※ Capítulo 6 ※
Na manhã seguinte Mayuri se levantou cedo como de costume. Desceu as escadas e se dirigiu até a sala de refeições, surpreendendo-se com a ausência de sua tenente.
— Nemu — chamou, verificando se ela estava por perto.
Sem obter resposta Mayuri foi procurá-la na cozinha, constatando que não havia ninguém la. Estava tudo limpo e organizado, mas não havia o menor sinal de Nemu e muito menos do café da manhã.
— Não acredito que ela perdeu a hora. — Pensou.
Colocou a chaleira no fogo para preparar o chá e pegou alguns mantimentos prontos no armário. Biscoitos de arroz e barras de proteína deviam servir, senão chegariam atrasados.
Nemu gostava de comer arroz, peixe e soja fermentada pela manhã, por isso sempre acordava mais cedo e deixava tudo pronto, e Mayuri, naturalmente, comia qualquer coisa que ela preparasse, não porque não soubesse cozinhar, mas simplesmente por apreciar a praticidade daquele arranjo.
Com o chá pronto e a mesa posta, até cogitou começar a comer, mas uma pontada de curiosidade — obviamente não seria preocupação — o fez subir as escadas a procura de sua subordinada.
Bateu na porta do quarto de Nemu, e uma veia de irritação surgiu em sua testa ao não obter resposta. Entrou sem mais delongas, e para sua surpresa, o quarto estava completamente arrumado e não havia ninguém ali.
Mayuri ficou parado encarando o espaço vazio por um momento. Pensou em ir verificar o banheiro, mas sua intuição dizia que seria pura perda de tempo.
Abriu o guarda roupa e constatou que faltavam duas mudas de uniforme e algumas outras peças. Olhou na penteadeira, a escova de cabelos não estava lá, mas havia um bilhete colado no espelho: "O Comandante me convocou para uma missão de última hora, já era tarde e não quis acordá-lo. Não sei os detalhes, mas espero retornar em breve."
Mayuri deixou um buraco na parede ao lado da penteadeira após socá-la uma única vez, antes de racionalizar o conteúdo do bilhete.
Estava furioso com a atitude de Nemu, que aparentemente havia saído sem consultá-lo, acatando as ordens de outrem. Ele pretendia trazê-la de volta imediatamente, e estava disposto a despedaçar qualquer um que entrasse em seu caminho, mas havia questões sobre as quais deveria refletir primeiro.
— Não faço a menor ideia de onde ela está. — Pensou. — Mas por que Kyōraku lhe daria ordens diretas? Por que não convocar alguém de sua própria divisão? E acima de tudo, por que convocar justamente Nemu?
Mayuri formulava milhares de perguntas em sua mente e sua irritação aumentava cada vez mais. Ele era um cientista e buscava respostas por natureza, então rapidamente se arrumou e partiu rumo a 1ª divisão do Gotei 13. Não havia tempo para o café da manhã.
Lá chegando foi recebido por Ise Nanao, tenente da 1ª divisão.
— Como posso ajudá-lo, Kurotsuchi Taichou? — perguntou a mulher que segurava uma prancheta nas mãos e verificava alguns títulos de livros numa enorme estante que havia atrás de sua mesa.
— Preciso falar com o comandante — Mayuri respondeu com a voz artificialmente controlada.
— Ele não está disponível no momento — pronunciou-se sem encará-lo, ainda focada em sua tarefa.
— Eu sinto a reiatsu dele daqui, então por que você não o chama na sala ao lado antes que eu perca a minha paciência? — declarou ligeiramente irritado, estreitando os olhos amarelos numa estreita fenda.
— Eu não disse que ele não estava, disse que não está disponível. — Respondeu Nanao em alto e bom som, deixando a prancheta de lado e encarando-o ferozmente por trás dos óculos ovais. — O comandante do Gotei 13 tem mais o que fazer, sabia?
Aquela era a gota d'água, Mayuri segurou o cabo da zanpakutō, e estava determinado a passar por aquela porta, pouco importando se precisaria fatia-la primeiro.
— Que confusão é essa? — Uma voz grave e tranquila inundou o ambiente. — Kurotsuchi Taichou, deseja me ver? Por que não me chamou, Nanao-Chan?
— Eu o informei que estava ocupado — disse Nanao, tendo recuperado a compostura.
— Não se preocupe Nanao-Chan, eu posso lidar com isso — respondeu Shunsui Kyōraku. — Vamos até o meu escritório, Kurotsuchi Taichou.
Mayuri passou por Nanao fuzilando-a e ela devolveu o olhar de forma ameaçadora.
— Ela provavelmente deve saber de algo para estar tentando evitar que eu converse com o bêbado — Pensou Mayuri.
Entraram no escritório que mais parecia com uma sala de estar. Sentaram-se no tatame com uma mesa baixa separando-os.
— O que deseja, Kurotsuchi-Taichou? —Kyōraku questionou, enquanto servia uma dose de saquê para si e outra para Mayuri.
— Não vamos perder tempo com rodeios, sabe muito bem qual é o motivo da minha visita.
— Hum... — Tomou a dose. — Você terá de ser mais específico do que isso.
— Quero saber para onde enviou minha subordinada!
— Ah, isso. — Suspirou, servindo outra dose para si. — É confidencial.
— Confidencial?! — esbravejou Mayuri. — Que piada de mau gosto, devo lembrá-lo que sou o capitão dela?
— Ah sim, eu havia me esquecido que aquela jovem é sua tenente. — Mesmo usando um tapa-olho, a expressão de deboche em Kyōraku era nítida. — Mas eu devo lembrá-lo que como capitão da 12ª divisão você ainda é subordinado à mim?
— Eu tenho plena consciência da hierarquia do Gotei 13, mas o fato de ser o comandante não lhe dá o direito de passar por cima da minha autoridade, dando "ordens secretas" a minha subordinada no meio da noite, sem ao menos consultar-me sobre o assunto!
— Na verdade, uma das prerrogativas de ser o comandante é que eu tenho exatamente esse direito. — Tomou a segunda dose. — Que fique claro que Nemu não estava em posição de recusar as minhas ordens da mesma forma que você também não está.
Mayuri estava a ponto de destruir tudo com sua zanpakutō, mas sabia que o que Kyōraku estava dizendo era um fato, embora fosse revoltante ouvir isso de alguém que bebia durante o expediente. Ele não estava em posição de fazer exigências, mas também não desistiria.
— Eu entendo o que quer dizer, Comandante. — Suspirou na tentativa de se recompor. — Mas Nemu não é como os outros tenentes...
— Eu estou a par das circunstâncias que envolvem o nascimento de Nemu, Kurotsuchi-San. — Kyōraku o interrompeu. — No entanto, devo adverti-lo que embora o falecido Yamamoto-Sama tenha tolerado seu comportamento em relação a ela, eu não irei agir da mesma forma. Ela é uma Shinigami, independentemente da forma que foi concebida, e será tratada da mesma maneira que qualquer outra pessoa de mesma patente.
— E isso incluí desobedecer a hierarquia interna de nossa divisão?
— Não seja dramático, Kurotsuchi-San. — Sorriu sem mostrar os dentes. — Pense nisso como um trabalho freelancer, mas não se esqueça que Nemu é livre para mudar de divisão, se assim desejar.
Mayuri arregalou os olhos, estava sendo ameaçado? Por que o comandante diria tal coisa? Nemu mudar de divisão? Era absurdo sequer cogitar tal possibilidade. Estava irritado e começando a sentir um cheiro de conspiração pelo ar.
Aparentemente o comandante e sua tenente estavam tentando tirá-lo do sério, embora não soubesse exatamente quais eram suas reais intenções, precisava ser cauteloso.
— Por que está fazendo isso agora? — questionou olhando nos olhos do comandante. — Está tentando imitar seu querido antecessor?
— Não confunda a minha paciência com fraqueza, Kurotsuchi-San. — Encarou-o seriamente. — O velho Yama tolerava sua presença e personalidade odiosa por razões óbvias, mas eu não tenho tendências a jogar os problemas pra debaixo do tapete.
— Mas também não está disposto a esclarecer as coisas — rebateu, assumindo uma postura desafiadora. — Acha que é diferente dele?
— As coisas estão cristalinas. — Serviu uma terceira dose para si. — E sim, sou completamente diferente dele, principalmente em relação a esse assunto.
— E o que espera de mim? — Tomou a dose de saquê que Kyōraku havia servido no início da conversa. — Submissão?
— Soluções criativas sempre foram o seu forte. — Riu sem humor. — Certamente arranjará uma forma de se ocupar.
Não havia mais nada a ser dito. Após algumas formalidades, Mayuri retirou-se da 1ª divisão a passos duros, decidido a descobrir o paradeiro de Nemu e o significado de todo aquele disparate.
Nemu levantou cedo, estava dividindo o quarto com uma mocinha que aparentava não ter mais que quinze anos de idade e chamava-se Ururu.
Urahara havia feito as apresentações rapidamente na noite anterior, e tinha sido estabelecido que Nemu ajudaria Ururu com os deveres na loja enquanto não houvesse nenhum sinal de hollow.
Por volta de cinco horas da manhã, Nemu era a única acordada e achou melhor esperar em silêncio até que alguém levantasse e ela fosse informada sobre as regras da casa, cozinha e em que tarefas poderia ser útil.
Sentou-se na sala, e poucos minutos se passaram quando, de repente, um gato preto entrou pela janela e se aproximou dela.
— Nossa, que madrugada cansativa, acho que vou dormir, mas antes eu gostaria de um pouco de leite, você pode pegar para mim? — disse o gato encarando Nemu.
— Você fala — Nemu comentou com sua usual cara de paisagem.
— Que fêmea esperta você é. — Pulou na mesa de centro. — Mas devo confessar que essa foi de longe a reação mais sem graça que já recebi!
— Eu sinto muito — desculpou-se sem expressar qualquer emoção. — O leite está na geladeira?
— Sim, e aquela é a minha tigela. — Apontou a pata para uma vasilha roxa perto da janela. — Seria ótimo se você a lavasse antes.
— Entendido. — Levantando-se imediatamente, lavou a tigela na pia da cozinha e despejou o pouco leite que havia na caixa. — Acabou, mas tinha o suficiente para uma porção — comentou enquanto colocava a tigela cheia em frente ao gato.
— Obrigada! — O felino agradeceu.
Nemu sentou-se próxima ao gato enquanto este tomava o leite que ela havia servido.
— Delicioso! — disse o gato. — Aquela era a última caixa, você se importaria de ir comprar mais no mercado?
— Não me importo, mas vou precisar de instruções.
— Ah é verdade, você não tem muita experiência no mundo humano. Já se adaptou a este Gigai?
— Foi um pouco desconfortável nas primeiras horas, depois me adaptei bem, mas as roupas são muito estranhas...
Nemu usava uma camiseta preta e uma calça de moletom azul clara, um visual muito diferente do uniforme shinigami com o qual estava acostumada.
— Logo você se acostuma — disse o gato pulando da mesa. — Vamos ao mercado, vou lhe ensinar e você poderá ir sozinha nas próximas vezes.
Dito isso, o gato transformou-se em uma mulher de pele morena, cabelos cor púrpura e olhos amarelos. Após a transformação ela se ausentou por alguns minutos e voltou vestida.
— Ah eu odeio ter que usar roupas! Mas você não poderia ir ao mercado acompanhada de um gato falante e muito menos de uma mulher nua, não?
— Acredito que não — disse Nemu. — É muito interessante essa sua habilidade.
— Garota você é realmente contida! — Riu com gosto. — Mas sim, é uma habilidade muito útil.
— Você é Shihōin Yoruichi, não é? Ex capitã da 2ª divisão?
— Culpada — Yoruichi respondeu com ar brincalhão.
— Mayuri-Sama tem fichas de todos os shinigamis mais poderosos, eu reconheci o seu rosto dos arquivos...
— É bem a cara do Kurotsuchi ter um arquivo assim. — Abriu a porta da sala. — Pronta?
— Sim — respondeu Nemu, seguindo Yoruichi prontamente.
As duas mulheres caminharam até o mercado 24h que havia no bairro. Yoruichi explicava de forma simples como funcionavam as coisas no mundo humano, o dinheiro, as regras ao atravessar a rua e como se manter longe de problemas. Nemu assimilava tudo rapidamente. Além do leite compraram também lámen instantâneo, biscoitos e algumas garrafas de saquê.
Quando voltaram para a loja, acomodaram as compras na cozinha. Todos já haviam se levantado, então Yoruichi foi dormir no quarto de Urahara e Nemu aproveitou a oportunidade para conversar com ele sobre seus deveres e detalhes da missão.
Nemu era especialista em obter e armazenar informação. No pouco tempo que chegou analisou tudo muito rapidamente e reuniu em sua mente todas as informações que julgava serem importantes.
Na loja viviam: Urahara Kisuke, dono da Urahara Shop, cientista, ex capitão da 12ª divisão e fundador do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento; Shihouin Yoruichi, 22ª Líder do Clã Shihōin , ex capitã da 2ª divisão, ex comandante da Onmitsukidō, do Corpo de Correções e do Corpo de Milícia de Execução; Tsukabishi Tessai, ex capitão do corpo de Kidō, além de dois jovens subordinados de Urahara chamados Jinta Hanakari e Ururu Tsumugiya, cujos poderes não estavam muito claros para Nemu, mas sabia que não podia subestimá-los.
— Conseguiu descansar, Nemu-Chan? — perguntou Urahara, após tomarem o café da manhã preparado por Ururu.
— Sim, tive um bom repouso.
— Se precisar de ajuda com a aplicação do soro, posso auxiliá-la esta noite.
— Como sabe sobre isso? — perguntou sem esconder sua surpresa.
— Acredito que graças ao bom e velho telefone sem fio — disse Urahara em tom descontraído. — Ise Nanao se viu obrigada a dar maiores detalhes ao comandante a fim de convencê-lo, ele por sua vez fez o mesmo comigo, e agora não precisamos ter segredos já que todos sabemos o motivo da sua vinda a Karakura.
Nemu precisou de alguns segundos para processar todas aquelas informações. Afinal de contas, o que era aquele desconforto em seu peito?
— Sinto muito pelo transtorno que causei a todos.
— Não se preocupe Nemu-Chan, você será útil para mim também, pode me ajudar com o treinamento de Jinta e Ururu, faremos o controle de hollows, caso sobre algum para nós, já que o filho do Kurosaki-Kun é um aprendiz de shinigami que anda muitíssimo ativo por essas bandas, e eu lhe ajudarei no que puder!
—Muito obrigada, Urahara-Sama — agradeceu, fazendo uma reverência.
— Não precisa desse Sama, já lhe disse — Fez uma pausa. — Eu conheço Kurotsuchi Mayuri há muito tempo, então imagino que as coisas não sejam muito fáceis para você. — Sorriu amigavelmente. — Tenho certeza que ao final do tratamento você saberá o que fazer, afinal de contas você tem muitos apoiadores.
Nemu se sentia segura naquele lugar, era tudo muito diferente, mas bastante promissor. As pessoas que ali viviam eram extremamente inteligentes e fortes, só teria a aprender com elas e ajudar no que fosse possível.
Mas, por outro lado, ela sabia que Mayuri ficaria furioso se soubesse onde ela está, e conhecendo-o tão bem, não demoraria muito para que ele descobrisse o seu paradeiro. Ela só torcia para que houvesse tempo o suficiente para recuperar suas memórias e enfrentar toda aquela situação de frente.
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