Capítulo Trinta e Dois
Respiro fundo, saindo debaixo daquele emaranhado de terra. Meu peito subia e descia rapidamente a cada respirada difícil.
Olho ao redor, sentindo que algo me faltava, eu só não sabia o quê. Arregalo meus olhos, como se finalmente houvesse me lembrado.
Chace, CHACE! Aonde estava Chace?
Começo a procurá-lo desesperada, meu coração acelerado, minhas pernas tremendo como se estivesse com a Doença da Perna Bamba. Suspiro de alívio ao ver uma cabeça emergir logo em minha frente, seguida de tosses secas. Chace estava vivo.
--Estamos mortos.--Ele diz o óbvio, dessa vez sem ser em um sussurro... A Floresta podia nos escutar.
Meneio a cabeça, segurando em sua mão para puxá-lo para cima, me sentindo totalmente obrigada a olhar para os lados enquanto fazia isso, procurando os perigos logo à espreita.
Será que ainda estávamos invisíveis? Aonde se encontrava Clarisse e as Fadas? Será que a Floresta mandaria outra chuva forte? Será que ela faria com que ácido chovesse em novas cabeças? Por que nós estávamos dentro de uma mini caverna de terra se ela iria se desabar tão facilmente? Se ela tivesse feito chover antes, estaríamos mortos... Respiro fundo, contendo a minha respiração.
--O que faremos?--Dessa vez Chace sussurra, provavelmente não se sentindo à vontade para provocar a Floresta.
--Não faço a mínima ideia...
Rezo silenciosamente para Clarisse e as Fadas aparecem. Ao menos que elas dessem qualquer sinal de vida, ao menos para mostrarem que nada de ruim havia acontecido, ao menos para mostrarem que a Floresta não havia escutado as nossas conversas.
--Vamos morrer, não?
Não respondo Chace, temia dá-lhe a resposta, até porque doía, doía como o inferno tentar proferir a palavrinha "sim".
Olho ao redor, pássaros cantavam, animais conversavam, o riacho soava fraquinho ao longe... Não parecia que a Floresta estava nos caçando. Ao menos, não era percebível pela minha parte.
--Precisamos encontrar as Coisas...--Digo em um sopro de vento, quase inaudível, mas tenho certeza que ele havia escutado ao ver seu menear de cabeça.
--Certo, então vamos começar a procurar, de preferência sem morrermos no caminho.
Me contenho a revirar os olhos, fazendo o possível para ficar o mais próxima possível de seu corpo, segurando seu braço com uma certa força, enquanto começávamos a andar pelos galhos e folhas secas, além das raízes grossas que pareciam fazer força para quebrarem o solo. Se ainda estivéssemos invisíveis, quem sabe os animais não nos achassem tão facilmente enquanto caminhávamos, pelo menos era o que eu queria que acontecesse.
O dia estava perfeitamente ensolarado, eu deveria prestar completa atenção nele para não cometer o erro de morrer na chuva amargurada que poderia muito bem começar a cair a qualquer segundo.
--Tem alguma ideia de onde eles estão?
Balanço a cabeça em um claro sinal negativo, me tremendo toda ao escutar uma cobra rastejando perto de nós dois.
--Vamos andando, pelo menos até temos certeza que não estamos mais invisíveis...
--E como vamos ter a certeza?
--Se aparecer um animal e falar normalmente conosco.--Digo como se não fosse nada, recebendo um arregalar de olhos em resposta.
--Meredith, como você pode falar algo assim como se não fosse nada?
Não o respondo, continuando a minha dança diante das batidas frenéticas de meu coração desorientado.
Minha mãe uma vez disse que eu sempre fui a garota mais grossa de toda a vila. Eu nunca me importei, pois eu não precisava das opiniões dos outros, nunca fui de chegar olhar para a pessoa e achar que ela era realmente importante para o meu firmamento pessoal, então eu ficava sozinha, apenas por gostar da minha própria companhia, fingindo não escutar o que falavam de mim, para depois sorrir ao vê-los andar em minha direção com a mão estendida ou braços abertos. A Vila era composta de gente falsa. Eu temia que às Coisas fossem falsas e estivessem agora mesmo se rebelando contra nós.
--E se...
--Nem termine essa frase, Meredith!
Decido escutar Chace, ele muito provavelmente já sabia sobre o que eu falaria e estava com medo da possibilidade ser minimamente real. Quais as chances das Coisas se rebelarem contra nós? Bem, eram enormes, pois a Floresta era realmente manipuladora... Ou quem sabe eles nunca tivessem realmente estado ao nosso lado.
Fungo baixinho, agradecendo ao notar que Chace não havia escutado.
Corujas são animais assustadores, iguais são os corvos, isso é algo que eu e Chace super concordamos.
--Nem é de noite, como que corujas voaram para cima de nós?!
--Corvos também voaram, okay?!
Depois dessa já estava claro que nós não estávamos mais nenhum pouco invisíveis, o que significava que qualquer animal e até a tão charmosa Mãe Natureza podia fazer o que bem entendesse conosco, já que estava nos vendo, ou seja, todo o maldito plano que demoramos tanto tempo para orquestrar, não servia para nada.
Estávamos andando a mais ou menos oito minutos quando uma chuva de corujas e corvos voaram em nossa direção, fazendo eu soltar um grito nenhum pouco baixo ao sentir eles começarem a me picar e pisotear. Chace havia sido o que mais se machucou, mas conseguimos fugir, corremos durante longos minutos até eles irem embora. Estávamos verdadeiramente terríveis.
--Ela está jogando o jogo lentamente e pelo visto está indo bem.--Chace diz com ira no olhar.
Eu nem fazia ideia do porquê de estarmos cochichando ainda. Eu também não fazia ideia do porquê de a Floresta ainda querer brincar conosco antes de nos matar de verdade. Estávamos vulneráveis, erámos presas fáceis, mas ela não queria saber de nos abocanhar o quanto antes para não perder sua carne fresca.
--Chace, eu queria ter super poderes...
Se eu tivesse super poderes, ou magia, tudo seria mais simples. Se eu tivesse conseguiria derrotar a maldita, achar as Coisas para ter certeza do que havia acontecido e me dar bem de uma forma ou de outra, mesmo que custasse um membro de meu corpo todo sujo.
--Meredith, mesmo que você diga que queria ter super poderes, você nunca terá e nós vamos continuar com a ideia de que a qualquer momento algo virá nos matar.
Chace às vezes conseguia ser negativo demais, o que era péssimo. Quando senhor Franklin havia pego algum tipo de doença aos seus 10 anos, Chace passou a semana toda dizendo que seu pai iria morrer a qualquer segundo. Um tempo depois senhor Franklin ficou bom e aí Chace contraiu a doença, repetindo as mesmas palavras que disse para seu pai, mas dessa vez em primeira pessoa.
--Chace, deixe de ser tão você e pense em coisas que podem nos ajudar agora. Pense em qualquer coisa que destrua o jogo, mas pense...
Ela estava focando nos animais agora, logo começaria a focar nos desastres naturais, como tempestades terríveis, mas eu apostava que ela só tentaria isso nas últimas horas caso sobrevivêssemos até lá, o que era muito pouco provável.
--Nós somos muito pequenos para derrotá-la, Meredith, nada que eu possa pensar irá fazer com que consigamos vencê-la.
Reviro meus olhos. É sério que ele aceitava a morte tão facilmente? Eu estava sendo realista ao pensar nas possibilidades gigantes de mortes que tínhamos, mas ao menos eu estava tentando derrotá-la, não sendo como Chace.
--Chace, faça o favor, você ainda não está morto, então não aja como se estivesse.--Brigo com ele, recebendo um menear de cabeça triste em resposta.
Franzo as sobrancelhas, sentindo que havia esquecido de algo por um segundo, antes de arregalar os olhos ao notar que os pássaros não cantavam, nem os animais conversavam, tudo estava em silêncio absoluto.
--O que aconteceu dessa vez? O que ela está tramando? --Faço as duas perguntas no automático, mesmo sabendo que não obteria resposta alguma.
--Por que você insiste em perguntar mesmo sabendo que eu não tenho a bendita resposta?!
Suspiro, me levantando lentamente do lugar que nós dois estávamos escondidos, sendo prontamente seguida por Chace, esse que parecia prestes a sair correndo ao som de qualquer coisa, o que significava que sairia a qualquer bendito segundo.
--Meredith, o que você acha da gente se beijar por uma última vez antes de morrermos?
Dou um tapa estalado em seu braço, olhando para seu rosto como se o chamasse de o idiota do ano.
--Você foi você de novo, pare com isso, é sério, nós não vamos morrer!
Vejo seus olhos se revirarem como se bem negasse a minha fala, mas decido não dar muita bola. A morte era uma grande possibilidade, já estava cansada de pensar nisso. As coisas nunca ficavam boas quando o silêncio se estalava, assim como o bendito riacho que não mais soava ao longe.
O planinho de vocês foi tão fácil de destruir, vocês não fazem nem ideia.
Contenho a vontade gigante de revirar os olhos, os mantendo focados no alto como me acostumara a fazer em nossas conversinhas irritantes.
--Fascinante, mas eu realmente não faço ideia da forma que você descobriu.--Falo com a voz mais irônica possível, recebendo um olhar completamente reprovativo pela parte de Chace.
Você é incrivelmente malcriada.
Dou de ombros.
--Com você eu sou, querida.
Sinto um cutucão em meu braço, me fazendo olhar com uma sobrancelha arqueada para onde se encontrava Chace.
--Você ama se queimar, não é possível.
Reviro meus olhos, dando de ombros.
--Então, como será a nossa morte? Espero que seja rápida, estou com preguiça de continuar esperando.
Sim, eu NÃO amava me queimar, mas era impossível não soar menos irônica em meio a uma situação tão inteiramente chata, que nesse caso eram em todas as nossas conversas.
Você realmente não aprende, chega a ser um pesadelo.
--Que seja, eu tenho algo para pedir a você.
Diante do silêncio que se estalou, eu tenho quase certeza de que ela estava com uma sobrancelha arqueada, pensando em minhas palavras.
O que foi dessa vez?
Não contenho um risinho ao ouvir sua voz soar indignada.
--Se nós conseguimos sair dessa, vivos, você deixa a Vila dos Perdidos livre, sem mais show de marionetes. E sem blefar.
Ela não iria cumprir e, caso cumprisse, eu consideraria um claro triunfo pessoal.
Recebo outro cutucão de Chace, o olhando com ira.
--Você sabe que ela não irá cumprir, não sabe?
Reviro meus olhos, voltando a minha atenção para ela. Chace precisava parar de ser tão imensamente nervoso.
Interessante, você realmente não aprendeu a lição.
--Você está lendo a minha mente?--Pergunto, aguardando a resposta com uma certa urgência.
Não.
Eu realmente não estava sentindo nada, nem um puxãozinho na cabeça. Quem sabe ela estivesse falando a verdade, mas ainda não era nada confiável.
--Ótimo, irei acreditar em você.
Seu riso de escárnio soava adoravelmente repugnante.
Acho fofo que você faça essas propostas comigo. Eu não irei de maneira alguma tirar a Vila dos Perdidos do meu controle, entenda que custa muito menos.
Reviro meus olhos.
--Aonde estão as Coisas?
Não recebo resposta imediata, bufando pela demora sem sentido algum. Eu precisava saber o que havia acontecido com elas e com nosso plano.
Em algum lugar estão, não se preocupe.
Bufo, ira impregnando minha mente.
--Certo, então me explique o motivo pelo qual estar conversando conosco, por que não enviou uma tempestade, não chamou a noite com os Lobisomens, resumindo, não nos matou ainda.
Chace agora me cutucava sem parar, me olhando como se implorasse para eu ficar quieta, mas eu o ignorava, tentando ser o máximo focada no que devia, mas era complicado com aquelas unhas afiadas em minha pele.
Apressadinha, eu nunca disse que seria rápido, a questão é que está demorando demais.
Reviro meus olhos. Era claro que não estava apenas demorando, estava sendo um pesadelo. Não deveria ser tão difícil matar dois adolescentes de 17 anos.
--Como se matar dois adolescentes de 17 anos fosse realmente difícil, estou começando a pensar que você não quer nos matar.
--MEREDITH!
Não me importo com o grito de Chace, apenas continuo focando meus olhos em um ponto ao alto.
Por que eu estou conversando com vocês ao invés de os matar?
Espero ela terminar sua fala, mas ela não termina, esperando-me falar algo, o que me faz bufar altamente.
--É.
Porque eu queria escutar a voz de vocês uma última vez. Felizmente consegui escutar a do seu tão amado Chace, agora a gente pode ir para o joguinho de verdade.
Arqueio uma sobrancelha, sentindo um vento forte bater contra meu rosto, deixando meu corpo totalmente alerta às mudanças que aconteciam.
--Chace, venha para perto de mim.
Puxo Chace para o calor de meu corpo, temendo soltá-lo. Estava com impressão de que algo poderia muito bem cair em nossas cabeças em questão de segundos.
AUUUUUUU!
Arregalo meus olhos, olhando para o céu azul logo em cima de nós.
--Não são Lobisomens...--Chace diz, mas mesmo assim eu engulo em seco. Era um uivo de um lobo normal, mesmo assim assustador, feroz, sanguinário...
Sons, diferentes sons soando alto ao nosso redor, pássaros, ursos, raposas, lobos, animais de diferentes tipos, prontos para nos matar.
Olho para o rosto de Chace, medo impregnando a minha expressão. Agora era o fim, era adeus, não tínhamos as Coisas conosco, não tínhamos poderes, magia, qualquer coisa que pudesse nos salvar em meio a todos esses animais que se aproximavam lentamente de nossos corpos pequenos e indefesos.
AAAAAAAAAAA!!!!
Arregalo os olhos, o grito batendo contra as paredes da minha mente.
Espera, o quê?
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