▓ CAPÍTULO CINCO ▓
︻╦╤─ Quase nove anos depois.
Os anos se passaram e desde que tive a minha primeira vez com Otávio não moro mais na casa de Lourdes. Tenho uma ótima amizade com as garotas, principalmente com Josy. Atualmente, ela é independente, sendo mantida por um cliente fixo. Chegou até a ser pedida em casamento, mas recusou. O homem então fez um acordo para que não saísse com outros. No entanto, tenho minhas dúvidas de que isso aconteça.
Sempre faço uma visita na casa de Lourdes para um café. Além de amar manter o contato, porque ela é como se fosse a minha única família, essa é também uma maneira de ter notícias de Dom. Agora, ele é o dono do morro e comanda a facção de Tia Ondina, a ArCrim - Armada do Crime.
A rixa com o grupo de extermínio, principalmente pela morte de Pampa, que violentou Nina e é filho de um policial, motivou todos os conflitos que aconteceram nos últimos anos. Em um dos embates, o tráfico perdeu o Caldeira, foi nesse momento que Dom assumiu.
Desde então, a banda corrupta da polícia foi aniquilada pelo comando estratégico do vulgo Thundercat, aumentando o respeito e a admiração por ele em Tia Ondina. A facção ainda vive em pé de guerra com a polícia, mas a própria comunidade recusa a presença armada do Estado no morro. Cada vez mais, fica difícil qualquer ação da PM.
Dom trouxe uma lei implacável para os conflitos que acontecem entre quem mora no morro, nos chamados desenrolos. Isso deixa as pessoas satisfeitas com a sensação de que a justiça foi feita. Ele também tirou os milicianos de cima do pescoço dos moradores, que precisavam comprar tudo deles.
Orientada pelas meninas de Lourdes, prolonguei ao máximo a minha primeira vez com Otávio. Segundo elas, se eu me apressasse, logo me tornaria sem graça para ele e perderia o meu benfeitor. Consegui enrolar no acordo até os meus dezoito anos, o que não foi difícil, pois ele foi ficando completamente fascinado com o nosso envolvimento peculiar. Acredito que acabou se tornando um fetiche.
Lourdes não mentiu quando disse que Otávio é um bom amante, ele se esforça realmente para isso, como se o seu prazer dependesse completamente do meu. Sem nenhuma queixa a fazer, acabo sem conseguir fingir um orgasmo e, apesar de ter aprendido a gemer como ninguém, preciso realmente corresponder quando estamos na cama, porque, dificilmente sobra espaço para atuação.
Saí da escola com mais algumas medalhas. Consegui passar na faculdade de direito, e antes de me formar, o que vai acontecer em alguns meses, assumi o cargo de vereadora na prefeitura. A forte campanha que fiz no morro com a ajuda de Otávio ao lado de Lourdes, foi essencial para a minha vitória. Essa conquista trouxe um novo significado para a minha vida.
Durante a campanha no morro, algumas vezes avistei Dom de longe. As nossas trocas de olhares nunca são fáceis, eu sempre fantasio correr entre as pessoas e pular nos seus braços, mas falta tão pouco para alcançar o que quero. A beleza dele amadureceu, mas não saberia dizer em que época ele seria mais bonito.
Aos vinte e três anos, mudei fisicamente da mesma forma que Dom. Tenho traços mais maduros, com um corpo mais alongado, embora sinuoso. Sou uma jovem mulher que ainda colhe os frutos dos anos que passei sendo atleta. Mas, atualmente, a atividade física está riscada da minha rotina. Os meus cabelos estão maiores e ganharam mais volume.
Tudo tem dado certo para mim desde que Coalhada me atacou. Nesse momento da minha vida, sinto que estou pronta para viver a independência que tanto sonhei. Ando preparando o terreno para me desvincular de Otávio, o que não está fácil. O senador parece prever que estou prestes a encerrar o nosso acordo e tem se tornando alguém controlador, além de insuportavelmente obsessivo. Desconfio que não esteja pronto para aceitar o rompimento entre nós dois.
Tenho me mantido dentro da linha, fiel ao meu cliente. Ignoro muitas propostas que recebo dentro do nosso convívio social, algumas absurdamente generosas. Grande parte dos políticos parecem fascinados em passar a perna um no outro, e alguns dos que convivo se empenham em me tomar de Otávio, sem medir esforços ao me oferecer um mundo em vantagens. Acontece que eu não me deslumbro, porque riqueza não me interessa, sem contar que estou prestes a ser dona do meu nariz.
Somente dois homens podem me dar o que eu quero. Isso me faz pensar que talvez uma vida seja pouco para Dom realizar as fantasias que tenho com nós dois, só de imaginar, fico com a barriga agitada. Quanto a Otávio, ele já cumpriu com a sua função na minha vida, me deixou longe de onde fugi, e o considero muito por isso.
Graças ao meu vínculo com a câmara, que me garante uma boa quantia em vencimentos, posso dizer que sou capaz de andar com as minhas pernas. De certo modo, é o que tenho feito desde que saí de casa, porém amparada financeiramente pelo acordo com Otávio. De certo modo, não posso reclamar da vida, já que não me falta nada.
Meus próximos passos exigem cautela para Otávio se acostumar com a ideia de me desvincular dele. Ainda conto com a sua influência na política, sendo algo primordial para alcançar os meus projetos. A nossa relação vive o momento mais tenso, e estou colhendo os frutos da sua insegurança com brigas cada vez mais constantes.
Pensando sobre o dia em que irei embora, olho à minha volta tendo a certeza de que não sentirei falta dessa casa, nem do quarto que estou agora, por mais luxuoso que ele seja. Inesperadamente, a porta de madeira nobre se choca violentamente na parede, me tirando dos meus pensamentos. Otávio entra fumegante vindo em minha direção. Sentada sobre o divã, espalho pacientemente um hidratante feito com flor de cerejeira pelas pernas, ignorando a sua presença, sem dar palco para um novo ataque possessivo.
— Porque não atende a merda do telefone? — grita ao se deparar comigo.
Como é difícil não mandar ele à merda, detesto o tom de voz autoritário que usa comigo.
— Passei o dia fora e esqueci o telefone em casa — respondo com tranquilidade. — Boa noite para você também — digo dissimulada sem olhar para ele.
— Mentirosa... — rasteja a palavra pela língua e solto um longo suspiro.
— Grande novidade você pensar isso — afirmo sem me abalar e continuo ignorando ele. — Nunca ouviu dizer que mentira tem perna curta? Ou eu sou ótima em mentir ou você é péssimo em me desmascarar, já que nunca me pegou no flagra.
— Sonsa... você é uma grande sonsa, Dalena — acusa.
— Sonsa... mentirosa... continue, senador — provoco ainda mais. Ultimamente tenho usado esse recurso para ver se ele cansa de mim, o que é irônico, pois já alimentei o completo inverso: eu era uma perfeita gueixa, pronta para servir com um semblante sereno.
— Onde passou o dia, hein? — Tira o hidratante das minhas mãos para chamar minha atenção, o que não consegue, pois eu continuo concentrada nas minhas pernas. — Olha na minha cara, Dalena — exige com certo desespero na voz.
Levanto o meu rosto e encaro a sua revolta, cintila em seus olhos uma desconfiança real de que eu tenha passado o dia nos braços de outro. Eu me assusto quando também enxergo ele demonstrar uma visível necessidade de ser correspondido por mim. Percebo que os seus sentimentos não se tratam mais somente de um fetiche, Otávio nos vê de outra forma. Talvez por isso ande tão descontrolado, porque, definitivamente, sabe que para mim nunca passou de um acordo.
— Dalena... — diz numa súplica sutil, engolindo a própria raiva, sabendo que não vai me tirar do sério, e senta ao meu lado. — Você está muito diferente.
— Não. Você está diferente — corrijo, ainda com a sensação de que estamos vivendo coisas bem distantes um com o outro.
— Se estou, é culpa sua — acusa, se esquivando da responsabilidade do drama que ele mesmo cria.
— A culpa é minha por não te dar satisfação de cada vez que eu respiro? — Detesto quando ele joga toda a situação que criou em mim.
— Eu só queria que me atendesse quando eu ligar. Saí do congresso, que fica lá no meio do país, sem resolver o que precisava porque eu não tinha cabeça para mais nada por sua causa. — Otávio empurra as palavras em mim de um jeito penoso e se perde ao me ver dentro de uma chemise de cetim. — Você está linda, sabia...
Ele diz isso o tempo todo.
Sabendo no que essa discussão irá se tornar, assisto Otávio pousar a sua mão quente no interior da minha coxa e me acariciar, ainda sentado ao meu lado. Colocando a outra mão na minha nuca, leva a minha cabeça até junto da sua e espera por um beijo. Ao ver que não darei, encosta a sua boca na minha, iniciando por conta própria. Eu o acompanho sem resistência.
Ele beija muito bem.
Instantaneamente, eu me preparo para receber Otávio dentro de mim. Durante o tempo que estamos juntos, o senador domou o meu corpo para o atender feito um cachorrinho treinado. Eu me permito somente ser o seu brinquedo, porque ele nunca conquistou a minha mente ou o meu coração.
Seus dedos ficam mais ousados e avançam mais entre as minhas pernas, roçando sobre o tecido da calcinha, que em seguida Otávio afasta para o lado. Distancio mais os meus joelhos um do outro e sou penetrada por seu indicador. Ao notar que estou lubrificada, aumenta a intensidade do beijo, como se isso fosse uma droga que tivesse acabado de ativar um imediato estado de êxtase.
Eu já não lembro mais do porquê estávamos discutindo.
Tateando a minha intimidade, Otávio explora cada pedaço parecendo tocar na própria razão de existir. Nosso beijo não para, desafia o limite dos meus pulmões entre uma tomada de ar e outra sempre que abrimos um pequeno espaço para mover nossas cabeças.
Ao soltar meus lábios, sorri de um jeito embriagado. Deito minhas costas no divã, no que ele aproveita para deixar uma mão passear no meu corpo desabotoando a chemise, ao mesmo tempo que a outra desliza o dedo em vai e vem dentro de mim. Com os olhos do senador fixos em mim, inquieta, eu solto gemidos profundos apertando os meus olhos.
Quando finalmente expõe o meu corpo, pressiona um dos meus seios em sua palma e em seguida brinca, puxando levemente o mamilo. Notando que estou prestes a ter um orgasmo, desacelera os movimentos. Retirando o seu dedo de dentro de mim, coloca-o na minha boca e exploro com a minha língua o meu sabor em sua pele.
Otávio me puxa para dividirmos o meu gosto num beijo mais ardente. Pouso a mão sobre a sua calça social, pressionando o seu membro rijo o fazendo grunhir, e ele afrouxa a gravata. Eu ajoelho no divã, deixando a chemise deslizar pelos meus braços. O senador me assiste ao retirar toda a sua roupa, que espalha pelo chão.
Ao longo dos anos, o meu cliente tem ganhado mais fios grisalhos, isso o deixou mais charmoso, com um ar de homem mais maduro. O seu corpo magro e atlético não mudou em nada. Ombros largos, braços com músculos tonificados, a postura de alguém da realeza, com uma barriga não muito definida. Entre as pernas um exemplar do órgão masculino que não tenho muito a dizer. Admito se tratar de algo que não observo com clareza ou coisa do tipo, só vejo de relance, não me sinto confortável em olhar um homem da cintura para baixo.
— Venha... — manda com a voz urgente. — Hoje quero ser tratado como um rei — determina.
Desço do divã e me ajoelho no chão em frente a ele. Fecho os meus olhos, enquanto a minha língua brinca com os seus testículos, depois desliza pelo membro de Otávio. Umedeço toda a extensão até que abocanho tudo com a minha mão, segurando firme na base. Ao erguer o meu rosto, mantenho os meus olhos fixos nos dele.
Começo a mover minha cabeça para frente e para trás fazendo uma sucção delicada. Também dou atenção à glande, que noto de relance estar tão vermelha quanto um morango maduro. Como se sugasse uma bebida por um canudo, sinto que Otávio está perto de chegar ao clímax.
— Isso... isso... isso... — geme as palavras arfantes agarrado aos meus cabelos, ao mesmo tempo em que sugo, pressionando todo o seu membro na minha boca. — Espera... espera — pede quando está prestes a ejacular e puxa o ar para dentro da boca, como se sentisse uma ardência. — Devagar... — diz, no que obedeço.
Aparentemente, já sem conseguir se segurar, Otávio se ajoelha também e suga um dos meus seios da mesma forma que eu fazia a pouco. Penetra a minha vagina com o dedo médio, enquanto o polegar estimula o meu clitóris. Quando ele me agarra desse jeito, me possuindo em vários pontos do meu corpo, fico completamente fora de mim, subindo pelas paredes.
— Você não vai gozar agora... — diz em meu ouvido. Ele conhece todos os meus sinais.
Ao tirar o seu dedo de dentro de mim, faz uma meia volta ao meu redor. Agarra os meus seios por trás pressionando o seu corpo contra o meu e cheira a minha nuca, deixando a minha pele arrepiada. Segurando o meu maxilar, ele vira o meu rosto, levando a minha boca diretamente para a sua. Nossas línguas frenéticas se embolam na fronteira de nossas bocas.
Rebolo o meu quadril massageando sua rigidez entre as minhas nádegas, o convidando a me penetrar. Tudo em mim está ouriçado e clama por isso. Otávio acaricia o meu monte de vênus alternando com leves tapas, me punindo da melhor forma. Eu agarro a sua mão e a guio até a abertura entre as minhas pernas, onde juntamos os nossos dedos indo mais fundo.
Meus gemidos não param, preenchendo toda a mansão em que moramos juntos. Otávio sussurra diversas vezes com a voz rouca no meu ouvido "gostosa" até que me coloca de quatro, encaixando-se entre as minhas pernas e me penetra. Minha boca se abre ainda mais reverberando o prazer que eu sinto tão alto o quanto pode. Ele empurra a sua pelve contra a minha bunda apressando o ritmo, até que dobra sobre mim, buscando o meu clitóris para massageá-lo. Assim, embarcamos completamente em nosso ápice.
Os meus olhos se apertam e minha boca se abre, gritando loucamente. O senador se agarra firme em meu quadril, pressionando os seus dedos. Quando por fim, estoura o seu prazer dentro de mim, é como uma garrafa de champanhe. Foi rápido e satisfatório, sempre que ele chega de viagem é assim.
— Eu te amo, Dalena. Você vai casar comigo — suspira ao desabar suavemente sobre mim, enquanto ainda estou de quatro.
— Que porra é essa? — grito imediatamente ao sair bruscamente debaixo dele e ficar de pé. Duvidando dos meus próprios ouvidos, me pergunto se ouvi o que ouvi.
Merda!
Que merda!
— Tá louca? Quase arranca o meu pau! — Ele grita nervoso, massageando o pênis e me afasto com a glabela enrugada entre as minhas sobrancelhas, sem dar a menor importância se realmente o machuquei. — Falo que eu te amo e você surta? — questiona embravecido.
— Vai a merda com essa história de amor e casamento. — Visto a chemise apressada, depois saio em direção ao banheiro, enquanto ele me assiste boquiaberto. Está na cara que Otávio não esperava por isso. — Temos um acordo, senador! Um acordo — exclamo para lembrar a forma que estamos envolvidos.
— Qual é o seu problema? — Vem do quarto perguntando e invade o banheiro completamente consternado.
Jogo a chemise no chão sem dar importância a pergunta que Otávio me fez. Nua, entro no box, que provavelmente caberia um fiat mobi dentro, e aciono a ducha. A água jorra do teto num forte chuvisco, liberando um vapor da temperatura quente a sua volta. Molho a mão para testar se preciso deixá-la mais fria ou se está muito escaldante.
— Para de me ignorar, Dalena. — Entra atrás de mim, me deixando irritada. Detesto ser pressionada, e ultimamente é o que ele mais tem feito.
Que saco.
— Otávio, meu querido Otávio... — digo, me concentrando na água que cai, em uma tentativa de acalmar os meus nervos. — O nosso acordo é bem simples: eu faço sexo apenas com você e sou sutentada para isso.
— Que loucura é essa? Eu te tirei daquele cabaré! — cospe as palavras em tom de indignação.
— E quando eu saí de lá deixei de ser sua puta? — pergunto insolente e levo um tapa cheio na lateral do meu rosto. — Você está louco? — Devolvo imediatamente o tapa com toda a força que eu pude, apesar de saber que não teria o mesmo peso. — Eu que pergunto qual é o seu problema!! — berro sentindo as veias do meu pescoço saltarem.
Otávio me encara enfurecido e se afasta.
— Desculpa — diz com raiva de si por ter me batido ou de mim, eu não consigo identificar.
— Desculpa o caralho!! Você me bateu, bateu na minha cara!! — ralho fora de mim, segurando a lateral do meu rosto.
Saio pisando firme de dentro do box, me enrolo em um roupão e sigo decidida para o closet. Otávio não me segue. Eu me visto de um jeito descontrolado, enquanto já vou preparando rapidamente uma bolsa. Coloco roupas suficientes para uns dias e alguns itens de valor, para o caso de ser proibida de pegar o resto.
Otávio surge por trás de mim vindo do banheiro e se espanta ao se deparar comigo preparando uma bagagem para ir embora. Talvez ele ainda nem imagine que não pretendo voltar nunca mais. Não era da forma que eu queria romper, mas nem sempre é como planejo, às vezes só temos que agir rapidamente.
— Que merda é essa? — Puxa a bolsa das minhas mãos, totalmente fora de si.
— Devolve e me deixa sair daqui ou não respondo por mim. Não queira nem saber o que aconteceu com o único homem que me bateu — ameaço, relembrando as imagens de Coalhada morto com o peito ensanguentado em minha memória.
— Que isso... Não pode agir assim por causa de um momento de descontrole. Precisamos nos acalmar para conversar. Eu estou fora de mim, você ficou fora de si... — Otávio tenta argumentar.
— Exatamente, estou bem fora de mim, e para a sua segurança, sugiro que me devolva a bolsa — digo as palavras bem devagar, como se elas socassem a cara dele em câmera lenta.
— Por que disse aquilo? Você nunca foi minha puta, Dalena — insiste no assunto.
— Sério? Você pensa mesmo que sou tão burra só por causa da minha obediência? — pergunto com a voz falhando.
— Eu te tirei de lá — fala como se tivesse feito uma caridade da qual eu devesse a minha vida.
— Me tirou de lá quando eu estava pronta para abrir as minhas pernas para você e não porque me amava. Me tirou de lá para me colocar num lugar mais cômodo para me comer à vontade, não porque vivemos um romance. Se em algum momento achou que eu seria grata por me pagar para transar comigo, sinto muito, mas está terrivelmente enganado. Fechamos um serviço, não um caso de amor — esclareço.
— Eu te dou tudo, Dalena...
— Quem te dá tudo sou eu, Otávio. Nove anos da minha vida... Cinco deles servindo a minha boceta para você fazer o que quiser. O que gasta comigo não é nada em relação ao que dediquei — contraponho feliz por deixar isso bem claro.
— Como você passou todos esses anos pensando isso sobre mim? — questiona abismado, me deixando incrédula com o seu espanto. Não é possível que Otávio acredite mesmo que é o homem mais maravilhoso do mundo, um poço de bondade e altruísmo.
— O que achou que eu pensaria quando teve todos os relacionamentos que quis, sendo que eu nunca me incomodei com as suas inúmeras namoradas públicas, enquanto ficava escondida em um apartamento? — indago com ironia, perdendo o meu tempo para saciar a minha curiosidade, porque devo ter perdido algo e não estou entendendo.
— Nosso relacionamento é diferente, nenhuma delas está comigo agora. É você que está morando na minha casa — Otávio tenta se justificar, como se isso mudasse tudo. Talvez pense que o fato de eu ficar disponível vinte e quatro horas por dia para ele, transforme magicamente o nosso envolvimento em uma relação.
— Exatamente, estou morando na sua casa — pontuo, mostrando que não é um lugar que escolhemos como um casal. — Sou vereadora eleita há um ano, coincidentemente, o tempo que estou morando aqui. Isso não é interessante? No momento que comecei a ter uma fonte de renda que não fosse você, achou conveniente me colocar debaixo dos seus olhos e andar comigo publicamente.
— Uau! U-a-u... — diz de forma teatral.
— Não força, senador, não sou seus eleitores — aviso sem a menor paciência, não vou aceitar ele transformar isso em outra coisa bem debaixo dos meus olhos.
— Então todo esse tempo que dormimos juntos, que nos beijamos, que fodemos enlouquecidamente, nossas trocas de sorrisos, abraços, as nossas viagens, os presentes que te dei, a vida que eu te dei... tudo isso... tudo isso, Dalena... é apenas uma relação de negócios? — Todo o sangue de Otávio parece concentrado em sua cabeça. Que grande ironia, pois há pouco vi exatamente algo parecido, mas em outra parte do seu corpo. — Responde, Dalena... responde para mim. Diga olhando na minha cara que foi só isso. Que não sente nada.
— Foi e é só isso. Eu não sinto nada — minhas palavras saem secas e duras, embora completamente fluidas.
Eu não sinto nada por Otávio
— Ainda pouco você estava gemendo no meu pau... você estava chupando o meu pau... você estava gozando no meu pau. Tudo isso foi um grande teatro?... — Cobre a boca com a mão e alisa a sua barba, me encarando como quem surpreende um ladrão.
— Não, eu realmente gosto do seu pau — respondo sem dar muita importância.
— Você gosta do meu pau? — Ri de um jeito nervoso com incredulidade. — Você gosta... Aaahhh... Ela gosta do meu pau — alardeia com deboche, falando para uma plateia invisível.
Otávio passa uma mão em seus cabelos e coloca a outra mão na cintura. Anda nu de um lado para o outro do closet a passos largos, como se estivesse se preparando para uma luta verbal. Suas expressões mudam constantemente. Ele ri e fica sério, enquanto conversa sozinho, sem que eu consiga ouvir o que diz a si mesmo, gesticulando vigorosamente, parecendo modular o ar em sua defesa.
Quando parece ter terminado o seu debate individual, seus olhos faíscam com intensidade, mas também mostram confusão e me fitam. Comprimo a boca num claro sinal de impaciência.
— Eu digo que te amo, você surta e ainda quer sair daqui? — pergunta após um tempo, emoldurando as palavras em pura indignação.
— É... eu quero sair daqui — confirmo sem me esforçar para disfarçar a expressão de tédio.
— O meu pau não te serve mais, o meu dinheiro não te serve mais?... — deixa as palavras pairando no ar e me encara.
Respiro fundo e viro o meu rosto, desviando o olhar.
— Acreditei que tinha muita sinceridade entre nós dois, porque você sempre agiu sem disfarçar o que realmente nós sempre tivemos. Agora, estou vendo que você quer moldar a situação de acordo com a sua vontade. De repente, eu não sou mais a sua puta, sou a sua noiva, a mulher que você ama. Nossa, Otávio... caramba. Eu nunca reclamei de nada e segui tudo à risca — desabafo.
— É... eu estou vendo que você seguiu tudo à risca. — Seus olhos estão tomados por espanto. — Poxa, eu disse que te amava. — Otávio agarra a própria cabeça e me dá as costas. — Eu disse que quero casar você. Por acaso quer que eu coloque Lourdes na nossa frente e pergunte quanto isso vai me custar? Nem parece que escutou o que eu disse. Tenho sentimentos, sabia?
— Ah, claro que eu te ouvi quando me disse exatamente: Vou me casar com você. Não considerou nem mesmo a minha opinião, não se deu ao trabalho de me conquistar... — avalio extremamente lúcida. — Eu também tenho sentimentos, sabia? — ironizo.
— Tem noção do quanto eu sou rico e de quanto um filho comigo vai te dar? — faz a pergunta do nada, sem se tocar do quanto soa exibicionista e de como eu não ligo a mínima para a merda do dinheiro dele.
Idiota!
— Tem noção do quanto vale a minha liberdade e de que eu jamais vou querer um filho de alguém que eu não amo? — rebato com tranquilidade.
— Tá bom, Dalena. Okay. Não joga mais isso na minha cara, está bem claro que você não me ama. Acontece que eu te amo e eu quero que você fique comigo. Para isso acontecer vou fazer o que for possível, vou te dar o que você quiser — sentencia com uma certa cegueira. — Fala para mim o que você quer? Um carro novo, joias, imóveis...
— Distância... eu quero distância.
— Você me odeia, Dalena? — quer saber com a voz sumindo.
— Não, Otávio, eu não te odeio, só que no momento, eu quero respirar longe de você. Não pensava nisso para agora, com uma ruptura tão dramática. Infelizmente, dada as circunstâncias, quero acordar onde eu não tenha que olhar na sua cara e sorrir. Pode ter certeza, que esse tapa jamais será esquecido — explico, deixando os meus ânimos se acalmarem.
— Você me bateu também. — Aponta o dedo para mim e sacode.
— Com certeza, o tapa que recebeu doeu bem menos do que deveria — enfatizo, querendo ir embora mais do que nunca.
— O que quer para ficarmos quites? Quer chutar as minhas bolas? Chuta, vem aqui e chuta. — Abre os braços e oferece os testículos numa cena patética.
— Se eu tivesse lembrado na hora, com certeza teria sido uma boa forma de devolver, mas agora, meu sangue esfriou — lamento.
— Para onde vai uma hora dessas? Aqui é a sua casa.
— Com certeza, vou encontrar um lugar e, com certeza, aqui não é a minha casa, como disse há pouco.
— Claro que é, eu me expressei mal. — Tenta corrigir a própria fala. — Nunca deixei isso claro e foi um erro absurdo. Essa é a nossa casa, o nosso cantinho. — Parece até piada ele se referir a uma mansão como um cantinho.
— Eu nem conheço a sua família, Otávio. Para com isso, seja honesto comigo — peço, sabendo ser algo completamente impossível.
— Como assim, Dalena? Todos sabem quem você é, só não surgiu uma oportunidade. Com o nosso casamento, você vai conviver mais com todos. Minha família será a sua família também — idealiza como se tentasse convencer uma criança com uma promessa de pura fantasia.
— Tem razão, todos sabem sim. Inclusive, sua mãe já esteve aqui e deixou bem claro que eu não me deslumbrasse, porque ser vereadora e morar na SUA casa, não muda quem eu sou: uma puta favelada.
— Ela disse isso?... Desculpa, Dalena, desculpa. — Ele vem em minha direção para me abraçar. — Minha mãe terá que se redimir com você.
— Não me doeu, Otávio. Ela não é a minha sogra, não é a avó de um filho meu, mas surge a questão: e se fosse? Acha mesmo que existem condições para eu assumir esse lugar na sua vida? E se isso acontecer, o quanto vou me expor a passar por esse tipo de coisa? — questiono, realmente considerando a ideia absurda de me casar com ele por dinheiro.
— Dorme aqui, vai... Amanhã conversamos com a cabeça fria. Nós só estamos trocando ofensas. — Tenta apaziguar.
— Estamos trocando verdades — corrijo.
— Eu nunca te vi assim — diz, inconsolável.
— Mas sempre me tratou assim, deixando claro o meu lugar, e tudo bem. Nunca sonhei com outra coisa, eu sempre soube qual era a minha função, função que agora não quero mais.
— Você conheceu outro homem? — desconfia em mais um de seus surtos delirantes. — Alguém da câmara? São tantos te cercando...
— O meu homem se chama: independência. Estou com ele desde que fugi de casa. Esse sempre foi o meu caso de amor secreto, você nunca teve chances. E sabe por que nunca teve chances? Por pensar que era o meu dono. — Tento desenhar. — Durma bem, Otávio. Com licença...
Saio sem olhar para trás e percorro os espaços amplos e iluminados da mansão, com sua arquitetura moderna e imponente. Os móveis luxuosos, as obras de arte nas paredes e os lustres de cristal me parecem agora distantes, como se pertencessem a uma vida que já não me interessa mais.
Chego à garagem, onde os carros reluzentes parecem competir em beleza e potência. É aqui que nosso caminho juntos termina, mas não sinto medo do futuro incerto que se abre diante de mim. Pelo contrário, sinto uma sensação de liberdade, de que posso ir para onde quiser e ser quem eu quiser ser.
Aciono o botão da trava do meu carro, um modelo Captur na cor perolada com o teto preto. Ao destrancar, entro no veículo. Depois, dirijo até a entrada do condomínio de casas de luxo, sentindo a aspereza do couro do volante e a frieza do ar condicionado, mas ao mesmo tempo, firme do que estou fazendo.
Indo embora desse lugar, penso em uma grande ironia: enquanto no morro eu era bem tratada por ter um envolvimento clandestino com um político importante, aqui, as pessoas me entortam o nariz pelo mesmo motivo.
|NOTA DA AUTORA|
Mais um capítulo publicado com sucesso!
Como perceberam, houve um salto no tempo para o momento em que tudo mudou novamente na vida de Dalena. Agora me contem o que acharam, quero saber tudo.
Sexta tem mais capítulos de Te Espero Nos Meus Sonhos . Até breve ✿◕‿◕✿
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