Vilarejo Grimory
Dan
Seguia andando junto a meu irmão em meio ao vilarejo das Grimorys, em direção a nossos aposentos. O clima lá era quente e o chão não era asfaltado ou bem cuidado, era de terra mesmo, tanto que elas caminhavam descalças, sentindo a terra com seus pés, e devido ao calor, usavam poucas roupas, um tecido branco mesclado com faixas douradas era a cor da roupa delas, também eram bem curtas, deixando à mostra parte da barriga e de suas coxas.
Era um vilarejo dominado pelo Girl Power, mulheres negras e morenas de pulso firme, legítimas guerreiras nascidas e criadas com esse propósito de lutar umas pelas outras e ajudar a quem precisa.
Assim como nós, que precisávamos de ajuda poucas horas atrás.
Eu estava gostando do que estava vendo, as crianças estavam brincando e correndo pelas pequenas ruas do vilarejo que, por incrível que pareça, ficava dentro de uma montanha com pouca iluminação externa e corrente de ar, mas era um local acolhedor e bem-feito, que atendia a necessidade delas e de qualquer um que elas acolhessem.
Pelo que percebi, ali cada uma delas tinham sua tarefa e trabalho. Eu vi mulheres com uma espécie de armadura, na verdade eram duas, que estava nos levando até nossos aposentos, outras cuidavam das crianças e limpeza das pequenas casas, outras dos alimentos que eram servidos de casa em casa. Era uma espécie de cesta com frutas, uma pequena marmita que indicava estar sendo servido o jantar, acompanhado de um suco natural para as crianças e para os adultos uma garrafa de vinho, e um pequeno jarro de barro continha água — eu percebi quando uma pequena, junto de seu irmão, iria virar para tomar a água e derrubou sobre ela, dando um pulo engraçado. Assim como seu irmão, eu ri, mas para ele não acabou bem, pois ela, irritada, pisou sobre seu pé.
Vejo que Dante observava tudo com a mesma cara fechada de sempre, diferente de mim, que achava tudo aquilo incrível. Dou alguns passos mais à frente e pergunto para a guarda à esquerda, de modo despreocupado:
— Eu vi um garoto ali, tia. O que acontece com ele quando virar homem? Vocês matam ele? — pergunto com a maior cara de pau possível, sem sequer pensar em modo como ela iria reagir.
Vejo a mulher alta balançar sua cabeça em sinal de desaprovação e falar, brevemente, olhando para mim, enquanto andava com sua lança erguida na mão esquerda:
— Eles se tornam nossos guerreiros de linha de frente, os que buscam comida e coletam informações para a nossa líder Rey; eles não são muitos. Agora, na vila temos apenas 30 homens, a maioria filhos de guerreiras Grimorys que estavam por nascer meses após o surto. A maioria são jovens e menos da metade dos homens que já eram casados com elas. Outros as abandonam e as deixam, pois não aceitam que podemos ser tão poderosas quanto eles, se juntando a outros distritos ou se tornando viajantes solitários nas terras sem fim.
Olho para ela, fazendo uma cara que entendi o que foi dito e agradecendo a explicação. Sinto a mão pesada dela tocar meus cabelos, fazendo um breve carinho, deixando-o espetado. Dou um sorriso amigável a ela e seguimos caminhando sem pressa.
Logo chegamos ao local onde iríamos nos acomodar: uma pequena casa com dois cômodos. Adentramos o local, onde havia um quarto com duas camas de solteiro e uma sala, com uma pequena mesa para fazermos as refeições. Olho para ela intrigado e pergunto, de jeito bem tímido:
— Onde fica o banheiro? Sabe, para tomar banho e fazer as necessidades? — Fico vermelho e escuto ela responder brevemente antes de ir.
— As termas e banheiras gigantes ficam ao lado norte, atravessando o vilarejo, e os banheiros próximos às termas. As termas dos rapazes são menores e ficam à direita. Assim como a das mulheres, são banhos comunitários e juntos. Os banheiros masculinos são divididos com cabines e mictórios.
Olho para Dante com os olhos esbugalhados e falo, enquanto jogo as bolsas no chão de modo que demonstrava estar abismado com o que acabei de ouvir:
— Cara, esse banho comunitário é tipo uma banheira grande, onde nós nos lavamos antes no banheiro normal e depois entra lá, tipo, todo mundo tomando banho junto.
Dante dá risada de mim enquanto arruma as bolsas à frente de nossas camas e se aproxima de mim, colocando seu braço esquerdo em volta de meus ombros, estendendo a mão esquerda e tirando uma de mim e do que acabei de falar.
— Isso mesmo, meu caro irmão, banho comunitário. Foi o que ela disse, você vai ter que ficar nu, no meio de gente desconhecida nua. Perder a vergonha do seu corpo magricelo — diz ele, rindo e se jogando no colchão e relaxando com as mãos atrás de sua cabeça, fitando o teto amarelado com uma luz fraca, que iluminava o quarto simples e sem muitos detalhes.
O único detalhe ali era o símbolo da vila pintado à mão na parede com uma tinta vermelha. Para quem não sabe os símbolos das Grimorys é um falcão com uma lança. Amanhã eu perguntaria a um deles do vilarejo o significado. Aquilo me deixava curioso e eu adorava saber mais das coisas.
Pego roupas limpas em minha bolsa, junto a uma toalha que usávamos quando nos banhávamos em alguma casa abandonada ou rio próximo de onde acampávamos. Geralmente elas eram descartáveis, mas fazia dois terríveis dias que não sabia o que era um banho e estávamos bem sujos, fora que precisávamos relaxar em um banho bem quente. O inverno estava chegando e tomar banho em lago não iria rolar tão cedo.
— Dante, vamos conhecer o banheiro e as termas. Você sabe que nesses lances de banheiro e banho comunitário não vou só — digo, de modo tímido e com um tom de incômodo e receio.
Ele balança a cabeça, fazendo sinal de que iria e começar a ajeitar suas coisas para seguirmos caminho.
Saímos de nossos aposentos, seguindo caminho ao norte do vilarejo, estava com a toalha sobre meu ombro direito e segurando uma peça de roupa limpa na mão esquerda. Andava calmamente, descalço, assim como meu irmão e os demais do vilarejo.
O mesmo garoto que vi quando cheguei, junto a sua irmã, estava jogando bola em um canto, sozinho, de modo desmotivado e solitário. Sem avisar Dante, mudo meu caminho, seguindo em direção ao garoto.
Ele chutava a bola simples contra uma parede. Antes de me aproximar dele, ele a chutou com força contra ela, como se estivesse descontando sua aflição nela.
Ao me aproximar, a bola vem em minha direção, paro-o com meu pé e o garoto se vira, caminhando até mim, logo se desculpando. Olho para ele, mexendo as mãos, e falo, de modo amigável:
— Por que está se desculpando? Vi você jogando bola e com a diversão toda para você e pensei comigo "ei, quero me divertir também". Por que não fazer novas amizades?
O garoto ergue um sorriso de orelha a orelha e se aproxima de mim, falando, enquanto me abaixo, com os braços apoiados e minhas coxas:
— É realmente difícil achar alguém que queira fazer parte da diversão.
Olho para ele, estendendo meu punho direito fechado como um sinal de toque e digo, com um sorriso no rosto, assim que ele retribui o toque:
— Pode me chamar de Dan. Qual o seu nome, pequeno?
Ele me informa que seu nome era Simon, começo a jogar bola com ele, relembrando dos bons momentos que tinha junto a meu irmão no quintal pequeno e na época um pouco velho e precário, assim que nos mudamos, eu com meus sete anos e meu irmão com seus dez anos. Aquele pouco que tínhamos antes de tudo, era meu pequeno e grande infinito. Agora era tarde demais para perceber o valor das pequenas coisas.
Entreguei-me à diversão enquanto jogava uma pequena partida de futebol com o único garoto que tinha visto desde o momento que cheguei. Dante se aproxima de onde estávamos e ficava observando, de braços cruzados.
Foi um momento divertido e bem descontraído desde que tudo começou, era poder ser criança de novo e esquecer dos problemas que eu tinha naquele momento.
Após ficar mais ou menos 30 minutos jogando bola com o garoto e conversando um pouco com ele, criando um laço de amizade, e mostrando um pouco da magia elementar do fogo a ele, sigo meu caminho junto a Dante, ao banheiro masculino.
Ao adentrar, vejo um banheiro normal e simples, no mesmo não havia chuveiros, mas pequenos bancos feitos de barro. Na frente desses bancos, havia uma espécie de bacia que me lembrava uma pia enorme, com água morna junto a canecos; caso a água acabasse, era só puxar um pequeno bambu e mais era despejada dentro do recipiente. Sobre uma pequena prateleira, havia esfregões junto a sabonetes.
Olho para meu irmão e damos de ombros. Ele segue para o lado esquerdo e eu para o direito, começo a me despir e me lavar, assim como meu irmão do lado contrário do banheiro. Escuto ele falar, de modo calmo, puxando assunto comigo:
— Dan, por que você decidiu ir jogar bola com o garoto, mesmo não curtindo futebol?
Olho para ele, dando de ombros, e falo, jogando um pouco de água sobre meu corpo, e naquele momento eu sinto o quanto estava realmente precisando de um bom banho:
— Às vezes gosto de ser gentil, cara. Fora que me trouxe boas lembranças de quando eu era mais novo. Ele precisava de um amigo e sabe o quanto gosto de fazer novas amizades.
— Você confia na Dinah? — ele me pergunta, de forma séria.
— Sim. Eu não teria como saber se não tivesse dado uma chance a ela. Ela nos ajudou, não tem prova maior do que isso. "Se deve dar um salto no escuro para achar a luz em meio às trevas", não é mesmo? — digo, sorrindo. Levanto-me, amarrando a tolha em volta da minha cintura.
Dante sacudia os cabelos molhados e, colocando-se de pé, responde a minha pergunta, enquanto fazia o mesmo que eu.
— Usando minha frase contra mim, jogo baixo, Dan. Mas tem algo na Dinah que me faz desconfiar dela — diz ele, de modo pensativo, enquanto seguíamos em direção às termas.
— Será que esse "algo" é porque ela desafia o seu sex appeal? — digo, de modo irônico, tirando uma com ele.
— Idiota. Não tem nada a ver com isso — diz ele, de modo sério, dando um tapa em minha cabeça, mas senti que ele estava tímido.
Chegamos nas termas do vilarejo e adentramos as águas mornas. O local era bem espaçoso, apesar da moça ter falado que a dos homens era menor, fico imaginando como poderia ser a das mulheres, o tamanho e tudo mais.
Era como uma grande banheira, o local todo revestido por barro e terra, com detalhes brancos e dourados, pequenas linhas vermelhas davam um detalhe e toque final a mais. O local tinha uma pequena névoa de ar quente que estava acima da água, o ambiente tinha um aroma de aloe vera suave e bem agradável. Havia onde pendurar sua toalha, e a roupa que iria vestir ficava em uma espécie de armário no banheiro. Ao fundo do banheiro tinha uma passagem que levava às termas e ali ficava esse pequeno espaço para deixar seus pertences.
Coloco a toalha, assim como Dante, e seguimos em direção à banheira. Saio correndo e pulando dentro da água quente. Dante adentra a água calmamente, encostando com os braços e as costas nas pedras.
Fico andando para ver até onde ia a banheira, a temperatura da água era perfeita, morna, e os sais de banho que nela havia era algo que realmente estávamos precisando. Enquanto caminhava, olhava para trás e via Dante relaxando com os olhos fechados, eu seguia em frente e deixava ele naquele momento sozinho.
Vejo que mais ao fundo se encontrava a figura de um cara moreno e bem forte, com uma cicatriz em seu braço esquerdo na altura de seu ombro; passo com as mãos em meus olhos, cogitando estar vendo coisas. Porém, à medida que me aproximava, via que de fato alguém se encontrava ali.
Ele tinha cabelos brancos na altura de seu ombro, um olhar firme e sério. Antes de eu chegar perto, ele abre seus olhos, que estavam fechados, e me encara com seus olhos amarelados e penetrantes. Escuto sua voz firme e grossa:
— Você é do tipo barulhento, garoto. O que faz desse lado da terma? Venho sempre para este lado para não ser incomodado. Creio eu que agora terei que achar outro local no qual me banhar em paz, sem tais presenças.
Continuo seguindo em frente e estendo minha mão, falando, de modo amigável e não parecendo mais entrosado do que já estava:
— Olá, me chamo Dan Hawks. Foi mal lhe incomodar, achei que só estava eu meu irmão no local. E você seria?
Ele olha para minha mão, segurando-a de modo firme, cumprimentando-me, enquanto fitava meus olhos verdes.
— Me chamo James Grimory. Tudo indica que você e seu irmão foram ajudados por uma das guerreiras Grimorys. Seus rostos não são conhecidos por mim, o que apenas confirma minha tese.
Olho para ele após soltar sua mão, ele cruza seus braços, sentando-se na banheira, esperando pelos meus próximos dizeres.
— Isso mesmo! Estamos de passagem, iremos embora pela manhã, mas o vilarejo é incrível. Além do garotinho que conheci, você é o segundo homem que vejo aqui — digo, sentando-me próximo a ele normalmente.
— Nem era para eu estar aqui. Mas essa cicatriz está se fechando, um corte feito por uma lâmina de um Burnylla. Acharei ele e devolverei o presente na mesma moeda — diz ele, cerrando os punhos, e havia um desejo de se vingar mesmo, tanto em sua voz quanto na expressão ácida em seu rosto. — E essas cicatrizes em seu abdômen e peito, cara, como as conseguiu? Alguma batalha nas terras sem fim? Não me leve a mal, mas você tem cara de que ataca e sai correndo — diz ele, curto e grosso.
Dou uma risada sem graça e logo fecho meu rosto, encarando-o com um olhar do tipo "não acredito que você falou isso", e finjo que ele não falou nada demais, mesmo querendo enfiar o punho na cara dele.
— Essas cicatrizes foram algo que me aconteceu quando eu estava na sexta série.
Fico com um olhar cabisbaixo, e James nota falando rapidamente. Toco com minha mão esquerda sobre meu abdômen pouco definido, sentindo as marcas das poucas cicatrizes que ali havia e prossigo, falando de modo calmo, tentando não demonstrar muito meu lado emotivo e fraco, mostrando em minha voz que havia superado aquilo:
— As ganhei antes disso tudo, sabe? Eu tentei me defender de uns valentões de minha escola, no banheiro próximo de onde fazíamos natação. Eu era alvo fácil, nunca fui muito forte ou popular. Eu era o nerd atrapalhado e com poucos amigos. — Na verdade, meu único amigo mesmo era meu irmão, penso. Respiro fundo ao me ver novamente naquela cena e prossigo falando. — Um dia, quando decidi revidar e me impor na situação, os garotos de minha sala estavam com um estilete e fizeram esse corte sobre meu abdômen e peito para toda vez que eu ver e sentir as cicatrizes eu me lembrar que não posso tentar ser o que não sou. É como uma marca que me mostra que sempre serei o nerd esquisito, para eu não tentar mudar o que sou. — Ele me olhava atentamente e parecia estar analisando tudo o que eu dizia. — O pior foi me ver sozinho e o sangue dos cortes não tão profundos escorrendo sobre minha pele branca e pingando no chão, se misturando junto a água do chuveiro. Sabe... Eu tentei revidar, mas era algo em vão, porque eles estavam em grande número, eu estava sendo segurado e quando eu tentava me soltar e brigar contra eles, eu sentia a parte afiada do estilete rasgando minha pele fina. Então, não havia o que eu fazer ali. Mesmo após isso, eu levei alguns socos e chutes e fiquei
um tempo ali caído sobre o chão frio enquanto a água do chuveiro caía sobre mim, misturando com o sangue que saía dos cortes. Eles deixaram o estilete ali sobre o chão para parecer que eu havia feito aquilo, sabe? Eu não entendi muito bem, mas fui encontrado pelo zelador que cuidava daquele andar. Minha mãe e meu irmão foram notificados e me encontraram na enfermaria. No outro dia, na diretoria, eu inventei uma história mirabolante e assumi que foi eu que fiz aquilo. Meu irmão não acreditou muito pois sabia que algo estava acontecendo comigo e não fazia muito tempo, minha mãe se desculpou com a diretora. E eu a vi chorar por alguns dias e ficar muito mais atenta aos meus passos. Dante tentou arrancar informações de mim a fim de fazer justiça com as próprias mãos, mas eu não disse nada. Ele ficou com raiva de mim durante uns dias, mas um aluno do oitavo ano brigar com um do sexto iria lhe causar problemas e eu não queria que minha mãe chorasse mais por minha causa. Então eu me tornei forte e comecei a lidar com meus problemas e minha dor da minha forma, sem carregar ou arrastar as pessoas à minha volta. — Cerro meus punhos e falo, fechando meus olhos de modo firme: — Tem batalhas que devemos lutar sozinhos.
James olha para mim e pergunta, confuso:
— Por que está me contando tudo isso?
Eu simplesmente olho para ele e dou de ombros, com um sorriso no rosto.
— Eu sinto que posso confiar em você. Mesmo sendo um pouco bruto, creio que todos têm uma história e passado. Não devo julgar sem nem ao menos lhe dar um voto de confiança.
James se aproxima de mim e coloca sua mão em meu ombro, ficando um de costas para o outro.
— Sinto o mesmo sobre você. Minha intuição estava certa, você não é fraco, pode ser falador e barulhento, mas não é covarde. Te vejo amanhã, Dan — diz ele, de modo sério e caminhando de cabeça baixa.
Aceno para ele em sinal de despedida e vejo ele seguir em direção à saída das termas. Sento-me na banheira, fechando os olhos e me deixando relaxar pela água e neblina quente que pairava acima da água.
"Era tudo o que eu precisava nesses dias."
Mas aquela paz não dura muito tempo, logo sou tirado dela ao escutar uma voz de um homem vindo de baixo daquelas águas. Levanto-me e esfrego meus olhos, olhando em volta.
Sinto meu corpo ser puxado e uma forte pressão no local. De repente, sinto um tranco em meu corpo, vendo-me em um local diferente. Todo azul cristal, as paredes não eram mais as de terra e barro, foram mudadas e me lembravam uma caverna toda de cristal, a água era tão limpa e transparente que chegava a brilhar; a água à minha frente toma a forma de um homem, que vem caminhando até mim.
Começo a recuar, conjurando uma chama em minha mão direita. Eu sentia minhas pernas tremerem e procurava por Dante, mas ele não estava lá.
Em um piscar de olhos, ele estava em minha frente e falando bem perto, me encarando olhos nos olhos, como se soubesse tudo que eu estava sentindo. A água, de morna, se tornou fria no mesmo instante, causando arrepios por todo o meu corpo. A voz então fala comigo, em alto e bom tom:
— Encontre o garoto que domina o gelo. Ele será útil em sua busca, garoto. Ele e sua prima são os únicos do tipo gelo, ache-os. Eles serão úteis em sua busca pelas jornadas das terras sem fim.
— Como sabe de minha jornada? — pergunto, de modo inocente, mas, por incrível que pareça, ele não me botava medo como a forma do fogo que vi na outra vez.
— Você e seu irmão estão sendo vigiados por todo o seu caminho. Monte uma equipe em sua jornada e terás sucesso. Continue do jeito que está e morrerás antes de achar suas respostas. Um dia nos encontraremos e irei lhe presentear com um artefato elementar de meu poder. Eu quero que tudo isso acabe tanto quanto você meu caro. Lhe desejo sorte, e siga meus conselhos. Sua jornada não será fácil, quanto mais ajuda, melhor será. — Vejo ele se afastar de mim, erguendo os braços, e, antes de sumir, sua voz firme e jovem ecoa em meus ouvidos: — Nenhuma batalha se vence só.
Quando me vejo, estava deitado sobre o chão da banheira; abro os olhos, soltando uma bolha de ar de minha boca, levantando-me rapidamente, saindo de baixo da água. Sigo caminhando até Dante calmamente nas águas, enquanto pensava e retomava meu fôlego, escondendo em meu rosto tudo o que eu acabara de presenciar, para não levantar suspeitas para meu irmão.
Aproximo-me de Dante, acenando para ele, e falo, de modo calmo:
— Já vou saindo, estou bem relaxado. Mas se quiser, pode continuar.
Ele foca seu olhar em meu rosto, analisando-me de modo desconfiado, falando a seguir, com seu jeito normal e deixando o olhar de desconfiança de lado:
— Não, também já vou. Minha pele está começando a enrugar.
Saímos da banheira, seguindo em direção ao banheiro para nos trocarmos. Nesse breve caminho até lá, Dante puxa, sem mais nem menos, assunto comigo. Até eu achei estranho o modo como ele estava agindo desde o início de tudo, falando mais comigo e se esforçando para puxar assunto.
— Falou com o rapaz que estava nas termas? — diz ele, soltando a pergunta olhando brevemente para mim.
— Ah, o James, ele é gente boa, meu mais novo amigo — digo, sorrindo, lembrando da breve conversa que tive com ele.
— Você e sua mania de fazer amizades fáceis e confiar nas pessoas de primeira. Você é bom em socializar, tenho uma pequena inveja disso, Dan — diz ele, com a voz baixa e calma a última frase.
— Ei... Que feio ter inveja do irmão mais novo. Mas você faz amizades do seu jeito, acho você mais parecido com nosso pai nesse quesito — falo, de modo amigável.
Adentramos o banheiro, onde nos secamos e nos trocamos. Caminhamos no vilarejo, agora um pouco mais calmo devido ao horário tarde da noite, muitos já estavam dormindo. Ao chegarmos em nosso dormitório, vemos Dinah e a líder do vilarejo, com um vestido bem decotado e tatuagens distribuídas por todo seu corpo bem definido, longos cabelos vermelhos com uma franja. Ela segurava uma espécie de lança em sua mão direita, seus olhos eram amarelados, quase no tom de um dourado, ela nos fitava e olhava de modo rude, como se pudesse saber tudo o que falaríamos e como agiríamos.
Ela era bem alta e, assim que começa a falar, escuto o tom de sua voz firme e autoritário, uma típica voz feminina de mulher na faixa de seus trinta anos. Ela não estava com escolta, o que me faz pensar que ela não precisa que alguém lhe defenda. A julgar pelo seu porte, ela deve ser mestre em defesa e ataque.
— Boa noite, garotos. Me chamo Rey Grimory. Sou fundadora e líder do vilarejo e guerreiras Grimorys. Dinah foi me informar sobre a ajuda que ofereceu a vocês, precisava ver com meus próprios olhos o tipo de pessoas que adentraram nosso vilarejo — ela fala, de modo firme, enquanto caminha à nossa volta, analisando a nós dois sem nem disfarçar.
Eu senti um breve medo e não esperava que alguém me colocasse medo enquanto eu estava vestido de pijama e sendo meio que interrogado por uma mulher alta com uma lança de ouro em mãos.
— Não vejo ameaça em vocês, mas estarei de olho em seus movimentos. Saibam que eu tenho olhos em todos os lados, garotos. Tratem de não quebrar a confiança de uma Grimory. Perca minha confiança e eu acabo com vocês. — Ela dá uma risada e caminha em direção à saída, desejando que tenhamos uma boa noite de descanso.
Seguida dela, Dinah vai logo atrás e diz, acenando para nós e fechando a porta de nosso dormitório:
— Vejo vocês amanhã pela manhã para me despedir. Consegui um treinamento com a própria Rey. Descansem bem e se comportem. — Ela estava bem feliz e agitada, ela manda um beijo para Dante e sai, animada, atrás de sua líder.
Olho para Dante enquanto caminho em direção ao quarto e me jogo sobre a cama e falo, com as mãos atrás de minha cabeça, com um sorriso e um tom de malícia em minha voz:
— A Dinah está a fim de você mesmo, idiota.
— Você sempre vê coisa onde não existe, cara. — Vejo ele se deitar em sua cama e apagar a luz, sem mais nada a falar.
Viro para o lado, fitando a escuridão, até o meu sono chegar. Antes ele sequer dava sinal, pois com ele vinham mais das malditas visões ou pesadelos. Até aquele momento eu não sabia sobre o que poderia ser aquilo. Mas não estava tão longe de descobrir o motivo delas.
Um grupo de homens armados com roupas pretas estavam correndo em meio a uma cidade em ruínas, com prédios destruídos e poucos andarilhos nas ruas; a vegetação havia tomado parte do local.
Um garoto de cabelos brancos e grande, pele branca e bem alto, olhos azuis cristal e um corpo magrelo, corria. Ele vestia uma calça jeans e um casaco azul, aparentava ter a minha idade e segurava as mãos de uma garotinha, que abraçava uma pelúcia de unicórnio em suas mãos.
Os tiros dos homens eram impedidos pelas barreiras de gelo que o garoto colocava atrás deles dois, a garota estava em pânico e com medo de ser pega, nos olhos dela se via o medo e lágrimas que estavam por surgir.
Ele a pega no colo e aperta seu passo correndo e lançando estacas de gelo na direção dos homens que lançavam balas de choque, que ao entrar em contato com o corpo da vítima as paralisava a fazendo desmaiar no mesmo instante.
Nos uniformes deles estavam o logo da X-Bios Corporation, o que indicava que aqueles guardas eram da última sede da empresa. Mas o que eles queriam com aqueles dois? Vem então, em minha mente, o que a forma da água havia me falado mais cedo. Começo a correr junto a eles e escuto o garoto falar, ofegantemente, para a garota, olhando nos olhos azuis dela, de modo carinhoso e confiante:
— Ei vamos fazer algo divertido, tudo bem?
— O que está pensando? — pergunta ela, de modo inocente.
— Vamos nos esconder dos homens maus, tá bom? — ele fala, tentando convencê-la o quanto antes, virando uma rua na qual tinha muitos andarilhos, que seguiam atrás dos homens, que não desistiam de pegá-los.
Eles ainda continuam a correr atrás deles, enquanto outros atiravam contra os andarilhos com suas armas de fogo. O garoto entra dentro de um prédio que estava caído sobre outro, subindo as escadas. O local era um prédio empresarial e estava destruído e com pouca plantação e vegetação que havia invadido sua estrutura.
Ele olha em volta rapidamente, de um lado para o outro, vendo de imediato o armário de limpeza. Ele abre e coloca a garotinha no chão, agachando-se, ficando na altura dela, olhando-a nos olhos e fala, de modo bem convincente, com sua voz e expressão bem divertida, apesar de ofegante, e com um leve suor escorrendo de sua testa:
— Olha, esse é um esconderijo bem maneiro, arranjei o melhor para você, okay? Promete não sair daí até eu vir te pegar e nós ganharmos o pique-esconde? — diz ele, estendendo o dedo mindinho para ela.
Ela coloca o dedo mindinho dela junto com o dele, fazendo a promessa.
— Prometido — diz ela, com a voz fofa.
A pequena tinha um cabelo bem grande e branco, assim como o dele, a pele muito clara e os olhos tão azuis quanto o do jovem garoto.
Ela vestia um macacão jeans, que caía bem nela. Assim que ela faz a promessa, adentra o armário escuro e abraça forte sua pelúcia de unicórnio rosa.
— Cuida bem do Uni por nós. Não demoro muito — diz ele, com a voz meio grossa e sussurrando, de modo atencioso.
Ele fecha a porta e segue correndo, fazendo barulho para chamar atenção dos homens, mas algo pior surge: dois andrignos saltam sobre a mesa de madeira do escritório, procurando de onde vinha o barulho.
Ele se abaixa na quinta fileira das mesas, as criaturas estavam na segunda. Ele coloca a mão sobre a boca para evitar que as criaturas escutassem o barulho de sua respiração pesada. O que lhe faltava ali era sorte, ele só torcia para que a pequena não saísse do armário, porque, pela distância que eles se encontravam, as criaturas estavam mais perto dela do que dele; se algo desse errado, ele não teria como salvá-la.
Naquele instante, sou tirado desse local e sinto como se algo me puxasse para outra dessas visões. Vejo-me em um local queimando por chamas azuis e a forma de um adolescente surge à minha frente.
Quando me dou conta, era como se fosse uma cópia minha, falando comigo de modo rude e grosso:
— Você deve quebrar a conexão, seu idiota.
Olho confuso e falo, de modo curto e grosso também.
— Que conexão? Do que está falando?
Ele aponta para trás de mim e me viro lentamente, observando a mesma forma que queria me matar na floresta, aproximando-se de nós.
Começo a suar frio e a correr, pois ainda não tinha forças para lutar contra aquilo. Ela começa a invocar andarilhos controlados por suas chamas verde-esmeralda, as mãos começam a me puxar para o chão do qual elas estavam saindo.
A voz fria e calculista dela só aumentava em minha mente, causando uma dor tremenda em minha cabeça, sentindo as criaturas rasgarem a pele de minhas pernas com suas mãos enquanto me puxavam para o chão.
Sinto a voz de meu irmão, assim como as mãos dele em meu ombro, sacudindo-me para me tirar do transe, assim como da última vez.
— DAN, ACORDE! RÁPIDO, CARA! — ele falava, quase ordenando para eu despertar o quanto antes.
Acordo no mesmo instante, saltando da cama e me sentando sobre o colchão. Vejo ele me olhar assustado, como se visse algo sobre meu rosto. Eu estava suando frio e os cabelos caídos em minha testa estavam molhados com o suor de meu rosto.
— O que é isto no seu olho? Não está ardendo ou lhe causando incômodo? — ele me pergunta, caindo sentado sobre seu colchão.
Quando me dou conta, noto que, com meu olho esquerdo, via a aura elementar de meu irmão. Caminho em direção ao espelho do quarto em passos lentos e me olho nele.
Vejo meu reflexo e nele vejo a chama azul-celeste a qual meu irmão viu, e ficara tão surpreso e assustado quanto eu.
— O que está acontecendo comigo? — digo aquilo com a voz baixa e com um tom de preocupação enquanto levava minha mão direita, trêmula, em direção ao meu olho, que queimava uma pequena chama azul a sua volta.
Ficamos os dois ali, pensativos e apreensivos com as coisas que vinham acontecendo comigo e em nossa jornada.
Como isso poderia me afetar de agora em diante? As visões só têm aumentado, será que isso está relacionado a ela agora?
As perguntas surgiam em minha cabeça, assim como a preocupação tomava conta de mim enquanto via meu reflexo no espelho e não reconhecia mais quem eu era.
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