Quinto Capítulo
Após aquela longa conversa com Yris em que ficaram sabendo todos os detalhes da vida de Ludmilla, Brunna decidiu subir pra descansar um pouco. Sua barriga já estava pesada demais e não sabia direito porque, mas depois daquela conversa havia ficado um pouco melancólica, talvez fosse a gravidez que a tornava mais sensível!
Mas Marcos parecia querer continuar naquele tema, só que dessa vez sozinho com Brunna. Assim que entraram no quarto dela, ele foi logo comentando:
- Menina, que história essa hein?! A mulher num momento tem tudo, dinheiro, família, o amor da vida dela ao lado e, de uma hora pra outra fica só no mundo! Apenas com um pai que a vê uma vez ao ano e não dá a mínima pra ela! Não me surpreende que tenha ficado maluca! Quem não ficaria?!
Brunna não estava passando muito bem e queria ficar um pouco só pra relaxar e pensar no que tinha acabado de ouvir. Falou impaciente com Marcos:
- Bicha, me deixa sozinha um pouco vai, tô com a cabeça explodindo e não quero mais ouvir falar dessa história por enquanto. Me deixou chateada, não sei por que!
- Ora, eu sei! Porque é triste! Porque nos identificamos com ela na solidão.
Brunna já estava ficando irritada:
- Ah, Marcos, dá um tempo tá?! Identificar com ela em que? Ela viveu feliz por muitos anos, cheia da grana, cercada de gente que a amava, encontrou a mulher perfeita pra ela, então o que na vida dela lembra a nossa? Me diz, o que? A solidão?! Ah, me poupe dessa comparação! Ela está só agora! Tem dois anos e meio que tudo aconteceu. Antes ela era feliz e curtiu muito essa felicidade! Tá bom que foi uma tragédia ela perder todo mundo que amava assim, num espaço de 6 meses, mas daí a achar que a vida dela é semelhante a nossa não tem cabimento! Eu nunca tive família direito, nunca tive dinheiro à vontade, nunca fui amada por ninguém como ela foi, nunca tive quem cuidasse de mim quando eu ficava doente! E você então?! Agora chega dessa conversa, preciso ficar só e descansar, depois falamos.
Marcos a olhou pensativo e levantando-se pra sair comentou:
- Pode até ser que você tenha razão, mas pense no que a dona Yris te pediu agora no final.
E antes de fechar a porta completou:
- Fique aqui até o bebê nascer! Acho que vai ser bom não somente para Ludmilla, mas também pra você! Ela tem o mesmo sangue de sua filha e isso deve de algum modo mexer com ela. Talvez dona Yris tenha razão, quem sabe essa criança não seja a salvação de Ludmilla?! A criatura que irá tirar ela dessa apatia permanente e trazer de volta à vida?! Aproveite pra pensar muito bem sobre isso, Bru, é a sua chance de mostrar mais uma vez que sabe ser generosa como foi comigo. Te amo, minha bruxinha! Agora vou tentar jogar um pouco de charme para aquela gracinha de advogado!
E saiu deixando a amiga com a cabeça latejando mais ainda e afogada em pensamentos.
Ficou horas rolando pela cama tentando colocar as ideias em ordem. As palavras de Yris e de Marcos martelavam em sua cabeça e sentia certa indignação em saber que o marido nunca havia comentado uma linha sequer sobre o que se passou com a filha. Nem mesmo a morte dos pais e da companheira de Ludmilla , que pelas suas contas, deve ter ocorrido meses antes de se conhecerem.
"Que homem mais egoísta! Não se dignou sequer a dar apoio à filha num momento tão delicado! Deixou-a sozinha! Claro, foi mais fácil fingir que nada tinha acontecido a ter que atrapalhar a vida de orgia para cuidar da própria filha! E eu que cheguei a pensar que era parecida com ele, mas não quero ser assim, eu não sou assim! Não, eu nunca faria isso com minha filha... ou será que faria?"
E atormentada por esses pensamentos, Brunna adormeceu.
Já era noite alta quando Marcos entrou no quarto dela dizendo que deveriam descer para o jantar. Brunna tomou um banho e colocou um agasalho por cima do vestido leve, pra se proteger do frio que fazia àquela hora. Desceu imaginando que teria que passar por outra refeição como aquela do almoço, com Ludmilla muda e Yris falando pelos cotovelos pra não dar tempo de ninguém tentar puxar conversa com ela. Era tão constrangedor! Estava com o humor alterado e não via a hora de ir embora logo daquele lugar, logo após o funeral.
Quando chegou à sala de estar, encontrou Marcos sentado tomando um cálice de vinho e com alguns aperitivos na frente, não resistiu em comentar irônica:
- Tá com a vida que pediu a Deus, hein bicha?! Tomando um dos melhores vinhos do mundo, comendo bem, no coração da Europa... não esqueça que isso aqui é um funeral e não uma parada LGBTQi party!
- Chegou a senhora ironia! Pelo que vejo já está melhor do mal-estar né?! Voltou a ter o humor ácido de sempre! E minha coisinha linda como tá aí dentro?!
Disse isso beijando a barriga da amiga. Brunna deu um leve sorriso e passando a mão na barriga falou:
- Está inquieta! Hoje já me chutou tanto! Parece até que sente o que se passa em volta!
- É claro que sente! Sente principalmente o seu humor. Você pode tentar esconder e dizer pra mim e até mesmo pra você que nada disso te afeta, mas eu te conheço muito bem e sei que esses últimos acontecimentos mexeram muito contigo! Pensou no que Yris te pediu?!
Brunna deu um suspiro impaciente...
- Pensei sim e a minha decisão eu tomei em menos de 5 minutos! Caio fora desse lugar assim que Luiz for enterrado! Não fico um dia sequer além do necessário nessa casa! Pode ser tudo muito tocante, mas essa história não é minha, Marquito! Eu não pertenço a esse lugar, eu não tenho nada a ver com essa gente, então não tem porque me envolver na história deles!
- Mas Bru, ela é a irmã da sua filha! Como não é sua história?!
- Claro que não é! Por que tenho que me envolver em toda essa confusão só por causa desse grau de parentesco?! Eu não quero saber! Cheguei nessa casa tem menos de 12 horas e já tô até o pescoço disso tudo! Não vou entrar nessa cilada que é a vida dessa mulher! Eu não tenho nada a ver com isso! Minha obrigação termina com o enterro do meu marido, o resto é problema deles!
Marcos conhecia bem a amiga pra saber o quanto ela estava perturbada com aquela situação e quando Brunna ficava desse jeito, ela tinha sempre a mesma reação... fugir!
- Pense bem, Brunna, no Brasil você vai estar sozinha de qualquer jeito porque não posso ficar ao seu lado todo o tempo. Aqui pelo menos vai estar bem assistida quando essa criança nascer, vai ter a Yris cuidando de você todo o tempo e seu filho nascerá na mesma terra do pai! Você não queria um filho europeu?!
- Não Marcos, nunca quis um filho europeu! Eu quis um marido rico e de qualquer nacionalidade, de onde ele era não me importava! Assim como não me importa o que vai acontecer com ela quando eu me for, como já disse, essa história não me pertence, não tenho nada a ver com isso! Eu não tenho nenhum sentimento por essa gente e não me sinto na obrigação de fazer nada que não tenha vontade só pra melhorar a vida dela... que se dane!
Neste instante Brunna percebe que Marcos olhava em direção às costas dela com o ar pálido. Ludmilla havia entrado na sala com o Dr. Cornélio e olhava pra eles com ar curioso. Por um momento Brunna ficou apreensiva com a reação dela ao ouvir o que tinha acabado de dizer. Mas logo em seguida lembrou-se que falavam em português e provavelmente eles não entendiam essa língua.
Ludmilla permaneceu parada onde estava olhando fixamente para Brunna. Esta sentiu um desconforto muito grande com aquele jeito de ser olhada, como se toda a essência do que era fosse ali desnudada sob aquele olhar. Desconcertada, sentou-se no sofá de costas pra ela, mas ainda podia sentir seu olhar pesar em sua nuca!
Marcos sentou-se em frente a ela e Dr. Cornélio ao lado dele, não conseguiam disfarçar o flerte. Marcos disse tentando amenizar o ar pesado:
- O vinho produzido por vocês é extraordinário, Ludmilla! Venha, sente-se conosco!
Brunna olhou para trás e viu que Ludmilla continuava na mesma posição e com o mesmo olhar, parada como uma estátua, fitando-a com uma intensidade desconcertante! Nesse instante chega Yris com seu falatório e trejeitos típicos de mama italiana chamando a todos para o jantar.
Brunna quase soltou um suspiro de alívio com aquela intromissão e levantou-se rapidamente para sair logo dali e daquele olhar que a penetrava como agulha!
O jantar transcorreu como no almoço, com Yris falando sem parar sobre assuntos aleatórios; Renatinho apenas balançava a cabeça concordando com ela; Brunna, Marcos e Dr. Cornélio ouvindo pacientemente e até conseguindo de vez em quando dialogar; Ludmilla muda, olhando para o prato, só que dessa vez ela comeu alguma coisa!
Quando terminaram de comer a sobremesa, Ludmilla levantou-se de repente e disse com voz suave, porém de maneira grave, se dirigindo diretamente à Brunna:
- Gostaria que me acompanhasse até a biblioteca para tomarmos nosso café e conversarmos um pouco sobre os próximos dias, pode ser?!
Pega de surpresa, Brunna gaguejou um pouco! Coisa rara alguém conseguir fazer com que ela se sentisse tão desconfortável!
- Sim... claro... vamos sim...
- Traga nossas xícaras, por favor!
Ludmilla falava com a suavidade de sempre. Brunna pegou os cafés e a seguiu olhando como que hipnotizada para cada passo irregular que ela dava à sua frente. Entraram na biblioteca e Ludmilla fechou a porta atrás de si. Sentou-se no confortável sofá que adornava o ambiente e fez um gesto para que Brunna se sentasse à frente dela. Estava com o cenho franzido e parecia estar sentindo dor. Tomou alguns goles seguidos daquele café bem forte e Brunna não conseguiu deixar de perguntar:
- Está se sentindo bem?
Ludmilla levantou os enormes olhos para Brunna. Estavam tão escuros que o castanho mais parecia negro como um eclipse, e apesar da dor clara que sentia, falou no mesmo tom delicado de costume:
- Não se preocupe. Já me acostumei a essa dor! Ela é crônica, mas não sei por que tem dias que ela incomoda um pouco mais, mas já vou ficar bem, tomei um medicamento pra isso!
E soltando um suspiro como se um enorme cansaço a acometesse continuou:
- Precisava conversar com você a sós, acho que temos alguns pontos a esclarecer e não quero que nada fique pendente entre nós.
Brunna ficou apreensiva imaginando se Ludmilla tinha entendido o que havia dito a Marcos na sala antes do jantar. Ludmilla a olhava de modo muito direto, fixamente, sem desviar, mas não havia censura, mágoa ou qualquer outro sentimento negativo, e sim aquela melancolia que já era dona daqueles olhos. Após outro gole de café, prosseguiu:
- Eu entendo perfeitamente o português! Quando criança meus avós me levaram várias vezes à Portugal e ao Brasil. Estudei em Portugal por um ano e depois de adulta o Rio de Janeiro era um dos meus destinos favoritos nas férias! Não falo muito bem, mas compreendo tudo, por isso entendi sua conversa com Marcos ainda há pouco na sala!
Brunna a olhou, desconcertada! A respiração ficou um pouco ofegante pela adrenalina que corria em suas veias! Tentou dizer algo, mas Ludmilla a interrompeu com um gesto que surpreendeu Brunna! Ela a olhou com uma fisionomia calma e levemente sorridente e segurou seu braço com delicadeza:
- Não se preocupe ou fique envergonhada, entendo perfeitamente seu comentário! Realmente você não tem nada a ver com minha história e, se você casou com meu pai por dinheiro, é porque era esse tipo de relação que ele sempre quis! Ele lhe oferecia uma vida confortável e você a beleza e a juventude! Conveniente aos dois, imagino eu!
Brunna abriu a boca para dizer algo, mas novamente Ludmilla não deixou que ela continuasse:
- Não precisa se justificar, senhora... suas razões não me compete avaliar! Não há julgamentos aqui, tenha certeza disso! E como muito bem falou, a minha história não é da sua conta e a sua também não é da minha! Nada do que aconteceu antes que conhecesse meu pai e durante o casamento de vocês me interessa de fato!
Nesse momento Brunna olhou para o próprio braço onde a mão de Ludmilla ainda a tocava e queimava com seu calor. Ela engoliu em seco e quase engasgou ao tentar puxar mais forte o ar a fim de diminuir seus batimentos que pareciam rufar na base da garganta! Ludmilla, percebendo o desconforto da mulher à sua frente, retirou a mão e pegou um copo d'água para Brunna. Ela bebeu aquele líquido como se estivesse completamente seca. Ludmilla a observou calmamente e continuou com a mesma voz pausada e doce:
- Mas há algo que nos liga e que muito me interessa no momento...
Brunna a olhou esperando que ela dissesse algo sobre a herança, mas o que ouviu fez seu coração acelerar ainda mais...
- Seu filho, meu irmão!
Brunna pegou mais água na jarra em cima da bandeja e sorveu o liquido com avidez! Parou e respirou fundo por três vezes. Mais recomposta levantou e, olhando Ludmilla com sua característica altivez, perguntou:
- O que você quer dizer com isso? Essa criança é minha filha e só será sua irmã depois que o exame de DNA comprovar isso! Por enquanto ela é só minha! Aonde quer chegar com essa conversa?
Ludmilla também se levantou e olhou diretamente para Brunna, um olhar franco, sem armas, sem artimanhas... profundo:
- Exame de DNA? Não será necessário, senhora! Você parece ser uma mulher muito inteligente para cometer a estupidez de engravidar de outro homem que não fosse o meu pai! Afinal tinha propósitos claros com esse casamento! E como já disse, isso não me importa, mas essa criança que espera... é uma menina não é?
Perguntou com um leve sorriso no olhar ao que Brunna confirmou com um meneio de cabeça.
- Essa menininha que espera e sei que é minha irmã, sim, ela me importa e muito! E é por ela que a chamei aqui para termos essa conversa franca, sem rodeios ou subterfúgios. Quero que seja honesta comigo como foi com seu amigo, não economize em dizer o que te desagrada e nem se esforce em tentar ser gentil se não quiser. Não me interessa que tente me agradar, eu não preciso e nem quero agrados desnecessários. A única coisa que me importa agora é o bem estar e a possibilidade de fazer parte da vida dessa criança que carrega!
Brunna estava chocada com a forma direta e contundente com que Ludmilla abordava aquela conversa. Não havia ali margem pra tentar dissimular a farsa da jovem viúva desolada. A máscara havia caído muito antes do que ela esperava, mas também não conseguia entender aonde queria chegar Ludmilla...
- Já que estamos falando francamente e sem rodeios, então me diga o que pretende exatamente com essa preocupação toda com minha filha que ainda nem veio ao mundo? Qual o seu interesse em querer fazer parte da vida dela? Desculpe, mas não acredito nesse amor repentino e, se você saiu com alguma coisa da genética de seu pai, duvido que ame essa criança que ainda nem conhece!
Ludmilla ficou séria e encarou Brunna com intensidade! Não havia como decifrar seus sentimentos através daquele olhar, mas o rosto estava como uma máscara de pedra e os olhos deixaram aquele leve ar de sorriso e se tornaram escuros como ébano! Quando falou, a voz saiu como de costume, baixa e pausada, mas as palavras eram bem duras...
- Minha genética tem pouca coisa de meu pai e talvez tenha ficado restrita à parte física. Não me compare a alguém que mal me conhecia e que eu mal conhecia também! Não me julgue pelas suas próprias experiências nem pelos seus sentimentos! Vivemos em mundos muito diferentes e não sei o que passou na vida para julgar com tanta certeza, mas uma coisa eu sei, julgamentos assim em geral são completamente equivocados! Vejo que você é bem jovem ainda e talvez precise de mais experiência para saber que nossas certezas quase sempre caem por terra! A maturidade nos dá essa visão da nossa incapacidade de saber com certeza o que se passa na mente alheia!
Brunna, que sempre tinha uma boa resposta na ponta da língua pra tudo, ficou mais uma vez sem saber o que dizer diante da contundência das palavras de Ludmilla. E como um bicho acuado, tentou ser mais agressiva para se defender diante daquela mulher que a fazia se sentir uma garotinha idiota...
- Você devia saber que maturidade não tem nada a ver com idade, mas não vou discutir isso com você! Só a comparei ao seu pai porque é normal que os filhos tenham características dos pais, e você sabe muito bem que ele não era do tipo que se preocupa com filhos! Só quero que saiba que a filha é minha e não vou permitir que ela fique no meio dessa disputa de herança ou que seja usada para amealhar uma fatia maior dessa fortuna. Eu só vou lutar pela parte que cabe a ela por direito, o resto não me interessa! Por isso, assim que esse funeral terminar, vou embora daqui e nosso contato pode continuar somente pelos advogados!
Brunna respirou fundo depois de todo esse discurso para tentar se recompor e parar de tremer as mãos! Ludmilla continuava olhando para ela fixamente e de repente balançou a cabeça e começou a rir como se algo muito surreal tivesse sido dito! Brunna não entendia aquela mulher, mas não pode deixar de notar o belo sorriso que jamais pensara em ver naquela boca! Ludmilla ainda sorrindo começou a dizer:
Per me...
tutto ciò che
no é recíproco
é inutile
- Eu acho que temos um pequeno problema de comunicação aqui! Seu italiano é muito bom, mas acho que não estamos nos entendendo direito! Prefere que eu tente falar português?
Brunna ficou irritada com aquele comentário e principalmente aquela risada sem sentido, falou ríspida:
- Acho difícil que seu português seja melhor que meu Italiano. Se não estamos nos entendendo deve ser por outros motivos e não pelo idioma, mas se quiser pode tentar ser mais clara e mais rápida, por favor! Estou um pouco cansada e quero subir pro meu quarto!
Ludmilla ficou novamente séria, mas seu tom tinha a mesma suavidade de sempre:
- Desculpe, eu quis dizer que não estamos entendendo o que cada uma quer dessa história toda. A morte do meu pai nos deixou atordoadas e por isso essa tensão no ar. Não vamos deixar que nada disso atrapalhe o que realmente interessa para cada uma de nós.
Bebeu um gole d'água para aliviar a boca ressecada e continuou...
- Eu percebo que a questão da herança é muito importante pra você e é justamente essa parte que menos importa pra mim! Por isso eu tenho uma proposta a lhe fazer...
Brunna ficou com os sentidos ligados, sentia que algo surpreendente estava por vir...
- Que proposta?
Ludmilla sentou-se e fez um gesto para que Brunna fizesse o mesmo, olhou diretamente para mulher a sua frente e falou...
- De tudo que meu pai me deixou somente me interessa uma coisa, esta Vinícola! Que por sinal já é minha há muitos anos! Meu pai já havia deixado gravado que ela passaria para o meu nome assim que ele morresse, não entrando em partilha alguma! Ele sabia o quanto este lugar é importante pra mim e como eu amo viver aqui, portanto essa propriedade não fará parte da herança.
Brunna ouvia atentamente, mas ainda não entendia aonde Ludmilla queria chegar. Ela continuou a falar...
- De todo o resto, pode até parecer estupidez da minha parte ou loucura, mas de tudo o mais que há nessa herança, nada mais me interessa! Não me importam Hotéis, Cassinos, Empresas e os demais imóveis que ele possuía por aí. Deve ter também muito dinheiro em ações e investimentos. Posso até precisar de uma parte para melhorar as instalações da Vinícola, mas tenho certeza que há suficiente pra isso e muito mais!
Ludmilla bebeu mais um pouco d'água e prosseguiu...
- Minha proposta é muito simples, eu transfiro a parte que me couber da herança para essa criança que vai nascer e, consequentemente, a administração de toda a herança passará para as suas mãos, com a supervisão de alguém de minha confiança... desde que...
Brunna estava estática! A respiração suspensa! Seu foco era apenas os lábios de Ludmilla pronunciando cada sílaba como se estivesse em câmera lenta. Esperou que ela continuasse...
- Desde que você cumpra as seguintes condições: quero que essa criança nasça aqui na Vinícola e que viva aqui até completar dois anos, após esse prazo, que eu tenha o direito de visitá-la quando quiser, aonde ela estiver e que venha passar no mínimo um mês a cada ano comigo aqui na Vinícola até completar dezoito anos. Em todas essas visitas você pode acompanhá-la ou não, conforme preferir. Quero participar ativamente da vida dessa criança e poder com isso satisfazer dois desejos que tenho...
Nessa hora Ludmilla abaixou a cabeça e apertou as mãos sobre o colo como se tivesse certa dificuldade para encontrar as palavras certas...
- O primeiro é dar continuidade ao nome Oliveira, a esperança de que esta criança prossiga com nossa família e não deixe que ela se acabe em mim! O segundo é tentar ser para ela o que meu pai jamais seria e o que ele jamais foi pra mim! O dinheiro que ele deixou é sem dúvida um fator de segurança para ela, mas vai ser o amor e a dedicação que você como mãe e eu como irmã daremos a ela que vai determinar o tipo de pessoa que ela será quando adulta!
Brunna não sabia o que dizer. As palavras martelavam na sua mente, mas não faziam muito sentido para ela. Achava que aqueles motivos eram muito frágeis para se abrir mão de uma fortuna como aquela. Com certeza aquela mulher à sua frente era completamente insana! Não sabia o que pensar, o que dizer...
- Eu... não sei o que falar... acho tudo muito louco e fora da realidade! Quem em sã consciência abre mão de uma herança milionária e legítima para apenas conviver com uma criança que sequer nasceu ainda?! Desculpe, mas isso não faz o menor sentido pra mim!
Ludmilla esboçou um leve sorriso e novamente olhou Brunna profundamente...
- Eu entendo que não faça sentido pra você. Nós duas temos valores bem diferentes, senhora! Eu não me importo com todo esse dinheiro pelo simples fato de que não vou precisar dele! Tudo o que gosto de fazer, meu sonho profissional, os lugares que gosto de ir, as pessoas com as quais gosto de conviver... tudo está aqui neste lugar! Sim, eu sempre gostei de viajar, mas não precisarei de tanto dinheiro pra isso! Meu lugar é aqui! É onde quero viver, morrer e ser enterrada como toda a minha família foi! E para mim o que mais quero no momento é que essa criança nasça aqui na Vinícola Oliveira, que tenha a oportunidade de conhecer sua origem paterna e de amar este lugar como eu amo! Se quando for adulta ela não se interessar por nada disso e preferir outros lugares, que siga seu caminho e encontre a felicidade do jeito que preferir! Quero apenas que ela tenha o direito de escolher, que tenha a oportunidade de conhecer os dois lados que temos a oferecer e que faça a escolha que a fizer mais feliz! Eu não tenho filhos e não posso mais tê-los, por isso ela será minha última esperança de continuar o nome da nossa família e o nosso legado de grandes produtores de vinho dessa região.
Brunna estava boquiaberta! Alguém abrir mão de tanto dinheiro, glamour e poder era algo muito fora do seu mundo! Ludmilla estava disposta a entregar tudo para apenas ter o direito de conviver com a irmã, e isso era difícil de assimilar para Brunna! Esses laços, esse amor pelo nome e pelo sangue de família, era algo que não entendia por não conhecer!
Brunna levantou-se do sofá e começou a andar devagar pelo ambiente como a tentar racionalizar toda aquela conversa, após um tempo falou...
- Eu não quero usar minha filha como moeda de troca! Acho a metade dessa herança suficiente para ela por toda a vida! Essa coisa toda dá a impressão que você está nos comprando!
Ludmilla levantou-se e retrucou com a voz tranquila como de costume...
- Não senhora... acho que você não me entendeu muito bem. Não pretendo comprar ninguém! Quero apenas abrir mão de algo que não me fará falta, para ter o direito de conviver tranquilamente com minha irmã, pelo tempo que quisermos, sem empecilhos! A questão da herança parece ser uma grande preocupação sua, então, quero apenas deixar tudo claro e resolvido!
- Pare de me chamar de senhora! Meu nome é Brunna! Brunna entendeu bem?!
Brunna falou com uma rispidez que não conseguiu disfarçar! Algo a incomodava muito em Ludmilla! Não sabia se era aquela tranquilidade inabalável, se era a forma franca e direta de falar sem tentar impressioná-la ou se era algo ainda desconhecido, intrigante, que a fazia se sentir uma tola diante daquela mulher!
Ludmilla continuou sem se abalar...
- Desculpe, seu nome não é ainda familiar pra mim e não consigo pronunciá-lo muito bem, mas vou tentar! Ia... Brunna... Brunna!
Brunna sentiu algo estranho ao ouvir seu nome ser pronunciado por ela e sem querer os pelos de sua nuca se arrepiaram...
- Tá bom! Me chame como quiser! Eu preciso ir pro quarto... tô muito cansada desse dia e de toda essa história... preciso dormir...
- Mas não vai dizer nada sobre minha proposta?! - perguntou Ludmilla demonstrando certa apreensão pela primeira vez.
Brunna se dirigiu até a porta, abriu e antes de sair virou-se para Ludmilla e disse...
- Eu não tenho a menor condição de sequer pensar sobre o que me disse, que dirá tomar uma decisão que mexe com a vida de um ser que ainda nem nasceu! Eu ouvi bem a sua proposta e depois do funeral voltamos a conversar sobre esse assunto. Vou considerar tudo o que falou e darei uma resposta antes de voltar ao Brasil. Boa noite!
E fechou a porta deixando atrás de si uma mulher com o coração apertado!
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Estão com os coletes preparados???? Aguardando vocês no próximo 😘
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