Capítulo 06 - Ligações Perigosas
― O celular, Amanda – minha professora de flauta dizia, na segunda.
― Amanda, o celular – professor Maurício, na terça.
― Novamente, Amanda, novamente, me dá aqui o celular – a mulher chata de flauta repetiu, na quarta.
― Você devia cantar uma música sobre telefone, já que é tão dependente dele. Tem uma ótima da Beyonce com a Lady Gaga, conhece? – professor Maurício, na quinta, para delírio de Igor.
Perdi o celular tantas vezes e por tanto tempo durante as aulas da semana seguinte que eu simplesmente resolvi prestar atenção nas aulas. Bruno ficou meio aborrecido por eu não responder suas mensagens em tempo real, mas acontece que ele mesmo me deixava esperando por horas às vezes. Era bom tomar um pouco do próprio remédio.
E, além disso, eu estava com medo da professora chata de flauta jogar meu celular no chão, de tanta raiva que ela tinha dele. E DE MIM.
Prestar atenção nas aulas era mais fácil... Mas era horrível. Na minha aula de flauta não tinha ninguém simpático e receptivo, como Igor e Ana Júlia. Todos (inclusive a professora insuportável, que eu me recuso a decorar o nome) me repreendiam quando eu errava as notas (o tempo todo) e riam quando eu sugeria uma música para aprendermos (aparentemente Beijinho no Ombro está muito antiquado e todos querem aprender uma coisa chamada Eu Sou a Diva Que Você Quer Copiar? Eu nem sabia que a Anitta tinha lançado uma música nova).
― Anitta? – um dos alunos insuportáveis de música perguntou e todos começaram a rir. – Essas músicas são da Valesca Popozuda.
Tá vendo? Esse era o tipo de coisa que eu precisava aturar três vezes por semana. Eu era sempre o alvo de piadas devido a minha falta de talento e ao meu escasso conhecimento sobre músicas. ORA, na inscrição não dizia que você precisava saber tudo do assunto. Quer dizer, pelo menos eu acho que não.
Na aula de canto a situação não estava muito melhor. Apesar de Igor e Ana Júlia serem infinitamente melhores que minhas companhias nas aulas de flauta, eles dois só sabiam conversar sobre música, o que não era exatamente meu tema preferido. Muito menos depois de sofrer tanto bullying por não ser sábia entendedora. Quando não estavam falando sobre isso, pareciam conversar nas entrelinhas, como se estivessem guardando segredos de mim. Especialmente sobre o que ambos fazem quando não vão as festas.
No almoço de segunda, quando os dois me deixaram para ensaiar (aparentemente queriam abrir a aula de terça com uma cantoria em dueto, mas não o fizeram até agora. Disseram que não está bom o bastante, mas não me contaram nem a música que querem apresentar – não que eu fosse saber pelo nome), fiquei pensando sobre eles dois. Era muito estranho que eles sempre sumissem no horário das festas e que tivessem desculpas tão ruins para não ter ido (“fiquei doente”, “dormi”, “estava passando So You Think You Can Dance”). Era oportuno que eles sumissem durante o tempo da festa, exatamente quando uma dupla estava vendendo bebida contrabandeada... Uma dupla que dizem ser composta de homem e uma mulher... Hummmmmmm...
Igor e Ana Júlia não fizeram a cantoria inaugural da aula nem na terça, nem na quinta e nem no sábado. Eduardo também não. Aliás, depois da festa, nós trocamos poucas palavras. É quase como se, instintivamente, nós estivéssemos nos repelindo. Desde o acontecido, eu estava meio desconfortável na presença dele. Engraçado. Não estava mais com ÓDIO, especialmente porque ele não estava mais sendo rude comigo, ou fazendo piadas e perguntas constrangedoras. Porém, o constrangimento era intenso. Sabe quando você não sabe para onde olhar, o que falar, nem o que fazer com as mãos? Quando de repente você está ciente daquela espinha aparecendo no seu queixo, nas suas unhas meio sujas perto da carne (como é que elas ficam tão sujas? Eu juro que tomo banho) e até mesmo cogita que sua sobrancelha pode estar despenteada? Pois é.
Por sorte, nós dois só nos encontrávamos nas aulas de canto (mas limitávamos nosso contato a um aceno) e nas vezes que eu estava com Lila e ela, obviamente, estava com Gustavo e Eduardo aparecia para encontrar o amigo. Tudo era muito estranho entre nós, com poucas palavras e menos ainda olhares. Ele voltou a parecer o menino esquisito que ficou me encarando quando eu pedi para ele trocar de lugar ou o quieto que só olhou para minhas pernas no dia da nossa inscrição nas aulas. E, sinceramente, eu estava confusa. Eu estava tão confusa que eu nem sabia exatamente sobre o que era minha confusão.
Como sempre, Lila e Gustavo monopolizavam a conversa quando nós quatro estávamos juntos, falando sobre música. Eu tentava ouvir com meu melhor sorriso, mas tenho certeza que deixava transparecer o tamanho do meu tédio. E do meu ódio. No jantar de quarta, os dois matracavam sobre o Show Final (e eles falavam com essas letras em maiúsculo mesmo. Como se fosse o Show Final do Oscar, sei lá). A única coisa que eu tinha a dizer sobre o Show Final é que meus professores já falavam disso, para dizer:
― Você vai tocar UMA NOTA. Uma nota o show inteiro, Amanda. Acha que vai conseguir fazer isso ou vai errar ela também? – era a mulher insuportável de flauta. – E vou te colocar na última fileira.
― Amanda, se você não cantar em nenhum momento, vou ser obrigado a te excluir da apresentação final – era professor Maurício. – E isso serve para todos que não cantaram até agora. Eu preciso ouvir suas vozes!
Eduardo também não tinha cantado. Eu estava louca para saber como ele cantava, mas ele parecia com tanto medo quanto eu. Toda vez que o professor sugeria que ele fosse o cantor do dia, ele se afundava na cadeira e ficava da cor do cabelo, do mesmo jeito que eu também fazia. Exceto que eu não ficava da cor do meu cabelo. Seria estranho alguém ficar marrom com pontas azuis.
O que meus professores não sabiam é que eu pouco me importava em não participar da apresentação final. Secretamente, eu estava agradecendo à Deus por isso. Eu realmente não tinha talento e me imaginar em um palco, tendo que me apresentar de qualquer maneira que fosse, na frente de um monte de gente, já me fazia querer vomitar. Sim, eu tinha dançado e cantado Sandy e Junior, mas ninguém ouviu de verdade minha voz com aquela barulheira. E tinha bem menos gente na festa do que terá na apresentação final. Ou seja, tô fora.
Eu estava fazendo tanta força para não cantar que até voltei a me reprimir no chuveiro. Tá que isso não se devia tanto ao fato da apresentação final e sua pressão, mas especialmente ao fato da voz ter voltado a aparecer e cantar. E eu não queria me expor, mesmo que anonimamente. Voltei a ficar bem quietinha, concentrada apenas em me lavar da maneira mais rápida e eficaz que eu conseguia.
No tempo livre daquela semana, entre minhas fugas de Eduardo e minhas folgas do assunto música, eu ficava com Bruno. E, naquela semana, fiquei craque em dizer não para Bruno. Como ele trabalhava o dia inteiro, só conseguíamos ficar juntos mesmo, por mais tempo, de noite. Ainda assim, sempre tínhamos que procurar uma sala vazia, um armário desocupado, uma área escura. Eu estava muito cansada de ter que me esconder. Tudo bem, talvez fosse um pouco antiético da nossa parte, mas será que era tão ruim assim um romance entre um monitor e uma aluna? Quer dizer, eu não era uma aluna de 13 anos... Já estava perto dos 18. Sabia o que eu estava fazendo.
Tanto sabia que continuava negando.
Eu insistia para que fizéssemos coisas que um casal normal faz: jantássemos juntos, fossemos a piscina... Até ir pra academia eu estava aceitando (e olha que não sou nem um pouco fã). Claro que em momento nenhum eu usava a palavra casal. Ele não tinha pedido para namorar comigo e eu também não estava esperando (muito) isso. Eu só queria parar de ser tratada como se fosse motivo para ele ter vergonha. Ele continuava com sua ladainha de monitor e aluna, dizendo que não podia perder o emprego, que gostava muito de mim, muito mesmo e que queria desfilar comigo pelo acampamento, mas não podia.
O que ele podia e fazia o tempo todo era pedir para que eu passasse a noite com ele. E era isso que eu negava o tempo todo. Todavia, na segunda foi mais fácil. Na sexta, eu já estava incerta... Eu realmente gostava de Bruno. Pelo menos, meu corpo gostava muito dele e das sensações que ele me causava. Porém, eu gostava dele o suficiente para me entregar assim? Ele estava fazendo seu trabalho e cavando espaço no meu coração. Cada palavra bonita abria seu caminho, mas eu estava muito derrotada por não ser assumida. Por não poder contar nem para Lila.
― Você está certa. Ficar assim escondido pelos cantos é muito 13 anos, Amanda. Você devia aceitar ir pro meu quarto. Podemos ser nós mesmos, sem medo de sermos pegos ou julgados...
― Não, Bruno – eu respondia veemente. – Não estou pronta para isso.
Na terça:
― Amanda, você é muito especial, sério mesmo. Gosto demais de você, quero muito ficar com você... Deixa eu te mostrar o quanto eu te quero – dizia ele, pressionando o corpo dele contra o meu e me apertando contra a parede.
― Não, Bruno – era difícil falar não com meu corpo dizendo sim. – Por favor, não.
Na quarta:
― Pelo amor de Deus, Amanda, o que eu tenho que fazer para te convencer a passar a noite comigo? Eu preciso de você. Eu sei que você também quer ficar comigo...
― Bruno – respondia, me esquivando com cada vez mais dificuldade. – Não.
Na quinta:
― Mandinha, eu estou ficando maluco. Você não pode continuar fazendo isso comigo. Por favor, aceite... Por favor... – ele alternava as palavras com beijos no meu pescoço e meu joelho ficava fraco. Eu precisava me afastar para conseguir dizer:
― Não, Bruno. Não posso.
Na sexta eu quase cedi. Simplesmente porque eu não aguentava mais dizer não. Um lado de mim queria muito aceitar ir para o quarto de Bruno. Não necessariamente ir para o quarto dele significaria transar com ele, certo? Eu podia muito bem dizer não? Só seria mais confortável e menos infantil ficar com ele no quarto do que pelos corredores do acampamento, não é? Se eu resolvesse não levar tudo até o fim, eu poderia parar e dormir, certo? Bruno entenderia.
Aquilo ficou na minha cabeça durante a noite e por todo o sábado. Era basicamente a única coisa que eu pensava. Estava completamente dividida se aceitava ou não o convite. Quais seriam as consequências se eu aceitasse? A pior parte era que, mesmo quando nós duas estávamos dividindo a pia e nos maquiando em conjunto, eu não podia perguntar a opinião de Lila. Ela nem sonhava que eu estava de romance com Bruno. E eu tinha prometido não contar para ninguém...
Fui para festa ainda sem saber o que fazer. Encontrei Eduardo e Gustavo logo no início, porque, se eram inseparáveis antes, depois que ficaram, Lila e Gustavo não se soltavam mais. Estava tão aérea, perdida em meus pensamentos, que nem sei se cumprimentei os dois decentemente ou só fiquei lá encarando-os com cara de paisagem. Só dei conta de mim quando já estava sozinha com Eduardo e ele estava com a mão no meu ombro. Tive que sacudir a cabeça algumas vezes para entender que ele me perguntava:
― Você está bem?
― Claro – respondi de imediato. – Estou ótima. Só estou cansada. Foi uma semana difícil.
― Entendi – ele disse, recolhendo a mão. – Não era melhor ter ficado no quarto descansando, então?
― Você não conhece Lila, minha melhor amiga? Vou te apresentar – brinquei. – Ela nunca me deixaria faltar a uma festa.
― Só espero que ela não inscreva a gente no karaokê de novo, né? – ele disse, com um pequeno sorriso.
― Vou dar um perdido nela, caso ela inscreva – respondi, também dando um pequeno sorriso lateral.
― Quer dançar, Amanda?
Olhei para ele antes de responder. O que ele estava perguntando? Se eu queria dançar? A gente já não tinha estourado a cota de danças com o Ed Sheeran? E com Sandy e Junior? Olhei em volta, ainda devendo a resposta. Bruno não estava em lugar nenhum, de novo, e nem Igor e Ana Júlia. Eduardo ainda esperava uma resposta, mas seu sorriso já estava se esvaindo.
― Claro, Eduardo – respondi. – Por que não?
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Dançar com Eduardo não foi tão ruim quanto eu pensava. Dançamos com uma distância razoável um do outro e em nenhum momento ele fez uma performance de sua dança infernal, o que foi ótimo para minha sanidade mental. Quando começaram as performances do karaokê, Lila e Gustavo reapareceram e nós passamos o restante da noite rindo e comentando as apresentações de nossos colegas no palco. Dessa vez Lila não nos inscreveu e eu fiquei profundamente grata, ainda que não tenha dito nada para ela.
Bruno me encontrou no final da festa. Eu ainda estava com os três, sentada em uma mesa rindo de alguma besteira que Gustavo tinha falado, quando senti sua mão em meu ombro. Olhei surpresa. Não sabia que era permitido contato físico na frente de pessoas.
― Boa noite gente, tudo bem com vocês? – Bruno perguntou para meus colegas. – Posso falar com Amanda só um instante?
― Claro – Lila respondeu, dando um sorriso. Gustavo acenou com a cabeça e Eduardo simplesmente baixou os olhos.
Eu levantei em silêncio, encarando Bruno em busca de respostas. Ele não disse nada, mas foi andando na direção da saída, o que me obrigou a ir atrás dele. Nós mal tínhamos passado pelo beiral da porta quando ele segurou minha mão e começou a correr, me obrigando a correr atrás dele. Só parou quando nós dois entramos, aos tropeços, no prédio do alojamento, mas também só parou porque, ao perceber que estava vazio, me empurrou contra a parede ao lado do elevador para me beijar.
― Bruno – eu disse, tentando ao mesmo tempo buscar ar. – O que você está fazendo?
― Por favor, Amanda, por favor. Passe a noite comigo – ele disse, também ofegante. – Eu quero muito ficar com você. Da maneira certa. E quando sairmos daqui desse acampamento horrível eu juro que vou te levar para encontros de casais normais. Vamos ao cinema, ao teatro, visitar seus pais, fazer o que você quiser. Só, por favor...
Eu o silenciei com um beijo, ao mesmo tempo que ele apertava freneticamente o botão para chamar o elevador. Não queria pensar muito no que eu estava fazendo, só queria fazer de uma vez. Eu gostava de Bruno, gostava mesmo. E eu podia desistir, se mudasse de ideia. Ia dar tudo certo. O elevador chegou e nós entramos, ainda sem nos desgrudarmos. Quando ele apitou, acusando que havia chegado em seu andar, nos separamos. O que foi importante, já que o corredor estava cheio de gente que ainda estava indo para a festa (mesmo no final dela). Ou pelo menos eu achei que estavam indo para a festa. Não deu tempo de ficar cogitando muito sobre o que aquelas pessoas estavam fazendo, porque Bruno me puxou com muita pressa na direção de sua porta.
Ele enfiou a chave e eu aguardei impaciente, olhando por cima do ombro para ver se todas aquelas pessoas já tinham ido embora e se eu já podia beijá-lo de novo. Precisava manter a mente ocupada para não pensar em nenhuma besteira, do tipo desistir. Foi só quando a porta abriu com um baque contra a parede que eu virei-me para encarar o quarto.
Bruno já tinha dado um passo à frente e eu estava, honestamente, com o pé no ar para segui-lo quando a vi.
― Bruno? – ela perguntou, tirando um pirulito da boca. – Quem é essa?
No meio do quarto de Bruno, bem em frente a cama, estava essa menina, agindo como se fosse dona do lugar.
E ela estava vestindo apenas um short minúsculo e seu sutiã.
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Larguei a bomba e saí correndo!
Oi gente! PRIMEIRO DE TUDO, quero agradecer muitíssimo vocês porque o livro passou das 1000 leituras. Isso é fantástico! Quando comecei não fazia ideia se teria boa recepção e nossa, vocês superaram muitíssimo minhas expectativas. Até agora essa meta de usar mais o wattpad nesse ano tem sido fantástica! Acho que em muito tempo eu não conseguia escrever tanto... Não tô conseguindo escrever várias coisas, mas só de conseguir manter Acampamento atualizado, já fico feliz.
E sim, liberei o capítulo um pouco mais cedo porque ainda estou me sentindo mal por ter atrasado daquela vez!!! Espero estar perdoada! Esse título foi sugestão da Aimee Oliveira, autora de Invisível que está sendo postado aqui! Ela betou o capítulo porque eu precisava de ajuda para decidir um título e não conseguia pensar em nadinha.
Eu vi no relatório do wattpad que agora tenho alguns leitores de Portugal, do México e dos Estados Unidos??? Que loucura!!! Oi gente! Hi guys! Hola chicos! Obrigada!! :)
Tomara que vocês continuem lendo e gostando da história! Não esqueçam de comentar e das estrelinhas, porque aí eu fico bem feliz. E quem sabe não faço capítulos extras no meio da semana? :B
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