Prólogo
No quarto de uma casa simples, uma jovem mulher acende um cachimbo. Neste cômodo precário e revirado, seu bebê de apenas nove meses se arrasta pelo chão empoeirado pelas cinzas de cigarro. Enquanto o colchão da cama coberto com um lençol encardido cheirando a esperma e suor, está o homem que lhe apresentou a ruína.
Já com as primeiras tragadas, vem uma fumaça densa e branca, de cheiro muito forte, que se mistura com o odor de mofo do ambiente. Em poucos segundos sua feição calma muda, ela se levanta andando de um lado para o outro se assustando com qualquer barulho.
Rapidamente fecha às janelas e certifica de que a porta esteja trancada, seu bebê chora estendendo os bracinhos para mãe querendo ser alimentado. Desnorteada, ela pega o menino e lhe balança até dar a última tragada.
Alguns minutos após apagar o cachimbo, se aquieta e volta a agir como se nada tivesse acontecido. Seu cérebro doente pelo vício já se acostumou com a sensação, e o prazer já não é sentido da mesma maneira.
- Mas que merda, faz esse menino calar a porra da boca - o homem repreendeu, cheirando a última carreira de pó.
- Ele está com fome, seu imbecil, eu preciso de dinheiro para o leite - explica tentando acalmar o bebê. - Não chore, lindo.
- E o que você quer que eu faça, Angel?
Angel nada diz, vai até a cama e pega uma corrente prata com pingente de cruz e coloca no bolso, seu marido retruca e tenta pegar de volta, mas ela não deixa. Com o bebê nos braços destranca a porta e caminha até a cozinha, com o braço livre revira a geladeira em busca de algum alimento, mas não encontra nada além de uma garrafa de gim e um sanduíche velho.
Ela bebe um gole da bebida enquanto se sente culpada, sonha em sair do vício, mas, ao mesmo tempo, não sente esperança, sente pena de si mesma, e principalmente da criança inocente que carrega nos braços. Com carinho, beija a testa do bebê devolve a garrafa no lugar e coloca um pedaço do mesmo sanduíche guardado no fundo da geladeira, na boca da criança.
Com os olhos lacrimejantes e corpo pesado decide sair com a criança em busca de alimentos, seu marido grita de longe "Para onde você vai, vadia?" E nenhuma resposta é ouvida. Angel já não se sente humana, como se fosse um corpo em estado de putrefação.
Nem mesmo se recorda de como chegou nesse estado, e ainda, sim, preocupada com sua criança caminha pelos becos escuros e perigosos do bairro pobre onde vive. Não demora muito para ver um grupo de homens jogando cartas, em um bar imundo.
Respira fundo pegando em mãos a corrente que pegou do marido, enquanto a criança vencida pelo cansaço dorme no seu ombro. Ela beija seus cabelos com carinho e caminha até aqueles homens, para oferecer o objeto.
- Boa noite, estou vendendo essa corrente para comprar leite para meu menino. Será que vocês poderiam me ajudar?
Imediatamente todos olham em sua direção, Angel é jovem e muito bonita. Seu corpo curvilíneo, em conjunto com seus longos cabelos negros, emana juventude e sensualidade, um prato cheio para os olhares perversos daqueles homens. Angel se constrange ao ser olhada como um pedaço de carne. Mesmo assim, não abaixa a cabeça esperando conseguir ajuda.
- De quanto precisa? - um velho pergunta, olhando dos seus pés a cabeça como uma mercadoria.
- 50 pratas, é o suficiente! - responde esperançosa.
- Isso aí não vale nem 30 pratas, eu pago 15 - responde debochado rindo como se tivesse ouvido uma piada, acordando o bebê com a tosse asquerosa que veio em seguida.
- Vale, sim, vale muito mais na verdade moço. É prata de verdade! Mas eu preciso muito do dinheiro, meu filho está com fome e eu não tenho nada para dar para ele - ela explica balançando o bebê que outra vez chora intensamente, o coração da mulher se aperta por saber que tudo é sua culpa. Ela se tornou uma viciada, que gasta e vende tudo que tem para consumir crack, tinha culpa do sofrimento e desnutrição de seu filho. - Não chora Jungkook, mamãe vai dar um jeito.
- Está pensando que sou idiota? É claro que é falso - fala ríspido enquanto os outros caras acham graça.
- Não seja grosso, John, olha moça, eu não quero essa merda, mas se sentar para beber conosco te faço um agrado - o homem mais jovem da roda propõe.
- É isso aí, vamos encher a cara - outro homem concorda levantando um copo americano com cerveja.
- Agradeço pelo convite, mas eu realmente preciso do dinheiro - agradece tentando ser gentil mesmo sentindo-se humilhada, virando de costas para ir embora do bar.
Preocupada com o choro intenso da criança, Angel tenta ir embora em busca de alguma ajuda, mas quando começa se afastar do local um dos homens que permaneceu a todo tempo calado a persegue segurando-a pelo braço.
- Pago 100 pratas por uma noite - oferece tentando aproximar seus corpos, sem se importar com a criança nos braços da mulher.
- Eu não quero me solta!
- Ora, não se faça de santa, não se lembra de mim? Você não reclamou quando eu te comi gostoso na frente do seu marido, em troca de duas pedras de crack.
Angel sentia nojo de si quando reconheceu o homem, tinha vergonha do que fazia quando seu vício a submetia a tamanha humilhação, mas era uma adicta, o que poderia fazer? É claro que ela sonhava em abandonar as drogas e mudar de vida, mas a verdade é que não tinha forças e sozinha era incapaz de conseguir.
Tentou por várias vezes, mas a fissura era insuportável, sua vida é como uma montanha-russa cheia de altas e baixos. Onde tenta se limpar, mas vive em constantes recaídas, seu vício tem total controle sobre a sua vida.
Devido aos efeitos do crack recém-usado ainda presente em seu organismo, todo seu sistema nervoso está fragilizado. Aceleração dos batimentos cardíacos, aumento da pressão arterial, dilatação das pupilas, suor intenso, tremores, excitação, coragem e alto estima elevada. O que ela tinha a perder? Seu filho tinha fome e não era como se ela nunca tivesse aceitado alguma proposta assim.
A vergonha e sentimento de humilhação dão lugar a fissura, ao desejo de por mais uma vez sentir aquela sensação que lhe traria tanto prazer. Gradualmente sua postura relutante dá lugar a um sorriso sugestivo, que agrada o maldito homem ao seu lado.
- Me arruma o "doce" e um leite para meu filho e pode me foder a noite inteira - o homem sorri vitorioso se sentindo excitado.
Aquela não era a primeira nem a última vez que a pobre criança era exposta à tamanha imundície, Angel não tinha consciência dos impactos negativos que suas ações gerariam em seu filho. Os anos passaram e Jungkook cresceu, com eles os traumas e a sede de vingança por sua vida miserável.
Todos os que um dia foram responsáveis por seus estigmas, seriam alvos de toda sua fúria. Enquanto ele se esforça para nunca mais voltar à periferia onde nasceu. Angel se arrependeu, mas é tarde demais, sentado em um antigo Monte Carlo, a um homem frio cujo coração é oco.
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