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Capítulo 10

   Meses se passaram desde que começamos a busca pelo irmão mais novo de Joel, Tommy. O inverno finalmente chegou, tivemos que saquear diversas lojas de roupas para usar os casacos em camadas como cobertores. Depois de se afastar da cidade e andar por horas no meio da floresta, finalmente chegamos à uma cabana afastada de todos.

— Porra, ta muito frio vamos entrar. — Esfreguei as mãos, Joel me puxou para baixo e olhou para a casa. — O que foi?

— Pode ter alguém ali, eu vou na frente e vocês entram depois.

— Não vamos esperar aqui fora. — Avisei, Ellie concordou no mesmo segundo.

— Está bem.

— Não podemos só bater? Seja lá quem mora aqui deve estar sozinho há muito tempo. — Ellie sugeriu, olhei em volta.

— Ela tem razão. — Concordei, Joel carregou a arma e seguiu devagar até a cabana.

— Ele vai mesmo fazer isso? — Ellie perguntou por cima do meu ombro.

— É melhor não arriscar. — Puxei minha pistola e a carreguei, Ellie revirou os olhos e me seguiu em silêncio. — E então?

— Parece vazia. — Joel sussurrou, Ellie foi até a porta e a abriu. — Espera.

— Voltou cedo da... — Uma senhora cruzou o corredor e então congelou, Joel apontou sua arma.

— Quem voltou? Quem mais vive aqui? — Ele perguntou, a senhora arregalou os olhos.

— Apenas eu e meu marido. — Ela explicou e então notou nossos lábios secos e o rosto corado por causa do frio. — Estão com fome? Querem comer? Eu fiz sopa.

— Porra eu to faminta. — Ellie passou por Joel rapidamente, fiquei ao seu lado e o encarei.

— Desculpe a invasão de repente, vamos aceitar a sopa. — Expliquei, o mais velho baixou a arma e a guardou no cinto.

A senhora foi até a sala e se sentou em uma cadeira, Joel puxou um mapa do bolso e jogou sobre a mesa.

— Pode me dizer onde estamos?

— Claro, estão bem aqui. — Ela apontou no mapa, fui até Ellie na cozinha e alcancei uma tigela.

— Olha os modos, somos visitas, não vamos comer tudo que eles tem. — Pedi, a garota soltou a concha dentro da panela.

A sopa estava com um cheiro delicioso, fazia um bom tempo que não comia algo de dar água na boca. Fiz uma tigela para Joel e levei até a sala, entreguei para ele, o mais velho me encarou com apreensão.

— É melhor comer, se só estão de passagem vão precisar de energia. — A senhora avisou, Joel pegou a tigela e começou a comer.

— Quando seu marido volta? — Perguntei e dei outra colherada na tigela.

— Eu não sei, depende do tempo que demora para caçar, as vezes mais as vezes menos. — Ela dizia, Joel colocou a pistola em cima da mesa.

— Vamos esperar.

— Obrigada pela recepção outra vez. — Peguei sua pistola e coloquei de volta no seu cinto, ele me encarou confuso.

— Já vi que tem sido dias difíceis. — A mulher riu, olhamos para ela. — É normal, meu marido é bem teimoso também.

— Nós não somos próximos. — Respondi rapidamente, ela riu.

— Claro que não.

— Caralho isso é um cervo?! Que maneiro! — Ellie gritou do segundo andar, deixei a tigela na mesa e fui até ela.

— Ellie o que está fazendo?

— Lorie olha aqui, isso é muito foda! — Apontou, havia a cabeça de um certo pendurada na parede.

— Argh, sempre detestei caçadores por isso. — Praguejei, Ellie riu e olhou para mim.

— E olha pra você agora.

— Eu caço pra você jantar, não pra pendurar cabeça de animais como troféu. — Coloquei as mãos na cintura, Ellie deu de ombros.

— Aposto que esse cervo tava uma delícia. — A encarei incrédula. — O que você acha que ele fez com o corpo?

— Você é má.

— Eu sou uma sobrevivente, e você também. — Apontou, antes de respondê-la Joel nos chamou do andar de baixo.

Desci rapidamente, ele estava parado em frente a mesa da sala apontando sua arma para o velho marido da mulher que nos recebeu.

— Não queremos problemas. — Expliquei, o homem soltou a arma e sentou-se perto da mulher.

— Então não aponta sua arma pra mim. — O velho pediu, olhei para Joel, ele se negou a baixar a arma.

— Eu to procurando meu irmão, o nome dele é Tommy você o viu?

— Não tem ninguém para esses lados. — Ele negou, Joel colocou a pistola no bolso.

— Em que parte do mapa estamos? É melhor responder igual sua esposa. — Ameaçou, fui até o mapa e virei para o senhor.

— Estão bem longe, como podem estar perdidos? — O velho resmungou, Joel segurou o cinto. — Disse a verdade pra eles?

— Disse. — A esposa respondeu.

— Isso é sopa? Deu sopa pra eles?

— Dei.

— Sinceramente mulher. — O velho resmungou outra vez, soltei uma risada frouxa.

— Anda logo. — Joel pediu, o homem se inclinou e apontou o local certo no mapa.

— Sabem se tem algum lugar como uma cidade ou algo assim? Com pessoas, vaga-lumes?

— Eles não parecem ver pessoas há um tempo Joel. — Olhei para ele, a mulher concordou.

— Moramos aqui há anos, tudo que vemos são corpos.

— Corpos? Onde?

— No rio da morte. — O velho apontou no mapa. — Eles descem o rio, as vezes monstros, as vezes pessoas. Seja lá quem está matando eles, não deve ser do bem.

Olhei para Joel confirmando, era para lá que devíamos ir. Ele pegou o mapa e guardou no bolso, Ellie desceu as escadas rapidamente.

— Desculpem o incômodo. — Ele pediu, estiquei os lábios aliviada por finalmente agir feito humano.

— Não vão até o rio, só vão encontrar coisa ruim por lá. — O velho avisou, deixamos a cabana.

Ellie roubou os coelhos que o velho conseguiu na caça e correu até nós, a encarei repreensiva.

— O que? To garantindo nossa janta, aliás você não gostou dele.

— Como é? — Joel perguntou, segurei os ombros de Ellie empurrando-a na frente.

— Nada. Não é nada. — Respondi rapidamente, a garota sorriu. — Porra a cada dia que passa fica mais frio. 

— Melhor montarmos acampamento logo, vamos fazer uma fogueira alta, não deve ter ninguém por aqui e é mais quente assim. — Joel dizia, montamos acampamento perto de algumas rochas onde o fogo esquentava deixando mais confortável, me encostei em um delas e adormeci em segundos, estava tão cansada que minhas olheiras estavam cada vez mais escuras.

— Pode dormir também, eu fico de vigia. — Ellie avisou, Joel carregou seu rifle.

— Sem chance.

— Vocês precisam mais que eu, e podem pegar o turno da noite. — Ela dizia, Joel olhou para mim e então negou.

— Pode dormir. — Ele foi direto, Ellie deitou-se perto da fogueira e dormiu com o calor do fogo, algumas horas depois acordei, Joel estava dormindo perto da mesma e ninguém estava de guarda.

Acendi a fogueira outra vez fazendo-o acordar, ele olhou em volta rapidamente e sentiu alívio ao nos vez em segurança.

— Você dormiu. — Falei baixo para não acordar Ellie.

— Cochilei.

— Acha que o Tommy está lá? Depois do rio? — Sentei do seu lado, ele olhou para frente.

— Eu espero que sim. — Respondeu, quem dera pudesse ler seus pensamentos agora.

— Vai encontrá-lo. — Toquei seu ombro e me levantei. — Pode dormir um pouco, eu vigio agora.

— Tudo bem, já descansei. — Ele levantou e me encarou, desviei o olhar para o chão. 

— Aquele casal vivia lá há bastante tempo, não devem ter visto o caos que as cidades se tornaram. 

— Isso é péssimo, estão sozinhos e desprotegidos. — Ele colocou as mãos na cintura e olhou para frente.

— Eu chamo de liberdade, já que todos vamos morrer um dia, gostaria de não ter passado por tudo aquilo no começo. — O respondi, ele voltou a me encarar. — A quarentena foi horrível do início ao fim, não desejo aquele tipo de proteção à ninguém.

— Os militares foderam com tudo, quando o real inimigo era outro.

— Mataram inocentes, crianças, jovens. E depois foi pior, criaram uma comunidade onde todos tinham que trabalhar arduamente enquanto aqueles escrotos comiam e dormiam em suas camas quentes. — Quase cuspi as palavras, ele concordou. — Me diz Joel, teve algum momento bom depois que tudo isso começou? Teve algum momento em que se sentiu bem? Feliz?

— Nem tudo era ruim.

— Não. Pra um passarinho em uma gaiola, ter comida e água não é ruim. — Me referi como exemplo, ele permaneceu sério.

— É assim que se sentia?

— É. — Engoli em seco, o olhar distante, pensando em como era a vida dentro dos muros daquela cidade antes de me juntar a causa dos vaga-lumes. — Vou arrumar as coisas, vamos sair logo.

— Ta.

O caminho foi silencioso exceto por Ellie puxando assunto a cada três passos, descemos a trilha até o rio e seguimos até chegar em uma represa.

— Cacete, é assim que produzem energia?

— É, não me pergunte como, eu não sei. — Joel foi direto, considerando todas as questões que Ellie fez durante o caminho, ele já estava sem paciência.

— Aí gente, esse é o rio da morte? — Ellie olhou pro mapa, paramos, Joel foi até a garota e encarou o papel.

De repente várias pessoas montadas em cavalos surgiram, Joel puxou Ellie para trás.

— Malorie.

— Tudo bem. — Larguei a arma e levantei as mãos.

— Larguem as armas agora! — Um dos homens perguntou, pisquei algumas vezes assustada, estavam todos armados e encapuzados. — Quem são vocês?!

— Joel, Ellie, Malorie. — Apresentei, o homem franziu o cenho. — Escuta, não queremos problemas, estamos procurando alguém.

— Vieram no lugar errado. — Ele apontou para mim, Joel foi a frente e me puxou para trás.

— O meu irmão Tommy, ele está com vocês?

— Eu não sei, pode ser. — Ele deu de ombros, Joel arregalou os olhos esperançoso.

— Primeiro vamos ver se estão infectados, depois conversamos. — O homem trouxe um cachorro, recuei. — Se ele atacar vocês, vamos atirar na hora.

— Não estamos infectados. — Expliquei, ele deu de ombros outra vez.

— Não é negociável.

O homem soltou o cachorro que partiu para cima de nós, segurei o braço de Joel com medo, não temia os infectados mas sim um mero cachorro. Ele passou por nós me cheirando rapidamente e então foi até Ellie, Joel segurou meu braço impedindo de interferir, a garota estremeceu preocupada, em segundos poderia ser mutilada por um cachorro raivoso. Para nossa sorte ele latiu e então pulou em seu colo, a garota riu aliviada fazendo carinho e distribuindo afagos.

— Bom. — O homem disse, uma mulher foi até ele e sussurrou algo.

— Venham com a gente. — Ela disse, Joel assentiu.

Recebemos dois cavalos, Ellie subiu comigo em um e Joel em outro. Os seguimos até uma cidade distante como uma fortaleza, certacada por muros e com torres de vigia em todos os lados. Assim que entramos a cidade parecia uma pequena vila, tudo construído com o tempo. Havia um grupo de construtores bem próximos de um prédio erguendo uma parede, Joel pulou do cavalo surpreso.

— Tommy! — Gritou, o irmão desceu do andaime e correu até ele o recebendo com um abraço caloroso. Sorri, levemente feliz pela recepção, e aliviada pelo reencontro que levou meses para acontecer.

— Bem-vindos a Jackson. — Ele nos recebeu, a mesma mulher que falou com o homem mais cedo se juntou à nós. — Pelo visto já conheceram a Maria.

— Recepção calorosa. — Ellie respondeu em tom de deboche, Joel a encarou apreensivo.

— Estão com fome? — A mulher perguntou, dei de ombros.

— Claro.

Nós a seguimos até um grande refeitório onde havia comida quente e bem temperada, Ellie comia rapidamente como se fosse fugir do seu prato.

— Ei, vai com calma. — Repreendi, Maria, a mulher que nos recebeu riu.

— Perdeu alguma coisa aqui porra? — Ellie disse para a garota no outro lado, a repreendi outra vez.

— Você é nova, ela não está acostumada seu comportamento. — Maria explicou.

— Eu posso ensinar.

— Ellie. — Repreendi outra vez.

— Foi mal, é estranho, só isso. — A garota explicou, neguei envergonhada.

— São parentes? — Maria perguntou-me.

— É minha mãe. — Ellie brincou, a encarei outra vez.

— Não sou mãe dela.

— Em que você se meteu Joel? — Tommy o perguntou.

— A Ellie é de uma família importante, temos que levá-la até os seus pais. — Ele explicou, Tommy olhou para mim.

— Juntos? E a Tess não veio com vocês?

— Não. — Ele foi direto, encarei o prato na minha frente.

— Joel não é lá o melhor colega de equipe. — Tentei brincar para descontrair, Tommy riu.

— Sei bem como é, desculpe ter que aturar meu irmão por tanto tempo.

— Obrigada! — Concordei, ambos rimos.

— Ta legal, bom papo. Mas será que podemos conversar só entre a família? — Ele se referiu a Maria, Tommy segurou a mão da mulher.

— A Maria é da família, estamos juntos. — Tommy explicou, Ellie largou a colher boquiaberta.

— Cacete, meus parabéns. — Ela disse, Joel estava surpreso e irritado. — Joel, dá parabéns.

— Parabéns. — Ele resmungou.

— Escuta podem trocar de roupa, tomar banho e ficar a vontade, nós deixamos uma casa pra vocês no final da rua. Não é tão grande, mas é bem confortável. — Maria dizia, olhei para Joel esperando uma resposta.

— Pois é, bem confortável. — Tommy concordou, levantei quebrando o clima tenso.

— Vamos adorar, obrigada. — Agradeci, puxei Ellie comigo, Joel levantou logo depois.

— O que acham desse lugar? — Ellie perguntou enquanto seguíamos atrás a casa, os olhos notando cada detalhe pelo caminho.

— Parece estável, tem água quente, animais, comida. É diferente da quarentena. — Expliquei, Joel parecia irritado com o irmão. — Não acha?

— Acho que acabamos de chegar. — Ele dizia, olhei em volta, haviam lojas e um mural com todas as fotos de entes queridos perdidos ou mortos bem no centro da cidade, ele parou e encarou o mural como se reconhecesse alguém.

— Joel, ta tudo bem? — Ellie perguntou, notei seu pânico de começo, puxei a garota pelo braço.

— Vamos até a casa, ele vem logo atrás não é? Nos vemos lá.

— Ele reconheceu alguém? — Ellie me perguntou, olhei para trás.

— Acho que sim, mas isso não é da nossa conta.

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