Minnesota era bom o suficiente para que ela e Sandro permanecessem escondidos. Principalmente porque ele tinha uma casa ali, uma casa segura, com câmeras e com diversas armas acessíveis a sua mão. Red Wing era, mais especificadamente, o nome do local que eles estavam ficando por aquele período. A parte boa de estar em Minnessota naquele período, julho, é que era o mês que fazia mais calor ali, ficando entre os 17° e 29°. O que significava que, com sorte, Sandro poderia mostrar a cidade para Hadassa sem que eles precisassem botar algumas camadas de roupas.
Se a temperatura ficasse acima de 20° ele poderia mostrar para ela seus lugares preferidos, poderiam ir para restaurantes a noite, e nesse caso o agasalho é sempre indispensável. Isso fez com que, apesar de estarem preocupados com tudo o que deixaram para trás, Sandro e Hadassa estavam dispostos a enxergar aquela viagem como férias e se libertarem das algemas em busca da liberdade.
Antes eles precisavam ficar em casa, Hadassa não podia sair com Marcos à solta, mas Marcos não estava mais ali, era impossível que ele tivesse ido até Red Wing junto deles, e isso acalmou tanto Hadassa quanto Sandro. Nada mais os prendiam dentro das paredes de casa. Por isso assim que o avião pousos e eles pegaram um táxi, Sandro decidiu que levaria Hadassa, naquele exato momento, para seu restaurante preferido. Ele esperava que ela gostasse de comer algo diferente e de experimentar novos ares depois de ter passado por três prisões diferentes. A casa de Marcos, o hospital e sua própria casa. Diferentes, porém todas sufocantes.
Eles apenas passaram na casa de Sandro para deixar as malas, mas Hadassa não viu como ela era, pois cochilara durante a viagem de carro. Depois disso foram em direção ao Oliver's Wine Bar, Sandro adorava esse restaurante pois quando você pedia um prato ele vinha com o vinho que mais combinava com ele, e o preço da comida não era tão exorbitante. Quando chegaram lá ele acordou Hadassa. Que saiu do carro sem questionar o porquê estavam na área do Centro e não em um espaço residencial, provavelmente por causa da sua sonolência.
A entrada do restaurante era pequena, tinha uma fachada preta com toldos em vermelho, intercalando listras de um tom mais claro e um mais escuro. Sua fachada era composta de muitas janelas de vidro, e uma porta feita do mesmo material. Além disso, tinha plantas espalhadas em baixo das janelas, o que fazia Hadassa, já menos sonolenta diante de um lugar tão bonito, se sentir aconchegada no novo espaço.
Sandro abriu a porta para ela, deixando-a entrar no restaurante antes dele. Lá dentro estava com pouca iluminação, apenas com alguns pontos de luz, e algumas lâmpadas pendendo do teto. As paredes eram cinza e havia uma bancada em um canto do restaurante, mais à frente de onde Sandro e Hadassa entraram, nessa bancada tinham um bar onde as pessoas podiam se sentar e fazer seus pedidos. Nos dois entornos desse bar havia mesas pequenas, para casais ou dois amigos curtindo um Happy Hour. Nos outros espaços do restaurante havia mesas maiores com mais cadeiras. Sandro escolheu uma das mesas de dois lugares para que eles sentassem, apesar de Hadassa preferir uma mesa privada com mais espaço, ele não lhe pediu opinião sobre isso. Depois de esperarem por pouco tempo, o garçom chegou oferecendo-lhes o cardápio. Sandro o pegou e escolheu as opções de comida para ele e para Hadassa.
— Espero que você não se importe com eu ter escolhido a refeição de nós dois. — Ele estava sorrindo para ela, amigável. Como se não tivesse errado pouco tempo antes. — Eu realmente queria que você experimentasse meus pratos preferidos daqui.
— Não há problema nisso, de verdade eu não me importo. — Hadassa sorriu colocando sua mão por sobre a dele. — Mas eu vou ficar mais feliz se você me comunicar antes e não depois do pedido.
— Você está certa. Minha atitude não foi das melhores. — Além disso, Hadassa havia passado por muitas coisas, não era legal que ele começasse a controlar as coisas dessa maneira. — Peço desculpas.
— Está tudo bem Sandro, vamos aproveitar nosso jantar.
Pouco tempo depois lhes serviram um couvert, um pão italiano, menor do que os normalmente servidos em uma padaria, ele acompanhava camarões mergulhados em azeite temperado com ervas e alho. Tudo era servido em uma tábua de madeira, o caldo com o fruto do mar estava em um pote de cerâmica escura e ia com uma colher para que o cliente colocasse seu conteúdo em cima do pão, que já ia cortado. Depois disso foi servida a entrada, uma Salada Caesar, muito bem feita com todos os ingredientes extremamente frescos.
— Está tudo tão gostoso. — Hadassa comentou com Sandro.
— O segredo é que é tudo feito por eles, inclusive o pão. Além disso, tudo é extremamente frescos e sem agrotóxicos. — Ele estava sorrindo enquanto mastigava, não tinha como não ficar feliz com uma noite como aquela, no seu restaurante favorito com sua companhia favorita. — Eles reabastecem todo dia.
— Por isso a comida tem um sabor tão acentuado, é tudo de muitíssima qualidade.
— Exatamente. — O garçom chegou recolhendo seus pratos e outro veio em seguida com o prato principal.
— Acho que esse é um excelente momento para dizer que massa é a especialidade da casa.
Foi servido a eles capeletti com recheio de ricota com espinafre e molho bechamel com pedaços de bacon. Para Hadassa estava tudo delicioso, mas para Sandro algo faltava. Não estava igual a última vez que ele comera ali, talvez fosse a combinação do vinho, que era branco e portanto correto, ele só sabia que estava insuficiente, e por isso decidiu chamar o garçom.
— O macarrão não está muito bom, você poderia avisar ao chefe, por favor. — Ele não cumprimentou ou esperou o garçom cumprimentar ele e Hadassa antes de fazer alguma reclamação e isso aos olhos dele estavam tudo bem, mas Hadassa achou muita falta de educação.
— Você poderia ter pelo menos cumprimentado ele no início. — Ela chamou atenção de Sandro após o garçom se retirar. — Achei meio indelicado da sua parte.
— Mas não está tão bom Hadassa. — Ele voltou a comer, dessa vez fazendo pequenas caretas quando não gostava de algo.
— Para mim está delicioso. — Ela sorriu para o garçom que havia os atendido antes, que estava se dirigindo a outra mesa, e viu de sua boca brotar um pequeno sorriso em resposta ao comentário de Hadassa.
— É porque seu paladar não é apurado como o meu. — Ele deu de ombros como se isso fosse uma constatação óbvia. — Ficou muito tempo trancado comendo sobras.
— Obrigada por lembrar-se disso. — A comida perdeu o delicioso sabor que tinha antes, foi estragada pela memória dolorosa que Hadassa tinha dos seus últimos anos.
— Desculpa pelo comentário. — Ele sorriu para ela, que por sua vez não tinha mais disposição para retribuir. — Foi indelicado da minha parte.
— Foi sim. — Ela não queria mais ficar ali, mas ainda havia a sobremesa, que pelo o que Sandro havia dito no avião enquanto eles estavam indo para lá, seria a melhor parte da refeição. Por isso ela decidiu não comentar nada sobre ir embora assim que terminassem o prato principal, apesar de esse ser seu desejo.
O comentário de Sandro havia deixado Hadassa chateada e um pouco nostálgica de uma maneira ruim. Ele não estava errado ao dizer que ela comia restos, essa era exatamente a verdade dos últimos anos da vida dela. Restos ou pães duros. De vez em quando, normalmente em dias que Marcos estava de bom humor, ela conseguia comer coisas mais frescas e saborosas. Mas era tão raras que esses dias se tornavam praticamente um evento para Hadassa.
Logo as sobremesas vieram, cada um deles recebeu uma porção de cheescake de amêndoas com um molho de frutas vermelhas. De fato a sobremesa fez ter valido a pena ter ficado no restaurante. Ter comido aquele doce fez com que Hadassa ficasse mais relaxada, mas isso não impediu o atropelamento de tristeza que ela estava tendo. Hadassa e Sandro terminaram o jantar, pagaram por ele e pegaram um táxi para casa.
Durante todo o caminho Hadassa havia ficado com o rosto encostado no vidro do carro permitindo que as luzes dos postes da rua iluminassem seu rosto como eles quisessem. Hadassa gostava de toda essa luminosidade, não havia isso no porão, e poder vivenciar aquilo naquele momento significava que ela estava viva e vivendo. Por mais que a luz incomodasse seus olhos, aquilo era algo bem vindo, aceito de braços abertos por ela.
Quando chegaram na casa, tanto Sandro quanto Hadassa estavam exaustos e só pensavam em dormir. Tudo o que havia acontecido com ela nas últimas semanas, e que também afetaram a vida dele, fez com que ambos se sentissem mais desgastados do que o normal. E ali, em uma casa segura e a quilômetros de distância do perigo, eles acreditavam que poderiam, finalmente, ter liberdade suficiente para descansarem.
Sandro mostrou para Hadassa onde ficava o banheiro e onde ela iria dormir o quarto de hóspedes, e foi para o seu quarto de onde não saiu mais até o dia seguinte. Hadassa tomou seu banho e se deitou na cama que seria sua pelos próximos dias. Ela dormiu como um neném que sabe que não tem com o que se preocupar, pois sabe que seus pais estão ali.
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