▓ CAPÍTULO SEIS ▓
Dou um gole no café fumegante e observo do quinto andar, sem muito interesse, as crianças brincando na piscina do apart-hotel através da grande janela que permite a luz natural entrar abundante. A vista para o espaço gourmet não é uma maravilha, mas não deixa de ser agradável.
Finalmente chegou o dia que planejei há praticamente nove anos e que sonho desde que coloquei os pés para fora da casa de Sandoval. Até acordei tarde para encarar o fim de semana, porque estou desfrutando sem a menor pressa a sensação de não ter vínculo obrigatório com ninguém. Agora é somente eu e as minhas decisões. Quero que este momento seja saboreado com extrema tranquilidade. No entanto, logo percebo que não vai acontecer tão cedo quando vejo Otávio surgir no meu campo de visão, seguido por uma comitiva de funcionários do flat carregando uma infinidade de buquês de flores.
Exatamente. No tempo de fazer um café e tomar o primeiro gole, foi tudo por água abaixo. A cena só me parece uma grande palhaçada, chamando a atenção de todos por onde ele passa. Otávio é mestre em aparecer, talvez por isso seja político ou seja político por isso, acho que não faz diferença.
Respiro fundo ao notar que ainda precisarei de mais tempo e paciência para me libertar dele. Não posso ignorar que a minha vida na política depende de um bom relacionamento com o senador. Também me forço a lembrar que realizar minhas promessas de campanha são a minha prioridade no momento. Eu me tornei vereadora não apenas para ter um contracheque alto, mas para mudar, nem que seja um pouco a realidade do morro.
A ideia de fazer a diferença no mundo pode parecer piegas, juvenil ou sei lá o quê, eu não ligo. Só quero colocar a minha cabeça no travesseiro e saber que o meu mandato valeu a pena para a população de Belo Rio. É desesperador ver que as coisas simplesmente não andam na administração da coisa pública, mesmo com tanto dinheiro arrecadado com impostos.
Contrariada, eu olho ao redor da sala do flat enquanto aguardo Otávio bater à porta. O espaço comum, que não proporciona uma grande experiência de decoração, está longe de ser o tipo de imóvel que ele aprovaria para eu morar. A sala é suficiente para uma ou duas pessoas. Há um sofá de cor bege para dois lugares, uma mesa de centro com revistas em cima e uma pequena TV presa à parede. As cortinas brancas são simples, as paredes têm um tom neutro. Nada é muito atrativo ou elegante, o que para mim, serve o propósito de um bom apartamento.
Em poucos instantes ouço os nós dos dedos de Otávio batendo contra a porta oca de madeira e, preparando a minha paciência, abro-a com uma expressão simpática. Ao me ver, o senador alisa a sua barba me estudando através dos seus olhos miúdos com um ar inocente. Mesmo com tantos anos ao seu lado, vendo de perto os bastidores da política, ainda me pergunto como ele consegue manter esse olhar amigável sendo que é um verdadeiro lobo em pele de cordeiro.
— Bom dia, luz da minha vida! — diz abrindo um sorriso cheio de encantos, ele é muito bom nisso.
— Bom dia, senador Otávio Primmaz! — retribuo sem me deixar seduzir por sua capacidade de quebrar a resistência das pessoas. Não dá para cair nessa depois de tanto tempo sabendo que é uma arte que ele domina e não algo verdadeiro.
— Por que tanta formalidade? — pergunta com uma voz mansa.
— Por que tantas flores? — questiono sem conseguir evitar o sarcasmo, arrancando alguns risinhos dos funcionários que aguardam no corredor, mas Otávio não se deixa abater e continua o espetáculo.
— Percebi que eu nunca te dei uma rosa... — fala com teatralidade para parecer romântico. Eu sei que ele não é disso, apesar do esforço que está fazendo.
— Sempre preferiu me dar presentes úteis... úteis para você — digo ao lembrar da infinidade de lingerie que ganhei nas datas comemorativas ao longo desses anos. Os funcionários se entreolham pegando o meu sarcasmo no ar.
Otávio se prepara para falar algo com o dedo em riste, mas ao pensar melhor, apenas o sacode no ar sem se deixar levar pelo calor do momento. Prendendo os lábios dentro da própria boca, parece engolir as palavras que estava prestes a pronunciar. Até que se decide sobre o que dizer.
— Eu te trouxe nove buquês para representar os anos que deixei de fazer isso e tentar reparar a minha falha. Cada um possui doze rosas, que simbolizam a quantidade de meses do ano.
— Impressionante — ironizo com um sorriso cínico e os funcionários fazem cara de paisagem. Eu deveria me controlar mais, só que está difícil.
— Gostaria que fossem em dias, mas a cidade não tinha essa quantidade de flores e talvez aqui não coubesse — avalia ao passar os olhos pelo pequeno apartamento que ocupo com certo desprezo.
Eu bem que já imaginava!
— Ah, é. Belo Rio é uma capital pequena, sem contar que seria bem absurdo você gastar dinheiro com trezentos e sessenta e cinco buquês vezes nove, daria...
— Três mil, duzentos e oitenta e cinco buquês — responde o resultado com mais rapidez, passando a mão pelos cabelos um pouco grisalhos.
— Que loucura... — digo abismada, sabendo que ele teria capacidade de cometer essa insanidade, e eu provavelmente o faria engolir todas as flores com tamanho desperdício.
— É o que se faz quando a mulher que ama decide ir embora.
— Sério? Coitado de quem não tem dinheiro para isso. — Alguns funcionários tentam controlar um risinho ao prender os lábios na boca, interrompendo o súbito divertimento quando Otávio se vira para eles.
O senador faz um sinal para o grupo, que logo entra em fila me cumprimentando e em seguida deixa os buquês espalhados pelo ambiente. Depois, todos saem em silêncio, dando um rápido aceno de cabeça, desaparecendo em seguida corredor afora, nos deixando a sós.
Eu bem que percebi entre os funcionários, algumas mulheres encantadas com as flores e o olhar brilhando ao fitar Otávio, como se ele fosse o próprio Chris Evans ou coisa do tipo. A carência e deslumbramento de grande parte do público feminino é algo a ser estudado. Na verdade, já foi. E é usado por grandes marcas que fazem bom uso disso, vendendo produtos na cor rosa bem mais caros que em outras cores.
— Não vai me convidar para entrar? — pergunta e cruzo os meus braços sobre o peito. — Fiz o possível para ser sua primeira visita.
— Como descobriu onde eu estou morando? Não avisei a ninguém.
— Eu sou um senador. Acha mesmo que tenho dificuldades para descobrir algo assim? — responde com uma soberba dissimulada.
Abrindo passagem, eu me afasto da porta, olhando com tristeza para as flores espalhadas pela sala, que é integrada com a cozinha. Paro novamente na janela, de costas para a visita inesperada, sentindo uma imensa saudade do sentimento que há pouco eu saboreava lentamente. Ele encosta no meu corpo e me abraça, apoiando o queixo em meu ombro.
— Tenho algo que irá gostar mais do que as flores — fala com uma voz risonha no meu ouvido.
— Qualquer coisa é capaz de me deixar mais feliz do que as suas flores — ironizo.
— Você nunca foi dada ao romantismo — reconhece .
— Sua definição de romantismo é diferente de como eu enxergo esse conceito. — Dou um longo suspiro.
Para ser sincera, eu sempre me bloqueei para não me deixar levar com coisas do tipo em relação ao senador, nunca confiei nele como homem. Como cliente, reconheço que ele nunca me deixou na mão. Otávio sempre garantiu que eu tivesse tudo o que precisasse. Para o senador, isso nunca foi muito, já que é riquíssimo. De qualquer forma, nunca gostei de explorar.
— É, eu sei que você é uma pessoa difícil de agradar. Mesmo assim, quis arriscar só para te mostrar que eu não sou como me pinta. — Ouço Otávio falando, tomada pelo tédio que é esta conversa.
— Quem sou eu para discutir com você, senador. — A pequena risada dele vibra em meu ouvido, ultrapassando os meus fios castanhos que cobrem o meu rosto. Talvez ele não tenha entendido que foi puro deboche, ou prefere fingir que não. Vai saber o que se passa na cabeça desse homem.
— Deixando de lado essas demonstrações gratuitas de amor, vou contar uma novidade que realmente vai te deixar feliz — diz repleto de empolgação ainda segurando a minha cintura, se posicionando um pouco mais ao meu lado.
— Fique à vontade para tentar.
— Está sendo cruel — faz uma advertência ressentida, ajeitando uma mecha para trás da minha orelha —, mas mesmo assim vou te dar isso. — Junta os meus cabelos em suas mãos e deixa um beijo em meu pescoço.
Imediatamente, percebo que o meu corpo não possui uma sintonia coerente com o meu coração e a minha mente. Ele fica arrepiado com as carícias de Otávio e a sua presença próximo a mim. O pior de tudo é ver que o senador tem consciência disso, o que se torna um estímulo para insistir em um romance entre nós.
— A Lei Orçamentária que você criou e conseguimos aprovar para o prefeito fazer o tal centro de acolhimento à mulher no morro que tanto deseja, será executada por ele a partir de agora.
Uau! Internamente, meu corpo está em êxtase de alegria, mas não deixo que ele perceba. Preciso ter certeza se não é um delírio ou coisa do tipo. Só tenho um ano como vereadora, já consegui aprovar a Lei Orçamentária com o apoio de Otávio e agora tenho um compromisso do prefeito? Não é possível!
— Sério? — Olho surpresa para Otávio. Ele não mentiria sobre isso, não seria capaz, eu acho.
Tenho consciência que Otávio não dá muita importância a esse projeto. Sinceramente, ninguém além de mim tem o mínimo interesse em um centro de acolhimento para a mulher. Como senador, ele só se esforçou para aprovar, porque não aguentava mais a minha insistência nisso.
— Claro. Eu sei que o prefeito estava fazendo corpo mole, já que é uma área de difícil acesso ao poder público para realizar a obra e os trâmites por conta do tráfico. O fato é que ninguém quer mexer em um vespeiro. Mas eu deixei claro o quanto isso tem importância política para mim e o quanto vou investir nesse projeto. Sabe por quê? — Balanço a cabeça em negativa. — Porque você é muito importante para mim.
Dá até para acreditar no que Otávio disse. Sei que o senador não dá a mínima para um centro de acolhimento à mulher em Tia Ondina, ele já tem o eleitorado feminino de lá na palma da mão. Sempre é o candidato mais votado no morro. Basta distribuir sorrisos e abraços em época de campanha para garantir votos o suficiente na área.
Otávio gira o meu corpo e fico de frente para ele. Minha mente tenta descartar todas as palavras que traziam um sabor amargo junto daquela notícia. Só não posso ignorar o preço que preciso pagar, mas vale a pena sacrificar um pouco mais da minha sonhada liberdade. O centro de acolhimento é um sonho que tento trazer para o morro onde morei. Agora, já não é apenas só meu ou de Tia Ondina, porque foi um dos grandes motivos de ter sido a mulher mais votada para vereadora de Belo Rio.
Isso é uma vitória e tanto!
— Nem um sorriso? — pergunta com os olhos passeando pela minha boca. Eu realmente não sorri, porque estou em choque.
— Obrigada... — A palavra ressoa nos meus lábios, mas o agradecimento não é para ele, é para o universo, mesmo assim Otávio recebe com um sorriso vitorioso.
Eu sempre soube que não seria uma conquista fácil e não é somente sobre conquistar o eleitorado. Sem um bom retorno, ninguém está interessado em dar assistência social às pessoas, principalmente às mulheres. Concretizar algo assim, demanda muitos acordos. Não sou nem capaz de imaginar o que Otávio prometeu para dar andamento no centro.
— Achei que era mal-agradecida. Eu te acolhi e ontem, ouvi muitas palavras duras da sua boca. — Coloca a mão no meu maxilar e pressiona suavemente as minhas bochechas. — A sua sorte é que você me chupa como ninguém.
— E você me elogia como ninguém.
— Eu prefiro te dar prazer como ninguém — rebate.
Otávio não perde tempo e avança na minha boca sendo retribuído, ele sabe que isso liberou o seu acesso a mim. Novamente eu vendo o meu corpo em nome de algo maior, em nome dos meus sonhos. Acredito que para o senador não interessa os reais motivos pelos quais estou cedendo. Simplesmente fantasia ser capaz de me conquistar, desconsiderando completamente que não passa de uma troca.
— Sabe que com toda aquela briga eu fiquei com mais tesão em você — confessa ao largar a minha boca. — Aí, fiquei pensando... nós nunca brigamos de verdade, como um casal — fala amassando o meu corpo contra o seu. — Eu sempre me chateava, mandava e você obedecia — lembra tirando a minha blusa. — Não conhecia esse seu lado... — aponta descendo o meu short de algodão e a minha calcinha, em seguida levanta e abraça o meu corpo nu. — Mas gostei tanto do que vi, que fiquei louco para te chupar.
Otávio desce as mãos da minha cintura para a minha bunda e me aperta contra a sua ereção. Meu corpo perde as forças e solto uma arfada, quando eu me sinto queimar por dentro. Provavelmente eu não valho um centavo por isso, mas é bom saber que posso aproveitar um momento íntimo com ele sem entregar o meu coração
— Você é inacreditável. — Solto um sorriso em seu pescoço ao mesmo tempo que ele ainda enche suas mãos com a minha bunda.
— Você também, sabia? — Suas mãos sobem pelas minhas costas arrepiando a minha pele.
— Não. Fiquei curiosa para saber porque sou inacreditável.
— A sua beleza é inacreditável, o seu sorriso é cheio de vida, o sabor da sua boca é único, o seu cheiro me deixa louco... nada em você parece desse mundo. Uma deusa de outro universo que eu tenho a felicidade de possuir. Toda minha.
Otávio se ajoelha, acaricia a linha do meu sexo com o polegar e beija com uma verdadeira veneração. Encosto minha cabeça na parede fixando os meus olhos no micro-ondas, que marcava 10:49 da manhã no display. Ele estica a pele ao sugar todas as partes do meu sexo com a sua boca, deixando o meu corpo em puro êxtase.
— Boceta gostosa — declara ao tomar o fôlego, continuando em seguida. — Ahhh, Dalena Rosa, deusa da beleza e do prazer, me declaro teu servo eterno — brinca, me arrancando uma risada.
A minha perna é levantada por Otávio que beija o interior da minha coxa com delicadeza e faz um trilha até o meu monte de vênus, onde passeia a língua pela pele lisa e depois me invade. Ele saboreia a minha carne em movimentos que se aprofundam, fazendo repetidas investidas frenéticas na minha intimidade.
Olho para baixo, com meus gemidos brotando das minhas entranhas, e assisto de relance Otávio tirar o seu membro da cueca box de uma marca de grife qualquer. Ele passa a deslizar a sua mão por toda a extensão do seu sexo, em movimentos rápidos de vai e vem, alternando com breves instantes de calmaria.
— Você me deixa louco, Dalena Rosa... — diz num breve respiro.
— Não para... — imploro com a voz arfante.
O senador retoma os meus grandes lábios para si, enchendo a sua boca atendendo ao meu pedido. Depois, os invade se aprofundando a cada instante, como se fosse o epicentro de um terremoto em meu corpo. Ele investe no meu clitóris com uma língua mais nervosa. Pelo movimento do seu braço, percebo que intensifica o vai e vem da sua mão, deslizando pela sua rigidez com extrema habilidade ao que parece.
Conectados em um único ponto através de um toque tão frágil, transportamos o prazer de um corpo para o outro, criando algo feito por energia pura. Passo a gemer mais acelerado, sentindo que estou prestes a ter um orgasmo na boca de Otávio. Ele acompanha o meu ritmo, percebendo que me aproximo do ápice, e sincronizado comigo, alcançamos o prazer juntos, enquanto emite alguns urros selvagens em meu clitóris.
Ao soltar o seu membro, Otávio deixa vários beijos envolta da minha pélvis, que libera alguns espasmos involuntários. Suspiro cansada. Sinto o tesão aos poucos abandonar a expressão do meu rosto e deixar apenas o sentimento preocupante de como ele vai se cansar de mim assim. Quando o vejo agarrado a minha bunda com as mãos em brasa, percebo que não há sinal algum de que isso aconteceria tão cedo.
— Vamos pra casa — chama ao levantar e me abraçar apertado.
— Não estamos juntos, Otávio, e vai permanecer assim — aviso ofegante. Sair de lá, já foi um grande começo.
— Isso significa que vai ficar com outros homens? — questiona preocupado.
— Significa que vou fazer da minha vida o que eu quiser — explico.
— Acha que é justo comigo, hum? — Afaga o meu pescoço com o seu rosto.
— Acho justo comigo que batalhei por isso — respondo encarando o relógio no micro-ondas que marca 11:22 em seu display. Lá se vai a minha deliciosa manhã. Não que eu menospreze o esforço de Otávio em me fazer ter um orgasmo, quando ainda nem tomei meu café, mas a presença dele está me dando nos nervos.
— Por que anda tão cabeça dura? — Pressiona os meus cabelos entre os seus dedos com certa força e me encara ao perguntar com uma voz macia.
— Cuidado Otávio, está em uma zona muito desconfortável para mim — alerto e ele afrouxa a mão.
— Desculpa, Dalena..., me desculpa. — Otávio diz.
Franzindo o meu cenho, desvio o meu olhar. Ele deve estar testando o meu limite, ou não tem a menor noção de quem eu seja.
— Olha, podemos manter isso como sempre foi, mas cada um no seu canto. — Tento negociar novos termos, seria um bom recomeço se ele aceitasse algo assim.
— Inacreditável! — exclama contrariado, afastando completamente a ideia para a minha decepção. — Aliás, essa é a palavra do dia.
— Não estou propondo nenhum absurdo — argumento, certa de que tenho total razão.
— Dá para ver claramente que está bem confortável com a ideia — ironiza em um tom indignado.
— Você também pode ficar — sugiro em um tom mais apaziguador, buscando o olhar dele. Eu preciso que fique conformado com isso, não quero Otávio no meu pé vinte e quatro horas por dia. Passei o último ano vivendo no meu limite.
— Nem tente me convencer disso — rejeita o pensamento com uma expressão de chateação, inclusive, evitando me olhar.
— Difícil conversar assim...
Muito difícil.
— Claro que é difícil. — Se afasta um pouco e cruza os braços.
— Otávio, precisa enxergar que as coisas não são da forma que quer. Existe uma realidade entre nós dois que ignora — falo, sabendo que não vai mudar muita coisa.
Pelo que vejo dele, se mantendo inflexível, não vai mudar mesmo. Sempre achei que a maioria dos homens fossem mais abertos à ideia de algo completamente sexual. Mas, pensando melhor, no fundo existem muitos que tem a fantasia do cachorrinho que mijou no post e acha que ali é o seu território.
Otávio me estuda alisando a barba, ele é tão caricato que chega a ser engraçado os seus gestos. Nunca o levei muito a sério pelo fato de sempre ficar feliz em eu dar o que queria ou falar o que esperava ouvir. Sempre pareceu muito fácil o nosso envolvimento, porque não havia exigências absurdas da parte dele, só gostaria que aceitasse o fim disso com a mesma facilidade.
— Você por acaso me deixou te chupar, porque eu consegui que o Valmir Mar se comprometesse a executar a sua Lei Orçamentária para o centro? — pergunta com desconfiança, e nem acredito que só descobriu agora. — Isso foi uma troca? — insiste e bufo um riso. — Mas você gozou na minha boca — fala, parecendo realmente não entender.
— O hábito faz o monge — ironizo sem soar maldosa. — Olha, quando eu morava com a Lourdes, ela conversou muito abertamente comigo sobre tudo. Aprendi que o sexo por dinheiro ou o interesse que seja não precisa ser algo desgastante. Pode ser prazeroso, ainda mais que você é muito bom nisso — elogio com sinceridade.
Vejo de viés Otávio guardar o seu sexo na cueca se afastando bruscamente, abotoa a calça e depois senta no sofá. Apanho o meu short no chão e o subo pelas minhas pernas, assistindo o senador afundar o rosto nas mãos como se estivesse prestes a chorar. Depois de vestir a minha blusa, eu puxo um puff embaixo do aparador da pequena sala, onde me sento cruzando as minhas pernas.
— Você nunca gostou nem um pouco de mim? — A pergunta paira no ar um instante.
— Não como espera ao que parece, até pensava que era algo recíproco — esclareço.
— Espera um pouco. Todo esse tempo dormindo e acordando juntos, você se manteve alheia — constatou com o olhar surpreso. — Como conseguiu me enganar tanto? Ontem eu só achei que estava chateada e por isso falou aquelas coisas, mas hoje abriu as pernas para mim. Eu senti a sua boceta quente na minha língua e se comporta como se não fosse grande coisa — diz em tom de lástima. Arqueio as minhas sobrancelhas, prendendo os meus lábios.
— Nem vem, Otávio. Primeiro, acho que você, melhor do que ninguém, sabe que sexo e amor são independentes. Ainda não experimentei os dois juntos, então não sei como funciona muito bem, mas é algo muito óbvio. Lourdes sempre conversou bastante comigo, me deixando pronta para saber lidar melhor com nosso envolvimento — esclareço.
— Pelo visto, Lourdes arrancou o seu coração e me entregou você apenas com uma vagina — choraminga.
— Segundo — ignoro o que disse —, eu nunca te enganei, nunca disse que te amava. Sempre tivemos uma boa convivência. Conversamos, sorrimos, brincamos, transamos e foi tudo legal. Provavelmente, você é a melhor pessoa com quem eu passaria essa experiência — concluo.
— Tudo se resume a interesse, eu nunca fui capaz de te conquistar? — levanta a questão.
— Se você estava tentando me conquistar, não parecia. Só parecia que estava me pagando mesmo — respondo um pouco sem jeito.
— Foi Lourdes quem te disse isso, que era um pagamento? — questiona num tom de revolta.
— Claro, porque sempre foi. Olha, ela também me instruiu a não esquecer qual era o meu lugar para que eu não me deslumbrasse. Ficaria difícil para mim se eu me apaixonasse, mas se de repente se tornasse uma relação, eu saberia, o que não aconteceu, convenhamos — ventilo, buscando ser objetiva na tentativa de que Otávio entendesse de uma vez por todas. — Você sabe muito bem o motivo de ter entrado nisso. Fui aberta com você nesse sentido. Eu não poderia idealizar algo assim. Uma garota de programa apaixonada é o fim, não acha?
— Pelo amor de Deus, você nunca fez programa. Não te tirei de lá antes, porque na minha posição iria me comprometer. Agora, enquanto estava lá, recebeu um treinamento dela para ter um coração de pedra... — conclui e, praticamente, desisto de fazer o senador entender. Na verdade, ele sabe muito bem e não quer aceitar porque não é conveniente ao que deseja.
— Ela não me treinou, eu não sou um cachorro. — Sorrio embasbacada. — Nós só conversamos sobre essas coisas, já que eu não sabia onde estava me metendo. Não ignora o fato de que eu não sabia absolutamente nada do mundo quando começamos a conversar — digo tentando afastar dos pensamentos uma adolescente desesperada que fugiu de casa e matou alguém. — Ela tem sido uma grande amiga desde sempre. Quando sua mãe tentou me atacar com aquelas palavras, não conseguiu me atingir, porque eu tenho total consciência do que somos.
— Eu te esperei amadurecer, Dalena. Não só isso, cuidei de tudo o que te envolvia para você crescer sem se preocupar com nada, nem mesmo com a sua mãe. Hoje é vereadora e está prestes a se formar em direito. — Otávio me encara perplexo. — Lourdes vira a sua cabeça contra mim fingindo ser sua amiga e você acha que isso é normal, que não significa nada?
— Por que seria se nunca me disse o contrário? E por favor, para de atacar Lourdes desse jeito, isso me incomoda. — Fico um pouco irritada.
— Em todo esse tempo, como não viu que meus envolvimentos nunca representaram nada em relação a você? Eu só precisava ter ao meu lado pessoas com posições que me trouxessem prestígio. Além de que, preferi te deixar focar nos seus estudos. Durante esses nove anos ficou à vontade, longe das obrigações, era só isso — alega em agonia.
Longe das obrigações? Deve ser piada. Como se o sexo com ele deixasse de ser uma obrigação e não interferisse na responsabilidade que assumiu em me manter justamente sob essa condição. O senador faz parecer que era algo opcional.
— Respira um pouco, Otávio — peço, guardando a minha indignação.
— Eu tenho as mulheres mais caras aos meus pés, conquistei todas que eu quis, mas justo você vem me dizer que são negócios... — desabafa irritado.
— Justo eu fui sincera com você. Não digo que todas são por interesse e até mesmo, alguém pode acabar unindo isso ao amor, como eu faço com o sexo. Mas a sua posição e a sua conta bancária sempre tiveram muito a oferecer, seja status, luxo, um teto ou um prato de comida — pontuo com certa acidez.
Sei bem o que as mulheres que o senador se envolveu desejavam. Era tudo uma grande relação de negocios envolvendo sexo, assim como é o meu caso com ele. A diferença é que não possuo um sobrenome ligado a uma família importante.
— Então, quer dizer que eu sou apenas um caixa eletrônico? — Ele cruza os braços sobre o peito.
— Mulher cara e conquistar uma mulher em uma mesma frase parecem coisas divergentes. Então, para muitas, sim, você é um meio de se manter no topo ou chegar até ele. Não vejo nada de errado nisso, cada um faz o que quer, mas é uma realidade. Aliás, tenho certeza que sabe muito bem do que se trata. Inclusive, sobre o que é o nosso envolvimento. Não se ensina um padre a rezar.
— Certo, dona Dalena... — fala inconformado.
— Não foi a minha intenção machucar os seus sentimentos, mas não sei o que está fazendo no lindo mundo de Bob. A realidade não é uma massinha de modelar, ela é dura, ainda assim é o melhor lugar para se viver, como diz o ditado. E eu não vou cair nesse papo de amor.
— A única realidade dura para mim e que estou aqui digerindo amargamente é a da sua falta de sentimentos com nós dois. Mesmo assim, não muda o fato de que eu amo você e quero colocar uma aliança no seu dedo com o meu nome. — Otávio suaviza a expressão em seu rosto e me lança um sorriso dolorido.
— Continuamos em um impasse, então. — Comprimo os lábios em uma linha reta.
— Vamos fazer o seguinte... Eu quero te propor um outro trato, anulando o que fizemos quando pediu abrigo a Lourdes. — Abro um sorriso incrédulo para o senador. — Sabe que quando quero algo, vou até o fim ou não me chamo João Otávio Primmaz.
— É, eu sei e estou sentindo na pele — falo mais para mim do que para ele.
— Essa será a minha proposta: A partir de agora nada de sexo, até que se apaixone por mim — sentencia e caio na gargalhada. — Qual é a graça?
— Vai se aliviar com as milhares de mulheres que tem e eu só vou fazer sexo quando me apaixonar por você? Ahh... faça-me o favor!
— Que milhares de mulheres, Dalena?! Há muito tempo só fico com você.
— Você nem tem ideia, não é? Nem imagina quantas mulheres acham que não te levaram ao altar por minha causa. Não tem a menor noção das ligações que recebi de madrugada enquanto você transava com alguém que fazia questão de gemer o seu nome e sobrenome. Recebi muitas fotos e vídeos para me provocar ciúmes com a intenção de fazer a nossa suposta relação acabar. Inclusive, estou atualizada sobre a sua estadia em Brasília. — Pego o celular para abrir o aplicativo de mensagens.
— Não precisa mostrar — pede rapidamente.
— Faço questão — insisto, ignorando o seu pedido. — Há dois dias, no horário do almoço, fez uma refeição de praticamente seis mil reais em um restaurante famosíssimo com uma estrela Michelin e comeu a sobremesa na cama de um hotel cinco estrelas.
— As coisas não são bem assim... — tenta se justificar de forma evasiva
— Ai, Otávio, nem se dê ao trabalho, por favor. A minha única preocupação com a sua vida sexualmente ativa era se usava camisinha, já que comigo faz questão de não usar, mas sempre recebi provas de que se protege. Aqui no vídeo dá para ver direitinho que usou um preservativo de menta, a moça soube posicionar bem a câmera — digo com desdém abrindo o vídeo no celular que já estava na pasta da lixeira, mas ele vira o rosto imediatamente.
Desligo o aparelho antes que os sons da intensa atividade sexual de Otávio tomem conta do ambiente. Ainda estava na parte que a mulher se afasta da câmera e começa a sorrir igual uma idiota para o senador, que a esperava na cama.
— Isso só prova o meu amor por você. — Ouço isso estufando os meus olhos, espantada com a cara deslavada dele.
— Isso só prova o seu amor pelo seu pau... Embora, eu precise reconhecer, você até tentou me conquistar. Só acho que o seu esforço é suficiente para nós dois concluirmos que o melhor é cada um seguir com a própria vida — sugiro com uma falsa gentileza.
— Eu não vou procurar outras mulheres e não vou desistir, Dalena — afirma categórico. — Pode até dizer que entre nós não existe nada, mas eu mereço que me deixe tentar. Se eu não conseguir, tudo bem, você segue com a sua vida do jeito que quiser.
— Ai, Otávio...
— Não seja tão cruel comigo... É só me dar a chance que eu quero, vai estar nas suas mãos.
Penso por um longo momento, enquanto Otávio permanece firme. Está na cara que ele vai criar milhões de oportunidades para ficar agarrado no meu pé e não posso simplesmente dar um fim quando ainda tem tantas esperanças comigo. Essa pode ser uma boa oportunidade de acabar tudo de forma amigável.
— Tá bom, então tenta — digo vencida pelo cansaço ao descruzar minhas pernas e sacudi-las com impaciência. — Só peço que saiba reconhecer e respeitar uma possível derrota.
— Acordo fechado — concorda, e trocamos um aperto de mãos para selar as diretrizes estabelecidas.
Otávio se levanta tranquilamente do sofá, me deixando confusa e surpresa. Sem dizer uma só palavra, caminha em direção à porta por onde sai sem sequer se despedir. É como se ele estivesse correndo daquela situação, esperando que tudo sumisse quando desse as costas e voltasse em um outro momento para começarmos totalmente do zero. Seria possível algo assim entre nós dois?
É fato que nunca me magoei com os relacionamentos dele ou a minha posição em sua vida. Talvez ter o meu coração pertencendo de alguma forma a outro, mesmo que seja um sentimento juvenil, tenha sido um bom escudo a tudo o que Otávio me expôs durante esses anos.
Se passou tanto tempo desde que eu e Dom tivemos um contato real no supermercado, que me pergunto se não seria somente um eco das minhas memórias. Mas sempre que o vejo ou ouço o seu nome, tenho a resposta do quanto isso é verdadeiro, do quanto está vivo dentro de mim.
Eu sempre soube que viver qualquer coisa com Dom é algo inatingível, embora o meu coração ignore completamente essa realidade. Vai ser divertido ver Otávio tentar superar tudo o que aqueles olhos azuis me causam, porque nem mesmo todas as vezes que fizemos sexo conseguiram ser melhores do que um simples beijo. O meu único beijo de amor.
Deito sobre o tapete felpudo no chão da sala, enquanto encaro o teto, pensando o que posso esperar dessa proposta sem sentido. Chego a conclusão de que duvido completamente que Otávio seja capaz de nos colocar em um outro espaço. Eu só precisaria manter tudo isso até o centro do morro ser concluído.
|NOTA DA AUTORA|
Demorou, mas saiu! kkkkkk
Alguém ai confiando que Otávio se sairá bem nessa? E tem torcida para o senador ou é time Dom firme e forte?
Quem curtiu a ideia da Dalena sobre o centro de acolhimento a mulher? Nos próximos capítulos o personagem vai falar melhor sobre isso. A ideia surgiu na obra, mas encontrei lugares com um projeto parecido e que funcionam como casa de acolhimento para vítimas de violência doméstica e abuso sexual.
Hoje A Matrioshka do Turco chegou na Amazon, tem cenas mais completas e um capítulo extra. Quem quiser dá uma passada lá para conferir, o link tá nas mensagens públicas do meu perfil.
Até sexta com mais um capítulo de Te Espero Nos Meus Sonhos. Obrigada pela leitura. ✿◕‿◕✿
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