CAPÍTULO CATORZE
LUCINDA FLANAGAN
Estamos sendo invadidos.
Não é uma coisa que eu perceba com muita agilidade, mas a constatação vem assim que Elain saca a espada e faz uma posição defensiva. Não acho que ela esteja em condições de usar a arma, mas seu rosto não dá indicações de dor.
O salão está um caos e uma massa desordenada de roxo e azul luta contra fileiras e fileiras de soldados vestidos de cinza de marrom. As Terras Baixas cansaram de esperar uma resposta da Rainha, ao que parecia. O vislumbre de seus uniformes me traz lembranças indesejadas.
Eu congelo por alguns segundos, sem saber o que fazer. Curandeiras não eram treinadas para esse tipo de situação.
Elain está indo em direção ao trono, indo para a fileira que se forma para defender a Rainha. Não sei o quanto do castelo está tomado, por isso eu a sigo.
O lorde que visitou Elain mais cedo está conversando com a monarca, as palavras saindo com impressionante rapidez de seus lábios. Não consigo decifrar do que se trata.
Olho para o lado, onde o novo Chefe da Guarda parece congelado. Se eu olhasse um pouco depois, jamais teria percebido sua hesitação. Não quero pensar se o tempo que ele ficou parado poderia ter impedido alguma morte.
O barulho das espadas se chocando faz meu ouvido doer e eu sigo Elain com passos apressados. Ela se posiciona na linha e sou obrigada a me afastar para dar espaço para os outros soldados.
Tento ficar calma, mas minhas mãos estão tremendo. Trabalhar curando pessoas não garante um acervo muito grande de golpes da auto defesa. Acho que conseguiria fazer alguém dormir com minha magia e um pouco de poções, mas dopar pacientes inquietos não parece uma grande habilidade no momento.
Elain está brandindo a espada, golpeando soldados que ousam se aproximar. O sangue já manchou um pouco as suas roupas enquanto os corpos se empilham na sua frente. A violência daquilo me faz querer vomitar.
— Ei! O que você está fazendo? — Olho bruscamente para Elain e enfio a mão na minha bolsa, torcendo para ter trago alguma porção sonífera. O antigo Chefe da Guarda está ao seu lado agora, agarrando o braço da mulher. Me aproximo o máximo que posso.
— Você tem que vir comigo agora mesmo. — Ele diz com veemência.
— Eu não...! O que está acontecendo?
— A Rainha solicitou seus serviços. É uma ordem. Você deve escolta-la para fora do Salão.
— A Rainha? — Ela perece em dúvida e procura por ela no Salão. — Onde ela está?
Ele indica um canto onde a monarca está, encarando ambos. Ela lança um olhar severo. Se para Elain ou o Chefe, não sei.
— Estou indo. Lucinda deve vir comigo, ela é curandeira.
— Sem objeções. Se apresse. – Ele diz de forma plana e a empurra pelos degraus.
Aperto a bolsa contra a lateral do meu corpo e sigo Elain, passando tão perto do Trono como jamais estive na vida.
— Vossa Majestade. – Elain faz uma mesura profunda e eu a imito. — Estou aqui para escolta-la.
— Rápido. – É toda a resposta dela. Seguimos por um corredor tão mal iluminado e com o cheiro bolorento que me faz pensar com quanta frequência foi usado. Ou qual a última dinastia que passou por ali.
Os gritos e o clangor das espadas vão ficando para trás conforme avançamos. Durante algum tempo, o único barulho que sobra é o som repetido das nossas passadas. Tenho quase certeza que atravessamos todo o castelo quando o corredor finalmente se abre para uma sala bem iluminada e decorada em ouro e marfim.
É o escritório pessoal da Rainha. Quero segurar a respiração para não macular o local.
— Não temos muito tempo, então vou explicar de forma sucinta. – A rainha se senta em uma poltrona com tanta calma e graça que eu me pergunto se estamos mesmo sendo invadidos.
— Estou as ordens, Vossa Majestade. — É a resposta automática de Elain.
— Estou enviando você em uma missão extraoficial em nome da Coroa. Para resgatar a Rainha perdida e trazer o exercito que vai libertar Dundeya.
Qualquer pessoa que me olhasse notaria a expressão de pura perplexidade eu meu rosto ostentava. Busquei os olhos de Elain, mas ela manteve uma expressão impassível. Olhei para a Rainha novamente, que parecia muito satisfeita com as reações.
— O que estou pedindo, Elain Donovan, é que busque minha irmã de seu exilio e, com ela, traga um exercito para restaurar Dundeya das mãos de Lorde Rowan Haytham, que nesse momento está usurpando meu trono.
— A minha vida está a favor da Coroa, Vossa Majestade. – Elain responde e eu fico impressionada com a firmeza do seu tom. Talvez ela saiba do que tudo aquilo se trata. — Mas..., mas eu pensei que a princesa estivesse morta.
Ou talvez não soubesse.
— Não tenho tempo para explicar todos os detalhes que cercam essa trama, mas quando encontrar Thalia ela poderá lhe dizer. Você precisa sair da cidade antes que eles cerquem a muralha. Reúna seus pertences, leve a curandeira, e siga para o coração do território neutro entre os reinos. Você encontrará uma floresta onde Thalia tem ficado escondida. Leve esta carta.
Um envelope lacrado com o selo Real é passado para as suas mãos.
— Eu sei que você não entende, mas eu preciso que faça valer o seu juramento de honra para com este país e siga as minhas instruções.
— E vou, Vossa Majestade. – Elain responde e há um leve tremor na sua voz. — Eu posso saber... posso saber porque me escolheu? Por que não o Chefe da Guarda?
— Eu confiei minha vida ao seu pai e nunca fui desapontada. Estou confiando-a novamente a você. – A voz da Rainha é firme, mas há um traço de simpatia. Ela se vira para mim e eu preciso conter um tremor. — E estou colocando a vida e a saúde de Elain nas suas mãos.
Faço uma mesura profunda, tentando demonstrar que eu também estou a serviço da Coroa. Elain me imita, seus cabelos loiros escorrendo por entre os ombros.
Um estrondo próximo nos sobressalta e a Rainha se levanta.
— Não temos tempo a perder. Se apressem e não sejam pegas. – Ela indica uma passagem por trás das cortinas e corremos para dentro de outro corredor bolorento.
Outro estrondo soa, muito mais próximo e Elain me puxa pelo braço.
Mergulhamos em uma semiescuridão.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro