Érica Sousa

Era 4:30 da tarde. Daniela, Érica e Daniel haviam ido até a escola.O trânsito estava mais calmo naquela hora e eles voltavam para casa.

Érica preferiu escutar uma música de rock no caminho até a escola.Ela havia ignorado sua mãe no carro, pois Daniela não parava de falar. Sua mãe puxou conversa com Daniel, falaram do novo ano, as expectativas deles e ela ainda disse que ficava feliz de eles irem estudar juntos.

A garota começava a entender o que sua mãe queria. As vizinhas, Daniela e Ruth, eram amigas e seus filhos mal falavam um com o outro.Elas queriam uma aproximação deles. Como Érica não havia percebido isso antes?

Ela só precisava ter raciocinado um pouco mais e iria perceber que sua mãe tinha suas intenções com a ideia de irem até a escola com o vizinho. Quando enfim percebeu teve que balançar a cabeça e se culpar por ter sido desatenta.

Érica olhava pela janela enquanto pensava. A escola municipal Henrique Alves era grande, dois andares,o muro era pintado de branco e a parede da frente era pintada de cor creme claro.

No muro tinha o nome da escola em letras maiúsculas. Érica não pôde deixar de sorrir ao olhar para a escola e imaginou como eram as salas de aula. Tinha do 5° ao 3° ano do ensino médio. Com seus pensamentos longe ela lembrou do que Daniel havia dito. A escola tinha armários.

A jovem estava ansiosa para a volta as aulas. Seus antigos "amigos" não iam mais ser falsos com ela, não ia ter que vê-los todos os dias e estava pronta para a nova fase da sua vida.

Na volta para casa ela não estava mais escutando música. Havia perdido o interesse de ignorar sua mãe, mas não queria admitir isso para si mesma. Daniela não puxou mais nenhum assunto com o vizinho e permaneceu com o olhar atento ao trânsito.

Um suspiro da garota fez Daniel olhar para ela e finalmente ele rompeu o silêncio.

- As aulas começam dia 3-sorriu um pouco.

- Está preparada filha?-sua mãe perguntou sorrindo.

- Se estou feliz que minhas férias vão acabar?-perguntou irônica-Na verdade não. Eu queria mais um mês de férias.

- Você sabe que não foi isso que te perguntei-ela suspirou e pareceu um pouco impaciente.

- Ah mãe-a garota se virou para olhar para ela- Relaxa aí vai, porque eu estou ansiosíssima para a volta as aulas.

Érica não havia sido irônica, mas ao ver sua mãe entortar a boca para o lado percebeu que ela entendeu sua resposta como ironia.

- A senhora precisa relaxar mais-ela disse e bateu no ombro da mãe- Eu vou ficar bem na escola e até já tenho um novo amigo, não é Dani?

Daniel observava a conversa delas e ao ouvi-la dizendo isso teve que se virar para a garota que estava ao seu lado. Érica tinha um sorriso maroto nos lábios e olhava nos olhos dele.Ele pareceu ter percebido sua ironia.

- Se precisar de ajuda com alguma coisa relacionada a escola-ele frisou a última palavra- Eu estou aqui.

Ela arqueou uma sobrancelha.Essa não era a resposta que a garota estava esperando. Daniel cruzou os braços e a encarou sério. Ela pensou que ele podia estar jogando.

Os dois sabiam que não tinham muitas chances de serem amigos. Eram bem o oposto um do outro.Ela pensou que ele havia percebido as intenções de sua mãe e poderia estar jogando com ela. Daniel parecia saber fingir um pouco quando isso lhe convia.

Ela começou a pensar que sua mãe poderia acreditar que realmente eles estavam se esforçando para se darem bem. Isso não a preocupava, porque ela não queria agradar sua mãe.

Daniela estacionou o carro debaixo de uma árvore e eles saíram.Ela agradeceu a ele e disse que eles deviam sair mais vezes.

Érica revirou os olhos observando eles e entrou no apartamento sem se despedir de Daniel. Queria poder estar sozinha em casa novamente,mas não teria como ter sua liberdade no momento.

Seu pai havia ido para o trabalho novo. Henrique era porteiro de um grande shopping que ficava um pouco perto de onde moravam e Daniela era uma manicure que trabalhava para si mesma.

Érica se jogou em sua cama e seu celular tocou. Ela o pegou e percebeu que havia uma notificação nova no  facebook.Era de uma antiga amiga sua que tinha muita inveja dela.

Na notificação dizia que essa garota estava em um relacionamento sério.
Érica suspirou e se lembrou do seu lema de aproveitar a vida e de sua nova fase. Começou a desfazer as amizades de pessoas falsas do seu facebook.

Ela só queria não ser mais enganada por falsidades e a cada amizade desfeita a garota só fazia suspirar. Estava na hora de mudar.

Carla Oliveira

18:30 da noite

A noite havia se iniciado. A conversa com seu pai ainda rondava a cabeça dela. Uma pergunta que ele fez para ela a incomodou bastante.

Victor perguntou se sua filha estava bem com as novas mudanças na casa.
Carla havia mentido e respondeu que queria ver a felicidade do pai, mas admitiu que sentia falta da sua família de verdade.

Seu pai disse que estava pensando em conversar com sua namorada para matricular Natália na mesma escola que Carla estudava. Essa foi outra surpresa desagradável para a garota.

Depois da conversa com sua filha Victor pareceu mais aliviado. Ela não aguentava mais olhar para cara de Natália e resolveu ir até a casa de Daniel.

Havia mandado mensagem para ele, mas não teve retorno.O garoto nem se quer respondeu, mas ela ia para a rampa de qualquer jeito.

Se arrumou e pegou seu skate que ficava em baixo da cama. Ao passar pela sala percebeu Natália mexendo no celular. Passou por ela rápido, mas não deixou de perceber que sua nova irmã olhou para seu skate.

Carla não entendeu o motivo exato do espanto dela ao ver o skate.Deu de ombros, abriu a porta e saiu. Ela precisava que seu amigo tivesse um bom motivo para não ter respondido sua mensagem.

Ao chegar na casa dele subiu as escadas do apartamento e bateu na porta.

- Quem é?-ouviu a voz de Daniel.

- Abre logo aí-bateu outra vez impaciente.

Ele abriu a porta e sorriu para ela.

- Por que não avisou que vinha?-deu espaço pra ela passar.

- Prefiro vim de surpresa- se sentou no sofá- Cadê sua mãe e sua avó?

- Elas foram no supermercado-sentou e pegou o controle da tv.

- Que sorte que você tem de morar somente com sua mãe e sua avó-olhou para ele.

- Está falando isso por conta das novas moradoras agradáveis da sua casa?- perguntou brincando e colocou em um canal de filme.

- Infelizmente sim-suspirou- Elas não tem nada de agradáveis, Daniel.O que você fez hoje? Sumiu o dia todo.

- Nos vimos de manhã e você não lembra mais?-perguntou com voz de divertimento- Eu não sumi não.

- E minha mensagem?-pegou no rosto dele o fazendo olhar para ela- Ignorou de propósito?

- Não tive tempo hoje-respondeu sério.

Ele parecia cansado e ela percebeu.

- O que aconteceu hein?-colocou o braço no ombro dele.

- Sabe a minha vizinha? A Érica?-ela concordou com a cabeça- Ela...vai estudar com a gente e eu fui até a escola com a Érica e a mãe dela.

Carla arqueou uma sobrancelha e ficou confusa. Sabia muito bem quem era a vizinha dele e pensava que eles nunca seriam amigos.

- Como assim, cara?-sorriu e olhou para a tv.

- É uma longa história-balançou a cabeça- Depois te conto.

Ela começou a observar o apartamento e disse para ele que aquele lugar era pequeno.

- Aqui deve ser muito chato-cruzou os braços- O que é que você faz para se divertir hein?

- Já estou acostumado-deu de ombros e continuou olhando para a tv- Ah e eu vi sua mensagem, mas não tive como responder. Não vou para rampa com vocês.

- Sério?-fez uma voz de choro-Mas por que?

- Vou grafitar-respondeu animado- Preciso sair essa noite.

- É mesmo?-sorriu-E a tia Ruth já sabe disso?

- Ah não-colocou as mãos no rosto-A minha mãe.

- O que vai dizer para ela?-pegou seu skate e colocou o pé em cima-Vai contar a verdade?

- Minha mãe não gosta dessa arte do grafite-disse nervoso- Não tinha pensado nisso.

- Como você é lento-empurrou ele e começou a rir- Eu posso te ajudar.

Daniel a empurrou de volta, ela pegou o controle da tv e mudou de canal.
Ele reclamou e ela o mostrou o dedo do meio.

- Eu estava assistindo, Carla-disse impaciente.

- Não está mais-deu língua para ele- Deixa eu te ajudar a enganar a sua mãe.

- Sabe que eu odeio mentiras-disse sério- Nada de mentir, Carlinha.

- Carlinha é?-o encarou- Meu nome é Carla. Não tem nada de inha. Deixa eu te ajudar? É muito fácil e a gente só precisa inventar algo para tia Ruth.

- Eu odeio mentir ok?-suspirou-Sem chances.

- As coisas são tão simples, Daniel-se levantou e subiu no skate- Você só precisa parar de ser bom, comportado e aprender a quebrar as regras.

Ela abriu os braços sorrindo, quase se desequilibrou e se segurou nele.
Eles olharam um para o outro. Aquela aproximação havia sido sem intenção nenhuma, mas estavam tão perto que  ela podia sentir um pouco do cheiro do perfume dele.

- Deixa?-ela perguntou sussurrando depois de um tempo- Pode confiar em mim-se afastou dele rapidamente.

Daniel piscou os olhos umas duas vezes, sorriu e pareceu não estar prestando atenção ao que Carla disse.

- C-claro-respondeu com a voz um pouco rouca- Aceito sua ajuda.

Carla estranhou o jeito estranho dele, mas não o questionou. Continuaram sentados no sofá, quietos e não trocaram mais nenhuma palavra.

Depois de um tempo Ruth e a avó dele chegaram e a garota disse para ela que eles precisariam sair, pois iam visitar um amigo.

Ela usou seu jeito único de mentiras para convencer Ruth e fazer ela acreditar. Ele agradeceu a ajuda e ela piscou o olho para ele.

Eles foram para o quarto dele e Daniel começou a procurar algumas coisas. Vestiu um casaco, pegou sua mochila, colocou um spray dentro e pegou seu skate. Saíram da casa dele e se despediram.

- Na próxima vou grafitar com você-
disse e colocou uma mecha de cabelo de trás da orelha.

- Eu não tenho dúvidas disso-sorriu e abraçou ela.

Eles seguiram caminhos opostos. A garota ainda estava confusa pelo que havia acontecido a pouco tempo. Eles estavam tão próximos que por um momento pensou que fossem acabar se beijando.

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