Não tome nada com álcool e volte o mais rápido possível para casa da Andy.
- Tudo bem.
- Agora deixa eu ir. Tentarei descansar. Beijos.
- Beijos ... E pai ... - Hesitei um pouco antes de dizer. - Eu te amo.
- Eu também querida. Se cuida.
Desligou.
Lis já estava com o seu vestido preto que destacava a cor do seus cabelos. Ela teria ido com ele preso se não fosse por Andy convencê-la de ir com ele solto. Andy também passou varias camadas de rímel e um gloss na cor pêssego, terminando assim a produção de Lis.
Andy por sua vez estava também de vestido, porém o dela era verde e rendado. Era um palmo acima do joelho. Seu cabelo estava trançado de forma delicada para o lado. Ela tinha marcado seus olhos com delineador e aplicado blush, usava um batom rosa discreto nos lábios.
E eu continuava com a mesma roupa que tinha vindo pra casa dela. Ambas olharam pra mim horrorizadas.
- Anne! Vai se trocar! - Disse as duas em coro.
- Estou indo.
Não demorei muito no chuveiro, já tinha tomado banho mais cedo. Passei meu hidratante e meu corpo pareceu agradecer pelos mimos quase raros. Vesti a calça, a blusa e soltei o cabelo, bagunçando ele de leve com os dedos para dar volume. Encarei meu rosto pálido e sai do banheiro, já procurando meu all star pra vesti-lo.
Andy olhou pra mim desaprovando minha roupa.
- Querida você não vai pra escola. Vai em uma festa! Na verdade você vai até mais arrumada para escola.
- Sabe qual é a relação entre a duas? Ambas eu não quero esta presente. - Vesti meu tênis
- E sabe de uma coisa? Não me importo. Vou procurar uma roupa para você.
- Só por que você vai procurar, não quer dizer que irei usar. - Respondi de forma malcriada.
- Não perguntei. Você só vai usar.
Ela começou a mexer no guarda roupa, pegando saias e vestidos. E desaprovando todos. No fim ela suspirou e pareceu se dar por vencida quando notou algo.
- Use isso! - ela me estendeu um cropped "tomara que caia".
- Não vou usar isso. Minha barriga vai ficar a mostra!
- Essa é a graça. - Ela sorriu. - Se você não usar irei fazer uma maquiagem bem pesada em você.
Vesti o cropped. Tentei esconder o máximo da minha "nudez" com o meu cabelo. Lis que estava presente no quarto naquele momento me entregou um saquinho. Eu o abri e peguei o batom vinho. Ele era incrível. Agradecida passei o mesmo na boca, era tão vivo que parecia até esmalte nos lábios. Adorei.
Saímos em direção a casa da Jaque. Escutamos assobios na rua e eu sabia que todos eram direcionados a Andy e Lis, elas estavam surpreendentes.
De longe já dava pra ouvir a música alta vindo do sobrado vermelho.
A casa de Jaque era de dois andares e a laje coberta. Era tinha a cor vermelha e a entrada era uma comprida garagem. Havia uma escada de caracol na estrada que subia para o segundo andar e nos fundos da casa tinha mais uma escada.
Os portões da garagem estavam abertos, mas não tinha muito gente naquela área. Havia alguns recipientes de isopor com bebidas cobertas de gelo e um sofá a onde um menino e uma menina estavam conversando. Imaginei que a festa estaria acontecendo na laje por que obviamente o som vinha de lá.
Andy pegou uma latinha de guaraná, Lis e eu não pegamos nada. Subimos a escada de caracol e ignoramos o andar de cima, fomos direto pra laje.
Um grande globo brilhante estava no centro com algumas pessoas dançando embaixo dele. O chão foi coberto por uma lona estilo tabuleiro de xadrez. Não havia lugar pra se sentar. Tinha mais cinco "baú" a onde continha as bebidas e uma mesa com algumas baboseiras.
Não tinha muita gente ainda.
Tocava uma eletrônica alta. Não conhecia boa parte das pessoas e me sentia deslocada, mas aparentemente Andy conhecia a festa toda.
As 21:00 a festa começou a encher. Ficou complicado subir e descer as escadas. Gente já alterada pulava de forma embriagante na pista de dança. No segundo andar parecia mais um motel de tanto casal se beijando. Não queria nem imaginar a situação dos quartos. No primeiro andar estava rolando os típicos joguinhos de festas. Como verdade ou desafio e "vira a bebida". A maioria das pessoas já estavam bêbadas.
As 22:00hrs Andy chamou a gente pra jogar um dos joguinhos e eu neguei de forma coerente, porém Lis ficou curiosa e Andy a puxou sem nem ao menos me da a chance de convence-la a não ir.
Fiquei sozinha vendo um monte de bêbados se agarrando de forma explícita.
Decidi voltar para casa de Andy depois que tinha se passado meia hora que estava solitária. Procurei Lis pra que voltasse comigo e quando a encontrei junto de Andy em uma pequena rodinha ela estava tão alterada que me chamou de chata. Dizendo que eu não sabia me diverti. Me estressei com aquilo e fui caminhando sozinha pela noite.
Quando cheguei na casa de Andy disse para Senhorita Beth que não estava passando bem e vim sozinha para não estragar a diversão das meninas, ela aceitou a desculpa e eu me vi sozinha no quarto de Andy. Fiquei tempos sentada na cama, mas não dormi. Em algum momento senti sede. Já passava das duas da manha e nenhuma das duas tinha voltado para casa.
Quando deu quatro horas comecei a ficar preocupada. Continuava com a mesma roupa da festa, decidi ir atrás das meninas. O portão estava fechado porem sabia que Jaque guardava uma chave reserva na caixinha do correio. Quando entrei vi a completa bagunça: copos descartáveis jogados por todo o espaço, salgados amassados, latinhas de cerveja e garrafas de vodkas estavam em todos os lugares. No segundo andar ainda encontrei camisinhas espalhadas. Nojento. Encontrei Lis deitada com a maquiagem toda manchada e o cabelo desgrenhado dormindo em um sofá de dois lugares. Acordei ela com alguns sussurros. A mesma acordou e demorou um tempo para perceber a onde estava e qual era seu estado atual. Sua expressão foi de confusão a terror. Ela sabia que tinha feito algo de errado.
- Ai meu deus, eu bebi! Eu enchi a cara na verdade. Que horror! Que marca é essa? - Ela apontou para sua coxa a onde tinha uma enorme marca roxa. - Não me diz que isso é ... Ai meu deus! - Ela estava se descontrolando. Tentei amenizar as coisas.
- Calma. Pode ser apenas uma batida. Vamos embora você precisa de um banho. Cadê Andy? - Olhei envolta sem encontra-la.
- Não lembro ... A gente estava jogando ... Eu bebi muito, tinha um garoto chamado Rodrigo dando em cima de mim e ele me beijou ... Ficamos um tempo nos beijando e quando procurei por Andy ela estava dançando com um menino ... Ai minha cabeça - Ela colocou a mão de forma dramática na cabeça. - A onde você estava ?
- Fui para casa.
- Você perdeu a festa toda!
- Amém.
Fui caminhando até a cozinha, todos os quartos estavam fechados e claro não iria interromper intimidade de ninguém. Subi na laje, mas não havia ninguém lá. Voltei e Lis já estava com sua sandália e organizava os fios rebelde de seu cabelo.
- Bom não encontrei ela. Vamos embora.
Nessa hora a porta do ultimo quarto próximo a cozinha se abriu de imediato olhei pra ver quem era e fiquei estupefata. Davi era a ultima pessoa que pretendia encontrar. De cara imaginei que talvez se eu tivesse na festa poderia ter ficado com ele ... Mas logo outro pensamento me passou, que possivelmente ele tinha ficado sim com alguém, por que seu cabelo estava completamente bagunçado e estava sem camisa mostrando o abdômen não tão bem definido, mas liso. Ele tinha uma cara de sono e quando nos viu abriu um sorriso que logo foi cortado por um bocejo.
- Olá garotas - Ele mexeu no cabelo e se esticou de forma calculada - Aproveitaram a festa ? - Nem eu e nem Lis respondemos a pergunta e ele pegou uma garrafa de agua na geladeira, tomou-a. - Que pena que vocês não aproveitaram, por que tenho certeza que a amiguinha de vocês se divertiu muito. - Ele sorriu como um gato para gente e o pensamento que tanto temia veio até mim. Ele tinha dormido com Andy. E no momento que eu desenvolvia o pensamento a mesma saiu do quarto, também arrumando o cabelo e organizando o vestido amassado. Ela olhou pra mim e Lis e sorriu, eu tive uma vontade súbita de mata-la.
- Bom dia meninas! - Ela estava carismática
Não consegui disfarçar meu desprezo. Encarei ela com o meu pior olhar, o de nojo. Estava pronta pra explodir, mas como sempre preferi fugir da situação. Desci apressada as escadas.
- Calma Anne! Que foi? - Escutei Andy atrás de mim, eu teria corrido, mas de alguma forma queria que ela me alcançasse. - Você esta maluca?! O que houve com você?
- O quê houve? - Encarei ela, arregalando meus olhos. Teria saído fumaça de mim naquela hora. - Você acabou de dormi com o meu ... - Medi bem as palavras. - Com um qualquer !
- Eu não fiz nada! - Ela tentou se explicar, mas com um olhar de curiosidade ela completou - Não ... Pera ... Você ... Gosta dele?!
- Não! Só não achei que você seria tão vadia assim! - As palavras saíram da minha boca sem nem antes eu puder repensar. Minha visão estava péssima por causa das lagrimas acumuladas de raiva.
- Vadia?! Eu não fiz nada! Só ficamos juntos! Que droga Anne! Pare de ser uma mamãe! Tenta se diverti. - Minha voz aumentou, nessa hora já tinha algumas pessoas vendo a nossa discussão. Entre elas Davi e ele continuava tomando a agua com um sorriso no rosto, Lis também observava horrorizada.
- Você - não - sabe - por - o - que - eu - passei. - Disse soletrando cada palavra - Não me mande ser divertida, por que não tenho motivos para tal. Idiota - Eu sai apressada pela rua. Não tinha razão naquela hora, era os pensamentos que me guiava. Era um domingo e as ruas estavam vazias, e o clima era frio. Me abracei e deixei que as lagrimas tomassem seu rumo.
Não acreditava que minha melhor amiga tinha ficado com ele ... Era, horrível. A dor era tanta que chegava a me deixar inconsciente. Tinha um mundo na minha frente, mas eu não o enxergava. Caminhava sem rumo, apenas andava por que era uma atividade monótona que disfarçava minha vontade de deitar e ficar paralisada por todo o resto da vida.
Lembrei que era apenas um sonho, mas parecia tão real, a dor era real.
Algumas padarias já estavam aberta, e senhores e senhoras de idade vagava pela rua mantendo suas primeiras atividades.
E eu continuava andando, não percebi quando o cenário mudou. Havia acabado os comercio e eu tinha entrado em uma avenida. Não escutei o barulhos dos vários ônibus e caminhões que circulavam. Não percebi os barulhos de moto. Também não percebi quando o barulho alto e nítido de buzina soou. Quando me dei por mim estava encarando um caminhão que chegava cada vez mais perto. Fiquei assustada. Depois relaxei imaginando que com a minha morte eu acordaria daquele pesadelo. Depois pensei se sentiria dor. O caminhão estava bem próximo e eu conseguia ver o rosto com o boné assustado do caminhoneiro e que tentava freneticamente mudar o veiculo de pista. Escutei mais buzinas e fechei os olhos. Esperando ... Esperando ... Esperando, meu corpo pareceu entrar em coma. E quando retornei a abrir os olhos já me sentia fora do sonho.
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