Becca

Deito a cabeça no travesseiro e continuo escrevendo, já tinha terminado a introdução e estava mandando por e-mail para ele para pegar as referências.

Olho para frente e vejo Charlie deitado na direção oposta com a cabeça apoiada no braço e o outro escrevendo alguma coisa no computador com preguiça.

-Te mandei.- murmuro.

-Ok.- ele senta e coloca o computador no colo.

-Sobre anteontem....

-Não precisa falar nada.- ele nem olha para mim.

-Não quero que fique me olhando com pena.- peço.

-Não vou, princesa.- ele fala distraído e algo se alivia no meu peito.

-Gente.- Ryan abre a porta e nós dois viramos o rosto.- Eu vou pedir uma pizza, vocês querem algo?

-Não, eu já tô indo.- explico fechando o computador.

-Não quer ficar?- Charlie pergunta.

-Não, não quero atrapalhar.- guardo as coisas na bolsa.

-Não vai, a pizza é grande e Taylor está fora, então vai sobrar.- Ryan fala gentil.

-Pode ser, então.- mexo os ombros.

-Ok.- ele fecha a porta e vai embora.

Charlie levanta pegando as coisas e colocando em cima da escrivaninha, ajeito a blusa no meu corpo e Charlie passa a mão pelo cabelo antes de olhar para mim.

-Você está com pena.- cruzo os braços.

-Não é isso, Becca.- ele balança a cabeça.

-Ah, coitada de mim por meu pai me bater.- reviro os olhos.- Vários pais batem nos filhos, não quer dizer nada...

-Não quer?- ele levanta as sobrancelhas.

-Charles...

-Eu odiei você.- ele senta na escrivaninha.- Odiei você por muito tempo, até domingo.

-O que mudou?- pergunto.

-Descobri que você é igual a mim.- ele explica e eu rio.- Pare com isso, Becca, esse humor não funciona mais comigo.

-Acha que me desvendou?- me aproximo.- Que finalmente entendeu que eu sou má com você por que eu preciso descontar em alguém o que meu pai fez?

-Quase isso.- ele mexe a cabeça.- Podemos ser amigos...

-Amigos?- pergunto.- Charles, passamos três anos irritando um ao outro e você acha que podemos superar isso só por que meu pai tem uma política de educação mais agressiva?

-Você é muito burra se acredita nisso.- ele se ergue e percebo que estamos bem próximo.

-Eu odeio você, Charles.- sussurro.

-Ok.- ele sorri.

-Devolve.- provoco.- Não vai falar nada?

-Não.- ele balança a cabeça.- Amigos.

-Não somos amigos.- começo a me irritar.

-Você não decide isso.- ele fala tranquilo.

-Nem você.- sorrio com raiva.

-Charles...

-Está em fase de negação, ok...- ele levanta a mão e afasta uma mecha do meu cabelo.

Empurro a mão dele e Charlie arregala os olhos de surpresa, pego minha bolsa e o casaco, não vou ficar por aqui, não posso ficar aqui com ele assim.

Passo pela porta e desço as escadas com raiva, Ryan me chama e eu o ignoro indo até lá fora. Pego as chaves do meu carro e percebo que estou com tanta raiva que estou apertando minhas mãos.

-Becca?- Adam aparece.

-Agora não.- abro a porta de trás e jogo as coisas lá.

-Você tá bem?- ele parece preocupado.

-Tô.- respiro fundo e passo a mão pelos cabelos.

-Não parece.- ele se aproxima mais.

Encaro os olhos azuis claros e ele me observa, a mão dele acaricia minhas costas e desço os olhos até seus lábios precisando de alguma coisa para voltar para a realidade.

-Becca?- ele aperta minha cintura.

Me aproximo dele e no mesmo momento penso em Charles, franzo as sobrancelhas e percebo que estou pensando em Charles quando quase ia beijar Adam.

-Desculpa.- sussurro abrindo a porta.

-Quer que eu dirija para você?- ele franze as sobrancelhas.

-Não, tô bem.- entro e dou a partida.

Piso no acelerador e o carro vai bem rápido pela rua, respiro fundo e limpo uma lágrima que está escorrendo pela minha bochecha.

Não sei por que estou chorando, só não consigo parar de chorar. Acho que no fundo sei que Charles está certo, sei que meu pai não bate em mim só para me educar, ele nunca bateu só para me educar.

🥁

Charles

Olho para Adam do outro lado da mesa e ele está rindo de algo que Evie está falando, observo o rosto dele e me sinto um idiota por não ter visto isso antes.

Quando Becca saiu do quarto, vi pela janela que Adam foi até ela e eles pareciam bem íntimos, achei que estava inventando até ver que Becca avançou para beijar ele.

Mas saiu antes de acontecer alguma coisa, claro que eu não tinha visto que eles dois tiveram algo, eu era muito burro para não ter visto isso.

Passo a mão pelos cabelos e me pergunto por que estou tão irritado com isso sendo que Becca me odeia e já deixou isso bem claro.

-O que você tem?- Adam bebe um pouco de cerveja.

-Desde quando está transando com Becca?- escapa e Evie para de sorrir.

-Até onde eu sei, não devo satisfações para você.- Adam fica sério.

-Achei que era meu amigo.- vejo de canto de olho Ryan se preparar.

-Eu sou seu amigo, cara, mas não vou deixar de transar por sua causa.- ele explica com raiva.

-Tanta gente para transar e vai logo escolher Becca Davis?- rio.- Nem considerou que eu odiava ela?

-Você não parece odiar ela.- ele balança a cabeça.- Parece que está com ciúmes.

-Eu estou me sentindo frustrado por descobrir que escondeu isso de mim!- levanto.

-O que você fez com ela, afinal?- ele fala no mesmo tom.- Ela estava chorando quando foi embora!

-Chorando?- Evie me encara.

Saio da cozinha e subo as escadas com os pés pesados, não sabia que Becca estava chorando quando foi embora, minha intenção não era fazer ela chorar.

Eu estava querendo oferecer amizade para ela, eu quis tentar ser amigo dela e tentei tocar o rosto dela. Então ela começou a ir embora e aconteceu aquilo com Adam.

Não queria fazer ela chorar, não sabia que era um assunto delicado para ela. Eu já tinha superado as agressões dos meus pais, mas aparentemente ela não queria admitir que também tinha sofrido assim.

Passo a mão pelo rosto e sento na cama, abaixo a cabeça e me sinto um idiota por ter brigado com Adam e por ter feito Becca chorar e surtar daquele jeito.

Eu só queria parar com essa merda de inimizade, não queria mais ficar discutindo com ela quando sabia o que tinha passado, eu só queria não brigar mais com ela.

Tinha que ajeitar isso.