Capitulo 27
Encarei a tela do Netbook. Já estava na quinta página, mais de 15 mil palavras. 15 mil coisas que um dia eu gostaria de dizer, fazer ou simplesmente viver. Já havia escutado de algumas pessoas que " brincavam com as palavras", naquele momento sentia que as palavras brincavam comigo.
Eu sempre imaginei que teria tempo antes de morrer. Que poderia dizer para as pessoas tudo que pensava. Que poderia dar um adeus digno, mas nunca sabemos quando nossa hora vai chegar...
E cada vez mais eu ficava sem tempo. Me sentia um fracasso e acima de tudo sentia que tudo que havia vivido até então era apenas teatral. Sem emoção, sem verdade.
Algumas pessoas ficam felizes por poder morrer com a certeza de que tinha vivido um amor verdadeiro, que havia feito conquistas e vivido intensamente. E eu estava pensando com o que eu poderia me confortar quando a morte viesse me buscar. Nada.
O que fazer quando se esta sozinho? Lembrar... Mas lembrar o que exatamente? Sonhar... Mas o que sonhar quando não se tem mais esperanças? Então, eu somente esperava algo.
Eu nem sabia exatamente quanto tempo estava ali.
Estava tão encarcerada em sentimentos negativos que dormia sempre com o travesseiro molhado de lágrimas que nem percebia que chorava.
Naquele dia especifico havia pegado no sono sem chorar. Estava absorvida por um cansaço incomum quando a porta do quarto abriu e fez um barulho estrondoso. Por um momento sem racionar achei que a MINHA casa estava sendo invadida, ai lembrei que não estava em casa então somente esfreguei os olhos tentando me adaptar com a falta de iluminação.
Fiquei encarando a porta até a visão focar. Demi veio tropeçando até a minha cama. No começo achei que ela estivesse ferida ou fraca até ela bater no baú de roupas e xingar.
- Você esta bêbada? - Arregalei os olhos e virei o rosto quando senti o cheiro forte de bebida. - Como você pode esta bêbada ? - O nojo na minha voz era sagaz.
Ela riu de uma forma ignorante. Agora ela já tinha conseguido sentar na cama e jogava a cabeça para trás querendo expressar o quanto achava graça naquilo.
- Temos o direito de nos divertir querida, nos embriagar ... Ter prazer. - Ela se aproximou e eu instintivamente me afastei ficando na ponta da cama, a coberta estava dificultando minha saída estratégica da cama. - Mas somos resistentes. Tomei uma garrafa de tequila. - A voz dela tinha engrossado um pouco mais, respirei aliviada.
- Tequila? - Tentei manter a conversa, não estava gostando da ousadia que o álcool provocava nela.
- Sim, tequila é meu ponto franco. - Ela passou os dedos pelo cabelo, estava olhando fixamente para o teto. Passou-se dois minutos em silêncio e então ela sorriu. Um sorriso brilhante que trazia luz em toda aquela escuridão, então ela me encarou. - E você.
Meu relógio mental demorou para entender e quando finalmente o tic tac funcionou Demi já estava muito perto, e a coberta estava presa embaixo do corpo dela. Tentei me desviar e consegui por alguns instantes até ela segurar meu rosto com aquelas unhas compridas e aproximar seu rosto do meu.
- Você é meu ponto fraco Anne. - O perfumo doce dela se misturou com o cheiro de bebida eu fiquei enjoada. Minha cabeça rodou e só conseguia sentir a unha dela cravada na pele da minha bochecha.
- Demi você esta me machucando. - Tentei virar a cabeça mas ela pressionou ainda mais as unhas e instintivamente soltei um gemido. - Não Demi, para ... - Minhas palavras se perderam quando a boca dela se aproximou mais abafando meus pedidos desesperados.
Só acreditei que aquilo estava acontecendo quando me deu ânsia. Se não bastava a língua dela querendo abrir passagem pela minha boca de forma bruta ainda tinha o gosto de tequila e sal.
Era impossível de acreditar que a mão na minha nuca era de uma mulher. E a boca tocando a minha, e a língua lutando para entrar na minha boca. O difícil era acreditar que além de uma mulher era Demi, um demônio. Pensar nisso só aumentava minha vontade de vomitar.
Pensei em Richard e por impulso mordi os lábios de Demi. Ela xingou e se afastou. Aproveitei para me desfazer das cobertas.
Ela me puxou e eu a empurrei. Em situações normais ela não teria nem se mexido mas por conta da embriaguez ela se desequilibrou e tombou na cama, aproveitei e sai correndo. Passei pela porta e a fechei para ter mais tempo.
Havia decorado o caminho da saída nas minhas poucas visitas a sala a onde geralmente comíamos. Fui direito para lá sentindo o cheiro da ... Vida.
Não me abalei pelo frio que senti quando finalmente passei pela porta. Senti um arrepio de prazer por finalmente esta sentido o vento bater nos meus braços.
Escutei de longe Demy gritando. Sábia que tinha pouco tempo.
Olhei em volta, estava escuro demais para entender o que era aqui e a onde estava. Corri.
Quando finalmente meus olhos se adaptaram consegui enxergar o muro que preenchia ao redor da casa. Droga.
Não tinha mais o que fazer. Não tinha como sair daquela prisão. E quando Demi me alcançasse ela me forçaria a fazer aquelas coisas. Pior, teria que fazer aquelas coisas e aguentar ela me machucando.
Comecei a chorar. Estava desesperada, não aguentava mais aquilo.
Uma tristeza avassaladora me encontrou e foi um susto por que aquela tristeza era o dobro do que eu sentia. Era como se por um segundo eu estivesse sentido todo o peso do mundo. Mas ...
Escutei um sussurro. Primeiro foi tão baixo que me assustou, comecei a procurar de onde tinha vindo até ouvir mais claramente. Anne ...
O chamado perfurou meu coração, tão fundo que não saberia explicar a sensação que tive.
- Richard ... - Respondi, as lágrimas se misturaram com o sorriso que se formou nos meus lábios. Fazia tanto tempo que não sentia algo tão puro.
Fechei os olhos me concentrando nele. Ele estava tão triste que aquilo me quebrava ainda mais. Mas no meio de toda aquela tristeza senti uma esperança vinda de nós dois, uma esperança que se abraçou assim que falei o seu nome.
Ele estava na minha frente. O cabelo estava maior e só de olhar já conseguia ver os nós que se formava. Usava uma camisa branca. Era estranho ver ele com uma roupa clara.
Os olhos dele estavam tão fundos ... Me encarou por tanto tempo que tive vontade de me beliscar para ele ver que era eu. Sorri, para mostrar que não era um sonho. Estávamos ali.
Então ele me abraçou e eu desfaleci com seu toque. Era uma coisa tão real, algo tão nosso. Tive vontade de gargalhar quando os lábios dele tocou meus pescoço e os fios de seu cabelo carinhosamente se encaixaram no meu rosto. Meu coração se acelerou e parecia bater por dois e então percebi que o outro coração era o dele.
- Você ... Não pode ser, e-e-eu não tô acreditando - O cheiro dele havia mudado, agora ele cheirava a banhos rápidos consegui perceber o quanto a vida dele parecia esta uma turbulência.
- Ah Anne ... Procurei tanto por você.
Foi só então que me lembrei. Teria que ser rápida, ainda estava em perigo e na casa de Demi. O fato de conseguir sentir Rich de novo era por que estava fora da casa de Demi mas assim que ela me encontrasse e me prendesse aquilo tudo iria acabar.
- Achei que estivesse morta ... - Me afastei dele e percebi seu olhar meio confuso.
- Richard escuta. Estou presa desde o dia em que sumi. - Senti a raiva no olhar dele e as mãos se fecharem. - Demi, Rich. Foi ela que me pegou. A casa dela ou sei lá o que é isso a onde estou tem alguma barreira que não me permite me comunicar com você. - Comecei a falar mais rápido com medo de que não desse tempo de contar tudo que eu sábia e que pudesse ajuda-lo a me encontrar. - Ela ... Me tranca em um quarto e eu nunca saio. Hoje ela chegou bêbada e eu consegui fugir mas sinto que já já ela vai me encontrar. Você precisa me ajudar! Ela esta ficando sem paciência, hoje tentou me agarrar a força, Rich por favor.
Ele se afastou um pouco. Consegui vislumbrar as veias do seu pescoço. Ele tentou se controlar antes de se dirigir para mim.
- Fiquei um mês na cola do Luke mas ele jurou que não tinha feito nada. Até começamos a trabalhar juntos para lhe encontrar. Demi disse para ele que foi destinada a uma missão e sumiu, ninguém a questionou por que isso acontece frequentemente no nosso mundo. Nunca imaginei que ... - Ele suspirou - Sinto tanto Anne.
Me aproximei dele e segurei sua mão.
- Tudo bem, só me salva. Só me tira daqui, seja meu anjo Rich.
Ele me abraçou novamente tão forte que na hora percebi que seria um adeus mesmo antes dele saber.
- Anne? - Estava me desconcentrando. Primeiro parei de sentir seu toque, depois sua voz começou a sumir e ele foi desaparecendo aos poucos.
Retomei o fôlego sentindo o toque das minhas mãos no chão.
- Te encontrei.
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