20
Fui para o trabalho sentindo um grande alívio por todos os vestidos estarem prontos. Como agradecimento ia comprar carne fresca para Riwty, era um gasto desnecessário, mas desde que chegou aqui parecia que ele só se alimentava do que dávamos para ele.
Hoje a padaria não ia abrir até as 3 da tarde. Quando cheguei lá vi uma grande confusão, vários ingredientes espalhados pela cozinha e caixas com doces e salgados no balcão.
Eu fiquei encarregada de ajudar na decoração dos doces que não amassavam, muitos precisariam ser decorados na casa.
Beto ficaria algumas horas a mais para cozinhar algumas fornadas extras caso fosse necessário.
-Eu aluguei uma charrete para vocês levarem tudo, meus lindinhos. Ellie, quero que você vá para casa hoje, todos nós estamos muito cansados e eu decidi que vou manter a padaria fechada hoje.
-Eu concordo, vovó. A senhora tem se esforçado demais_disse Beto abraçando dona Gema.
O carinho dele com a avó sempre mexia comigo, ela era uma senhorinha maravilhosa e realmente merecia que cuidassem dela. Carregamos tudo para a charrete e enquanto Beto dirigia eu cuidava das caixas.
Ficar naquela charrete me lembrou de Penélope, desde que eu e Felipe tínhamos parado de usar o celeiro, eu não tinha visto mais a égua que era praticamente minha. Talvez passasse por lá amanhã.
A charrete trepidava na estrada de terra e eu não parava um segundo, precisando arrumar as caixas o tempo todo. Beto parecia não notar a minha dificuldade e continuava mantendo o galope. Ele cantava uma canção desconhecida para mim, talvez fosse do condado dele.
Como eram os outros condados? Eu sabia que nosso reino era enorme, do tamanho de um continente, enquanto os reinos vizinhos eram bem pequenos. Para falar a verdade, nós não éramos um reino, mas um império. Algumas regiões eram antigos países, por isso a diferença estética tão grande. Isso tudo havia acontecido há muito tempo, atualmente éramos um reino pacífico que optava pela diplomacia.
Infelizmente, os reis posteriores à anexação desses países fizeram uma política de eliminação de suas antigas culturas. Hoje falávamos apenas uma língua, alguns tipos de dança e principalmente, várias religiões foram extintas. Os livros sobre esses assuntos foram queimados e a transmissão oral ficou muito deturpada das origens.
Estava tão distraída pensando naquilo que não notei quando chegamos. A grande casa vermelha era única na vila, parecia exibir uma bandeira "sou algo diferente, venha descobrir o quê?" Comecei a me sentir nervosa, nunca havia entrado ali e estava muito curiosa para saber como seria.
Beto me ajudou a descer da carroça e um homem enorme veio nos atender. Eu só o havia visto algumas vezes na taverna e não fazia ideia da sua vida. Agora eu sabia, era segurança da casa. Ele nos ajudou a carregar as caixas, chamou mais dois homens tão grandes quanto ele e tanto eu quanto Beto ficamos parados sem nada para fazer.
Resolvi seguir o último antes que perdesse a chance de entrar na casa. O lugar também era vermelho por dentro e tinha muitos quadros de mulheres e homens nus. Um tapete grosso de pelo de ovelha tingido de preto ocupava o centro da grande sala. Vários sofás estavam espalhados nas paredes, vermelhos ou de couro preto. O ambiente cheirava a incenso, cigarro e perfume feminino.
Algumas das moças caminhavam pela casa, a maioria em trajes íntimos, arrumando os cabelos umas das outras e passando maquiagem na frente do grande espelho que ocupava quase uma parede inteira. Duas moças faziam a faxina, conhecia-as da vila, eram de uma família muito pobre. Quando as duas moças me viram ficaram muito vermelhas e começaram a trabalhar de cabeça baixa.
Anahi, uma das meninas, veio nos cumprimentar. Ela usava uma longa camisola preta, não era transparente, mas muito sensual assim mesmo. Beto ficou ainda mais vermelho quando ela chegou perto de nós.
-Desculpem-me pelos trajes, mas hoje estamos todas na correria e fazendo mil tratamentos estéticos então essas camisolas acabam ficando mais práticas.
Entreguei os vestidos para ela e me deparei com suas unhas pintadas de vermelho com uma fina barra preta no topo. Não consegui deixar de encarar.
-Eu sei que são um pouco chocantes para quem não tem o hábito...
-São lindas, simplesmente lindas.
Anahi arregalou os olhos, mas sorriu logo em seguida.
-Você sempre foi diferente. Quer pintar?
Dessa vez os olhos que se arregalaram foram os meus, mas assenti furiosamente com a cabeça, deixando um sorriso se espalhar pelo meu rosto.
-Então vamos.
Quando ia segui-la Beto me cutucou.
-Ellie, assim que terminar vá para casa. Esse lugar vai ficar muito perigoso depois que os clientes chegarem.
-Tudo bem.
Fiquei espantada, achei que ele iria tentar me arrastar de volta para casa ou comentar algo negativo sobre pintar as unhas, ele sempre me surpreendia. Acabei agindo impulsivamente e dei um beijo em sua bochecha. Saí correndo para a moça logo em seguida.
-Ele é uma graça, você devia largar esse Pablo e ficar com ele, dá pra ver que ele é caidinho por você.
Ri muito sem graça.
-Se bem que o Pablo também é muito fiel. O matias trouxe ele aqui uma vez, disse que vocês dois tinham brigado, mas o Pablo não conseguiu fazer nada, disse que era muito apaixonado por você, acabou desistindo e os dois foram embora, ele nunca mais voltou.
Tentei não revirar os olhos com a notícia da fidelidade de Pablo, ah se eles soubessem.
-E o matias?
-Ah, ele vem bem menos que a maioria, mas vem as vezes.
-Todos os homens dessa vila frequentam a casa?
-Não, só a maioria.
Ela riu e eu fiquei um pouco triste, mas se até Matias traía o Pablo. Se bem que ele podia fazer isso para não desconfiarem dele.
-Mas os pais sempre trazem os filhos aqui quando completam quatorze anos, aí as garotas mais jovens atendem eles.
-Quantos anos têm suas meninas mais jovens?
-Ninguém vem para cá com menos de dezesseis, a não ser que seja para trabalhar na faxina. Bem, nem George nem o sacerdote trouxeram os filhos. O sacerdote por motivos religiosos, ele é um dos homens da vila que não frequentam o bordel. Uma vez perguntei para George o porque de ele nunca ter "iniciado" os filhos, por assim dizer, ele falou que os filhos iriam decidir quando estivessem prontos e que não achava saudável impor uma idade.
Aquilo parecia realmente uma coisa que Pá diria.
-Pá frequenta a casa?
-Frequentou por um tempo, mas enquanto sua esposa era viva ele não veio aqui. Agora ele diz que já está velho demais para essas coisas. Eu acho que ele ainda dá um bom caldo.
Fiquei roxa de vergonha, não conseguia imaginar Pá desse jeito, além do mais, Anahi era muito nova para ele. Ela tinha por volta de trinta e ele estava na casa dos sessenta.
Entramos em um quarto lotado de meninas, não que isso fosse difícil já que o quarto era pequeno. Mas a maioria das mulheres ali eu não conhecia, elas seguiam um padrão de corpo e altura. Elas eram magras e baixas e quando uma fez uma posição que para mim parecia impossível percebi que eram as contorcionistas.Elas usavam um tecido dourado que mostrava suas pernas, a maquiagem também era dourada e elas haviam passado óleo no corpo todo, fazendo-as brilhar.
Nos sentamos na cama e Anahi pegou um pequeno baú e despejou seu conteúdo no colchão. Vários vidrinhos com cores diferentes caíram, alguns tons de rosa, vários tons de vermelho, preto e branco.
-De que cor você que pintar?
-Eu só queria pintar os pés.
-Ah, não. Já que vamos fazer vamos fazer tudo.
-Tudo bem, eu quero aquele vermelho ali._ Falei apontando para um vidro que tinha um líquido da mesma cor do que Riwty fez para mim.
-Ele é lindo mesmo.
Foi um momento divertido, eu ouvi as meninas fofocando, falando dos homens da vila. As moças tentaram aprender algumas coisas com as contorcionistas. As poses que elas faziam eram impressionantes. Elas até passaram alguns alongamentos para fazermos todos os dias e aumentarmos nossa elasticidade.
Anahi me pagou 12 cobres, o que eu tentei diminuir, mas ela disse que com um prazo tão apertado eu merecia. Precisei sair dali descalça, segurando as botas com as pontas dos dedos para não borrar o esmalte das unhas das mãos.
Já tinha andado quase 100 metros quando Riwty se materializou na minha frente. Ele me puxou para a floresta ao lado da estrada e me parou em um local que ninguém nos veria.
-Vamos, precisamos arrumar você para a festa.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro