Capítulo 25
"O circo Arakluz tem o prazer de anunciar que o especial da semana das crianças contará com todas as apresentações já conhecidas por nós e uma nova atração principal, Anny Maia, a melhor aluna de química da Universidade Federal de Kennet em 2010 e agora – sendo considerada a primeira nesse ramo – circense química. "
Deixei o jornal de lado e balancei a cabeça, a mulher mal tinha chegado e já era chamada de atração principal pelos jornais. E ainda tinha a admiração de Alex.
— Você nunca lê jornais, por que tem isso? — Perguntei a Alex na segunda, segundo dia das apresentações da semana das crianças. Tínhamos chegado mais cedo para ajudar na organização da noite, já que na noite anterior só tivemos uma apresentação simples de estreia, a daquele dia necessitaria de mais atenção. As semanas tinham passado rápido e todos vínhamos ao circo para ensaios e revisões da programação – que havia sido passada na semana anterior.
— Quando passei pela banca vi o nome do nosso circo na capa, quis ver a reportagem completa. — Justificou dando de ombros e tirou a blusa.
— Sei... — Respondi dando alguns passos para sair do trailer e deixá-lo se trocar, porém Alex segurou em meu braço e me puxou para um abraço.
— Acho que isso é mais ciúmes por causa do nome da Anny, não? — Caçoou me embalando com seus braços.
— Não. E se me der licença pretendo ir até meu Mestre para perguntar algo sobre o meu script. — Tentei me desvencilhar de seu abraço e sair. Oras, eu não estava com ciúmes, só não via algo de tão especial nela para tanta atenção que ela vinha recebendo. Ela só estava na companhia há uma semana e a bajulação não acabava mais.
— Perguntar por que você não é a última na apresentação de hoje? — Ele questionou e eu o olhei nos olhos, depois de desviar do seu peito rijo.
— Como você sabe?
— Sei porque eu e Anny faremos o fechamento, você não estava prestando atenção na reunião que tivemos na semana passada? — Provocou e foi me puxando para o pequeno sofá acoplado dentro do trailer. — Dalton até avisou que colocou câmeras por precaução para essa semana, ele espera um grande público.
— Não sei se você lembra ou estava se importando, mas eu passei mal e... Que seja — Irritei-me. Mas não por muito tempo, Alex grudou sua boca a minha me deixando sem o quê para raciocinar. Ele estava estranho, mais atencioso que o normal e carinhoso também, no entanto não parava de tentar me fazer ciúmes provocando-me por causa de Anny.
Alex já queria tirar minha blusa quando ouvimos uma batida na porta. Ele bufou e passou a mão no cabelo. Ainda deitada arrumei minha roupa e julguei-me por começar a fazer coisas no meu ambiente de trabalho.
— Agora que tenho a resposta pela mudança no script que seguimos por anos, vou até as meninas para ver se precisam de algo. — Levantei e Alex pegou uma blusa branca dentro da sua mochila.
Seja lá quem fosse continuava a bater atrás de uma resposta do lado de dentro. Resolvi acabar com aquela agonia e abri a porta, dando de cara com uma mulher morena, de olhos pequenos e escuros e longas madeixas negras. Anny Maia. Que coincidência, não?
— Oi, Ellie, né? Boa tarde, estava procurando pelo Alex, me disseram que esse é o trailer que ele costuma ficar. — Disse. Abri um meio sorriso e apontei o lado de dentro tentando não soar irada quando falei.
— Todo seu!
Acho que falhei.
— Boa noite, nova estagiária e futura professora do Instituto de Dança de Kennet! — Jenny gritou ao telefone.
Sorri e me encostei no meu trailer camarim depois de separar todas as roupas que eu usaria, já estava cansada antes mesmo de entrar na lona.
— Boa noite, Jenny!
Jenny foi a mais animada ao saber que eu poderia ingressar numa carreira no Instituto, aliás, fora uns das únicas saber, os demais foram Alex, Corine e Dalton, e as gêmeas. Jenny então relembrou aquele dia no bar e restaurante do Cláudio, quando falamos que de alguma forma eu deveria dar o primeiro passo para o que eu sempre sonhei em fazer, e mesmo não sendo algo meu, pelo menos eu estava começando. "Comece pequeno...", ela lembrou brincando.
Queria deixar para contar naquele dia à Thomas que eu havia conseguido o estágio, isso se Susan já não desconfiasse de algo, por eu ter aparecido durante alguns dias de semana lá para meus testes e os ensaios para a apresentação do dia 16. Queria que ela não tivesse contado, então assim eu teria uma desculpa para ir até ele. Caramba, eu parecia uma desesperada!
Já fazia duas semanas que não nos falávamos, ele não aparecera mais com Susan nos treinos dela, ela estava vindo com a avó ou o tio, no circo a mesma coisa, mesmo que tenhamos ficado sem nos apresentar para nos preparar para essa semana. Ele não fez uma visita sequer. Mas eu estava confiante que ele viria aquela noite e eu me encontrava com uma ansiedade descomunal.
— Ellie, estou falando com você!
— Oi?
— Achei que tivesse morrido, ainda bem que não, ainda quero muitos dias para te xingar por me deixar sozinha na Lasur. — Jenny choramingou mais uma vez.
Quando eu definitivamente consegui uma vaga de estágio no Instituto eu decidi sair da Lasur, assim eu poderia me dedicar a tempo diurno a dança e evitaria encontrar-me com o doutor Flávio.
— Eu vou te visitar todos os dias se quiser!
— Claro que vou querer! Mas agora me conte, o tal irmão do Thomas vai aí? — Minha risada escapou de novo, desde que eu detalhei com precisão a aparência de Tobias, Jenny vinha tentando achar um jeito que o encontrar por acaso. Isso porque nem o viu pessoalmente ainda. Aquela família tem um bom gene!
— Pela décima vez, Jennifer, eu não sei! Na verdade, nem sei se o próprio Thomas virá, não converso com ele faz tempo...
— Senti um tom tristonho nessa voz? — Gracejou e quando eu iria lhe responder, ela se adiantou. — Parei. Sei que você está com Alex há quase um mês e você e o Thomas são amigos...
Porém talvez você esteja certa sobre meu tom... eu só não sei aceitar isso.
— Mas não importa, eu vou desligar agora porque preciso me arrumar. O espacial de semana das crianças é o melhor! Depois do que vocês fazem em dezembro, é claro, aquele é fabuloso!
— Com certeza, Jenny. — Sorri mexendo com o pé em alguns papéis de confete que tinha no chão. — Vai lá, amiga. Nós vemos no trailer vermelho e com a bailarina colada, tudo bem?
— Claro! Beijos. — Desligamos e eu então me virei.
E antes eu tivesse ficado de costas e não visse aquilo. Alex estava completamente entretido com a "circense química". Parecendo notar que eu os encarava, ela levantou o rosto e sorriu largamente para mim. Só pode ser brincadeira!
Saí dali para a tenda dois, onde eu imaginava que as gêmeas estariam treinando por uma última vez. Precisava me ocupar com algo.
Eu não estava com ciúmes de Alex, não era isso. Eu sentia que não. Mas Anny não me parecia alguém confiável, eu não costumava julgar uma pessoa antes de conhecê-la – exceto quando eu criava uma história fictícia na minha cabeça –, mas com ela era algo que eu não sabia explicar. Talvez fosse antipatia à primeira vista!
Treinei por meia hora até ouvi de um palhaço, que passava por ali, que o circo havia aberto para o público. Voltei para o trailer e busquei minha roupa.
Como em todo ano Dalton havia alugado um sítio que ficava próximo ao circo para usarmos para nós arrumarmos, pois como eram mais pessoas e o espetáculo era longo, precisávamos de um lugar maior e comodidade para nós arrumarmos e descansarmos entre uma apresentação e outra.
Fui até o sítio que não era nada longe e vi que o grupo de acrobacia já estava lá. Cumprimentei quem eu ainda não tinha visto naquele dia e entrei para a fila do banheiro para o banho. Conversei com uma garota, que estava na apresentação em agosto do inverno, coisas banais enquanto esperávamos, até que ouvi meu celular tocar. Pedi para que ela vigiasse meu lugar na fila e fui para um canto mais silencioso.
— Oi!
— Ellie, tem uma mini bailarina saltando loucamente atrás de você, está no sítio? — Olívia perguntou rindo acima do barulho de onde ela estava. Já imaginava de quem ela falava... Susan.
— Estou sim, mas pede para ela esperar que eu vou tomar um banho rápido e já encontro ela — Respondi a Olívia e comecei a morder a parte de dentro da minha boca para segurar minha língua. Lógico que não adiantou. — Olívia?
— Relaxa, Ellie. Ele veio.
Assenti como se ela me visse e agradeci, desligando em seguida.
Não demorei no banho para poder ter um tempo de sobra para me preparar, quando finalizei a fantasia iriam anunciar a turma da acrobacia em alguns minutos, voltei correndo para o trailer para guardar minha roupa e surpreendi-me com o que vi.
Um buquê de violetas estava sobre o sofá de forro alaranjado. Não me aproximei muito, mas não me impedi de observa-las de longe, com meu nariz coberto por um pedaço de pano de mágico que tinha sobre um móvel, Alex devia ter deixado aqui.
Eram tão lindas, e estavam muito bem embaladas, de longe vi a logo da floricultura que ficava no centro, perto do maior prédio da cidade, aquele com a melhor vista. Senti algumas lágrimas pinicarem meus olhos, além das causas pelo pólen excessivo que invadia o ambiente.
Corri para perto de uma gavetinha e antes mesmo que eu conseguisse pegar o antialérgico soltei o primeiro espirro. Depois de pegar o potinho de mel – meu antialérgico natural – e em seguida corri até o buquê me arriscando e procurei por um bilhete, encostando no topo das flores. Saí em disparada do trailer em buscar de ar.
Eu estava atrasada, mas precisava ler o que estava escrito. Sabia que só uma pessoa que ainda não tinha conhecimento da minha alergia para enviá-las. Apenas Thomas, simplesmente Thomas. E eu não estava irritada. Estava até achando a situação engraçada, porque ele não queria chegar em mim e perguntar quais tipos de flores eu gostava, ele queria me surpreender. E conseguiu.
Lembro do meu primeiro encontro com Alex, ele me trouxera tulipas, elas possuíam pouco cheiro e sendo assim pouco pólen, eu podia até cheira-las sem muitos problemas, mas de vista nunca foram minhas favoritas. E lá dentro, no trailer, estavam as que eu mais adorava, e a que meu nariz e corpo odiavam pelo excesso de pólen. Violetas. Irônico, não é?
Espirrei mais um pouco até o antialérgico fazer efeito e nesse meio tempo corrido cheguei até atrás das cortinas, na concentração, onde todos estavam. Retirei o bilhete que eu tinha colocado no cadarço da minhas sapatilhas e o li com dificuldade por causa da penumbra.
" 'Há muita gente que espera que o sonho se realize por mágica. Mas toda mágica é ilusão. E ilusão não tira ninguém do lugar onde está...'¹ Em você vejo um sonho que se realiza com esforço. Tenho certeza que ficarei encantado com mais um show seu está noite, e todas que se seguirão. Faça sua mágica, encante a todos, mas não viva de ilusão. Boa sorte para você e sua equipe..."
No finalzinho estava escrito algo, mas pela pouca luz eu não conseguia ver. Desviei de alguns palhaços que estavam vestidos dos personagens do "Balão Mágico", chegando próxima do vão da cortina e consegui luz suficiente para ler o resto.
"Espero que um dia, o que tenhamos não seja magia, pois não quero viver contigo de ilusão. Com carinho, Thomas."
Um sorriso brotou sozinho nos meus lábios e eu fiquei paralisada com o papel na mão por uns segundos, depois fui chamada aos gritos de volta para a concentração. Voltei a colocar o pequeno papel entrelaçado à minha sapatilha e sorri para o grupo vestido de criança. Estávamos homenageando cada criança existente, vestindo como elas e realmente sendo como elas, havia até mesmo um acrobata em uma cadeira de rodas e outro com uma bengala para deficientes visuais. Entramos fazendo piruetas e cambalhotas nos ares, como mortais e giros duplos, os outros para dançar, seja como estão caracterizados.
As arquibancadas estavam lotados e pelo que eu percebia mais uma havia sido adicionada para aquele dia. Infelizmente com tantos movimentos rápidos que eu tinha que realizar foi impossível deixar que meus olhos viajassem pelo público, mas eu esperava ter mais chances depois.
E mesmo sem chances. Eu iria atrás deles. Precisava vê-los.
*¹ - Excerto retirado da frase de Roberto Shinyashiki.
Bônus da Jenny após a conversa com Ellie nesse capítulo está disponível no link em meu perfil.
(31/08/2016)
Esse mês não acaba mais não, gente? Hahaha.
Como informei no meu perfil, hoje irei postar 2 capítulos por: no sábado tenho simulado e amanhã eu preciso fazer um trabalho de Religião.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro