24 (liz)
O vento gelado me faz agradecer internamente por estar coberta pelo moletom de Theo, apesar da estranheza do fato. Usar o agasalho de outro garoto que não seja Noah parece errado. Mas, já que minha opção era isso, ou deixar que todos vissem através da minha blusa, achei que a ideia do agasalho parecia melhor.
— Você não vai me raptar, vai? — Pergunto, depois de algum tempo caminhando em silêncio ao lado de Theo. Ao que parece, ele optou por estacionar o carro no fim do mundo.
Ele faz uma careta que indica que a ideia é absurda.
— É muito bom saber o quão bem você pensa de mim, Elizabeth.
Apesar de ter acabado de perder uma aposta cujo o pagamento seria não me chamar mais de "Elizabeth", não o corrijo por fazê-lo dessa vez. No fundo, acho que estou começando a me acostumar. Talvez até goste de como o meu nome soa quando ele o diz.
Dou de ombros.
— Como eu vou saber? Tecnicamente, a gente mal se conhece. Só nos vimos umas duas vezes. — Argumento, embora, nas poucas vezes em que estivemos juntos, tenhamos aprendido bastante sobre o outro. Ao menos, o suficiente para eu saber que ele não deve ser um raptor.
— Três. — Corrige Theo. Aparentemente, nosso encontro esquisito na entrada do colégio conta como algo para ele. — E, para ser justo, você me conhece mais do que eu te conheço a essa altura. — Rebate.
Sorrio. Gosto da ideia de saber mais coisas sobre ele do que ele sabe sobre mim. É como se, enquanto estou com ele, pudesse fingir que não sou uma das garotas que cometeu um crime e está lidando com as consequências disso. Com ele, posso ser apenas eu.
— Bom, acredite em mim, quanto menos souber, melhor será para você. — Falo, parando ao lado de seu carro quando ele destrava a porta.
Theo me encara de forma suspeita, mas não diz coisa alguma. Entra no carro e, do lado de dentro, abre a porta para mim.
Sento-me no banco de carona meio receosa. De repente me lembro de que prometi a Sarah que me esforçaria para manter uma distância segura de Theo, e depois da noite de hoje, só posso concluir que falhei miseravelmente nesta missão. Mas, para ser honesta, não me arrependo. Precisava muito me distrair do encontro perturbador que tive com Colin, e de todas as coisas malucas que ele me disse sobre Noah, que no momento, me fazem duvidar de que tenho certeza de que sei quem Noah realmente é. Odeio perceber que, mesmo com minha relutância em ceder qualquer porcentagem de confiança à Colin, inevitavelmente, acabei deixando que ele entrasse em minha mente.
Balanço a cabeça, afastando o pensamento. Não consigo pensar sobre isso agora, ou minha cabeça irá explodir em chamas. Tento respirar fundo e concentrar minha mente no presente enquanto coloco o cinto de segurança e torço para que Theo seja um motorista melhor do que Sarah.
— Se importa se eu ligar o rádio? — Theo pergunta, o que é esquisito. — Mike sempre reclama das minhas músicas. Diz que o meu gosto musical é de velho.
Dou de ombros.
— Fique à vontade. Você é o motorista. Eu sou apenas a garota em seu banco de carona. — Digo, sorrindo, mas meu sorriso logo se desfaz quando de repente me ocorre que provavelmente não sou a única garota que já esteve em seu banco de carona, e, por alguma razão, isso me causa um leve desconforto. Odeio a ideia de ser "mais uma", ainda que não seja esse tipo de relacionamento que Theo e eu temos.
Talvez ele perceba a indigestão que a ideia me causa, porque franze o cenho, confuso com minha mudança de expressão repentina.
— Qual o problema? — Pergunta.
— Costuma dar carona para muitas garotas? — Questiono, antes mesmo de refletir sobre a pergunta, ou sobre como ela soa quando dita em voz alta. Não sei nem ao menos por que isso me incomoda tanto.
Theo parece ficar imóvel por alguns instantes, e eu me pego de braços cruzados, esperando que ele responda de uma vez.
— É impressão minha ou está com ciúmes, Encrenca? — Observa, desconfiado.
Sinto uma onda de constrangimento me invadir lentamente. A ideia é absurda. Por que eu teria ciúmes dele?
— Não seja bobo. Eu só quero saber quantas bundas já passaram pelo banco onde estou sentada.
— Você é meio maluca, Elizabeth. — Ele diz, em meio a uma gargalhada. — Mas se quer mesmo saber, não, eu não costumo dar carona para muitas garotas.
Aperto os olhos, desconfiada.
— É, sei. — Respondo, cética.
— Não gostei do seu tom. O que quer dizer com isso?
— Quero dizer que até parece que alguém como você não seja do tipo que sai com um monte de garotas.
— "Alguém como eu"? — Theo questiona, como se não tivesse ideia do que estou falando.
Inclino a cabeça para trás, recostando-me no banco e encarando fixamente a estrada a nossa frente. É claro que ele sabe do que estou falando. Apenas quer me ouvir dize-las.
— Sabe do que eu estou falando.
Ele ri.
— Elizabeth, eu sou um homem! Preciso que me diga todas as coisas com o máximo de clareza possível, porque, não, eu não sei do que você está falando, e a menos que me diga exatamente o que é, vou terminar essa noite sem saber o que quer dizer quando diz "alguém como eu".
Solto um riso. Seu argumento é barato, mas convincente.
— Qual é, você sabe que é do tipo sedutor. As garotas devem cair na sua lábia o tempo todo. — Resumo, de forma polida.
Com o canto dos olhos, vejo Theo abrir um sorrisinho convencido que comprova a minha ideia sobre ele.
— Então me acha sedutor? — Provoca.
Reviro os olhos.
— Não fique tão convencido. Só estou dizendo que duvido muito que um bando de garotas já não tenha estado nesse carro. Provavelmente, todas do mesmo tipo.
Ele franze o cenho.
— Por quê? Acha que eu tenho um tipo? — Indaga.
— Provavelmente. — Reforço.
— E qual seria esse tipo, na sua opinião infundamentada? — Ele pergunta, rindo. Posso ver que está se divertindo enquanto tenta descobrir o que penso sobre ele, mesmo não tendo certeza sobre nenhuma dessas coisas.
Dou de ombros.
— Eu sei lá. Loiras, talvez. Magras e altas. Inteligentes e ricas, mas com baixa autoestima. Talvez com questões familiares complexas. Com certeza do tipo que foram líderes de torcida no ensino médio, e talvez ainda sejam na faculdade.
Theo explode em gargalhadas, não conseguindo mais se conter.
— Eu espero que saiba que nada do que você falou chega remotamente perto da verdade.
— O quê, não gosta de loiras? Ruivas, então? — Provoco.
Ele balança a cabeça.
— Só estou dizendo que essas coisas não são fatores decisivos e não fazem a menor diferença. Não sou tão superficial, Elizabeth.
— Sei. — Respondo, contendo a parte de mim que insiste em se perguntar o que seria um fator decisivo para ele, afinal.
"Não importa", penso.
Após alguns minutos dentro do carro, com a música baixinha e a estrada escura, começo a sentir o peso do cansaço recair sobre mim. Toda a ansiedade que senti durante o dia em relação ao encontro com Colin parece ter sugado as minhas energias, e, para ser honesta, já fazia algum tempo que não ficava fora de casa até tão tarde. Me sinto mais enferrujada socialmente do que o normal, o que também demanda muita energia. Agora que finalmente pude relaxar, me dou conta do quão exausta me sinto. Mas, graças ao fim de noite agradável que tivemos, ao menos não estou tomada pelo sentimento de medo ou culpa. Pela primeira vez em muito tempo, me sinto leve e, talvez, até feliz. É bom. Mesmo que eu saiba que não vai durar por muito tempo, me apego a esse sentimento presente e finjo que tudo está bem, só por uma noite.
Encosto a cabeça na janela do carro, sentido minhas pálpebras tornarem-se pesadas e a estrada do lado de fora se tornar um enorme borrão.
— Ei, Theo... — Murmuro, sentindo-me tão sonolenta que talvez já esteja delirando em meio a um cochilo.
— Hum? — Responde ele, sem tirar os olhos da estrada.
— Obrigada por hoje. Eu precisava mesmo me distrair.
— E deu certo?
Abro um sorriso preguiçoso.
— Deu, sim. Foi divertido. Obrigada.
Tenho a impressão de vê-lo sorrir de lado antes de meus olhos se fecharem de vez.
— Fico feliz, Elizabeth. — Responde, sua voz e a música no rádio soando cada vez mais distantes conforme mergulho em um sono profundo.
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